Acórdão Nº 0016044-73.2019.8.24.0038 do Quarta Câmara Criminal, 21-01-2021

Número do processo0016044-73.2019.8.24.0038
Data21 Janeiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 0016044-73.2019.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador ALEXANDRE D'IVANENKO

RECORRENTE: ALESSANDRO VOLKMANN (ACUSADO) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto por Alessandro Volkmann, inconformado com a decisão (Evento 135) proferida pelo Juízo da Vara do Tribunal do Júri da comarca de Joinville, que admitiu a denúncia e o pronunciou como incurso nas sanções do art. art. 121, § 2.º, incs. II, III e IV, c/c art. 14, inc. II, ambos do Código Penal; art. 14 da Lei n. 10.826/2003; e art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, submetendo-o, então, a julgamento pelo Tribunal Popular.

Em suma, o recorrente, representado por defensor constituído, argumentou o seguinte: [a] "embora esteja estampada a materialidade e autoria, o mesmo não se pode dizer quando ao animus necandi do acusado Alessandro"; [b] "não restou clara a intenção do acusado em praticar a conduta a ele imputada. Isto é, da análise dos elementos de prova colhidos na investigação policial e suas particularidades, não se pode afirmar que Alessandro agiu com animus necandi. Os indícios apontam, a bem da verdade, para um desentendimento com o segurança da casa noturna, ao retorna para buscar sua esposa (Patrícia) o segurança e fez menção que ia pegar a arma, em ato continuo o acusado voltou ao carro e pegou sua arma, de maneira acidental efetuou um disparo que atingiu o pé da vítima Anderson Alves de Sena"; [c] "as provas carreadas aos autos indicam que Alessandro atirou acidentalmente a pistola, sem que tivesse feito mira, portanto, não configuram os indícios necessários para o encaminhamento para o julgamento pelo tribunal do júri"; [d] "duas testemunhas que trabalhavam na casa noturna também como segurança, relatam que Alessandro sacou a arma, porém não mirou! Importante ressaltar Excelência, que foi efetuado apenas 01 disparo, ou seja, Alessandro detinha recurso para outros disparos, porém, não o fez"; [e] "embora se possa considerar que disparo deu causa à lesão da vítima, não há demonstração de que o acusado tinha o objetivo de ceifar a vida de alguém, ou assumiu esse risco. Não se pode generalizar a ação do acusado a ponto de considerar que em qualquer dano ou lesão colateral havia intenção de causar a morte"; [f] "o acusado não concorreu para tentativa de homicídio, em sua modalidade tentada, isto porque, logo após o disparo acidental, desistiu, de forma voluntária, de prosseguir na execução do crime"; [g] "o Ministério Público não logrou êxito em sua tese acusatória, de modo que o não se pode incidir as qualificadoras do motivo fútil, perigo comum e do recurso que dificultou a defesa da vítima".

Concluiu requerendo ao Tribunal o provimento do recurso, "para reformar a sentença de pronúncia do recorrido Alessandro Volkmann, conforme os fundamentos ventilados, despronunciando-o e subsidiariamente desclassificando-se a infração para o delito de lesão corporal previsto no art. 129, CP, e, após, remetendo-se o feito ao Juízo a quo para o seu regular prosseguimento, nos termos do art. 74, § 2º, do CPP. Caso venha a ser pronunciado, requer pelo afastamento das qualificadoras imposta na denúncia, por insuficiência das circunstâncias" (Evento 147).

Com as contrarrazões (Evento 153), e mantida a decisão impugnada por seus fundamentos em atenção ao preconizado no art. 589 do Código de Processo Penal (Evento 155), os autos ascenderam a este Tribunal.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Lio Marcos Marin, que se manifestou pelo conhecimento e não provimento do recurso (Evento 15 - promoção 1).

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, o recurso há de ser conhecido, e inexistindo preliminares a serem debatidas, nem mesmo de ofício, passa-se à análise do mérito.

Colhe-se dos autos que o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia contra Alessandro Volkmann, pelo cometimento, em tese, dos crimes previstos no art. 121, § 2º, incs. II, III e IV, c/c art. 14, inc. II, do Código Penal, no art. 14 da Lei n. 10.826/2003 e no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, pelos seguintes fatos descritos na peça acusatória (Evento 11):

Consta dos autos que o denunciado ALESSANDRO VOLKMAN saiu de sua residência no dia 17 de agosto de 2019, portando irregularmente a pistola imbel calibre .380, nº GCMD1HGA46904 F1, registrada em seu nome, passando a transitar com ela, ocasião em que se deslocou até o estabelecimento comercial "American Pub", situado na Rua Visconde de Taunay n. 613. Bairro Atiradores, Joinville.

Na sequência, no interior do referido estabelecimento, o denunciado, com animus necandi, utilizando-se da arma de fogo tentou matar Ariel Fernandes Lopes, que trabalhava como segurança no local. Entretanto acabou por atingir a vítima Anderson Alves de Cena ao desferir-lhe disparo, que ocasionou as lesões descritas no Laudo Pericial de Lesão Corporal n. 9406.19.04225 (pág. 60).

O crime foi praticado por motivo fútil, tendo em vista que o acusado tentou ceifar a vida Ariel em razão da vítima ter retirado o denunciado da casa noturna, devido a Alessandro estar embriagado.

O denunciado utilizou-se de meio que resultou em perigo comum, ao efetuar disparo de arma de fogo no estabelecimento comercial "American Pub", local de grande circulação de pessoas, colocando em risco não apenas a vítima, mas também os demais indivíduos presentes no momento dos fatos.

O delito foi cometido com emprego de recurso que dificultou a defesa da vítima, porquanto o acusado colheu a vítima de surpresa ao efetuar o disparo de arma de fogo de inopino, enquanto a vítima estava em seu ambiente de trabalho e não esperava a injusta agressão.

O resultado morte somente não ocorreu por circunstâncias alheias à vontade do denunciado, uma vez que Anderson recebeu pronto e eficiente atendimento médico que lhe evitou a morte.

Por fim, o acusado ainda conduziu seu veículo automotor marca Spin pela via pública, estando com sua capacidade psicomotora alterada em razão da voluntária ingestão de bebida alcoólica. Em decorrência da alteração da capacidade psicomotora, o denunciado estava dirigindo em alta velocidade e "derrapando na via", gerando manifesto perigo aos os usuários da via pública

Devidamente processado, sobreveio decisão interlocutória mista não terminativa, pela qual o Juízo a quo admitiu a acusação e, então, pronunciou o réu Alessandro Volkmann para julgamento pelo Tribunal Popular, por infração ao art. 121, § 2º, incs. II, III e IV, c/c art. 14, inc. II, do Código Penal, ao art. 14 da Lei n. 10.826/2003 e ao art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro (Evento 135).

Daí o inconformismo manifestado pelo acusado, por meio de sua defesa constituída, que insiste nas seguintes teses: despronúncia; desclassificação da conduta para o crime de lesão corporal, por ausência de animus necandi; e exclusão das qualificadoras do motivo fútil, perigo comum e recurso que dificultou a defesa da vítima.

Porém, não obstante os argumentos articulados, o recurso não comporta provimento, adiante-se.

Inicialmente, convém transcrever o disposto no "caput" e no parágrafo primeiro, do art. 413, do Código de Processo Penal:

Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.

§ 1o A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena.

Como se sabe, a pronúncia representa mero juízo de admissibilidade da acusação quando formada convicção sobre a materialidade do fato e a existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, relegando a análise valorativa e aprofundada dos elementos de prova ao Tribunal do Juri - soberano por vontade constitucional (art. 5º, inc. XXXVIII, "d", da Constituição da República).

Nesse sentido é o escólio extraído da doutrina de Heráclito Antônio Mossin:

Para que o juiz pronuncie o acusado, basta que se convença da materialidade do fato e da existência de indícios...

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