Acórdão Nº 0020496-34.2008.8.24.0064 do Quarta Câmara de Direito Público, 03-11-2022

Número do processo0020496-34.2008.8.24.0064
Data03 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0020496-34.2008.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ LUIZ DACOL

APELANTE: MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ-SC APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

À luz dos princípios da economia e celeridade processual, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem (evento 24, PROCJUDIC2, 2G, fls. 67-77):



Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público contra Município de São José, por meio da qual requer a condenação do réu à obrigação de fazer, consistente na realização de contenção da encosta da obra de drenagem no loteamento D. Ana, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) a ser revertida para o Fundo de Reconstituição dos Bens Lesados do Estado de Santa Catarina.

Assevera, em síntese, que no loteamento D. Ana há uma área de risco de desmoronamento, com grave possibilidade de soterramento de algumas residências.Sustenta, ainda, que segundo levantamento da FATMA, foi verificado que o loteamento em questão não possui licenciamento ambiental para autorizar o início do empreendimento, embora a documentação do ano de 1979 comprove que o loteamento fora aprovado e encaminhado ao registro de imóveis.

Complementa afirmando que o Município réu fora informado diversas vezes acerca dos problemas no local, havendo necessidade de execução de projeto de recomposição da encosta e, mesmo assim, quedou-se inerte.

Acostou o Procedimento Administrativo instaurado pela 8ª Promotoria de Justiça (fls. 13-187).

A decisão de fls. 189-195 deferiu liminarmente o pedido de tutela antecipada e determinou que o réu iniciasse e concluísse, no prazo de 60 (sessenta) dias, a obra de contenção/recomposição da encosta no loteamento.

Citado (fl. 212-v), o Município de São José requereu a supressão ou a dilação de prazo para dar cumprimento à decisão liminar, dada a complexidade das obras (fls. 225-228). Acostou relatório de vistoria e atividades e de Estudo e Verificação de Trabalhos de Contenção e reposição de encostas e áreas limítrofes (fls. 231-241).Em vista dos requerimentos feitos pelo réu, o Ministério Público pugnou pela realização de audiência de conciliação (fl. 253).

Às fls. 255-265, o Município réu apresentou contestação, na qual suscitou, preliminarmente, necessidade de denunciação da lide ao empreendedor responsável pelo loteamento, a empresa Empreendimentos Imobiliários Rodeio Ltda., a fim de assegurar o seu direito de regresso. No mérito, sustentou que a pretensão do Ministério Público fere o princípio da separação dos poderes, de modo que deve ser reconhecida a impossibilidade jurídica do pedido.

Designada audiência de conciliação (fl. 268), no ato as partes concordaram em suspender o processo por mais 90 (noventa) dias para a conclusão das obras (fl. 276).

Decorrido o prazo de suspensão, o Município de São José apresentou relatório de vistoria às fls. 285-286, argumentando ter cumprido integralmente as obras necessárias ao local.

O Ministério Público entendeu ainda haver obras pendentes e requereu nova audiência de conciliação, a fim de ajustar as medidas necessárias (fl. 290).

A decisão de fl. 298 acolheu o pedido de denunciação da lide ao loteador, suspendeu o processo e determinou a citação dos litisdenunciados Andrino Manoel dos Santos e Aurino Manoel dos Santos.

Citado (fl. 327-v), o réu Andrino apresentou contestação às fls. 332-342, na qual arguiu, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva, uma vez que as construções irregulares teriam sido feitas em desacordo com as normas do empreendimento aprovado e, não bastasse, o loteamento fora alienado à empresa JOWI Empreendimentos Imobiliários. Suscitou a prejudicial da prescrição e, no mérito, disse que o loteamento fora devidamente aprovado, inexistindo nexo causal entre a conduta deste réu e as construções irregulares, eis que construídas pelos moradores e de forma incorreta. Juntou documentos (fls. 343-351).

O Ministério Público pugnou pelo julgamento do processo no estado em que se encontra (fls. 354-356).

À fl. 383, adveio a informação do óbito do denunciado Andrino.

Antes mesmo de formalizar a sua citação, o litisdenunciado Aurino apresentou contestação (fls. 385-394). Em suma, disse ser ilegítimo para figurar no polo passivo da demanda, dado que as construções foram realizadas em desconformidade com o projeto aprovado do loteamento e que houve a alienação do empreendimento. Completou requerendo a denunciação sucessiva ao adquirente e o reconhecimento da prescrição. No mérito, disse não haver nexo de causalidade entre as irregularidades e a sua conduta. Juntou procuração (fl. 395).

O Ministério Público requereu o julgamento imediato da lide, eis que seria incabível nova denunciação neste momento, devendo prosseguir tão somente em relação ao Município de São José (fls. 398-400).

Os autos vieram conclusos.

É o relatório. Decido.



Sobreveio sentença, a qual julgou a lide nos seguintes termos:



Diante do exposto, com fulcro no art. 487, I, do CPC, JULGO PROCEDENTES os pedidos iniciais para confirmar a tutela antecipada concedida e CONDENAR o Município de São José à obrigação de fazer, consistente na realização de contenção da encosta e obra de drenagem no loteamento D. Ana, nesta cidade, no prazo de 1 (um) ano, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), a ser revertida a favor do Fundo de Reconstituição de Bens Lesados do Estado de Santa Catarina.

Fica a parte ré desde já ciente de que eventual descumprimento das determinações no prazo assinalado poderá ensejar, ainda, a adoção de outras medidas para a efetivação da tutela específica ou obtenção do resultado prático equivalente, às expensas do réu.Sem condenação em custas ou honorários.

Sentença sujeita a reexame necessário (art. 496, I, do CPC).



Inconformado, o Município interpôs recurso de apelação (evento 24, PROCJUDIC2, 2G, fls. 82-95).

Preliminarmente, arguiu que houve cerceamento de defesa em razão do julgamento antecipado da lide, argumentando que a demanda foi ajuizada há anos, fundada em risco de desmoronamento, mas não houve manifestação do Juízo sobre a prova pericial pleiteada na contestação para aferição do risco atual, diante da ausência de notícia de desmoronamento.

Sustentou, ainda, que a sentença merece ser reformada para fixar a responsabilidade da empresa que empreendeu o loteamento Dona Ana (Empreendimentos Imobiliários Rodeio Ltda.), por meio dos seus sócios, Andrino Manoel dos Santos e Aurino Manoel dos Santos, com análise das defesas já apresentadas.

No mérito, sustentou que a realização de contenção em encosta e drenagem no loteamento é objeto de ato discricionário da Administração pública, havendo indevida interferência do Poder Judiciario na execução das políticas públicas. Concluiu, assim, que o pedido deve ser julgado improcedente e sua responsabilidade afastada.

Requereu, assim, o provimento do recurso.

Em contrarrazões, o membro do Ministério Público atuante na primeira instância requereu o não provimento do reclamo (evento 24, PROCJUDIC2, 2G, fls. 116-118)

A Procuradoria-Geral de Justiça, na mesma toada, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (evento 24, PROCJUDIC2, 1G, fls. 122-130).

Vieram os autos conclusos.

VOTO

1. Compulsando os autos, observo a presença de todos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão por que conheço do recurso.

Conheço, também, da remessa necessária, com fundamento no art. 496, I, do CPC, a qual em conjunto com o apelo, abrange toda a extensão da decisão em revisão.

2. A preliminar de cerceamento de defesa deve ser rejeitada, pois, como se verá no mérito, a omissão do Município na fiscalização de risco de dano urbanístico e à saúde da coletividade local ficou bem evidenciada pelo acervo de documentos carreados aos autos tanto pelo Ministério Público quanto pelo ente federativo demandado.

Nesse contexto, o Magistrado, como diretor do processo e destinatário final das provas, entendendo suficiente o acervo documental para dar amparo à sentença, pode dispensar diligências inúteis ou meramente protelatórias (art. 370, parágrafo único), como seria a prova pericial e sucessivos questionamentos em relação ao risco incontroverso existente em razão da própria situação do loteamento irregular.

3. Relativamente ao pedido de reforma da sentença na parte em que afastou o litisconsórcio formado em razão de pedido de denunciação da lide previamente deferida pelo Juízo, razão não socorre ao Município.

Em 2012, aproximadamente quatro anos depois do ajuizamento da ação, houve o deferimento do pedido de denunciação da lide formulado pelo Município em face de Andrino Manoel dos Santos e Aurino Manoel dos Santos, titulares originários da empresa que promoveu o loteamento (evento 24, PROCJUDIC1, 2G, fl. 336) que, por sua vez requereram denunciação sucessiva à empresa que efetivamente teria implantado o loteamento.

Andrino foi citado (evento 24, PROCJUDIC1, 2G, fl. 373) e contestou o pedido (idem, fls. 379-389), tendo arguido ilegitimidade passiva ao argumento de que o loteamento "foi vendido à empresa JOWI Empreendimentos Imobiliários", em 6/7/79...

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