Acórdão nº 0017444-88.2010.8.11.0042 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Vice-Presidência, 27-04-2021

Data de Julgamento27 Abril 2021
Case OutcomeProvimento em Parte
Classe processualCriminal - APELAÇÃO CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoVice-Presidência
Número do processo0017444-88.2010.8.11.0042
AssuntoHomicidio qualificado

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO


PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 0017444-88.2010.8.11.0042
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Homicidio qualificado]
Relator: Des(a).
MARCOS MACHADO


Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). PAULO DA CUNHA, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO]

Parte(s):
[ESTADO DE MATO GROSSO - PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA (APELANTE), WALITON FRANCISCO SOUZA - CPF: 832.709.811-04 (APELADO), MARCIANO XAVIER DAS NEVES - CPF: 531.754.251-00 (ADVOGADO), VALDEVINO ANTONIO DA SILVA (VÍTIMA), MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (CUSTOS LEGIS), ESTADO DE MATO GROSSO - PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA (APELADO), MARCIANO XAVIER DAS NEVES - CPF: 531.754.251-00 (ADVOGADO), WALITON FRANCISCO SOUZA - CPF: 832.709.811-04 (REPRESENTANTE)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO DA DEFESA E PROVEU PARCIALMENTE O MINISTERIAL.

E M E N T A

EMENTA

APELAÇÕES CRIMINAIS - HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO MOTIVO TORPE - SENTENÇA CONDENATÓRIA - RECURSO DEFENSIVO - JULGAMENTO CONTRADITÓRIO ÀS PROVAS DOS AUTOS - LEGÍTIMA DEFESA, HOMICÍDIO PRIVILEGIADO E QUALIFICADORA NÃO CARACTERIZADA - PEDIDO DE NOVO JULGAMENTO - RECURSO MINISTERIAL - NEGATIVAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME E DA CULPABILIDADE, VÍTIMA NÃO CONTRIBUIU PARA O COMETIMENTO DO CRIME, ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA IMPERTINENTE - PRETENSÃO DE AUMENTO DA PENA - LEGÍTIMA DEFESA - DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS - VERSÃO DO APELANTE NÃO ACOLHIDA - APELANTE IMAGINOU QUE A VÍTIMA ESTAVA COM UMA GARRAFA NA MÃO - CINCO DISPAROS NAS COSTAS - LAUDO PERICIAL DE NECROPSIA E MAPA TOPOGRÁFICO PARA LOCALIZAÇÃO DE LESÕES – NECESSIDADE DE USO MODERADO DOS MEIOS NECESSÁRIOS À REPULSA - JULGADO DO TJMT - OPÇÃO POR UMA DAS CORRENTES DE INTERPRETAÇÃO DA PROVA - LIÇÃO DOUTRINÁRIA - DECISÃO NÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS - TJMT, ENUNCIADO CRIMINAL 13 - ELEMENTOS DE CONVICÇÃO PRODUZIDOS SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO - DECISÃO LEGITIMADA - ARESTO DO TJMT - HOMICÍDIO PRIVILEGIADO - DOMÍNIO DE VIOLENTA EMOÇÃO, LOGO EM SEGUIDA À INJUSTA PROVOCAÇÃO DA VÍTIMA - OFENSA VERBAL QUE DEVE SER REPELIDA COM EXPRESSÕES VERBAIS, NÃO COM TIRO OU FACADA - PONDERAÇÃO DE QUALIDADE E CONDIÇÕES PESSOAIS DOS CONTENDORES - LIÇÕES DOUTRINÁRIAS - JULGADO DO TJMT - QUALIFICADORA - VINGANÇA POR DISCUSSÃO RELATIVA AO PAGAMENTO DE CERVEJAS CONSUMIDAS NO BAR - ADMISSÃO COM SUPORTE EM DEPOIMENTOS DE TESTEMUNHAS - EXCLUSÃO SOMENTE QUANDO ABSOLUTAMENTE IMPROCEDENTE - ORIENTAÇÃO DO STJ - RECURSO MINISTERIAL - MULTIPLICIDADE DE DISPAROS DE ARMA DE FOGO E CONTRA A VÍTIMA JÁ CAÍDA AO SOLO - MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA DO AGENTE - CULPABILIDADE NEGATIVADA - ENTENDIMENTO DO STJ E TJMT - COMPORTAMENTO DA VÍTIMA - VALORAÇÃO IDÔNEA - VÍTIMA EMBRIAGADA E ALTERADA QUE INSULTOU O ACUSADO E FOI AO SEU ENCONTRO, NOS FUNDOS DO BAR, ONDE ACABOU SENDO BALEADA - DEPRECIAÇÃO JUSTIFICADA - LIÇÃO DOUTRINÁRIA - CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO - CRIME COMETIDO NA PRESENÇA DOS FAMILIARES DA VÍTIMA - ARESTO DO TJMT - CONFISSÃO PARCIAL OU QUALIFICADA - ATENUANTE PERTINENTE - ACÓRDÃO DO STJ E TJMT - RECURSO DA DEFESA DESPROVIDO - RECURSO MINISTERIAL PROVIDO PARCIALMENTE.

A caracterização da legítima defesa pressupõe “não apenas que a agressão seja atual ou iminente, como também que o agente faça uso moderado dos meios necessários à repulsa” (TJMT, Ap nº 69665/2012).

Não se configura “como manifestamente contrária à prova dos autos a decisão que, optando por uma das versões trazidas a plenário do Tribunal do Júri, não se encontra inteiramente divorciada do conjunto fático-probatório existente no processo” (TJMT, Enunciado Criminal 13).

“As decisões do Conselho de Sentença só são consideradas manifestamente contrárias à prova dos autos quando desprovidas de qualquer sustentação nos elementos produzidos sob o crivo do contraditório judicial. Havendo elementos de prova que sustentem a versão escolhida pelos jurados, não há como desconstituir a decisão do Júri.” (TJMT, AP NU 0006840-86.2009.8.11.0015)

Nas palavras de Francisco de Assis Toledo, “uma provocação verbal pode ser razoavelmente repelida com expressões verbais, não com um tiro, uma facada ou coisa parecida” (Ilicitude penal e causas de sua exclusão. Rio de Janeiro, ed. Forense, 1984. pág. 77).

“A injusta provocação deve ser apreciada objetivamente, isto é, não segundo a opinião de quem reage, mas segundo a opinião geral, sem perder de vista, entretanto, a qualidade ou condição das pessoas dos contendores, seu nível de educação, seus legítimos melindres” (GRECO. Rogério, Curso de Direito Penal: parte especial, vol. II: introdução à teoria geral da parte especial: crimes contra a pessoa. 14. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2017. pág. 61).

A qualificadora reconhecida pelo Tribunal do Júri “somente pode ser excluída quando for absolutamente improcedente, sem qualquer apoio nos autos, de modo a se preservar a competência constitucional” (STJ, HC nº 182.153/DF).

O fato de o delito ter sido praticado com multiplicidade de disparos de arma de fogo e contra a vítima já caída ao solo demonstra maior reprovabilidade da conduta do agente, extrapolando a culpabilidade já prevista no tipo penal (STJ, AgRg no HC nº 497187/PE; AP N.U 00033224-69.2012.8.11.0042).

“Apesar de não justificar a prática delituosa, nem isentar o acusado de pena, o comportamento da vítima pode servir como fator determinante para desencadear a prática delituosa”, a justificar sua depreciação (LIMA. Leciona Renato Brasileiro de. Código de Processo Penal Comentado, 4ª ed., Salvador, Juspodivm, 2019, pág.1074).

As circunstâncias do delito “comportam valoração negativa o crime cometido na presença dos familiares da vítima” (TJMG, Ap N.U 1.0105.16.043913-6/001).

“A atenuante da confissão qualificada deve ser valorada quando debatida em plenário, ainda que cifrada no pretexto de legitima defesa” (TJMT, Ap nº 60336/2018).

R E L A T Ó R I O

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

APELAÇÃO Nº 0017444-88.2010.8.11.0042 - COMARCA DE CUIABÁ

APELANTE(S): WALITON FRANCISCO SOUZA

MINISTÉRIO PÚBLICO

APELADO(S): WALITON FRANCISCO SOUZA MINISTÉRIO PÚBLICO

R E L A T Ó R I O

Apelações criminais interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL e por WALITON FRANCISCO SOUZA contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá, decorrente de veredito do Tribunal do Júri, nos autos de ação penal (Código 300284), que condenou WALITON FRANCISCO SOUZA por homicídio qualificado por motivo torpe a 12 (doze) anos de reclusão, em regime inicial fechado – art. 121, § 2º, I, do CP – (fls. 483/488).

A 1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL DE CUIABÁ afirma que: 1) “o fato do agente ter praticado o crime contra vítima que estava embriagada, e continuar efetuando disparos de arma de fogo contra esta, mesmo depois da mesma encontrar-se caída ao solo” justificaria a negativação das circunstâncias do crime; 2) a culpabilidade deveria ter sido considerada desfavorável, em razão do cometimento do crime “em estabelecimento comercial de propriedade do pai da vítima” e “diante dos olhos da companheira e duas irmãs”; 3) “a vítima não contribuiu para o cometimento do crime”, a ensejar a elevação da pena-base; 4) a atenuante da confissão espontânea afigura-se impertinente porque “o réu alegou ter agido sob domínio de violenta emoção, admitido pelos jurados”.

Requer o provimento para que seja majorada a pena (fls. 509/515).

WALITON FRANCISCO SOUZA sustenta que a decisão seria manifestamente contrária às provas dos autos: 1) por ter agido “em legítima defesa própria e de outrem, visando unicamente proteger a própria vida e de sua esposa”; 2) “o crime ocorreu sob o domínio de violenta emoção”, a caracterizar homicídio privilegiado; 3) “não nutria nenhum sentimento de vingança em relação à vítima”, de modo a afastar a qualificadora do motivo torpe.

Pede o provimento para que seja submetido a novo julgamento (fls. 550/588).

WALITON FRANCISCO SOUZA e a 1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL DE CUIABÁ pugnam pelo desprovimento dos recursos opostos (fls. 520/530 e fls. 592/612).

A i. 5ª Procuradoria de Justiça Criminal opina pelo desprovimento do recurso da Defesa e provimento do apelo ministerial para elevar a pena, adotando “per relationem as contrarrazões e razões recursais do douto representante do Ministério Público da instancia singular” (Silvana Correa Vianna, procuradora de Justiça - fls. 615/617)

É o relatório.

À d. Revisão, observado o impedimento do i. Des. Orlando de Almeida Perri.

V O T O R E L A T O R

V O T O (MÉRITO)

EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Os recursos são cabíveis (CPP, art. 593, I), manejados por quem tem interesse (CPP, art. 577) e não verifica hipótese de extinção de punibilidade (CP, art. 107).

Consta da denúncia que:

“[...] no dia 24 de outubro de 2010, por volta das 20:39 horas, no Bar do Ciro, que é de propriedade do denunciado, situado no Bairro Dom Aquino, nesta urbe e Comarca, mediante disparos efetuados com um revólver, WALITON FRANCISCO SOUZA marou a vítima Valdevino Antônio da Silva. [...]

Ante o exposto, o Ministério Público Estadual requer a Vossa Excelência: [...] a condenação do denunciado nas penas do art. 121, § 2º, inciso I, c/c art. 92, inciso I, alínea ‘b’ (perda do cargo público), ambos do Código Penal c/c Lei nº 8.072/90.” (Fânia H O Amorim, promotor de Justiça - fls. 17/22)

Em sessão plenária, o Conselho de sentença respondeu aos seguintes quesitos:

“1º Quesito: No dia 24 de outubro de 2010, por volta das 20h30min, no Bar do Ciro, situado no bairro Dom Aquino, nesta capital, a vítima VALDEVINO ANTONIO DA SILVA foi atingida por disparos de arma de fogo, provocando-lhe os ferimentos descritos no Laudo de Necropsia acostados aos autos e que foram a causa da sua morte?

04 SIM

2º Quesito: O acusado WALITON FRANCISCO SOUZA...

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