Acórdão nº 0016230-86.2015.8.11.0042 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Segunda Câmara Criminal, 31-05-2021

Data de Julgamento31 Maio 2021
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCriminal - APELAÇÃO CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Número do processo0016230-86.2015.8.11.0042
AssuntoCrime Tentado

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO


SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 0016230-86.2015.8.11.0042
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Homicídio Qualificado, Crime Tentado]
Relator: Des(a).
RUI RAMOS RIBEIRO


Turma Julgadora: [DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). PEDRO SAKAMOTO]

Parte(s):
[MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), EDEMILSON DA SILVA LOURENCO (APELADO), DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 02.528.193/0001-83 (REPRESENTANTE), WANDERLEY CAMACHO MIGUEL (VÍTIMA), CLAUDELINE SILVA CIPRIANO (VÍTIMA), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO.

E M E N T A

RECUSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – HOMICÍDIO CONSUMADO E TENTATIVA DE HOMICÍDIUM – IMPRONÚNCIA – IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL – PRETENSÃO – REVERSÃO DA DECISÃO JUDICIAL PARA PRONÚNCIA – ALEGADA EXISTÊNCIA DE PROVAS DE MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA – INVIABILIDADE – AUSÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA – APLICAÇÃO DAS DISPOSIÇÕES DO ART. 414, DO CPC – IMPRONÚNCIA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO.

Inexistindo indícios suficientes de autoria e de participação, impõe-se a manutenção da sentença de impronúncia.

R E L A T Ó R I O

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto pelo Ministério Público contra a sentença proferida pelo Juízo da 12ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT, nos autos da ação penal n. 0016230-86.2015.8.11.0042 – Código 411467, que impronunciou Edemilson da Silva Lourenço, do crime previsto no art. 121, §2ª, inciso IV [por duas vezes], sendo um na forma consumada e o outro na forma tentada [art. 14, inciso II], nos moldes do art. 69, todos do Código Penal.

Inconformado, o Ministério Público, em suas razões recursais, busca a reforma da r. sentença, para que o apelado seja pronunciado e submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri (Id. 73539663 – fls. 178/187).

Em sede de contrarrazões, a Defesa requer o improvimento do recurso ministerial, para que seja mantida incólume a sentença prolatada pelo juiz singular (Id. 73539664 – fls. 04/13).

Nesta instância a douta Procuradoria Geral de Justiça, através do eminente Procurador de Justiça, José Norberto de Medeiros Júnior, manifestou-se pelo provimento do recurso ministerial, assim sintetizando (Id.82698488):

Sumário: Apelação Criminal – Homicídio qualificado tentado e consumado – Acusado impronunciado – Inconformismo Ministerial – Pretendida a pronúncia – Possibilidade – Decisão de pronúncia que não exige completa certeza do crime – Necessidade de indícios mínimos de autoria e materialidade – Aplicação dos Princípios do in dúbio pro societate – Pelo provimento do apelo. ”

RELATADO O NECESSÁRIO.

V O T O R E L A T O R

Conforme relatado, trata-se de recurso de apelação criminal interposto pelo Ministério Público contra a sentença proferida pelo Juízo da 12ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT, nos autos da ação penal n. 0016230-86.2015.8.11.0042 – Código 411467, que impronunciou Edemilson da Silva Lourenço, do crime previsto no art. 121, §2ª, inciso IV, consumado e tentado, nos moldes do art. 69, todos do Código Penal.

Emerge da denúncia (Id. 73539662 – fls. 01/05):

“(...)Consta do incluso inquérito policial que, no dia 10 de setembro de 2014, por volta das 21h0Omin, em plena via pública, na Rua Poxoréu, bairro Alvorada, em frente ao estabelecimento comercial denominado Lanchonete Nacional, nesta Capital, EDEMILSON DA SILVA LOURENÇO, com o auxílio de WILLIAN DE OLIVEIRA CAMPOS (falecido), utilizando-se de recurso que dificultou a defesa das vítimas, mediante disparos de arma de fogo, matou WANDERLEI CAMACHO MIGUEL, e tentou matar CLAUDELINE SILVA CIPRIANO, que não veio a óbito por circunstâncias alheias à sua vontade.

Segundo restou apurado, a vítima era usuária de drogas e para sustentar o vício auxiliava outros traficantes na mercancia de entorpecente.

Consta dos autos que alguns meses antes dos fatos, a vítima perdeu dinheiro de propriedade de outro traficante, o que a deixou apreensiva, pois acreditava que o matariam em razão disso.

No dia dos fatos, as vítimas CLAUDELINE e WANDERLEI estavam juntos na via citada, quando foram abordados por EDEMILSON DA SILVA LOURENÇO, proprietário de uma boca de fumo, que, com uma arma de fogo em punho, chamou WANDERLEI de safado e o chutou, vindo este a cair no solo, pois usava muletas. Nesse momento, CLAUDELINE clamou ao EDEMILSON que não matasse WANDERLEI.

Em ato contínuo e sem pestanejar, EDEMILSON, mirou em CLAUDELINE, que desesperada saiu correndo e, sem que ela pudesse se defender, lhe desferiu um disparo de arma de fogo, atingindo-lhe nas costas.

Em seguida, com WANDERLEI caída, e sem meios de se defender, EDEMILSON desferiu contra ele diversos disparos de arma de fogo que atingiram sua cabeça e membros e superiores, produzindo a lesões descrita no laudo pericial de fls. 17/36, as quais foram causa eficiente a morte da vítima ainda no local dos fatos.

Na data dos fatos, EDEMILSON foi conduzido até o local dos fatos por WILLIAN DE OLIVEIRA CAMPOS, já falecido, na motocicleta de placa NJC 4930 (B.O. de fls. 41/43).

O proprietário da motocicleta citada confirmou que na data do fato estava há aproximadamente dois dias na casa do EDEMILSON, onde funcionava uma boca de fumo, e havia emprestado o veículo a ele em troca de substância entorpecente, tendo o denunciado permanecido com a motocicleta por dois dias entre idas e vindas até a boca de fumo, sendo que da última vez que EDEMILSON saiu com a motocicleta, na companhia de WILLIAN, não retornou mais.

Importante destacar que conforme se depreende das fls. 96/109, o proprietário da motocicleta, José Luiz Magalhães dos Santos (apresentando-se falsamente como Gilberto dos Santos Neto), foi preso no dia 11 de setembro, aproximadamente 12 horas após o homicídio, sem a motocicleta placa NJC 4930. Já no dia 12 de setembro, EDEMILSON DA SILVA LOURENÇO e WILLIAN foram presos por direção perigosa da mesma motocicleta utilizada na prática dos crimes (fls. 110/111). (...)”

A respeito da pronúncia, dispõe o art. 413 do Código de Processo Penal:

"Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação

§1º A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena.

§2º Se o crime for afiançável, o juiz arbitrará o valor da fiança para a concessão ou manutenção da liberdade provisória.

§3º O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código."

A princípio, convém registrar que, por ser a pronúncia um mero juízo de admissibilidade, não é necessária prova incontroversa da existência de autoria ou de participação.

Existindo a possibilidade de se entender pela imputação válida do crime contra a vida em relação ao acusado, deve o juiz, em observância à regra do in dubio pro societate, admitir a acusação, assegurando o cumprimento da Constituição da República, que reservou a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida para o tribunal popular.

Noutro giro, em observância ao disposto no art. 414 do CPP, o juiz, fundamentadamente, impronunciará o acusado quando não se convencer da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.

Nesse sentido são os ensinamentos de Renato Brasileiro de Lima: (in Manual de Processo Penal, 7ª Edição, pág. 1.404)

"(...) referindo-se o art. 413, caput, do CPP ao convencimento da materialidade do fato, depreende-se que, em relação à materialidade do delito, deve haver prova plena de sua ocorrência, ou seja, deve o juiz ter certeza de que ocorreu crime doloso contra a vida.

Por sua vez, quando a lei impõe a presença de indícios suficientes de autoria ou de participação, de modo algum está dizendo que o juiz deve pronunciar o acusado quando tiver dúvida acerca de sua concorrência para a prática delituosa. Na verdade, ao fazer uso da expressão indícios, referiu-se o legislador à prova semiplena, ou seja, àquela prova de valor maus tênue, de menor valor persuasivo.

Dessa forma, conquanto não se exija certeza quanto à autoria para a pronúncia, tal qual se exige em relação à materialidade do crime, é necessário um conjunto de provas que autorizem um juízo de probabilidade da autoria e da participação. Destarte, a nosso ver, havendo dúvidas quanto à existência do crime ou quanto à presença de indícios suficientes, deve o juiz sumariante impronunciar o acusado, aplicando o in dubio pro reo."

No caso em epígrafe, verifico que os elementos constantes dos autos mostram-se demasiadamente frágeis para a pronúncia dos acusados pelo crime de homicídio qualificado.

Após instrução processual, sobreveio decisão de impronuncia com fundamento no art. 414 do Código de Processo Pena, sob os...

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