Acórdão Nº 0014684-55.2018.8.24.0033 do Terceira Câmara Criminal, 19-01-2021

Número do processo0014684-55.2018.8.24.0033
Data19 Janeiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0014684-55.2018.8.24.0033/SC

RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN

APELANTE: MAYCKON RODRIGO DE SOUZA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Itajaí, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Mayckon Rodrigo de Souza, dando-o como incurso nas sanções do art. 157, § 3º, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, pela prática da conduta assim descrita na inicial acusatória:

No ano de 2018, o denunciado MAYCKON RODRIGO DE SOUZA planejava assaltar a vítima Luciano da Silva, em sua residência localizada na Rua Alexandre Dávila Baptista, 140, Bairro Murta, nesta cidade.

Para tanto, no dia 09 de agosto de 2018, por volta das 10h50min, o denunciado MAYCKON RODRIGO DE SOUZA fazendo uso do terminal telefônico n. 47 99234-3845 e passando-se por "Gustavo", mandou mensagens via aplicativo whatsapp para a vítima, manifestando interesse em comprar perfumes, os quais eram vendidos pelo ofendido.

Assim é que, no mesmo dia, por volta das 20h10min, o denunciado se deslocou até a residência de Luciano da Silva, situada na Rua Alexandre Dávila Baptista, 140, Bairro Murta, nesta cidade e lá ingressou. Após observar os produtos vendidos pela vítima, o denunciado, mediante o emprego de uma faca, anunciou o assalto à vítima e exigiu que ela permanecesse em silêncio.

Em um momento de descuido do denunciado, a vítima tentou fugir do local, correndo até o portão de sua residência, contudo, foi atingida por diversos golpes de faca desferidos pelo acusado em suas mãos, costas, virilha e rosto. Durante a agressão, a vítima gritou por socorro, atraindo a atenção de vizinhos, razão pela qual, o denunciado evadiu-se do local, não se consumando o delito por circunstâncias alheias a sua vontade.

A morte da vítima só não se consumou pois ele, imediatamente, foi encaminhado ao Hospital Marieta Konder Bornhausen, resultando em ferimentos corto contusos suturados, um de três em região medial periocular esquerda, um de quarto em região supra escapular direita, um estendendo-se da região tênar até a região palmar da mão esquerda, um de três em região do terço proximal anterior da coxa direita e equimose arroxeada em região infra orbitária esquerda [sic]. (fl. 66) (evento 16).

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar o acusado às penas de 10 (dez) anos de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 5 (cinco) dias-multa, em seu mínimo legal, por infração ao disposto no art. 157, § 3º, segunda parte, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal. Foi-lhe negado o direito de apelar em liberdade (evento 147).

Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação, no qual requereu a absolvição do acusado em razão da insuficiência de provas para embasar o édito condenatório, alegando especialmente a ausência do animus furandi, invocando assim o princípio do in dubio pro reo. Subsidiariamente, pugnou pela desclassificação da conduta para aquela prevista no art. 129, caput, do Código Penal. Por fim, pleiteou o direito de recorrer em liberdade (evento 169).

Juntadas as contrarrazões (evento 172), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Gilberto Callado de Oliveira, opinou pelo conhecimento e não provimento do recurso (evento 12).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação contra decisão que julgou procedente a denúncia e condenou o acusado por afronta ao art. 157, § 3º (segunda parte), c/c art. 14, II, ambos do Código Penal.

O apelo merece ser conhecido, porquanto presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

Pretende a defesa a absolvição do apelante, sustentando, em síntese, a ausência de provas suficientes a embasar a condenação, principalmente no tocante ao animus furandi, razão pela qual pugna pela aplicação do princípio do in dubio pro reo.

Sem razão.

Textua o tipo penal em questão:

Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:

Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

[...]

§ 3º Se da violência resulta:

II - morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa.

E dita o art. 14, II, do Estatuto Repressor:

Art. 14. Diz-se o crime: [...]

II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Pois bem.

A materialidade delitiva veio demonstrada pelo boletim de ocorrência (evento 1 - inquérito 3 e 4) e laudo pericial (evento 1 - inquérito 67).

A autoria, assim como o dolo na conduta, restaram evidenciados nos autos.

A demonstrar, pertinente percorrer a prova oral colhida, cujas algumas transcrições, muito bem elaboradas pelo togado, passarão a integrar este voto, evitando tautologia.

