Acórdão Nº 0015183-49.2012.8.24.0033 do Quinta Câmara Criminal, 29-10-2020

Número do processo0015183-49.2012.8.24.0033
Data29 Outubro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0015183-49.2012.8.24.0033/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ CESAR SCHWEITZER


APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA APELADO: MILTON DE MIRANDA SANTORO


RELATÓRIO


O representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina com atuação perante o Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal da comarca de Itajaí ofereceu denúncia em face de Milton de Miranda Santoro, dando-o como incurso nas sanções do art. 121, § 3º, combinado com § 4º, do Código Penal, pela prática do fato delituoso assim narrado:
Que o denunciado Milton de Miranda Santoro é médico, especialista em cirurgia cardíaca, e como tal presta atendimento no Hospital Marieta Konder Bornhausen, localizado na Avenida Marcos Konder, nº 1111, Centro, nesta cidade e Comarca, além de prestar atendimento em consultório particular situado no município de Itapema.Por sua vez, no mês de novembro de 2011, na cidade de Itapema, a vítima Nadir Pedro Lazzaretti, após exames de rotina, foi encaminhado para atendimento por médico da área cardíaca, pelo que realizou exames e foi atendido pelo Dr. Luis da Rocha Silveira, que indicou a realização de novos exames nos quais foram constatadas as seguintes anormalidades: Volume Sistólico: 106 ml (normal de 26 a 88), Valva Mitral: Espessada e com depósito de cálcio; Valva Aórtica: Calcificada com estenose. O exame concluiu que a vítima/paciente Nadir apresentava: "Calcificação valvar aórtica com estenose discreta à moderada" (fl. 08).Uma vez realizados os exames, a vítima retornou ao cardiologista Dr. Luis da Rocha Silveira o qual alegou tratar-se de problema em grau leve e alegou que a vítima estaria, inclusive, capacitado para voltar às atividades laborais.Em busca de uma segunda opinião médica a vítima dirigiu-se ao consultório particular do denunciado, apresentando-lhe os exames já realizados, recebendo então o diagnóstico de que era portador de calcificação na válvula do coração e que "se a válvula fechasse poderia ter morte súbita" (fl. 125), que então o denunciado indicou a realização de cirurgia a ser realizada por si mesmo no Hospital e Maternidade Marieta Konder Bornhausen, nesta cidade de Itajaí.Ante as informações a si apresentadas a vítima submeteu-se à indicação médica, sendo que em 18 e 30 de janeiro de 2012 o denunciado solicitou ao SUS (Sistema Único de Saúde) a autorização para internação (fls. 19/20), sendo que internação deu-se em 10 de abril de 2012 (fl. 14) e a cirurgia foi realizada, sob responsabilidade do denunciado, em 18 de abril de 2012, na qual foi realizada a troca de válvula aórtica.A cirurgia cardíaca realizada na vítima gerou uma diversidade de conseqüências, sendo uma delas a obrigatoriedade da ingestão/utilização de substância anticoagulante. Contudo, para a vítima Nadir, em 09 de maio de 2012, a utilização do anticoagulante levou-o a sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) e consequentemente à morte que ocorreu em 11 de maio de 2012 (fl. 174).O denunciado Milton de Miranda Santoro agiu com imperícia ao indicar e realizar a cirurgia na vítima, eis que, segundo o quadro clínico por esta apresentado, a cirurgia cardíaca era desnecessária e não recomendável, ademais, pelos mesmos motivos, assim agindo, inobservou regra técnica da profissão por si adotada (Arts. 42, 48, 57 e 60, da Resolução CFM n. 1246/88). Por sua vez, a cirurgia realizada deu causa direta ao uso de anticoagulante e ao óbito (fl. 155), pelo que o denunciado, mediante imperícia, deu causa à morte da vítima Nadir Pedro Lazzaretti (sic, fls. 4-6 do evento 68.8).
Encerrada a instrução, a Magistrada a quo julgou improcedente o pedido formulado na inicial acusatória para absolvê-lo com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal.
Inconformado, interpôs o autor da ação penal recurso de apelação, objetivando a condenação do acusado nos termos da peça incoativa.
Em suas contrarrazões, o réu pugna pela preservação da decisão vergastada.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio de parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Paulo Roberto Speck, opinou pelo conhecimento e desprovimento do reclamo.
É o relatório

