Acórdão nº 0021151-11.2012.8.14.0301 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Público, 27-11-2023

Data de Julgamento27 Novembro 2023
Órgão2ª Turma de Direito Público
Ano2023
Número do processo0021151-11.2012.8.14.0301
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoTratamento Médico-Hospitalar

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0021151-11.2012.8.14.0301

APELANTE: ESTADO DO PARA

APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO PARA

RELATOR(A): Desembargadora LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS DE USO CONTÍNUO PARA TRATAMENTO DE SAÚDE. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA ABSOLURA DA JUSTIÇA ESTADUAL E ILEGITIMIDADES PASSIVA DO ESTADO DO PARÁ REJEITADAS. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA DA PARTE AUTORA. SENTENÇA QUE DETERMINOU QUE O ESTADO DO PARÁ PRESTE O INDISPENSÁVEL TRATAMENTO DE SAÚDE REQUERIDO NA EXORDIAL. RECURSO SONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA NA SUA INTEGRALIDADE.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e aprovados em Plenário Virtual os autos acima identificados, ACÓRDAM os Excelentíssimos Desembargadores que integram a 2ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade, no sentido de conhecer e negar provimento ao recurso, na conformidade do Relatório e Voto que passam a integrar o presente Acórdão.

Participaram do julgamento os Excelentíssimos Desembargadores José Maria Teixeira do Rosário (Presidente), Luzia Nadja Guimarães Nascimento (Relatora) e Luiz Gonzaga da Costa Neto (Membro).

Belém, em data e hora registrados no sistema.

Desa. LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO

Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível contra sentença prolatada pelo douto Juízo da 4ª Vara de Fazenda da Comarca de Belém (ID 297746 – fls. 1/6) que, nos autos da Ação Civil Pública com Pedido de Antecipação de Tutela ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Pará em favor de Raimundo Geraldo Santos Nascimento e Antônio Pereira dos Santos, e em desfavor do Estado do Pará, julgou procedente o pedido da parte autora, condenando-o ao cumprimento da obrigação de fazer descrita na petição inicial.

Dos autos se extrai (ID 297746 – fls. 1/6), que os pacientes Raimundo Geraldo Nascimento e Antônio dos Santos são portadores e câncer de rim, sendo-lhes prescrito fazer uso do medicamento Sutent 50mg de maneira contínua, que possibilitaria a melhora dos quadros clínicos apresentados, conforme laudos médicos acostados aos autos. Relatam que o Sistema Único de Saúde suspendeu o fornecimento do remédio em novembro de 2011 e que, recorrendo ao Ministério Público, tentaram por várias vezes soluções administrativas para o fornecimento do medicamento, porém sem sucesso. Assim, diante das tentativas frustradas e da demora excessiva do Poder Público, o Órgão Ministerial ajuizou a presente ação visando assegurar aos pacientes o direito à saúde, diante da sua hipossuficiência financeira, haja vista tratar-se de fármaco de alto custo.

O Estado do Pará apresentou contestação em ID 297744 – fls. 1/23, argumentando acerca do prequestionamento e de repercussão geral, quanto à solidariedade dos entes públicos nas questões de saúde, a partir do julgamento do RE 566.471/RN, que propõe sumula vinculante sobre a matéria. Prossegue apontando a ilegitimidade passiva do Estado do Pará, alegando ser de responsabilidade da autarquia Hospital Ophir Loyola o fornecimento do medicamento, pelo que postula a extinção do processo sem resolução do mérito. Argumenta acerca da atuação do Sistema Único de Saúde – SUS, sendo atribuição das três esferas de poder: União, Estado e Município. impossibilidade de processamento do feito perante a justiça comum estadual. Alega a existência de fatos relevantes que impõem o indeferimento da medida liminar e conduzem à improcedência da ação.

No mérito, tece considerações 1) acerca do modelo brasileiro de saúde pública, a partir da Constituição Federal de 1988; 2) da Política Nacional de Medicamentos; 3) reporta a inexistência de direito subjetivo a ser tutelado de imediato; o comprometimento do princípio da universalidade do acesso à saúde; 4) aborda o princípio da reserva do possível, os limites orçamentários disponíveis, a universalidade do atendimento a intervenção do Judiciário - violação de princípios constitucionais; 5) a necessidade de apresentação dos documentos necessários para a concessão do medicamento pleiteado, 6) a necessidade de aplicação de prazo razoável para cumprimento da liminar, 7) a impossibilidade de concessão de tutela antecipada em face da fazenda pública determinando a liberação de recursos públicos; e 8) a impossibilidade de condenação do Estado do Pará em honorários quando o representante judicial do autor for a Defensoria Pública. Ao final, postula a total improcedência dos pedidos.

Réplica à contestação em ID 297745 – fls.1/13.

Sobreveio a sentença (ID 297746 – fls. 1/6), cujo dispositivo abaixo transcrevo:

“Posto isso, JULGO TOTALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO, CONDENANDO o réu (Estado do Pará) ao fornecimento de forma definitiva do Medicamento SUTENT 50mg a Geraldo Santos Nascimento e Antônio Pereira dos Santos garantindo ainda, todos os meios necessários para a sua realização.

Deixo de condenar o réu em custas e honorários eis que se trata de entidades de direito público.

Certificado o trânsito em julgado, arquivem-se com as cautelas de estilo, dispensado o Reexame necessário nos termos do § 2º do art. 475 do CPC.

P.R.I.C”

Irresignado, o Estado do Pará apelou da decisão (ID 297750 – fls. 1/12), apresentando, em razões recursais, os mesmos argumentos trazidos na peça de Contestação.

Contrarrazões apresentadas em ID 297751 – fls. 2/16.

Instado, o Ministério Público apresentou parecer pelo não conhecimento da apelação e, em reexame necessário pela reforma parcial da sentença no sentido de reconhecer a legitimidade passiva da União, porém mantendo íntegra a decisão de mérito proferida (ID 11132527 – fls. 1/11)

É o relatório que submeto a julgamento em Plenário Virtual.

VOTO

Tempestivo e adequado, conheço do recurso e passo à análise.

Tratam os autos de Ação de Obrigação de Fazer com Pedido de Tutela Antecipada com o objetivo de que o Estado do Pará forneça aos requerentes o medicamento necessário à continuidade do tratamento médico, conforme diagnóstico do médico especialista.

Quanto às preliminares de ilegitimidade passiva do Estado e incompetência absoluta do Juízo, entendo que merecem rejeição, senão vejamos.

O Estado sustenta que a competência para processamento e julgamento do feito seria da Justiça Federal e, ainda, a ilegitimidade passiva, considerando que a obrigação no fornecimento do fármaco em questão seria da União.

O art. 23, inciso II, da Constituição da República, estabelece a competência concorrente da União, Estados e Municípios no que tange a saúdee assistência pública, razão pela qual a responsabilidade, entre os integrantes do sistema, é solidária.

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito-Federal e dos Municípios:

[...]

II- cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência.

Daí, constata-se que a Constituição da República aponta no sentido da responsabilidade solidária dos entes federados, justamente como forma de facilitar o acesso aos serviços, ampliando os meios do administrado exigir que o Poder Público torne efetivo o direito social à saúde, estabelecido como direito fundamental, conforme art. 6º da Carta Magna.

Com efeito, a saúde é direito de todos e dever do Estado sendo certo que a responsabilidade pela prestação dos serviços é de todos os entes Federados, que devem atuar conjuntamente, em regime de colaboração e cooperação.

Nesse sentido, a saúde compete solidariamente à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, podendo o cidadão acionar, com a devida prescrição médica, qualquer desses entes Federados, conjunta, ou isoladamente, para fins de fornecimento de medicamentos ou realização de tratamento médico.

A par disso, poderá a parte buscar assistência médica em qualquer dos entes, sendo imposto a cada um deles suprir eventual impossibilidade de fornecimento do outro, uma vez que se trata de dever constitucional, conjunto e solidário, não podendo o ente municipal se eximir da responsabilidade de fornecer o tratamento médico solicitado.

Cabe destacar a possibilidade de compensação de gastos entre os gestores do SUS, eis que está prevista no artigo 35, inciso VII, da Lei nº. 8.080/1990, senão vejamos:

Art. 35. Para o estabelecimento de valores a serem transferidos a Estados, Distrito Federal e Municípios, será utilizada a combinação dos seguintes critérios, segundo análise técnica de programas e projetos: (...)

VII - ressarcimento do atendimento a serviços prestados para outras esferas de governo. (...)

Neste sentido, é o entendimento jurisprudencial:

ADMINISTRATIVO. DIREITO A SAÚDE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS PELO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. INEXISTÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO ESTADO. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CERCEAMENTO DE DEFESA. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. 1. A presente divergência (legitimidade passiva do Estado para integrar a lide e legitimidade ativa do Ministério Público, que pretende o fornecimento de medicamentos à menor cuja provedora não dispõe de recursos para custear o tratamento médico) não guarda similitude com a matéria submetida ao procedimento do art. 543-C do CPC no REsp 1.102.457/RJ. 2. O funcionamento do Sistema Único de Saúde é de responsabilidade solidária da União, dos Estados e dos Municípios, de modo que qualquer um desses entes tem legitimidade ad causam para figurar no polo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso a medicamentos para tratamento de problema de saúde. Precedentes. 3. O Ministério Público possui legitimidade ativa para ajuizar ação civil pública que visa ao fornecimento de medicamento a pessoa que não tem condições financeiras de arcar com o tratamento médico, por se tratar de direito indisponível. Precedentes. 4. Reavaliar a necessidade, ou não, da prova pericial requerida, a...

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