Acórdão Nº 0025052-77.2013.8.24.0008 do Quarta Câmara de Direito Civil, 10-12-2020

Número do processo0025052-77.2013.8.24.0008
Data10 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemBlumenau
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0025052-77.2013.8.24.0008, de Blumenau

Relator: Des. Helio David Vieira Figueira dos Santos

APELAÇÃO CÍVEL E AGRAVO RETIDO. AÇÃO CONDENATÓRIA. DESMORONAMENTO DE MURO CONSTRUÍDO ENTRE IMÓVEIS VIZINHOS, DURANTE OBRA REALIZADA PELA RÉ. INDENIZAÇÕES POR DANOS EMERGENTES E LUCROS CESSANTES REQUERIDAS. TESE DE ILEGITIMIDADE ATIVA. REJEIÇÃO EM DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO RETIDO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELO DA RÉ.

1. AGRAVO RETIDO. NÃO CONHECIMENTO. AUSÊNCIA DE PEDIDO EXPRESSO DE APRECIAÇÃO DO AGRAVO NAS RAZÕES DA APELAÇÃO. NECESSIDADE. EXEGESE DO ART. 523, § 1º, DO CPC/73. ILEGITIMIDADE AD CAUSAM NÃO CONSTATADA DE OFÍCIO.

2. APELAÇÃO CÍVEL.

2.1. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO ACOLHIMENTO. ASSERTIVAS DA DEFESA DEVIDAMENTE ENFRENTADAS E AFASTADAS PELA MAGISTRADA, COM BASE NA PROVA DOS AUTOS. RAZÕES DO CONVENCIMENTO BEM ELUCIDADAS. DEFEITO NÃO VERIFICADO.

2.2. MÉRITO.

2.2.1. ALEGADA NÃO CARACTERIZAÇÃO DO DEVER DE INDENIZAR. REJEIÇÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA PROPRIETÁRIA POR DANOS CAUSADOS DURANTE OBRA REALIZADA EM SEU IMÓVEL. ARTS. 937, 1.311 E 1.312 DO CÓDIGO CIVIL. PRECEDENTES DESTA CORTE. INEGÁVEL NEXO CAUSAL ENTRE A ATIVIDADE EXECUTADA PELA RÉ EM SEU TERRENO E O DESMORONAMENTO DO MURO. CASO FORTUITO NÃO VISLUMBRADO. TEMPORAL E CHUVA FORTE EM REGIÃO DE ALTO ÍNDICE PLUVIOMÉTRICO. INTEMPÉRIE PREVISÍVEL CUJOS ESTRAGOS SÃO, VIA DE REGRA, EVITÁVEIS. CULPA EXCLUSIVA OU CONCORRENTE DA VÍTIMA TAMBÉM NÃO DEMONSTRADA. EXISTÊNCIA DE TUBULAÇÃO DE ESGOTO SOB O SEU TERRENO NÃO IDENTIFICADA COMO CLANDESTINA. PROVA TESTEMUNHAL COMPROVANDO QUE ESSE TIPO DE TUBULAÇÃO ERA O PADRÃO DA LOCALIDADE. AUSÊNCIA, ADEMAIS, DE PROVA DA INFLUÊNCIA DESSA TUBULAÇÃO NO DANO OCORRIDO. OBRIGAÇÃO DA RÉ NÃO AFASTADA.

2.2.2. LUCROS CESSANTES. RESCISÃO ANTECIPADA DE CONTRATO DE LOCAÇÃO COM PRAZO DETERMINADO. PROVA DE QUE A RESILIÇÃO SE DEU EM VIRTUDE DOS RISCOS CAUSADOS PELO DESMORONAMENTO. LOCADORA QUE DEIXOU DE AUFERIR A RENDA DA LOCAÇÃO POR QUATRO MESES. RESSARCIMENTO DEVIDO.