VOTO


Presentes os respectivos pressupostos de admissibilidade, conhece-se da irresignação e passa-se à análise do seu objeto.
Nada obstante as ponderações constantes das razões recursais, o pleito que visa a condenação do réu não merece prosperar.
Com efeito, a materialidade do fato encontra-se sobejamente demonstrada por meio do Ofício n. DJ 176/12 (fls. 11 do 68.8), ficha de acompanhamento funeral (fls. 6 do evento 68.8) e termo de retirada da declaração de óbito (fls. 7 do evento 68.8), bem assim pelas narrativas acostadas ao processado.
Todavia, na espécie, realmente não há nos autos provas suficientes para embasar a condenação do apelado. Assim, fazendo uso da técnica da fundamentação referenciada ou aliunde, amplamente admitida pela jurisprudência pátria, em especial nas Cortes Superiores (STF, AgR no RE 1099396/SC, rel. Min. Roberto Barroso, j. 23-3-2018; STJ, HC 462.140/RS, rel. Min. Laurita Vaz, j. 4-10-2018, AgRg no REsp 1.640.700/RS, rel. Min. Félix Fischer, j. 18-9-2018, AgRg nos EDcl no AREsp 726.254/SC, rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. 21-8-2018 e HC 426.170/RS, rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 8-2-2018; TJSC, Embargos de Declaração n. 0006291-74.2018.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Getúlio Corrêa, j. 16-10-2018 e Embargos de Declaração n. 0000906-80.2011.8.24.0027, de Ibirama, rel. Des. Sidney Eloy Dalabrida, j. 6- 9-2018), adotam-se os bem lançados fundamentos da decisão da lavra da Juíza de Direito Sonia Maria Mazzetto Moroso Terres como razões de decidir, porquanto examinou as provas existentes de acordo com a compreensão deste Colegiado:
[...]A situação em apreço diz respeito à morte da vítima Nadir Pedro Lazzaretti em razão de um acidente vascular cerebral hemorrágico (AVCH), supostamente causado em decorrência de complicação tardia de uma cirurgia cardíaca de substituição da válvula aórtica realizada pelo denunciado Milton de Miranda Santoro, médico cirurgião cardiovascular.Pela análise do arcabouço probatório coligido aos autos, é possível identificar o contexto de saúde do Ofendido desde o momento em que procurou atendimento médico na cidade onde residia até a data de seu óbito, pela causa mencionada alhures, no Hospital e Maternidade Marieta Konder Bornhausen, nesta Comarca.Inicialmente, a Vítima procurou atendimento médico pelo Sistema Único de Saúde na cidade de Itapema, onde foi atendido pelo caradiologista Dr. Luiz Eduardo da Rocha Silveira. Nesta primeira consulta, o médico verificou ao exame físico que o paciente apresentava sopro cardíaco decorrente de estenose aórtica, devido a presença dos sintomas de dor torácica e falta de ar. Diante da possibilidade de se tratar de caso grave, o Dr. Luiz Eduardo solicitou a realização de ecocardiograma, bem como recomendou à Vítima o afastamento de esforços físicos (fl. 221).Foi realizado o ecocardiograma na Vítima, tendo sido constatada a calcificação valvar aórtica, indicando a presença da doença estenose aórtica discreta a moderada (fl. 08). Diante do quadro clínico em questão, o Dr. Luiz Eduardo concluiu que o problema cardíaco do Ofendido ainda era leve e não comprometia o funcionamento do coração, motivo pelo qual liberou o paciente para a realização de suas atividades normais (fl. 222).Entretanto, no intuito de obter uma segunda opinião, Nadir Pedro procurou o consultório médico do Acusado, no qual relatou os mesmos sintomas anteriormente descritos e apresentou o resultado do exame cardíaco supramencionado. Ao contrário da interpretação do primeiro cardiologista, o Réu entendeu que a moléstia que acometia a Vítima era grave e exigia intervenção cirúrgica, ante à possibilidade da ocorrência de morte súbita conseguinte à calcificação da válvula aórtica, o que foi confirmado pelo Denunciado em ambas as fases processuais (fls. 235/236 e audiovisual - fl. 1055).Cumpre ressaltar que a cirurgia em questão consistia na substituição da válvula aórtica da Vítima por uma prótese mecânica, a qual, em razão de sua maior durabilidade, seria a recomendada para o caso, tendo em vista a expectativa de sobrevida do paciente. Todavia, este tipo de prótese valvar requer a utilização constante de medicamentos anticoagulantes pelo indivíduo, como forma de evitar a formação de coágulos e, consequentemente, a morte do paciente devido à ocorrência de trombose na válvula, conforme expuseram os cardiologistas ouvidos na qualidade de testemunhas de Acusação e Defesa (audiovisual - fls. 542, 675, 790/791 e 1024), bem como explícito nas Diretrizes acostadas aos autos (fl. 415).A Vítima foi encaminhada para o Hospital e Maternidade Marieta Konder Bornhausen, nesta Comarca, para a realização da cirurgia cardíaca. Após ser internado em 10.04.2012, o Ofendido passou pelo exame de cateterismo esquerdo, no qual também se constatou a presença de estenose aórtica leve a moderada (fl. 08). A orientação do Denunciado continuou sendo a da necessidade de operação, a qual foi realizada no dia 18.04.2012 e transcorreu normalmente.Após apresentar melhorias no pós-operatório, Nadir Pedro foi transferido da UTI para a ala normal na data de 20.04.2012 e, posteriormente, recebeu alta no dia 23.04.2012.Nos dias seguintes à alta hospitalar, as únicas informações constantes nos autos decorrem do testigo de Salete da Silva Lazzaretti, esposa da Vítima. Segundo Salete, após receber alta, o Ofendido teve uma série de complicações, sendo que seu estado de saúde foi piorando gradativamente. Nadir apresentava dores permanentes, falta de ar, tosse, insônia e crises de choro, sendo que no dia 26 de abril seu intestino parou de funcionar. Neste intervalo temporal, o Ofendido foi levado diversas vezes ao Pronto Socorro, tanto em Itapema, como em Itajaí, no Hospital Marieta. As crises persistiram até o dia...

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