A vítima Luciano da Silva ratificando suas declarações extrajudiciais (evento 1 - inquérito 05-07), declarou em juízo ter reconhecido a pessoa de Mayckon como sendo o masculino que esteve em sua residência no intuito de adquirir perfume para a namorada, produto que vendia, mas durante a suposta compra acabou anunciando um assalto, tendo lhe desferido golpes de faca quando tentou se evadir do local:

[...] vende produtos da Natura a pronta entrega; coloca os anúncios no OLX, Facebook e outras plataformas digitais; recebe vários pedidos por esses canais; no dia 8 ou 9 de agosto, uma pessoa entrou em contato, dizendo que tinha visto um anúncio dos perfumes no Facebook, dizendo que tinha interesse em comprar; o declarante disse que mandaria umas fotos dos produtos; mas a pessoa disse que queria ir na casa do declarante, com a namorada, porque ambos queriam comprar; o declarante disse que não atendia em casa, porque a forma usual era a pessoa escolher e ele fazer a entrega dos produtos; diante da insistência, e como era um casal interessado, o declarante não viu problema em abrir uma exceção; toda essa conversa foi via whatsapp (mas não tinha foto da pessoa); tudo foi entregue à Polícia Civil; foi marcado na casa do declarante às 19 horas; a pessoa tinha se identificado nas mensagens como Gabriel; por volta das 17 horas, a pessoa entrou em contato pra dizer que logo chegaria; depois, por volta das 20horas, o interfone tocou; o declarante foi até lá abrir o portão; o homem disse "sou eu, vim dar uma olhada nos perfumes"; o declarante perguntou se ele estava à pé; ele disse que tinha vindo de Uber, mas o motorista tinha ido ao posto comprar cigarro; o declarante perguntou da namorada; o homem disse que ela não quis vir porque estava com dor de cabeça; disse que ela havia pedido para ele escolher uns perfumes; o declarante estranhou, mas autorizou a entrada; o declarante mostrou os produtos; o homem ficou "enrolando", provando vários perfumes; finalmente ele escolheu os produtos para comprar; ele deu três notas de R$ 100,00 para efetuar o pagamento; o depoente virou de costas e andou um pouco até o lugar onde tinha dinheiro para dar o troco; nisso o rapaz abordou-o por trás com uma faca; a faca era dele mesmo; mandou o declarante ajoelhar; disse que era um assalto; o declarante ajoelhou; ficou com a faca no pescoço; o agente jogou um objeto [lacre] para que o declarante amarrasse suas mãos; o declarante decidiu que se amarrasse suas mãos com o objeto não iria sobreviver; o declarante enrolou um pouco, para ganhar tempo; a faca estava em seu pescoço; quando percebeu que o agente aliviou um pouco a faca, pegou a mão dele e virou, ambos caíram; daí o declarante levantou e saiu correndo; o agente correu atrás; nesse caminho o declarante foi levando facadas; uma facada pegou na mão, outra no rosto; essa facada no rosto atingiu o canal da lágrima; as vezes sai lágrima durante o dia; no que tentou empurrar o agente recebeu uma facada próximo da virilha; e quando conseguiu abrir o portão para sair levou uma facada nas costas, que quase acertou o pulmão; na sequência o declarante caiu; uma vizinha que estava escutando os gritos viu a cena; ela gritou para o marido ir ajudar; então o agente saiu correndo; durante e ação conseguiu perceber que o agente tinha tatuagens no pescoço; e nos dedos tinha tatuagens de baralho; no hospital, policiais foram tomar suas declarações; durante a semana a Polícia Civil mostrou uma foto, que o declarante reconheceu ser do agente; o declarante soube, por intermédio da Polícia, o nome do agente, Mayckon; também sabia que tinha outro envolvido, porque quando ele saiu correndo uma outra pessoa foi vista na rua; então o declarante fez pesquisa no Facebook de Mayckon; dai viu que ele tinha como amigo comum Jean; então o declarante ligou os fatos; Jean trabalhou na mesma empresa que o declarante; Jean já esteve na casa do declarante; Jean quando saiu da empresa ficou devendo um valor para o declarante; o declarante fez várias cobranças, mas Jean nunca pagava; naquela semana do ocorrido Jean tinha feito contato dizendo que iria pagar; pediu informações do declarante, se morava no mesmo local, se tinha o veículo HB20 ainda; tudo isso, depois do fato, causou suspeitas no declarante; no dia do fato viu bem o rosto do agente; por isso reconheceu com certeza o agente pela foto mostrada pela Polícia Civil; o dinheiro, R$ 300,00, ficou na casa; ficou manco quinze dias, porque a facada na perna pegou um nervo; ficou quinze dias sem trabalhar; no dia do fato não houve situação de ofensa verbal com o agente; as conversas pelo celular foram entregues a um policial civil (transcrição extraída da sentença - evento 147, grifou-se).

O policial militar Francisco de Assis Dantas Magalhães ouvido na fase judicial narrou que trocou informações sobre o caso com o policial Fernando Neto, mas não participou da ocorrência, de modo que a vítima chegou até o depoente através de terceiro, tendo-lhe narrado o ocorrido e passado informações acerca de um dos autores, o Jean, as quais Luciano já...

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