Acórdão nº 0016221-62.2017.8.14.0401 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Penal, 30-10-2023

Data de Julgamento30 Outubro 2023
Órgão2ª Turma de Direito Penal
Ano2023
Número do processo0016221-62.2017.8.14.0401
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
AssuntoUso de documento falso

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0016221-62.2017.8.14.0401

APELANTE: ELINALDO SILVA SARAIVA

APELADO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargador RÔMULO JOSÉ FERREIRA NUNES

EMENTA

APELAÇÃO PENAL. RECURSO DEFENSIVO. USO DE DOCUMENTO FALSO. PLEITO ABSOLUTÓRIO. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. IMPROCEDÊNCIA. REFORMA DA DOSIMETRIA. REDUÇÃO DA PENA. PROCEDÊNCIA. OCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM NA VALORAÇÃO DOS ANTECEDENTES CRIMINAIS E NO RECONHECIMENTO DA REINCIDÊNCIA. JUÍZO A QUO SE UTILIZOU DA MESMA CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO PARA APRECIÁ-LOS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

1. Não há que se falar em absolvição, quando há nos autos provas suficientes e concretas da materialidade e autoria delitiva. O crime de uso de documento falso tem como núcleo do tipo fazer uso do documento, ou seja, fazer com que o documento seja usado como se verdadeiro fosse.

2. O apelante confessou ter confeccionado carteira de juiz arbitral do TJPA e, conforme depoimento dos policiais civis, apresentou o referido documento na Delegacia quando foi prestar esclarecimentos, oportunidade em que a autoridade policial, verificando tratar-se de documento falso, lhe deu voz de prisão, não restando dúvidas de que o réu praticou o crime previsto no art. 304 do CP, uma vez que as suas condutas se encaixam perfeitamente no tipo penal imputado, havendo um conjunto probatório apto a embasar a sentença condenatória.

3. O Juízo sentenciante se utilizou do mesmo processo para valorar negativamente os antecedentes e reconhecer a agravante da reincidência, motivo pelo qual deve ser reconhecido o bis in idem e o referido vetor ser considerado neutro.

4. Considerando que todas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP devem ser neutras, a fixação da pena-base no mínimo legal se impõe, qual seja, 02 (dois) anos de reclusão (art. 297, CP) e 10 (dez) dias-multa.

5. Não existem atenuantes. Presente a agravante da reincidência (CP, art. 61, inc. I), exaspera-se a pena-base em 06 (seis) meses de reclusão e 10 (dez) dia multa, a fim de evitar reformatio in pejus em recurso exclusivo da defesa, totalizando a reprimenda em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, calculados à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época do fato, pena que torno definitiva face a ausência de causas de aumento ou diminuição de pena, a ser cumprida em regime inicial aberto, conforme art. 33, §2º, ‘c’ do CP.

6. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores da 2ª Turma de Direito Penal, por unanimidade, em conhecer do recurso e lhe dar parcial provimento, para reformar a dosimetria da pena imposta ao apelante, que passa a ser concreta e definitiva em 02 (dois) anos e 06 (seis) de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto, e 20 (vinte) dias-multa, mantidos os demais termos da sentença, no que couberem, na conformidade do voto do relator.

Desembargador RÔMULO JOSÉ FERREIRA NUNES

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de apelação penal interposta por ELINALDO SILVA SARAIVA, inconformado com a r. sentença prolatada pelo MM. Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal Distrital de Icoaraci/PA, que o condenou pela prática do crime tipificado no art. 304 do CP, impondo-lhe a pena de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto e ao pagamento de 60 (sessenta) dias-multa.

A pena corporal não foi substituída por penas restritivas de direitos, em razão de o réu ser reincidente em crime doloso.

Em suas razões, pede sua absolvição, sob argumento de insuficiência de provas e in dubio pro reo, nos termos do art. 386, V do CPP, subsidiariamente, requer a reforma da dosimetria, para reduzir a pena-base, considerando a circunstância judicial dos antecedentes neutra, tendo em vista que a reincidência do réu já foi considerada como circunstância agravante, a fim de não configurar bis in idem.

Em contrarrazões, o dominus litis manifestou-se pelo parcial provimento da apelação, fim de que a pena-base seja fixada em seu mínimo legal, em razão da reconhecida neutralidade da circunstância judicial referente aos antecedentes, mantendo-se a sentença condenatória em todos os demais termos.

Nesta superior instância, o custos legis se manifestou pelo parcial provimento do presente recurso, para redimensionar a pena-base ao mínimo legal.


É o relatório.


À revisão. Inclua-se no plenário virtual.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do apelo.

Consta na denúncia que:


no dia 27/06/2017 por volta das 10:00hrs, o denunciado acima qualificado for até à Unidade Integrada PROPAZ de Outeiro, a fim de prestar esclarecimentos acerca de denúncias que lhe imputavam o crime de estelionato, porém, já em sede policial, este se apresentou como Juiz e mostrou uma carteira do Tribunal de Justiça Arbitral e de Paz do Para n° 13001/PA, momento em que, ao ser perguntado se este possuía algum vínculo com o TJ/PA, este respondeu que não, lhe sendo dado voz de prisão. Ademais, em perícia realizada, constatou-se que o documento era uma cópia. suscetível a fraudes.”

