Acórdão Nº 0017561-52.2014.8.24.0018 do Quinta Câmara Criminal, 11-02-2021

Número do processo0017561-52.2014.8.24.0018
Data11 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão










Recurso em Sentido Estrito Nº 0017561-52.2014.8.24.0018/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA


RECORRENTE: JACIR PADILHA RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA


RELATÓRIO


Na Comarca de Chapecó, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia contra Jacir Padilha, vulgo "Índio", dando-o como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, inc. IV, do Código Penal, conforme os seguintes fatos descritos na inicial acusatória, in verbis (Evento 36):
"No dia 17 de agosto de 2014, por volta das 00h15min, em frente ao CERA - Centro de Referência do Aluno, localizado na Rua São Nicolau, no 360, Bairro São Pedro, em Chapecó/SC, o denunciado JACIR PADILHA, fazendo uso de uma arma de fogo (não apreendida), matou ANDERSON WILLE, tanto que o alvejou com pelo menos 07 (sete) disparos, que lhe atingiram na região fronto-temporal esquerda; região posterior do punho esquerdo; região temporal esquerda; região superior da orelha; região inter-escápulo-vertebral esquerda; região da coluna lombar e região glútea esquerda, tendo o resultado letal ocorrido, por traumatismo crânio- encefálico, como demonstra o Laudo Cadavérico de fls. 17/18.
No dia dos fatos, a vítima estava ingerindo bebidas alcóolicas, em companhia de alguns amigos, quando o denunciado chegou no local, e, por motivos não esclarecidos, sacou uma arma de fogo e desferiu vários disparos, que foram a causa eficiente de sua morte.
A vítima, no dia de sua morte, estava completamente embriagada = 14,99dg/l (Laudo de fl. 55) quando foi surpreendida, pela ação do denunciado, que, de forma repentina, descarregou a arma em direção a Anderson, que não tinha razões próxima ou remotas de supor um ataque semelhante e, sem a mínima condição de poder esboçar qualquer gesto defensivo".
Apresentada as alegações finais pelas partes o Dr. Raul Bertani de Campos julgou admissível a denúncia nos seguintes termos (Evento 92):
"Ante os fatos e fundamentos expostos, ADMITO a denúncia para o fim de pronunciar o réu JACIR PADILHA para submetê-lo a julgamento perante o Tribunal do Júri, por acusação de infração às normas do art. 121, § 2o, inciso IV, CP".
Inconformado, o acusado interpôs recurso em sentido estrito por intermédio da Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina. Nas razões recursais, em síntese, o requerente suscitou preliminar de nulidade do recebimento da denúncia, diante da ausência de fundamentação. No mérito, requereu a absolvição sumária em face à legítima defesa. Por fim, em pleito subsidiário, requereu o afastamento da qualificadora do recurso que dificultou a defesa do ofendido (Evento 112).
Nas contrarrazões, o Ministério Público pugnou o desprovimento do recurso (Evento 116).
Em juízo de retratação, o magistrado a quo manteve a decisão impugnada (Evento 119).
A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Sr. Dr. José Orofino da Luz Fontes, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (Evento 40).
Este é o relatório

VOTO


Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conhece-se do recurso.
1. Cuida-se de recurso em sentido estrito interposto por Jacir Padilha em face da decisão que o pronunciou para julgamento perante o Tribunal do Júri pela prática, em tese, do crime tipificado no artigos 121, § 2º, inc. IV, do Código Penal.
É sabido que a decisão de pronúncia se destina a filtrar a imputação, exercendo a função de encaminhar à apreciação do Tribunal Popular tão somente os casos que detenham provas mínimas a gerar dúvida razoável no espírito do Magistrado, em expressão do princípio in dubio pro societate, como juízo de admissibilidade da acusação.
O decisum encerra, portanto, "um mero juízo de admissibilidade, onde examinam-se somente indícios de autoria e materialidade do fato. Assim, deve o Magistrado ser comedido ao fundamenta-la, sob pena de invadir a competência do Tribunal do Júri, juiz natural da causa" (STJ, HC n. 170.716/MG, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 28.2.2012).
Destarte, consoante enuncia o art. 413 do Código Processual Penal, há de ocorrer a pronúncia quando, convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, identifique elementos mínimos para potencial e futura condenação, cabendo a apreciação e resolução de eventuais controvérsias ao juízo natural constitucionalmente instituído.
Por outro lado, o juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado nas hipóteses elencadas no artigo 415 do Código de Processo Penal, ou ainda, constatada a ausência de elementos bastantes a autorizar à submissão ao julgamento popular, evidencia-se a necessidade de impronunciar o agente (artigo 414 Código de Processo Penal).
2. Inicialmente, a defesa postula a nulidade da decisão que recebeu a exordial acusatória por ser desprovida de fundamentação suficiente para o início da ação penal.
Sem razão.
Dispõe o art. 516 do Código de Processo Penal, "o juiz rejeitará a queixa ou denúncia, em despacho fundamentado, se convencido, pela resposta do acusado ou de seu defensor, da inexistência do crime ou da improcedência da ação".
Já o art. 517 do mesmo Diploma prevê o contrário, porquanto não exige fundamentação para a decisão que recebe a exordial acusatória, in verbis: "Recebida a denúncia ou a queixa, será o acusado citado, na forma estabelecida no Capítulo I do Título X do Livro I".
Dessa forma, inexistindo razões para a rejeição e devidamente preenchidos os requisitos previstos no art. 41 do Código de Processo Penal, o magistrado singular, de forma singela, recebeu a denúncia em Evento 42, repetindo a providência, nessa forma mais detalhada, quando do recebimento da defesa prévia (Evento 50)
Acerca do tema, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que não se mostra imprescindível a fundamentação no decisum que recebe a inicial acusatória, por se tratar de despacho e, portanto não apresenta conteúdo decisório. Extraí-se: "o ato judicial que formaliza o recebimento da denúncia oferecida pelo Ministério Público não se qualifica e nem se equipara, para os fins a que se refere o art. 93, IX, da Constituição de 1988, a ato de caráter decisório. O juízo positivo de admissibilidade da acusação penal não reclama, em consequência, qualquer fundamentação" (STF, Habeas Corpus n. 70.763/DF, rel. Min. Celso de Mello, Primeira Turma, DJ 23-9-1994).
Ademais, ressalta-se que aprofundada fundamentação de ser exigida quando da possibilidade de avaliação da absolvição sumária, o que não é o caso dos autos.
Nesse sentido, colacionam-se entendimentos desta Corte:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME CONTRA A VIDA. HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO MOTIVO TORPE E PELO EMPREGO DE ASFIXIA (ART. 121, § 2º, I E III, DO CP). CRIME CONTRA O RESPEITO AOS MORTOS. OCULTAÇÃO DE CADÁVER (ART. 211 DO CP). ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. CORRUPÇÃO DE MENORES (ART. 244-B, CAPUT, DA LEI 8.069/1990). RECURSO DA DEFESA. 2. REQUERIMENTO DE DECRETAÇÃO DE NULIDADE. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. ALEGADA CARÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA SIMPLES QUE PRESCINDE DE FUNDAMENTAÇÃO APROFUNDADA. PREFACIAL AFASTADA. [...] 5. RECURSO DESPROVIDO. I - "A decisão de recebimento da denúncia é na jurisprudência desta Corte admitida mais sucintamente, somente na posterior decisão de absolvição sumária exigindo-se o exame das teses relevantes e urgentes alegadas" (STJ, Recurso e Habeas Corpus n. 25314, Min. Nefi Cordeiro, Sexta Turma, j. em 26-5-2015). [...] (TJSC, Recurso em Sentido Estrito n. 0015887-53.2016.8.24.0023, da Capital, rel. Jorge Schaefer Martins, Quinta Câmara Criminal, j. 17-05-2018) - Grifou-se.
APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO - TENTATIVA DE FURTO (CP, ART. 155, CAPUT, C/C ART. 14, II) - SENTENÇA CONDENATÓRIA - RECURSO DEFENSIVO. NULIDADE DA DECISÃO DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA - AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO - VÍCIO INEXISTENTE. "A decisão de recebimento da denúncia prescinde de fundamentação por não se equiparar a ato decisório para os fins do art. 93, inc. IX, da Constituição da República" (STF, Dias Toffoli). [...} RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO POR FUNDAMENTAÇÃO DIVERSA. (Apelação Criminal n. 0017578-05.2016.8.24.0023, rel. Des. Getúlio Corrêa, j. 22-05-2018) - Grifou-se.
Assim, inexistindo qualquer ilegalidade no ato judicial que recebeu a denúncia, afasta-se a prefacial arguida pelo acusado.
3. No mérito, pugna a defesa pela absolvição sumária do crime de homicídio qualificado pelo recurso que dificultou a defesa do ofendido pelo qual foi pronunciado sob o argumento de que teria agido sob o pálio da excludente de ilicitude da legítima defesa.
Contudo, sem razão.
Em análise do caderno probatório e como detalhado pelo magistrado a quo, verificam-se as necessárias provas da materialidade delitiva, notadamente pelo boletim de ocorrência, laudo pericial cadavérico e do local do crime (Evento 2, Inquérito 2, 8/11, 17/31), pelos depoimentos colhidos em ambas as fases, bem como dos demais elementos de prova constantes nos autos.
Em relação à autoria, existem indicativos suficientes para o encaminhamento do acusado a julgamento pelo Tribunal do Júri.
Assim, para referida análise e com o fito de evitar qualquer tipo de redundância, transcreve-se parte da sentença de pronúncia no que se relaciona aos indicativos mínimos de autoria, os quais utilizo como razão de decidir, in verbis (Evento 92):
"Os indícios suficientes de autoria estão demonstrados pela prova oral colhida, senão vejamos:
A testemunha Mércio Mosconi, prestou depoimento na polícia civil, (fl. 13) narrando que:
(...) é policial civil e na data dos fatos estava de plantão na Central de Plantão; Que por volta das vinte e três horas a Polícia Militar telefonou a CPP, informando que havia acontecido um homicídio no Bairro São Pedro; Que junto com a Delegada Isabel e o IGP, deslocaram-se até a Rua São Nicolau 360; Que ao chegar no local...

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