Acórdão nº 0021085-75.2005.8.14.0301 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 11-12-2023

Data de Julgamento11 Dezembro 2023
Órgão1ª Turma de Direito Público
Ano2024
Número do processo0021085-75.2005.8.14.0301
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoDívida Ativa (Execução Fiscal)

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0021085-75.2005.8.14.0301

APELANTE: ESTADO DO PARÁ

APELADO: NELIO OLIVEIRA DOS SANTOS, RICARDO DA SILVEIRA VAZ TEIXEIRA, MANOEL OLIVEIRA BRAGA, MANOEL PAIXAO MARTINS, ALMIR DA SILVA SOUZA, ANISIO JOSE MORAES DE OLIVEIRA, SALUSTRIANO BOSCO REIS, GILVANEI DA COSTA GONCALVES, EDINALDO OLIVEIRA SODRÉ, DIOGENES NAZARENO SILVA SANTOS

RELATOR(A): Desembargadora ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA

EMENTA

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. PECÚLIO. PLEITO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. PRELIMINAR REJEITADA. REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO. INEXISTÊNCIA DE DIREITO DE DEVOLUÇÃO. NATUREZA JURÍDICA DO SEGURO. CONTRATO ALEATÓRIO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

I - A alegação de impossibilidade jurídica do pedido não merece guarida, visto que o pleito dos apelados é possível, considerando-se o fato de que inexiste previsão legal que impeça os mesmos de postularem em juízo o direito reivindicado. Preliminar rejeitada;

II - O pecúlio era um benefício criado pela Lei Previdenciária Estadual nº 5.011/81 e extinto pela Lei Complementar nº 039/02, por meio do qual os segurados descontavam um percentual mensalmente a fim de terem restituído o quantum deduzido ocorrendo um dos eventos previstos em lei;

III - A extinção do pecúlio não gera direito à devolução, tendo em vista à natureza aleatória do mencionado benefício, visto que, enquanto perdurou a Lei Estadual 5.011/81, os segurados usufruíram da cobertura do risco suportado pela Administração. Precedentes deste egrégio Tribunal;

IV - Recurso conhecido e provido, para a reformar a sentença guerreada, julgando improcedente a ação ajuizada pelos apelados;

Vistos, etc.,

Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da 1ª Turma de Direito Público, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso interposto e, no mérito, dar-lhe provimento, nos termos do voto da Magistrada Relatora.

Sessão do Plenário Virtual da 1ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, realizada no período de 11 a 18 de dezembro de 2023.

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. DESA. ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA (RELATORA):

Trata-se de Recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto pelo ESTADO DO PARÁ, manifestando seu inconformismo com a sentença proferida pelo MM. Juízo de Direito da 6ª Vara da Fazenda da Comarca da Capital, que, nos autos da Ação Ordinária de Indenização por Danos Materiais ajuizada por NÉLIO OLIVEIRA DOS SANTOS E OUTROS, julgou procedente a mencionada ação, condenando o ora apelante a indenizar os recorridos os valores pagos a título de pecúlio com os acréscimos legais.

Condenou o recorrente, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobra o valor da condenação.

Nas razões recursais (Num. 13577971 - Pág. 1/12), o patrono do apelante arguiu, preliminarmente, a impossibilidade jurídica do pedido formulado pelos apelados.

No mérito, sustentou, em síntese, que a sentença recorrida está equivocada quanto à natureza jurídica do pecúlio, uma vez que se trata de espécie de seguro assistencial e não de benefício previdenciário, pois se vinculava à hipótese de assistência aos dependentes em caso de invalidez permanente ou morte do segurado.

Ao final, requereu o conhecimento e provimento do recurso de apelação, com a reforma da sentença guerreada.

Os apelados apresentaram contrarrazões ao recurso, pugnando, em resumo, pelo improvimento do apelo (Num. 13577976 - Pág. 1/7).

Após a regular distribuição do feito, o processo foi distribuído à minha relatoria e, através da decisão de ID 13608612 - Pág. 1, recebi o recurso no duplo efeito e determinei o encaminhamento dos autos ao Órgão Ministerial, objetivando exame e parecer.

O ilustre Procurador de Justiça, Dr. Estevam Alves Sampaio Filho, arguiu que deixava de exarar parecer no presente processo, visto que o caso dos autos não justificava a intervenção do Parquet, conforme preceitua o art. 178 do NCPC (Num. 14203023 - Pág. 1/2).

É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. DESA. ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA (RELATORA):

Presentes os pressupostos de admissibilidade, deve ser conhecido o presente recurso.

Antes de adentrar na análise do mérito do recurso, ressalto que conforme preceitua o art. 14, do NCPC, a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.

A sentença recorrida foi publicada antes de 18 de março de 2016, data que entrou em vigor o CPC/2015.

Nessas circunstâncias, o julgamento deve respeitar os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência do CPC/1973, bem como observar as normas aplicáveis aos recursos previstos na antiga Lei Adjetiva Civil.

PRELIMINAR

Preliminarmente, sustenta o Estado do Pará a impossibilidade jurídica do pedido dos apelados, face a inexistência de previsão legal e orçamentária para o pagamento da restituição pleiteada.

Ressalto que a possibilidade jurídica do pedido, como condição da ação que é, deve ser aferida in status assertionis, ou seja, como foi apresentada pela parte. Assim, deve o juiz indagar, ao receber a inicial, se os fatos alegados pela parte são verdadeiros, se tais pleitos são juridicamente e objetivamente possíveis de serem concedidos. Se a resposta for afirmativa, a mencionada condição da ação está presente.

Nessa senda, sobre a apreciação da teoria da asserção, sintetiza Marinoni que “o que importa é a afirmação do autor, e não a correspondência entre a afirmação e a realidade, que já seria problema de mérito” (MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Editora RT, 2006. P. 181)

Com efeito, no caso em apreço, tendo ocorrido mesmo uma retenção supostamente ilegal de valores pelo Estado do Pará, como apontaram os recorridos em sua exordial, há previsão legal suficiente para ensejar que o apelante restitua os valores, nos termos do 37, §6º da CF e arts. 186 e 927 do Código Civil. Logo, não existe a suposta ausência de disciplina normativa para a restituição.

Doutra banda, a alegada ausência de previsão orçamentária igualmente não se sustenta. Afinal, eventual condenação do Estado do Pará se processará através do regime do precatório, previsto no artigo 100 da CF/88, que possibilitará a inscrição dos débitos no orçamento anual do ente federativo.

Assim, rejeito a preliminar suscitada.

MÉRITO

No caso em análise, cinge-se a controvérsia recursal sobre o direito ou não dos apelados, servidores públicos do Estado do Pará, à restituição das contribuições pagas para formação de pecúlio.

Inicialmente, ressalto que o benefício do pecúlio foi instituído compulsoriamente no âmbito estadual desde a edição da Lei nº 755, de 31/12/1953. Sua previsão permaneceu a até a vigência da Lei Estadual nº 5.011/1981, que em seu art. 24, II, b, previa o pagamento do benefício somente nos casos de morte ou invalidez do segurado, parcial ou total, consoante redação do artigo 37, caput e parágrafos, do referido diploma legal.

É cediço que em se tratando de benefícios previdenciários, a lei a ser observada é a vigente ao tempo em que foi determinado a incidência do fato gerador, em observância ao princípio tempus regit actum, motivo pelo qual, o pedido de restituição do pecúlio previdenciário não encontra amparo legal, porquanto não é da natureza jurídica do pecúlio a restituição dos valores referentes às contribuições pagas ao plano, nos casos de cancelamento e/ou exclusão, sem que tenha ocorrido a condição para sua obtenção (morte ou invalidez), durante a vigência do benefício.

Acrescento que a Lei Complementar nº 039/2002 não trouxe a previsão do pecúlio previdenciário, tampouco trouxe disposição relativa à restituição de valores pagos a título desse benefício.

Desta forma, inexiste qualquer direito adquirido dos segurados envolvidos, considerando que estes tinham apenas mera expectativa de direito, tendo em vista se tratar de contrato público aleatório, cuja prestação é incerta e depende de evento futuro.

Esse entendimento encontra-se consolidado neste egrégio Tribunal, conforme demonstram os julgados abaixo transcritos:

“REEXAME DE SENTENÇA E APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. PECÚLIO. DESCONTO NO CONTRACHEQUE DOS SERVIDORES PÚBLICOS PARA FUNDO DE POUPANÇA DO IPASEP. EXTINÇÃO DO PECULIO OBRIGATÓRIO. DEVOLUÇÃO DO SALDO DAS CONTRIBUIÇÕES. NÃO CABIMENTO. 1-A natureza jurídica do pecúlio, ora em análise, não importa em devolução quando da sua extinção/cancelamento. 2- Os valores descontados nos contracheques da autora a título de prêmio pelo seguro de invalidez ou morte não são passíveis de restituição, porquanto os riscos foram suportados pela Entidade Previdenciária. Precedente do STJ e desta Corte. 3- Omissis. (Proc. nº 2017.00928293-02; 1ª Turma de Direito Público Rel. Desa. Ezilda Pastana Mutran; j. 06/03/2017; p. DJe 13/03/2017)

CHAMAMENTO DO FEITO À ORDEM DE OFÍCIO. AUSÊNCIA DE JULGAMENTO DE APELAÇÃO INTERPOSTA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. APELO PROVIDO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO INTERNO EM REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO E OBSCURIDADE. ACÓRDÃO EMBARGADO QUE MANTEVE A DECISÃO MONOCRÁTICA QUE REFORMOU A SENTENÇA POR SER INCABÍVEL A RESTITUIÇÃO DE VALORES DESCONTADOS A TÍTULO DE FORMAÇÃO DO PECÚLIO. MERO INCONFORMISMO DA PARTE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. UNÂNIME. 1 Chamamento do feito à ordem para julgamento do recurso interposto pelo Ministério Público do Estado do Pará. Razões recursais que coincidem com os argumentos do mérito do apelo interposto pelo IGEPREV, bem como com os fundamentos da decisão monocrática de fls. 652/655, mantida pelo aresto nº 154.022 da 5ª Câmara Cível que negou provimento ao agravo interno dos autores, no sentido de que não há que se falar em devolução de quantias pagas a título de pecúlio previdenciário com a extinção do benefício, uma vez que durante a sua vigência houve a cobertura dos...

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