São os fatos.

- MÉRITO:

ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS

Tenho que as provas presentes nos autos são suficientes para o convencimento tanto da materialidade como da autoria delitiva no que tange ao delito capitulado no artigo 304 do CP (uso de documento falso). Vejamos.

No que se refere à materialidade, encontra-se demonstrada pelo Laudo Pericial de nº 2017.01.000543-DOC, o qual concluiu que a Carteira de Justiça Privada nº 13001/PA, em nome de Elinaldo Silva Saraiva, tratava-se de documento digitalizado, que pode ser submetido a vários tipos de fraude documental (ID. 13003537 - Pág. 5) pelas declarações das testemunhas em juízo, somado à confissão do réu, que confirmou ter criado um modelo da carteira de juiz arbitral.

Quanto à autoria, vejamos o que afirmou o juízo, conforme consta da sentença (ID13003659 - Pág. 3) e conforme mídias dos autos:

“A testemunha de acusação Ismael Augusto Moía Ribeiro (PC), entretanto, declarou em juízo: que o denunciado se dizia juiz arbitral e apresentou, na delegacia, a carteira de juiz arbitral; que foi chamado na unidade policial para prestar esclarecimentos; que várias pessoas haviam ido denunciá-lo, pois ele iria celebrar vários casamentos em uma igreja evangélica, para o que pegou documentos pessoais das vítimas, sob a alegação de que iria fazer as certidões de casamentos, porém não os devolveu; que, quando ele apresentou a carteira de juiz arbitral na delegacia, o delegado percebeu que o documento não tinha validade, pois não havia a assinatura do Presidente do TJ/Pa, e lhe deu voz de prisão.

A testemunha Regina Carvalho Ribeiro (PC) declarou em juízo: que houve uma audiência, na delegacia, em que o acusado se apresentou como juiz arbitral; que o ato se deu em razão do registro de uma ocorrência policial, na qual o acusaram de solicitar documentos como certidões, identidade, comprovante de residência, com a finalidade de realizar casamentos, e não os devolver; que o réu estava realizando casamentos no distrito de Outeiro e no Município de Ananindeua. Que ele apresentou uma carteirinha de juiz arbitral para o delegado Reinaldo Marques; que o DPC questionou a assinatura, pois estava sem o nome da autoridade do TJ/Pa, tendo o réu confirmado que o documento não tinha validade e que ele não tinha nenhum vínculo com o referido tribunal.

Em seu interrogatório, o denunciado Elinaldo Silva Saraiva declarou: que não se apresentava como juiz arbitral do Tribunal de Justiça; que não apresentou o documento; que conheceu a arbitragem por meio do Tribunal de Justiça que havia na Avenida Júlio Cesar; que possuía uma carteira de juiz arbitral, mas não a usava, pois só iria utilizá-la quando começasse a funcionar o Tribunal de Arbitragem; que criou a carteira para usar futuramente; que nunca se apresentou como juiz arbitral nem apresentou a carteira; que é ministro evangélico e pode realizar casamentos religiosos; que foi no cartório se informar se poderia realizar casamentos civis; que não pegava documentos; que ajudava uma pastora que foi chamada na delegacia para prestar esclarecimentos; que nunca se apresentou como juiz arbitral; que criou o modelo de carteira de juiz arbitral..” (grifos nossos)

Assim, tenho que a decisão está bem fundamentada, ancorada em provas concretas dos autos, não havendo nada que corrobore as assertivas da defesa, revelando-se, portanto, inviável o pleito de absolvição, vez que presentes provas suficientes de autoria e materialidade delitivas, aptas a embasar a sentença condenatória.

O crime de uso de documento falso, tem como núcleo do tipo fazer uso do documento, ou seja, fazer com que o documento seja usado como se verdadeiro fosse. Diante disso, extrai-se dos autos que o apelante confessou ter confeccionado carteira de juiz arbitral do TJPA e, conforme depoimento dos policiais civis, apresentou o referido documento na Delegacia quando foi prestar esclarecimentos, oportunidade em que a autoridade policial verificando tratar-se de documento falso, lhe deu voz de prisão, não restam dúvidas de que o réu praticou o crime previsto no art. 304 do CP, uma vez que as suas condutas se encaixam perfeitamente no tipo penal imputado.

Assim, diante dos argumentos esposados, resta comprovada a materialidade e a autoria do delito de uso de documento falso, porquanto demonstrados os elementos constitutivos dos tipos penais, devendo o réu responder pelos seus atos, ante o juízo de reprovabilidade de sua conduta, sendo bem posta a condenação do réu nas sanções do artigo 304 do Código Penal. Neste sentido:

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA AOS ARTS. 304 DO CP E 386, III, DO CPP. USO DE DOCUMENTO FALSO. CRIME FORMAL. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT