Acórdão Nº 0021667-33.2009.8.24.0018 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 30-01-2020

Número do processo0021667-33.2009.8.24.0018
Data30 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemChapecó
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0021667-33.2009.8.24.0018, de Chapecó

Relator: Desembargador Luiz Zanelato

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO PAULIANA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA (CPC/2015).

RECURSO DA AUTORA.

DEMANDA ANULATÓRIA DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULOS. EMBASAMENTO NA OCORRÊNCIA DE FRAUDE CONTRA CREDORES. VIABILIDADE DA DEMANDA ATRELADA À COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS OBJETIVO E SUBJETIVOS PARA CARACTERIZAÇÃO DA CAUSA DE ANULABILIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 158 E 159 DO CÓDIGO CIVIL. AUTORA QUE SE LIMITOU A COMPROVAR APENAS A ANTERIORIDADE DE SEU CRÉDITO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA INSOLVÊNCIA DO DEVEDOR RESULTANTE DO INDIGITADO NEGÓCIO ("EVENTUS DAMNI"), TAMPOUCO DA INTENÇÃO DE FRAUDAR ("CONSILIUM FRAUDIS"). PRESSUPOSTOS INDISPENSÁVEIS À INVALIDAÇÃO DO ATO. REVELIA DA EMPRESA RÉ. NÃO INCIDÊNCIA DO EFEITO MATERIAL DA PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DOS FATOS. CONTESTAÇÃO OFERECIDA POR UM LITISCONSORTE PASSIVO. IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DOS REQUISITOS DA FRAUDE CONTRA CREDORES NA DEFESA DA DEMANDADA QUE CONTESTOU. ÔNUS DA PROVA QUE INCUMBIA À DEMANDANTE. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO, ADEMAIS, DO "CONSILIUM FRAUDIS". SIMPLES PROXIMIDADE DE DATAS QUE, POR SI SÓ, NÃO COMPROVA O INTUITO FRAUDATÓRIO. SENTENÇA MANTIDA.

1. "Consoante pacífico entendimento doutrinário e jurisprudencial, o sucesso da ação pauliana (também denominada ação revocatória ou anulatória de ato jurídico) está subordinado, essencialmente, à demonstração de três requisitos: a anterioridade do crédito, o eventus damni (insolvência do devedor em decorrência do ato fraudulento) e o consilium fraudis (intenção de fraudar)". (TJSC, Apelação Cível n. 2008.065242-5, de Rio do Oeste, rel. Des. Eládio Torret Rocha, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 09-09-2010).

2. "Não comprovado que a alienação do bem acarretou ou agravou a insolvência do devedor, bem como que os terceiros adquirentes do imóvel teriam como prever prejuízo a eventual credor, não há como determinar, sob o argumento da ocorrência de fraude contra credores, a anulação de negócio jurídico realizado a título oneroso (Apelação Cível n. 2013.076232-0, de Tubarão, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 23-2-2016).

SUCUMBÊNCIA RECURSAL. APELO INTERPOSTO SOB A VIGÊNCIA DO CPC/15. NOVA DECAÍDA DA RECORRENTE. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DA VERBA EM FAVOR DO CAUSÍDICO DA APELADA QUE SE IMPÕE. EXEGESE DO ARTIGO 85, § 11, DO CPC.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0021667-33.2009.8.24.0018, da comarca de Chapecó 3ª Vara Cível em que é Apelante Benin Transportes Ltda EPP e Apelados Transportes Sobral & Sobral Ltda ME e outros.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, acrescidos honorários recursais à apelante. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Salim Schead dos Santos, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Mariano do Nascimento.

Florianópolis, 30 de janeiro de 2020.

Desembargador Luiz Zanelato

Relator


RELATÓRIO

Benin Transportes Ltda EPP interpôs recurso de apelação da sentença de fls. 317-320, proferida pelo juízo da 3ª Vara Cível da comarca de Chapecó nos autos da ação pauliana, proposta contra Transportes Sobral & Sobral Ltda ME e outros, que julgou improcedentes os pedidos formulados na petição inicial.

Na origem, trata-se de ação de pauliana proposta pela ora apelante contra Transportes Sobral e Sobral Ltda., San Thomas Comércio de Gêneros Alimentícios Ltda. e José Roberto Comite, visando a desconstituição de negócios de compra e venda de quatro veículos, em cadeia, da primeira para a segunda ré, e desta para o último demandado, alegadamente com intuito de fraudar a satisfação do crédito possuído pela autora ante a primeira demandada.

Ao receber a inicial, o magistrado de origem determinou a citação dos réus (fl. 91).

Citada, apenas empresa ré San Thomas Comércio de Gênero Alimentícios Ltda apresentou contestação (fls. 106-115), argumentando, em síntese, que (a) está sendo injustamente acusada de promover, em conluio com a ré Transportes Sobral e Sobral Ltda e José Roberto Comite, o crime de fraude contra credores, por suposta dissimulação da compra e venda de veículos com o objetivo de prejudicar terceiros; (b) o negócio foi realizado de forma lícita, uma vez que a compra ocorreu dentro da normalidade e sem conluio, fraude, simulação ou tentativa de prejudicar terceiros; (c) é empresa operante nas relações de comércio exterior há vários anos, tendo como atividade principal a compra e venda de frutas oriundas do Mercosul, transportando-as da Argentina para o Brasil; (d) efetuou a compra dos veículos pelos preços certos e justos, através de pagamento em dinheiro, conforme documentos anexos; (e) a transferência dos bens foi realizada pelo despachante perante o DETRAN-SP, sem qualquer empecilho; (e) após a aquisição, constatou que os bens não estavam em bom estado de conservação como pareciam estar e que não seriam para o transporte de mercadorias, tendo em vista que as frutas exigem maior cuidado na conservação em câmaras frias, razão pela qual resolveu vendê-los a José Roberto Comite, que atua no transporte de outras cargas; (f) não tinha conhecimento de qualquer ação de cobrança, execução, busca e apreensão ou distrato da alienante originária com qualquer outra pessoa; (g) a boa-fé da contestante é clara, sendo que o contrato entre a autora e a ré Transportes Sobral e Sobral Ltda não estava averbado no documento dos veículos, para que tivesse conhecimento da lide; (h) em consulta ao DETRAN de São Paulo, verificou-se que existem outros bens do patrimônio da ré Transportes Sobral e Sobral Ltda, livres e desembaraçados, sem qualquer ônus, o que afasta a tese da empresa autora.

Pugna a improcedência do pleito exordial (fls. 106-115).

Réplica às fls. 155-160.

Designada audiência, foi deferida a produção de prova oral e determinada a expedição de carta precatória para a oitiva de testemunhas residentes em outro estado da federação.

Na data de 29-01-2018, o juiz da causa, Dr. Marcos Bigolin, prolatou sentença de improcedência dos pedidos, nos seguintes termos:

Cuida-se de ação pauliana proposta por Benin Transportes Ltda. em face de Transportes Sobral e Sobral Ltda., San Thomas Comércio de Gêneros Alimentícios Ltda. E José Roberto Comite, objetivando a anulação das transferências veiculares realizadas pela primeira requerida.

A autora sustenta que o primeiro requerido, com a intenção de se tornar insolvente e, assim, não pagar um termo de rescisão contratual, no valor de R$ 235.315,40 (duzentos e trinta e cinco mil, trezentos e quinze reais e quarenta centavos), transferiu para o segundo e, posteriormente, para o terceiro requerido, quatro veículos de sua propriedade.

Requer a anulação dos negócios jurídicos firmados pela requerida Transportes Sobral e Sobral Ltda., a fim de que os veículos voltem a incorporar o patrimônio desta e sejam utilizados para saldar o débito relativo à rescisão contratual.

Devidamente citados, a requerida San Thomas Comércio de Gêneros Alimentícios Ltda. contestou, arguindo, em síntese, que comprou os veículos livres e desembaraçados do autor, e que, tempo depois, por verificar que eles não estavam em perfeitas condições para atender o objetivo almejado, vendeu-os para o terceiro réu. Destaca que não houve qualquer fraude nas negociações.

Réplica às fls. 135/141 rechaçando as teses de defesa.

A requerida Transportes Sobral e Sobral Ltda. ajuizou exceção de incompetência, sendo esta rejeitada, da mesma maneira que a incompetência arguida pelo réu José Roberto Comite.

Audiência de instrução e julgamento frustrada pela ausência da parte ré, que posteriormente deixou transcorrer in albis o prazo para comprovação do motivo que a impossibilitou de comparecer ao ato.

Regularmente cumprida a carta precatória de oitiva das testemunhas arroladas pelas partes (fls. 243/261).

Vieram os autos conclusos.

É o relato.

[...]

Ante o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE os pedidos formulados por Benin Transportes Ltda. em desfavor de Transportes Sobral e Sobral Ltda., San Thomas Comércio de Gêneros Alimentícios Ltda. e José Roberto Comite. Custas e honorários advocatícios, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, conforme art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil, pela parte autora. P. R. I.

(fls. 317-320) [destacou-se]

Irresignada, a autora interpôs recurso de apelação, argumentando, em suma, que: a) a sentença vai de encontro com a realidade dos autos, pois, além da revelia e confissão dos réus, também foram apresentadas provas e testemunhos suficientes a comprovar a fraude arquitetada entre os requeridos; b) os réus José Roberto Comite e Transportes Sobral e Sobral Ltda, devidamente citados, não apresentaram contestação, nem compareceram à audiência, tendo havido revelia e presunção de confissão; c) está demonstrado nos autos que os veículos foram transferidos para a empresa San Thomas em 26-05-2009 e, após, para José Roberto Comite em 10-06-2009; d) os manifestos internacionais de carga comprovam que os caminhões vendidos prosseguiram trabalhando para as empresas que pertenciam ao primeiro réu; e) a testemunha Adenir Fischer confirmou que os caminhões prosseguiram transportando mercadorias para empresas de Luiz Leonardo Sobral, sócio da primeira ré; f) Ademar Sérgio Netto e Venicius de Lara Bortoli também confirmam essa versão; g) não houve prova do pagamento da compra e venda dos caminhões; g) está demonstrada a anterioridade do crédito da apelante e os demais requisitos necessários à caracterização de fraude contra credores (fls. 335-352).

Intimadas, as apeladas deixaram de ofertar contrarrazões ao recurso no prazo legal (fls. 356-357).

O recurso ascendeu ao Tribunal de Justiça e foi...

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