ALTERAÇÃO, PORÉM, DO TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA FIXADOS NA SENTENÇA. FLUÊNCIA A PARTIR DO RECEBIMENTO, PELA APELANTE, DA NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENVIADA PELA APELADA PARA COBRANÇA DO IMPORTE. CONSTITUIÇÃO EM MORA. APELO ACOLHIDO NO PONTO.

2.2.3. DANOS EMERGENTES. VALORES DESPENDIDOS PELA AUTORA PARA CONTENÇÃO. RESSARCIMENTO RESTRITO AOS GASTOS EFETIVAMENTE COMPROVADOS. SENTENÇA ALTERADA TAMBÉM NO PARTICULAR. CONSECTÁRIOS LEGAIS, PORÉM, MANTIDOS COMO DEFINIDO NA ORIGEM. ATUALIZAÇÃO DA MOEDA DESDE CADA DESEMBOLSO E JUROS MORATÓRIOS DESDE A CITAÇÃO.

AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO.

APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0025052-77.2013.8.24.0008, da comarca de Blumenau 4ª Vara Cível em que é Apelante Multilajes Pré Moldados de Concreto Ltda. e Apelado Bárbara Deeke Peters.

A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, não conhecer do agravo retido; e conhecer do apelo e dar-lhe parcial provimento.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Des. José Agenor de Aragão e o Exmo. Sr. Des. Selso de Oliveira.


Florianópolis, 10 de dezembro de 2020.


Helio David Vieira Figueira dos Santos

Relator





RELATÓRIO

Bárbara Deeke Peters ajuizou ação condenatória contra Multilajes Pré Moldados de Concreto Ltda. aduzindo ter sido prejudicada em razão de construção de galpão efetivada em imóvel de propriedade da ré, confrontante com imóvel de sua propriedade, à época alugado para a terceira Marinete de Souza – ME. Disse que recebia pelo bem, a título de aluguel, R$ 12.000,00 mensais, e que em 25/10/2012 a locatária procedeu à notificação extrajudicial para desocupação, justificada na falta de segurança e condições de habitabilidade ocasionados pelo desmoronamento de muro de contenção edificado pela requerida, 2 dias antes, que causou trincas e rachaduras em seu imóvel, além de ter resultado em deslizamento de grande volume de terra. Referiu que a rescisão do contrato deu-se 4 meses antes da data ajustada pelas contratantes, tendo ela deixado de auferir R$ 48.000,00 e, ainda, despendido R$ 1.580,73 para realizar pequenas obras de contenção. Requereu, assim, a condenação da demandada ao pagamento de indenização por danos materiais e lucros cessantes.

Na contestação, a requerida alegou a ilegitimidade ativa da requerente, ao argumento de que nunca foi proprietária do bem que afirmou ter alugado a terceira, que já esteve registrado em nome de Vera Deeke Peters, mas foi transferido a outrem em 05/12/2012. No mais, arguiu que não há nexo causal entre a resilição antecipada do contrato de locação e a sua obra, pois a queda do muro que fica entre os imóveis decorreu de caso fortuito, qual seja, a chuva torrencial, inclusive com granizo, que atingiu o município de Blumenau em 22/10/2012. Justificou ter conseguido todas as licenças necessárias antes de iniciar a construção e pontuou que, após o desabamento, providenciou a retirada de entulhos e colaborou para garantir o acesso ao terreno da autora. Mencionou a existência de uma tubulação de esgoto clandestina partindo do imóvel locado, que teria contribuído para o desmoronamento do muro. Além disso, argumentou que o estabelecimento mantido pela locatária já havia anunciado o fechamento antes do ocorrido, mas continuou funcionando nos dias seguintes ao temporal, e que o bem foi vendido a terceiro antes do prazo previsto para encerramento da relação locatícia. Por fim, defendeu inexistir prova dos danos causados à estrutura do imóvel. Pleiteou a extinção do feito ou a improcedência dos pedidos e, subsidiariamente, o reconhecimento da culpa concorrente e a fixação de indenização proporcional ao grau de culpa (p. 45/57).

Houve réplica (p. 150/157).

Afastada a preliminar de ilegitimidade ativa, com fundamento na assertiva inaugural de que a autora era possuidora do imóvel (p. 185/186), a requerida interpôs agravo retido, sustentando que essa condição não confere a ela legitimidade para postular a reparação dos danos verificados no bem (p. 191/192).

Durante a instrução foram ouvidas 2 testemunhas e 1 informante (p. 261).

Na sentença, a magistrada acolheu a pretensão inicial, por entender comprovada a narrativa de que "o desmoronamento do muro ocorreu por culpa da empresa ré em não tomar as devidas precauções para resguardar o terreno de imóvel da autora" (p. 379), inclusive após ter sido alertada do perigo de queda. A magistrada também reconheceu que a rescisão contratual deu-se por causa do ocorrido, o que inviabilizou a continuidade da locação. Então, o pleito foi julgado procedente, para condenar a requerida ao pagamento a) de indenização por lucros cessantes, no valor de R$ 48.000,00, e danos materiais, no importe de R$ 1.580,73, ambos acrescidos de juros de mora a partir do evento danoso e, respectivamente, atualizados desde a data de vencimento de cada aluguel e do desembolso; e b) das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 20% sobre o valor da condenação (p. 376/384).

A requerida apelou. Em suas razões, sustenta que a sentença é nula por carência de fundamentação no que toca à tese de defesa de que o acontecimento relatado pela apelada é resultado de caso fortuito. Ademais, reitera as alegações trazidas na contestação. Destaca a ocorrência de temporal e chuva torrencial no dia anterior ao da queda, que causou diversos outros danos no município; e insiste na culpa da autora, haja vista a tubulação clandestina encontrada sob o seu imóvel, e na ausência de prova dos danos alegados e do nexo causal entre a queda do muro e a rescisão do contrato de locação. Impugna também o termo inicial dos consectários legais fixado pelo juízo a quo, defendendo a fluência a partir da decisão e, subsidiariamente, da citação. Postula a reforma da sentença (p. 390/407).

O apelo é tempestivo e o preparo foi recolhido (p. 414/415).

Com as contrarrazões (p. 424/437), vieram os autos a este grau de jurisdição.

Este é o relatório.

VOTO

Aplica-se o Código de Processo Civil de 2015, na forma do Enunciado Administrativo n. 3, do Superior Tribunal de Justiça.

1. Não se conhece do agravo retido interposto contra a decisão que reconheceu a legitimidade ativa da apelada (p. 191/192), porque não reiterado o pedido de apreciação do inconformismo nas razões de apelação, conforme exigia o art. 523 do CPC/73.

De qualquer forma, não se cuida de hipótese de ilegitimidade ad causam, pois há evidente pertinência subjetiva a autorizar a autora a postular o ressarcimento de danos supostamente causados a ela, possuidora e locadora de imóvel, em razão da queda de muro decorrente de obra realizada pela ré.

2. Já o apelo, presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, é admitido para análise.

Preliminar de nulidade

De pronto, observa-se que não houve negativa de prestação jurisdicional pelo juízo a quo no que se refere aos argumentos da defesa, particularmente, a tese de que o evento danoso foi ensejado por caso fortuito – o temporal que atingiu Blumenau em 22/10/2012.

Extrai-se dos fundamentos da sentença motivação suficiente para afastar as assertivas da ré, como no trecho a seguir transcrito:

Pois bem, em que pese o esforço da defesa em fazer crer que a empresa ré não deu causa ao evento danoso, extrai-se dos documentos (21-23), bem como das declarações das testemunhas (fl.261) que o desmoronamento do muro ocorreu por culpa da empresa ré em não tomar as devidas precauções para resguardar o terreno do imóvel da autora.

A testemunha Beato Stingelin,...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT