Acórdão Nº 0018926-74.2014.8.24.0008 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 19-05-2022

Número do processo0018926-74.2014.8.24.0008
Data19 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0018926-74.2014.8.24.0008/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0018926-74.2014.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA

APELANTE: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (RÉU) ADVOGADO: REGINA MARIA FACCA (OAB PR081205) APELADO: FABIO FERNANDES DA COSTA (AUTOR) ADVOGADO: NEREU RICARDO MAES NETO (OAB SC020627)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo demandado, Banco Santander (Brasil) S.A., da sentença, proferida pela Juíza da Vara de Direito Bancário da comarca de Blumenau, Dra. Cintia Gonçalves Costi, que, nos autos da ação de revisão contratual (conta corrente e outras avenças), ajuizada por Fabio Fernandes da Costa, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos:

Ante o exposto, julgo procedentes em parte os pedidos consubstanciados na inicial, e diante da revisão do contrato de cartão de crédito firmado entre as partes declarar: a) a limitação dos juros moratórios à taxa média de mercado, em relação ao contrato de cartão de crédito, a ser averiguada em liquidação de sentença até a data de 01 de março de 2011, e, para aquelas posteriores a este marco, deve ser adotada a tabela específica para os contratos de cartão de crédito publicada pelo Banco Central - "operações de crédito com recursos livres - taxa média de juros - pessoas físicas - cartão de crédito rotativo (código 22022) ou parcelado (código 22023), exceto se o percentual utilizado pela instituição financeira for mais vantajoso a parte autora a.1) mantida a taxa de juros em relação as cédulas de crédito bancário para empréstimo pessoal, eis que inferiores as autorizadas pelo BACEN para o período; b) o afastamento da capitalização dos juros em todos os contratos com exceção das cédulas para empréstimo pessoal em que se verifica a pactuação do encargo por simples expressão numérica; c) o afastamento da comissão de permanência em todos os contratos; d) que a atualização monetária deverá ser realizada pelo INPC; e) que a multa contratual fica estabelecida em 2% calculada sobre o valor do débito; f) afastada a incidência dos encargos moratórios até a realização do recálculo do débito de acordo com os parâmetros da presente sentença; g) deferido o pedido de repetição do indébito na forma simples.

Em consequência julgo extinto o presente processo, na forma do art. 487, I do Código de Processo Civil.

Ficando extirpada do contrato e dos cálculos qualquer previsão em contrário, o prosseguimento do feito para cobrança de eventual saldo devedor deverá ser efetuado pelo credor, ora interessado, mediante a instauração do competente incidente de cumprimento de sentença (art. 509, §2º, CPC), posto que, em casos tais, tal procedimento é efetuado mediante a elaboração de simples cálculos aritméticos. (TJSC, Apelação Cível n. 2010.033961-0, de Joinville, rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, j. em 14-7-2010).

Condeno a parte ré ao pagamento das despesas processuais pendentes e honorários sucumbenciais devidos ao advogado da parte autora no percentual de 10% sobre o valor da causa (devidamente corrigido pelo INPC/IBGE desde a data da propositura da demanda).

Em caso de apelação, verificado o cumprimento dos requisitos dos parágrafos 1º e 2º do art. 1.009 do CPC, ascendam os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça, nos termos do parágrafo 3º do art. 1.010.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após o trânsito em julgado, arquivem-se.

Em suas razões recursais, o demandado-apelante sustentou as seguintes teses:

(a) a validade dos juros remuneratórios pactuados;

(b) a legalidade da capitalização de juros;

(c) a validade dos encargos moratórios;

(d) a caracterização da mora debendi; e

(e) a fixação dos honorários advocatícios com base no proveito econômico.

Por fim, pautou-se pelo provimento do recurso.

Contrarrazões (evento 72).

É o relatório.

VOTO

I. Tempestividade e preparo recursal

Constata-se que o recurso de apelação é tempestivo e que o recolhimento do preparo recursal foi comprovado (evento 68).

II. Caso concreto

(a) juros remuneratórios

Acerca da temática concernente à fixação de juros remuneratórios em contratos bancários, tal como a hipótese dos autos, a Súmula n. 382 do Superior Tribunal de Justiça assentou entendimento de que "a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade".

Ademais, no que tange à possibilidade de revisão da taxa pactuada, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de Recursos Especiais Repetitivos (REsp. n. 1.112.879 e REsp. n. 1.112.880), firmou o seguinte entendimento:

Nos contratos de mútuo em que a disponibilização do capital é imediata, o montante dos juros remuneratórios praticados deve ser consignado no respectivo instrumento. Ausente a fixação da taxa no contrato, o juiz deve limitar os juros à média de mercado nas operações na espécie, divulgada pelo Bacen, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente.

Em qualquer hipótese, é possível a correção para a taxa média se for verificada abusividade nos juros remuneratórios.

(REsp. n 1.112.879/PR. Relª. Minª. Nancy Andrighi, j. em 12.05.2010).

Com efeito, a jurisprudência admite a revisão da cláusula que estabelece o percentual dos juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que aplicável o Código de Defesa do Consumidor ao caso e a exista abusividade no pacto, nos termos do entendimento fixado pelo o Superior Tribunal de justiça, em julgamento de Recurso Especial, afeto ao rito dos recursos repetitivos:

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

(REsp. N. 1.061.530/RS. Relª Minª Nancy Andrighi, j. em 22.10.2008).

Colhe-se do teor do aludido acórdão os esclarecimentos acerca dos parâmetros a serem utilizados pelo julgador ao apreciar a questão atinente à revisão da cláusula contratual dos juros remuneratórios:

[...] conclui-se que é admitida a revisão das taxas de juros em situações excepcionais, desde que haja relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) esteja cabalmente demonstrada.

Necessário tecer, ainda, algumas considerações sobre parâmetros que podem ser utilizados pelo julgador para, diante do caso concreto, perquirir a existência ou não de flagrante abusividade.

Inicialmente, destaque-se que, para este exame, a meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional para a Selic - taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - é insatisfatória. Ela apenas indica o menor custo, ou um dos menores custos, para a captação de recursos pelas instituições que compõem o Sistema Financeiro Nacional. Sua adoção como parâmetro de abusividade elimina o 'spread' e não resolve as intrincadas questões inerentes ao preço do empréstimo.

Por essas razões, conforme destacado, o STJ em diversos precedentes tem afastado a taxa Selic como parâmetro de limitação de juros. Descartados índices ou taxas fixos, é razoável que os instrumentos para aferição da abusividade sejam buscados no próprio mercado financeiro. Assim, a análise da abusividade ganhou muito quando o Banco Central do Brasil passou, em outubro de 1999, a divulgar as taxas médias, ponderadas segundo o volume de crédito concedido, para os juros praticados pelas instituições financeiras nas operações de crédito realizadas com recursos livres (conf. Circular nº 2957, de 30.12.1999).

As informações divulgadas por aquela autarquia, acessíveis a qualquer pessoa através da rede mundial de computadores (conforme http://www.bcb.gov.br/?ecoimpom - no quadro XLVIII da nota anexa; ou http://www.bcb.gov.br/?TXCREDMES, acesso em 06.10.2008), são segregadas de acordo com o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices de preços), com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a modalidade de empréstimo realizada ('hot money', desconto de duplicatas, desconto de notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento imobiliário, aquisição de bens, 'vendor', cheque especial, crédito pessoal, entre outros).

A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das instituições financeiras e seu lucro médio, ou seja, um 'spread' médio. É certo, ainda, que o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não abrange todas as modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, presta-se como parâmetro de tendência das taxas de juros. Assim, dentro do universo regulatório atual...

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