Acórdão Nº 0015272-29.2017.8.24.0023 do Quarta Câmara Criminal, 19-05-2022

Número do processo0015272-29.2017.8.24.0023
Data19 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0015272-29.2017.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

APELANTE: LUIZ MARCOS DOS SANTOS TONELI (RÉU) APELANTE: LUCAS GOMES (RÉU) APELANTE: ROBERTO VARELA ZANCHETA (RÉU) APELANTE: WANDERLEY DOS ANJOS JORGE (RÉU) APELANTE: ALESSANDRO DA SILVA (RÉU) APELANTE: ANDERSON MANOEL NASCIMENTO (RÉU) APELANTE: CLAUDIO ROBERTO SIMAS JUNIOR (RÉU) APELANTE: FERNANDO VARELA ZANCHETA (RÉU) APELANTE: GILIARD FERREIRA LIVRAMENTO (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Florianópolis, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Gustavo dos Santos Silva, Fernando Varela Zancheta, Roberto Varela Zancheta, Giliard Ferreira Livramento, Anderson Manoel Nascimento, Cheverson Josnei da Cruz, Felipe Rodrigues Bernardino, Wanderley dos Anjos Jorge, Luiz Marcos dos Santos Toneli, Cláudio Roberto Simas Júnior e Alessandro da Silva, imputando, aos dois primeiros, a prática do delito capitulado no art. 2º, § 2º, § 3º e § 4º, I, da Lei nº 12.850/13 (fato 1); aos demais a prática do delito capitulado no art. 2º, § 2º e § 4º, I, da Lei nº 12.850/13; e de Lucas Gomes, como incurso nas sanções do art. 2º, § 2º e § 4º, I, da Lei nº 12.850/13 (fato 1) e art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06 (fato 2), em concurso material de crimes, pois, segundo consta na denúncia e no seu aditamento:

I. DO CRIME DE INTEGRAR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA (FATO 1).

Segundo apurado no curso do procedimento investigatório incluso, em data a ser melhor apurada durante a instrução processual, mas certo que no período entre julho de 2017 a agosto de 2018, os denunciados GUSTAVO DOS SANTOS SILVA, FERNANDO VARELA ZANCHETA, ROBERTO VARELA ZANCHETA, ANDERSON MANOEL NASCIMENTO, LUCAS GOMES, CHEVERSON JOSNEI DA CRUZ, FELIPE RODRIGUES BERNARDINO, WANDERLEY DOS ANJOS JORGE, GILIARD FERREIRA LIVRAMENTO, LUIZ MARCOS DOS SANTOS TONELI, CLÁUDIO ROBERTO SIMAS JUNIOR e ALESSANDRO DA SILVA integraram, pessoalmente, a organização criminosa denominada PRIMEIRO GRUPO CATARINENSE (PGC), associando-se entre si, de forma hierarquizada, estruturalmente ordenada, de modo permanente, caracterizada pela divisão de tarefas, com o objetivo de obterem, direta e indiretamente, vantagens ilícitas mediante a prática habitual do crime de tráfico de drogas, dentre outros ilícitos voltados aos interesses da facção.

O Primeiro Grupo Catarinense - PGC, criado em março de 2003, constitui uma estrutura no âmbito do crime organizado, com atuação inicial no interior de Unidades Prisionais e, depois, para as próprias cidades catarinenses. Esta organização criminosa mantém conexão com outros grupos criminosos, como o Comando Vermelho (CV), facção criminosa do Rio de Janeiro, e com a Família do Norte (FDN), facção criminosa do Amazonas. O PGC utiliza, nas suas atividades, o emprego de armas de fogo, além de contar com a participação de adolescentes.

O grupo tem liderança colegiada consistente no Primeiro Ministério (cargos vitalícios) e Segundo Ministério (com obrigatoriedade de estar recluso em São Pedro de Alcântara), além de contar com um Tesoureiro-Geral e com os que exercem os cargos de Disciplinas e Sintonias de estabelecimentos prisionais, cidades e bairros, difusores e cumpridores da ideologia e ordens do grupo. O objetivo da facção vem estampado em seu Estatuto, consistente em fazer o "crime de modo correto", especialmente o tráfico de drogas, crimes contra o patrimônio, comércio e transporte de armas de fogo e homicídios, promovendo o repasse de valores (dízimos) para obtenção de armas, pagamento de advogados, manutenção de familiares dos reeducandos do Sistema Prisional, além de fomentar um caixa central.

Em relação à investigação que deu origem aos presentes autos, o ponto de partida foram os depoimentos de duas testemunhas protegidas (fls. 16 e 18) que prestaram informações acerca da participação de diversos integrantes que atuam na cidade de Florianópolis, mais especificamente na comunidade conhecida como "Morro do Mocotó". Nesse contexto, a fim de apurar a prática de crimes por partes dos integrantes deste grupo criminoso, a Autoridade Policial representou pela interceptação telefônica de alguns ramais e posteriormente pela busca e apreensão nos endereços dos investigados e prisões temporárias, as quais foram autorizadas judicialmente, de forma que o cumprimento das medidas ensejou a apreensão de drogas2 , cartas, celulares, valores em espécie, sendo possível evidenciar que os denunciados, além de exercerem o tráfico de entorpecentes de forma reiterada, atuavam com obediência ao Estatuto e às ordens superiores da organização criminosa PGC - Primeiro Grupo Catarinense.

Extrai-se da investigação, especialmente dos períodos de interceptação telefônica judicialmente autorizados, que grande parte do grupo criminoso ora denunciado atuava fortemente de dentro das penitenciárias estaduais, emanando ordens através de ligações telefônicas e mensagens de texto (SMS), comandando o tráfico de drogas nos morros e biqueiras, utilizando ainda do aliciamento de indivíduos menores de idade para atuarem como "olheiros" e realizarem a venda de entorpecentes, além do uso de armas de fogo para imposição de sua vontade e resistência a qualquer atuação policial.

A participação dos denunciados na organização criminosa Primeiro Grupo Catarinense - PGC resultou devidamente definida no curso das investigações desenvolvidas nos presentes autos, permitindo-se detalhar a função de cada um deles no grupo criminoso:

O denunciado GUSTAVO DOS SANTOS SILVA, vulgo "ZÉ DO MOCA, AR15 ou R15", é um dos líderes dessa organização criminosa e é conhecido como o "dono do Morro do Mocotó"4 , pessoa que tem mais poder na localidade, possuindo armas de fogo e forte esquema de segurança, através de "soldados" que fazem a sua proteção. Realiza o tráfico de drogas no Morro do Mocotó em benefício da facção criminosa, bem como exerce função na cúpula do Primeiro Grupo Catarinense - PGC, integrando o Primeiro Ministério.

O denunciado FERNANDO VARELA ZANCHETA, vulgo "XADREZ", também é um dos líderes dessa organização criminosa, e mesmo segregado na Penitenciária de Florianópolis à época dos fatos, mantinha-se na liderança e organização do grupamento criminoso, inclusive se autodenominando o "representante do primeiro ministério". Em conversa telefônica captada no curso da investigação, é possível observar que o denunciado Fernando participa da reformulação do quadro de representantes da facção criminosa após a transferência de alguns dos antigos integrantes dos cargos da cúpula para Penitenciárias Federais. De acordo com o relatório policial, Fernando realizada uma chamada para um interlocutor não identificado, que está preso na penitenciária de São Pedro de Alcântara, oportunidade em que traça planos para a "reformulação do quadro da organização criminosa PGC"; além disso, Fernando revela "que ele e o GU são os representantes do PRIMEIRO MINISTÉRIO PGC"; conversam ainda a respeito da organização da facção no interior das unidades prisionais. Conforme decorre desta conversa, segundo a Autoridade Policial, Fernando propõe a reformulação do primeiro ministério da organização criminosa PGC a partir da transferência dos integrantes deste degrau hierárquico da facção.

O denunciado ROBERTO VARELA ZANCHETA, vulgo "CHECKMAT", segregado na Penitenciária de São Cristóvão do Sul à época dos fatos, tem atuação destacada na organização criminosa, notadamente no desenvolvimento de ações visando a estruturação e composição da facção PGC. Em mensagem de texto (SMS) interceptada, realizou o "reapadrinhamento" do denunciado Giliard Ferreira Livramento, a pedido deste, na facção criminosa. Conforme consta na investigação, Roberto solicita a Giliard: " manda seu cadastro completo com seus padrinhos que faço aqui e coloco na pista" (fl. 940). Assim procedeu Giliard. Depois de obter o "artigo" (antecedentes) de Giliard e de sua qualificação, Roberto passou a ser o novo "padrinho" de Giliard dentro da facção e, portanto, a chamá-lo de afilhado.

O denunciado GILIARD FERREIRA LIVRAMENTO, vulgo "GILI", segregado na Penitenciária de Curitibanos à época dos fatos, realizou contato através de mensagens de texto (SMS)7 com o denunciado Roberto Varela Zancheta, vulgo Checkmat, solicitando o seu "reapadrinhamento", ou seja, o seu retorno para a facção criminosa. Conforme referido acima, Roberto, atendendo ao pedido de Giliard, procedeu ao seu "reapadrinhamento" na facção, tornando-se, Roberto, o novo padrinho de Giliard dentro da facção criminosa.

O denunciado ANDERSON MANOEL NASCIMENTO, vulgo "CHEIRINHO", segregado na Penitenciária de Florianópolis à época dos fatos, durante o monitoramento telefônico, foi interceptado em conversa com integrante da facção não identificado, vulgo "Pai", falando a respeito da compra de substância entorpecente para fabricação de 'bala' (ecstasy), e que desejava entregar as drogas para um afilhado vender e ganhar dinheiro. Conversam ainda sobre a venda de drogas e sobre o novo estatuto da facção, momento em que Anderson diz "os caras tem que cumprir independente de ser irmão ou companheiro", referindo-se também à guerra existente com o PCC e a polícia. Por fim, dialogam sobre armas e um projeto que Anderson tem para o morro, e "Pai" informa que entregará drogas para a esposa de Anderson, Maria Fernanda Silva Correa, vender.

O denunciado LUCAS GOMES, vulgo "LUQUINHAS", segregado na Penitenciária de Florianópolis à época dos fatos, durante o monitoramento telefônico, foi interceptado em conversa com integrante da facção não identificado, vulgo "Nego", em que tratam de assuntos relacionados ao tráfico de drogas e a prisão de um comparsa. O denunciado Lucas informa uma conta bancária para que seja realizado o pagamento do dízimo. Em diálogo captado com a sua esposa, Viviane Jenifer do Rosário Souza, Lucas Gomes pede a ela para que realize o pagamento do dízimo e mande fotos dos comprovantes pois deseja compartilhar com o grupo.

O...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT