Acórdão Nº 0016141-73.2011.8.24.0064 do Terceira Câmara Criminal, 03-03-2020

Número do processo0016141-73.2011.8.24.0064
Data03 Março 2020
Tribunal de OrigemSão José
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0016141-73.2011.8.24.0064, de São José

Relator: Desembargador Júlio César M. Ferreira de Melo

APELAÇÃO CRIMINAL (RÉU SOLTO). CRIMES COMETIDOS CONTRA A SAÚDE PÚBLICA E O SISTEMA NACIONAL DE ARMAS. TRÁFICO DE DROGAS E PORTE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO (COM NUMERAÇÃO SUPRIMIDA) (ART. 33, CAPUT, DA LEI N.º 11.343/06 E ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, INC. IV, DA LEI N.º 10.826/03). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. ALEGADA PRELIMINAR DE NULIDADE DO PROCESSO EM RAZÃO DA AFRONTA AO PRINCÍPIO DA INVIOLABILIDADE DO DOMICÍLIO. PLEITOS DE ABSOLVIÇÃO ANTE A INSUFICIÊNCIA DE PROVAS DA AUTORIA DELITIVA. SUBSIDIARIAMENTE, PRETENDIDA A DESCLASSIFICAÇÃO PARA A CONDUTA DO ART. 28, DA LEI N. 11.343/06, O RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO (ART. 33, §4º, DA LEI DE DROGAS) E A SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. RECURSO CONHECIDO E, AFASTADA A PRELIMINAR, DESPROVIDO.

1. PRELIMINAR DE NULIDADE. INVASÃO DE DOMICÍLIO. O crime de tráfico de drogas possui caráter permanente, e sua consumação se estende pelo tempo: o estado de flagrância perdura enquanto não cessar a conduta delitiva. Vale lembrar que o direito à inviolabilidade do domicílio não é absoluto, porquanto admitidas as hipóteses previstas no art. 5.º inc. XI da Carta Maior. Uma vez comprovado o estado de flagrância, descabido o pleito de nulidade aventado.

A denúncia anônima, como ponto de partida da atuação policial, se confirmado o delito, torna-se elemento íntegro e capaz de justificar a adoção de medidas de investigação de crimes permanentes, como por exemplo, o ingresso em residência sem mandado judicial. Cogitar-se da impossibilidade da sua utilização como elemento de prova, na prática, levaria à inviabilidade da elucidação de crimes como o presente. Na hipótese, o ingresso dos policiais na residência do apelante ocorreu após o recebimento de denúncias anônimas e, na diligência, comprovada a posse de considerável quantidade de drogas (26,6g de cocaína - equivalente a aproximadamente 260 porções individuais, além de arma e munições). Desnecessário, pois, mandado judicial, caindo por terra o pleito de absolvição por afronta ao art. 5.° XI e LVI da CFRB. Preliminar afastada.

2. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. NARCOTRAFICÂNCIA. Quando os elementos contidos nos autos de prisão em flagrante são corroborados em Juízo por declarações firmes e coerentes dos Policiais Militares que participaram da prisão dos acusados, forma-se, em regra, um conjunto probatório sólido e suficiente para a formação do juízo de condenação. Uma vez confirmada a prática de tráfico de entorpecentes, cai por terra a tese de que as drogas apreendidas seriam destinadas exclusivamente ao consumo próprio.

3. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO (COM A NUMERAÇÃO SUPRIMIDA). O laudo pericial constatou que a arma apreendida possuía funcionamento normal e seu número de série de fabricação encontrava-se parcialmente destruído de forma fraudulenta.

4. PLEITO DE RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. Não se aplica a causa especial de diminuição de pena estabelecida no § 4.º do art. 33 da lei antidrogas quando demonstrado nos autos que o réu é reincidente.

5. SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVA DE DIREITO. A reincidência do acusado e o quantum da pena aplicada, não recomendam a substituição da pena corporal por restritivas de direitos, ante o não implemento dos requisitos previstos no art. 44 do Código Penal.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0016141-73.2011.8.24.0064, da comarca São José 2ª Vara Criminal em que é Apelante Jhonattan Camilo Pereira e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Terceira Câmara Criminal decidiu, à unanimidade, conhecer do recurso e, afastada a preliminar, negar-lhe provimento, fixando-se a verba honorária devida ao defensor dativo (Dr. Alessandro de Bona OAB/SC nº 43.185) no importe de R$ 540,00 (quinhentos e quarenta reais), pela atuação neste grau de jurisdição, com fulcro no art. 8º, §4º, e item 10.4 do Anexo Único da Resolução CM n. 11/2019 do TJSC. Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Getúlio Corrêa e Desembargador Ernani Guetten de Almeida.

Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Procurador de Justiça Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira.

Florianópolis, 3 de março de 2020.

Desembargador Júlio César M. Ferreira de Melo

Presidente e Relator


RELATÓRIO

Adoto o relatório da sentença de fls. 201-221, da lavra da Magistrada Bianca Fernandes Figueiredo, que apresentou devidamente os contornos da ação crime e o desenrolar do trâmite processual. In verbis:

O Órgão do Ministério Público em exercício neste Juízo, no uso de suas atribuições legais, ofereceu DENÚNCIA contra JHONATTAN CAMILO PEREIRA, já qualificado nos autos, atribuindo-lhe a prática dos crimes capitulados no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, e no art. 16, inciso I, da Lei n. 10.826/03, pelos fatos assim descritos, ipsis litteris:

Conforme constam das provas acostadas aos presentes autos, que a esta servem da fundamentação, no dia 03 (três) de setembro de 2011, por volta das 14h20min, policiais militares do Batalhão de Operações Especiais - BOPE - da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina se encaminharam até a residência localizada na Rua Peru, nº 263, bairro Procasa, no Município de São José - SC, com a finalidade de apurar delações no sentido de que no âmbito da indigitada residência era levado a efeito um esquema de alienação de drogas ilícitas.

Foi assim que os agentes estatais ingressaram no interior do sobredito imóvel e lograram êxito em localizar 48 (quarenta e oito) "petecas" da droga vulgarmente conhecida como "cocaína" em um roupeiro situado no quarto do denunciado Jhonattan Camilo Pereira, substância esta que é capaz de causar dependência física e/ou psíquica, proibida em todo o Território Nacional, conforme portaria nº 344/1988, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde e atualizada pela Resolução da Diretoria Colegiada RDC nº 07, de 26 de fevereiro de 2006, a qual o ora denunciado mantinha em depósito, com a finalidade de expor à venda.

Cumpre ressaltar que a guarnição também logrou êxito em localizar 01 (uma) arma de fofo, tipo pistola, modelo GLOCK ÁUSTRIA, calibre .380, oxidada, com numeração ilegível, de uso restrito, conforme Decreto nº 3665/200, armamento este que o denunciado Jhonattan possuía e mantinha em depósito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Consignamos, por último, que foram apreendidos 11 (onze) cartuchos de munição intactos compatíveis com o calibre .380, além de 01 (uma) munição compatível com o calibre .09mm e R$ 72,00 (setenta e dois reais) em Espécie.

Concluiu postulando o recebimento da peça acusatória, a citação do acusado e, ao final, a condenação deste nas penas dos dispositivos antes mencionados.

Às fls. 62-65 foi indeferido o pedido de revogação da prisão preventiva e recebida a denúncia.

Ofertada a defesa preliminar (fls. 71-81), houve a designação de audiência de instrução e julgamento (fl. 83).

Na fase instrutória, foram inquiridas 2 (duas) testemunhas arroladas pela acusação e 1 (uma) indicada pela defesa (fls. 105-107) e, ato contínuo, realizou-se o interrogatório do acusado (fls. 108/109). Em audiência, a defesa pleiteou a revogação da prisão preventiva (fl. 104), o que restou indeferido à fl. 112.

Posteriormente, a defesa reiterou o pedido (fls. 115-127) e, após manifestação favorável do Ministério Público (fl. 130), foi revogada a prisão preventiva do réu (fl. 132).

Juntados os laudos periciais de identificação de substância entorpecente e de exame em arma e munição (fls. 144-147/150-152), foram intimadas as partes para que se manifestassem, mas apenas o Ministério Público requereu fossem certificados os antecedentes criminais do acusado (fls. 156).

Na sequência, foram ofertadas as derradeiras alegações, em que o Dr. Promotor de Justiça postulou a condenação do acusado nos termos da exordial acusatória (fls. 164-171).

Por sua vez, a defesa pugnou pela absolvição do acusado, ao argumento de que inexistem provas suficientes para embasar a condenação. Alternativamente, requereu a desclassificação do crime de tráfico para o delito previsto no art. 28 da Lei n. 11.343/06 (fls. 176-179).

Posteriormente, vieram-me os autos conclusos.

Após a regular instrução do processo criminal, o Juízo do primeiro grau proferiu decisão com o seguinte dispositivo (fl. 220):

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE A DENÚNCIA e, em consequência, CONDENO o acusado JHONATTAN CAMILO PEREIRA às penas de 9 (nove) anos e 6 (seis) meses de reclusão, para cujo cumprimento fixo o regime inicialmente fechado, e 510 (quinhentos e dez) dias-multa, quantificada no valor unitário equivalente ao mínimo legal vigente à época dos fatos, por infração às condutas descritas no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 e no art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei n. 10.826/03.

Intimado pessoalmente em cartório, o acusado manifestou interesse em recorrer (fl. 225).

Após a inércia do patrono constituído, que mesmo após intimado deixou de apresentar as razões recursais, o Desembargador relator nomeou defensor dativo que apresentou a peça defensiva, tendo o órgão colegiado negado provimento ao recurso (fls. 307-321).

Irresignado, o Apelante interpôs recurso especial (fls. 317-346),o qual não foi admitido pelo Superior Tribunal de Justiça (fls. 349-351 e 381-382).

Na sequência, a Defesa impetrou habeas corpus aduzindo a existência de constrangimento ilegal por não ter sido oportunizado ao acusado a constituição de um novo causídico após a inércia do seu defensor, o que caracteriza violação à ampla defesa.

O Superior Tribunal de Justiça concedeu a ordem...

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