Acórdão Nº 0014253-69.2019.8.24.0038 do Primeira Câmara Criminal, 20-02-2020

Número do processo0014253-69.2019.8.24.0038
Data20 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemJoinville
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Apelação Criminal n. 0014253-69.2019.8.24.0038, de Joinville


Apelação Criminal n. 0014253-69.2019.8.24.0038, de Joinville

Relator: Des. Carlos Alberto Civinski

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA. TRÁFICO DE DROGAS (LEI 11.343/2006, ART. 33, CAPUT). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA.

MATERIALIDADE E AUTORIA NÃO IMPUGNADAS. DISCUSSÃO ACERCA DA DOSIMETRIA. INSURGÊNCIA QUANTO AO AUMENTO OPERADO NA PRIMEIRA FASE. FIXAÇÃO DA FRAÇÃO DE 1/3. INCREMENTO EM CONSONÂNCIA COM A QUANTIDADE E VARIEDADE DE ENTORPECENTES. OBSERVÂNCIA DO ART. 42 DA LEI DE DROGAS.

- Não se mostra desproporcional o incremento da pena-base à fração de 1/3 quando verificado que o traficante detinha larga quantidade de entorpecentes, em número capaz de atender milhares de usuários (2kg de maconha, 1,8g de MDMA e 51 micropontos de LSD).

- A existência de substrato probatório a revelar larga intimidade do agente delituoso com a prática do crime de tráfico de drogas, tem-se inviável a fixação de fração de redução, com base no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006, em patamar diverso do mínimo.

- Recurso conhecido e desprovido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0014253-69.2019.8.24.0038, da comarca de Joinville (1ª Vara Criminal), em que é apelante Everton Antonio Zanella, e apelados Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Acolheu-se, porém, manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça para corrigir equívoco na pena pecuniária e consequentemente minorá-la para 555 (quinhentos e cinquenta e cinco) dias-multa. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Desembargadores Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva e Hildemar Meneguzzi de Carvalho.

Florianópolis, 20 de fevereiro de 2020.

Assinado digitalmente

Carlos Alberto Civinski

Presidente e relator

RELATÓRIO

Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Everton Antônio Zanella, dando-o como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, em razão dos seguintes fatos:

Em data de 07 de agosto de 2019, por volta das 00:02 horas, na Rua Frontin nº 1388, Bairro Jardim Irirú, nesta cidade de Joinville/SC, o denunciado EVERTON ANTÔNIO ZANELLA manteve em depósito, em sua residência, para fins de comercialização, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, 7 (sete) porções da substância conhecida como maconha, apresentando a massa bruta de 2.006,1g (dois mil e seis gramas e um decigrama); 1 (uma) porção, acondicionada em embalagem de plástico incolor, com massa bruta de 15,8g (quinze gramas e oito decigramas) e 1 (um) comprimido branco, ambos da substância conhecida como MDMA; e 51 (cinquenta e um) micro-pontos da substância conhecida como LSD, acondicionados em selos de papel apresentando desenhos coloridos1, substâncias estas capazes de causar dependência física e psíquica (Portaria n. 344/98 da ANV/MS).

Além disso, foram apreendidos em poder do Denunciado 4 (quatro) rolos de plástico insulfilm para embalar os entorpecentes, 1 (um) envelope com cartas e anotações atinentes ao tráfico de drogas e a quantia de R$ 415,00 (quatrocentos e sessenta reais) em espécie, proveniente da narcotraficância. (fls. 42/43).

Sentença: a juíza de direito Regina Aparecida Soares Ferreira julgou procedente a denúncia para condenar Everton Antônio Zanella pela prática do crime previsto no art. 33, caput, § 4º da Lei 11.343/2006, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto; e ao pagamento de 694 (seiscentos e noventa e quatro) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, negando-lhe o direito de recorrer em liberdade (fls. 168-174).

Trânsito em julgado: muito embora não certificado pelo Juízo a quo, verifica-se que a sentença transitou em julgado para o Ministério Público.

Recurso de apelação de Everton Antônio Zanella: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que:

a) a natureza e quantidade do material entorpecente apreendido não autoriza o incremento da pena ou, no máximo, à fração de 1/9;

b) a causa especial de redução, prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.34/2006, deve ser fixada em seu grau máximo, uma vez que a decisão incorreu em bis in idem ao valorar por duas vezes quantidade e natureza da droga apreendida;

c) a alteração da pena, em atenção aos argumentos acima, importará na alteração do regime e substituição da pena por restritivas de direitos.

Requereu o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença, de modo a minorar a pena aplicada e alterar sua forma de resgate (fls. 180-186).

Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que:

a) o incremento da pena-base foi fixado em conformidade com o art. 42 da Lei 11.343/2006 e teve como elemento valorativo a natureza do produto estupefaciente apreendido, resultando na fração de 1/6;

b) a fração de redução da pena não incidiu em bis in idem, uma vez que teve como foco o valor monetário movimentado pelo apelante.

Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (fls. 191-197).

Parecer da PGJ: o procurador de justiça Francisco Bissoli Filho opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso. Porém, manifestou ser necessária a readequação da pena de multa, a observar a proporção em relação a pena corporal (fls. 210-214).

Este é o relatório.

VOTO

Do juízo de admissibilidade

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

Do mérito

A defesa e a acusação mostraram-se conformadas com a condenação de Everton Antônio Zanella pela prática do crime de tráfico de drogas, previsto no caput do art. 33 da Lei 11.343/2006.

Encontrando-se a insurgência recursal formalizada pela defesa restrita à pena aplicada, faz-se necessário destacar que a condenação foi fruto da apreensão em poder do apelante do material entorpecente, de numerário e documentos relacionados ao tráfico - conforme descrição contida na denúncia acima colacionada - e no depoimento dos policiais militares Fábio Fuscolin Klettmberg e Emerson Giaretta.

Apresentada a prova que levou à condenação do apelante, colaciona-se os argumentos contidos na sentença acerca do aumento operado na primeira fase da dosimetria, à fração de 1/3, (com base no art. 42 da Lei 11.34/2006) e a redução aplicada na terceira fase, à fração de 1/6 (com base no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006).

Primeira fase:

Quanto à dosimetria trifásica, na primeira fase, a análise das circunstanciais judiciais (art. 59 do CP) é a seguinte: a) a culpabilidade (reprovabilidade da conduta) é normal ao tipo em questão. b) os antecedentes não prejudicam o denunciado. c) A conduta social do acionado não diverge daqueles do seu convívio. d) A personalidade do acusado não enseja majoração, segundo os elementos coligidos aos autos. e) Os motivos não militam em desfavor do acusado. f) As circunstâncias do delito são normais. g) As consequências da infração não implicam agravamento nem atenuação. h) Não há de falar em comportamento da vítima. i) a natureza da droga exige maior repreensão, em razão da diversidade, as quais indicam, inclusive, elitização dos compradores (foi apreendido maconha, MD e LSD). j) a quantidade de droga também reclama maior rigor na punição, em razão da grande quantidade de droga apreendida (houve a apreensão de aproximadamente 2kg de maconha, 1,8g e 1 comprimido de MD e 51 micropontos de LSD).

Assim, para cada circunstância judicial desfavorável, aumento a pena mínima cominada ao tipo em 1/6 (um sexto), fixando a reprimenda básica em 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 832 (oitocentos e trinta e dois) dias-multa.

Segunda fase:

Na segunda fase do cálculo, não existem agravantes; incidem as atenuantes da menoridade relativa (art. 65, I, do CP) e da confissão espontânea (art. 65, III, "d", do CP). Logo, na medida em que reduzo a pena corporal em 1/6 (um sexto) para cada atenuante, há seu retorno para seu mínimo legal 5 (cinco) anos de reclusão. A pena de multa permanece inalterada pois segue o critério bifásico.

Terceira fase:

Como se sabe, a referida minorante visa conceder tratamento diferenciado ao "traficante de primeira viagem", de modo que sua incidência pressupõe que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique a atividades criminosas e não integre organização criminosa.

A aferição da existência destes requisitos depende, naturalmente, da prova colhida durante a instrução processual.

Na hipótese, o réu afirmou que estava traficando há aproximadamente dois meses, fato este que é corroborado pelas anotações contábeis apreendidas nos autos (e que estão disponíveis para consulta no Cartório desta Unidade Jurisdicional), cujo registro mais antigo é de 23-6-2019 (a prisão do réu, recorda-se, ocorreu em 7-8-2019).

O desempenho do tráfico há aproximadamente dois meses, ao menos em meu sentir, não comprova a dedicação a atividades criminosas.

Por outro lado, não se pode ignorar que houve a apreensão de aproximadamente 2kg de maconha, uma porção de 15,8g e um comprimido de MDMA e de 51 micropontos de LSD.

Outrossim, as anotações contábeis revelam que o conduzido teria "picado 210 balinhas" e que houve intenso comércio neste período, alcançando milhares de reais.

Sob esse enfoque, na medida em que entendo aplicável a minorante, a fração de redução deve ser operada em seu mínimo legal, isto é, 1/6 (um sexto), diante da grande quantidade de droga e do evidente lucro advindo de diversas negociações.

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