Acórdão nº 0017317-76.2010.8.11.0002 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Primeira Câmara Criminal, 15-12-2022

Data de Julgamento15 Dezembro 2022
Case OutcomeProvimento em Parte
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Data de publicação17 Dezembro 2022
Classe processualCriminal - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
Número do processo0017317-76.2010.8.11.0002
AssuntoHomicídio Qualificado

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 0017317-76.2010.8.11.0002
Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426)
Assunto: [Homicídio Qualificado]
Relator: Des(a).
ORLANDO DE ALMEIDA PERRI


Turma Julgadora: [DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). PAULO DA CUNHA]

Parte(s):
[ANTONIO APARECIDO CAMARA - CPF: 096.906.148-00 (RECORRENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (RECORRIDO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), LUIZ ALBERTO NEVES DE LIMA (VÍTIMA), LUIZ ALBERTO NEVES DE LIMA - CPF: 029.089.321-64 (VÍTIMA), RONAN BOTELHO - CPF: 345.968.951-04 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), MARCOS CARVALHO SILVA (VÍTIMA), ALEXANDRE FONSECA (TERCEIRO INTERESSADO)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
MARCOS MACHADO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO.

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Nº 0017317-76.2010.8.11.0002


RECORRENTE: ANTONIO APARECIDO CAMARA

RECORRIDO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO

EMENTA


RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DO OFENDIDO – PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA – NEGATIVA DE AUTORIA – DESCABIMENTO – RAQUÍTICOS INDÍCIOS DE AUTORIA OU DE PARTICIPAÇÃO – INEXISTÊNCIA DE PROVAS JUDICIALIZADAS – DECISÃO FUNDAMENTADA COM BASE EM CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL RETRATADA EM JUÍZO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO EM DISSONÂNCIA DO PARECER MINISTERIAL.

Conquanto não autorizado o reconhecimento da absolvição sumária do recorrente, a despronúncia é medida que se impõe, haja vista que O recente entendimento adotado pela Sexta Turma do STJ, firmado com observância da atual orientação do Supremo Tribunal Federal, é de que não se pode admitir a pronúncia do réu, dada a sua carga decisória, sem qualquer lastro probatório produzido em juízo, fundamentada exclusivamente em elementos informativos colhidos na fase inquisitorial” [STJ, HC n. 712.098/MG, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 9/8/2022, DJe de 18/8/2022].

1. Em que pese ao acórdão consignar que há indícios de autoria aptos a pronunciar o ora paciente, diante da prova testemunhal ouvida em juízo, observa-se que se trata de testemunhos indiretos, na medida em que não foram ouvidas testemunhas presenciais do fato.

2. Esta Corte Superior possui entendimento de que a pronúncia não pode se fundamentar exclusivamente em elementos colhidos durante o inquérito policial, nem em depoimentos testemunhais indiretos, como no presente caso. Assim sendo, os testemunhos indiretos não autorizam a pronúncia, porque são meros depoimentos de ‘ouvir dizer’ - ou hearsay, na expressão de língua inglesa -, que não têm a força necessária para submeter um indivíduo ao julgamento popular.

3. Consoante a bem fundamentada decisão de impronúncia, verifica-se que a única versão em juízo apontando os autores do delito é de um informante, pai da vítima, ou seja, que presta apenas declarações, na medida em que não é compromissado e que não presenciou o fato.

Contudo, essa não é a melhor posição para o deslinde da controvérsia dos autos, pois, no Estado Democrático de Direito, a força argumentativa das convicções dos magistrados deve ser extraída de provas submetidas ao contraditório e à ampla defesa. Isso porque o mínimo flerte com decisões despóticas não é tolerado e a liberdade do cidadão só pode ser restringida após a superação do princípio da presunção de inocência, medida que se dá por meio de procedimento realizado sob o crivo do devido processo legal.

4. Importa registrar que a prova produzida extrajudicialmente é elemento cognitivo destituído do devido processo legal, princípio garantidor das liberdades públicas e limitador do arbítrio estatal.

Com efeito, sob o pálio de se dar máxima efetividade ao sistema de íntima convicção dos jurados, consagrado na norma insculpida no inciso III do art. 483 do CPP, não se pode desprezar a prova judicial colhida na fase processual do sumário do Tribunal do Júri.

Em análise sistemática do procedimento de apuração dos crimes contra a vida, observa-se que o juízo discricionário do Conselho de Sentença, uma das últimas etapas do referido procedimento, não apequena ou desmerece os elementos probatórios produzidos em âmbito processual, muito menos os equipara à prova inquisitorial.

5. Na hipótese em foco, optar por solução diversa implica inverter a ordem de relevância das fases da persecução penal, conferindo maior juridicidade a um procedimento administrativo realizado sem as garantias do devido processo legal em detrimento do processo penal, o qual é regido por princípios democráticos e por garantias fundamentais. Em outras palavras, entender em sentido contrário seria considerar suficiente a existência de prova inquisitorial para submeter o réu ao Tribunal do Júri sem que se precisasse, em última análise, de nenhum elemento de prova a ser produzido judicialmente.

Todavia, essa não foi a opção legislativa. Diante da possibilidade da perda de um dos bens mais caros ao cidadão - a liberdade -, o Código de Processo Penal submeteu o início dos trabalhos do Tribunal do Júri a uma cognição judicial antecedente. Perfunctória é verdade, mas munida de estrutura mínima a proteger o cidadão do arbítrio e do uso do aparelho repressor do Estado para satisfação da sanha popular por vingança cega, desproporcional e injusta. Precedentes” [STJ, AgRg no HC n. 751.046/RS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 22/8/2022].

ESTADO DE MATO GROSSO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Nº 0017317-76.2010.8.11.0002


RECORRENTE: ANTONIO APARECIDO CAMARA

RECORRIDO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO



RELATÓRIO

EXMO. SR. DES. ORLANDO DE ALMEIRA PERRI

Egrégia Câmara:

Cuida-se de Recurso em Sentido Estrito interposto por Antônio Aparecido Câmara, em face da decisão proferida pelo juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Várzea Grande, que o pronunciou como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, inciso IV, do CP [homicídio qualificado pelo recurso que dificultou a defesa do ofendido – vítima: Luiz Alberto Neves de Lima], e o impronunciou pelo crime tipificado no art. 121, § 2º, incisos II e IV, do CP [homicídio qualificado pelo motivo fútil e mediante recurso que impossibilitou a defesa do ofendido – vítima: Marcos Carvalho da Silva], submetendo-o a julgamento perante o Tribunal do Júri.

A defesa sustenta que o recorrente não teve participação no crime em testilha, sendo que o único culpado foi o corréu, Alexandre Fonseca, vulgo “Paulista”.

Postula, ao final, sua absolvição sumária. Alternativamente, pleiteia sua despronúncia.

A 1ª Promotoria de Justiça Criminal de Várzea Grande requer a manutenção da sentença hostilizada.

O juízo de origem manteve a decisão hostilizada por seus próprios fundamentos.

A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Procurador de Justiça, José Norberto de Medeiros Júnior, opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

Inclua-se em pauta.


PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Nº 0017317-76.2010.8.11.0002


VOTO

EXMO. SR. DES. ORLANDO DE ALMEIDA PERRI (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Pesa contra o recorrente, Antônio Aparecido Câmara, a prática de dois crimes de homicídio qualificado pelo motivo fútil e mediante recurso que dificultou ou impossibilitou a defesa do ofendido [art. 121, § 2º, incisos II e IV, ambos do CP – vítimas: Luiz Alberto Neves de Lima e Marcos Carvalho Silva] – perpetrado em coautoria com Alexandre Fonseca, vulgo “Paulista” – consoante se extrai de excerto da exordial acusatória:

1º FATO:

Consta nos autos de inquérito policial que, no dia 20/6/2010, por volta das 1h10min no CTG do Bairro Paiaguás, nesta urbe, os denunciados, com nítida intenção homicida, por motivo fútil, mediante recurso que impossibilitou a defesa da vítima, ceifaram a vida de Luiz Alberto Neves de Lima, vulgo ‘Cunhado’.

Restou apurado que a vítima trabalhava como segurança no local dos fatos, onde estava acontecendo uma festa.

Os acusados chegaram no local em um veículo Monza de cor azul, de propriedade do acusado Alexandre, sendo que o denunciado Antônio dirigia o veículo.

Quando chegaram no local, Antônio estacionava o carro enquanto Alexandre se retirou do carro e iniciou uma conversa com a vítima, quando ocorreu um desentendimento entre eles referente ao preço do ingresso para entrar na referida festa.

Após o término da discussão, Alexandre retornou ao veículo proferindo ameaças à vítima.

Em dado momento, Antônio jogou o referido carro contra a vítima, atropelando-a, vindo ela a cair em solo, sendo posteriormente alvejada por disparos de arma de fogo desferidos por Alexandre, causa eficiente de sua morte.

Após o referido atentado, os acusados se evadiram do local.

2º FATO: Inquérito Policial n. 17025-91.2010.8.11.0002

Minutos após o cometimento do crime supracitado, os acusados, com nítida intenção homicida, por motivo fútil, mediante recurso que impossibilitou a defesa da vítima, mataram Marcos Carvalho Silva.

Os denunciados, após se evadirem do local onde ocorreu a morte de Luiz Alberto Neves de Lima, em local ignorado, estavam no veículo Monza de cor azul, de propriedade de Alexandre, dirigido por Antônio, momento em que avistaram a vítima Marcos.

Nesse momento, sem que a vítima tivesse qualquer chance de defesa, o acusado Antônio aproximou o veículo dela, quando Alexandre iniciou a desferir os disparos de arma de fogo.

A vítima foi a...

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