Acórdão Nº 0026119-90.2017.8.24.0023 do Terceira Câmara Criminal, 27-10-2020

Número do processo0026119-90.2017.8.24.0023
Data27 Outubro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão

Apelação Criminal n. 0026119-90.2017.8.24.0023, da Capital

Relator: Desembargador Leopoldo Augusto Brüggemann

Apelação Criminal. Crime contra a incolumidade pública. Posse de assessório de arma de fogo de uso permitido (ART. 12 LEI N. 10.086/2003). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

ALMEJADA CONDENAÇÃO POR INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CABIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS DEVIDAMENTE COMPROVADAS. CONFISSÃO DO ACUSADO QUANTO A POSSE DE CARREGADORES DE ARMA DE FOGO EM CONSONÂNCIA COM OS DEPOIMENTOS JUDICIAIS DOS AGENTES PÚBLICOS QUE PARTICIPARAM DA OCORRÊNCIA. ADEMAIS, DILIGÊNCIA POLICIAL QUE SE ORIGINOU EM CONTEXTO DE CONFLITO PELA SUPOSTA PRÁTICA DE AMEAÇA ENVOLVENDO A LEI MARIA DA PENHA. CRIME DE MERA CONDUTA E PERIGO ABSTRATO. CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE. PRECEDENTES.

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0026119-90.2017.8.24.0023, da comarca da Capital (3ª Vara Criminal) em que é Apelante Ministério Público do Estado de Santa Catarina e o Lucas Valdemir Gonçalves.

A Terceira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado no dia 27 de outubro de 2020, os Excelentíssimos Desembargadores Júlio César M. Ferreira de Melo e Getúlio Corrêa. Atuou pelo Ministério Público o Excelentíssimo Procurador de Justiça. Rui Arno Richter.



Florianópolis, 30 de outubro de 2020





Desembargador Leopoldo Augusto Brüggemann

Relator e Presidente






RELATÓRIO

Na comarca da Capital, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Lucas Valdemir Gonçalves, dando-o como incurso nas sanções do art. 180, caput, do Código Penal e art. 12 da Lei n. 10.826/2003, na forma do art. 69 do Código Penal, pela prática das condutas assim descritas na inicial acusatória:


FATO 1

Em data a ser melhor esclarecida no decorrer da instrução processual, mas certamente entre os dias 16 de março de 2016 e 8 de novembro de 2017, o denunciado Lucas Valdemir Gonçalves recebeu ou, de qualquer modo, adquiriu, em proveito próprio, coisa que sabia ser produto de crime, consistente em 1 (uma) placa de motocicleta com a inscrição MFC-7601, pertencente à motocicleta Honda/Twister 250, furtada em 16 de março de 2016, na Rua Quadrangular n. 539, Bairro Ingleses do Rio Vermelho, nesta Capital, tudo nos termos do Auto de Prisão em Flagrante de fl. 3, do Boletim de Ocorrência de fls. 4/5, do Boletim de Ocorrência de fl. 6, do Mandado de Busca e Apreensão de fl. 7, do Auto de Exibição e Apreensão de fl. 9, bem como dos depoimentos colhidos na fase policial (fls. 8 e 10).

FATO 2

No dia 8 de novembro de 2017, por volta das 6 horas e 25 minutos, na Servidão Pedro Laureano dos Santos n. 92, casa, Bairro Ingleses do Rio Vermelho, nesta Capital, o denunciado Lucas Valdemir Gonçalves possuía, no interior de sua residência, 3 (três) carregadores de pistola calibre .380, 2 (dois) carregadores de pistola calibre 7.65mm (32 Auto)1, e 1 (uma) e uma cápsula de calibre .38, deflagrada, tudo de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, conforme se extrai do Auto de Prisão em Flagrante de fl. 3, do Boletim de Ocorrência de fls. 4/5, do Mandado de Busca e Apreensão de fl. 7, do Auto de Exibição e Apreensão de fl. 9, bem como dos depoimentos colhidos na fase policial, em especial a confissão do denunciado (fls. 8, 10 e 13).

Na oportunidade dos fatos, em cumprimento ao Mandado de Busca e Apreensão n. 0026064-42.2017.8.24.0023, expedido pelo Juizado de Violência Doméstica contra a Mulher desta Capital, policiais civis dirigiram-se à residência do denunciado e, em buscas, encontraram, (1) no interior do quarto de Lucas, os acessórios e a munição descritos no Fato 2; e (2) no quintal de sua residência, a placa de motocicleta anteriormente furtada, cuja origem ilícita era conhecida pelo denunciado, uma vez que recebeu ou adquiriu o referido sinal identificador de forma avulsa, com o objetivo de colocar na sua motocicleta oriunda de leilão.


Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada parcialmente procedente para absolver o acusado em relação ao delito de posse ilegal de acessório de arma de fogo (art. 12, caput, da Lei 10.826/03), com fundamento no art. 386, III, do CPP, e condená-lo ao cumprimento da pena de 1 ano de reclusão, em regime inicialmente aberto, além do pagamento de 10 dias-multa, fixados, cada um, no importe de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do delito de receptação (art. 180, caput, do CP). A pena privativa de liberdade foi substituída por uma restritiva de direito consistente na prestação pecuniária de um salário mínimo (p. 123-137).

Irresignada, a acusação interpôs recurso de apelação requerendo a condenação do acusado pela prática do crime previsto no art. 12, caput, da Lei 10.826/03, sob o argumento de que na situação em concreto impossível falar em insignificância, tendo em vista que os acessórios apreendidos foram identificados em conjunto com bem proveniente de delito anterior, o qual resultou na condenação do apelado no crime de receptação. Salientou que a localização dos objetos se deu através de mandado expedido pela Vara de Violência Doméstica contra a Mulher da Capital, sendo que o acusado utilizava-se de instrumento bélico para realizar ameaças à sua ex-companheira e sogra. Ressaltou que o denunciado responde a outro processo por tráfico de drogas e receptação, de modo que é imperiosa sua condenação (p. 153-158).

Juntadas as contrarrazões (p. 161-165), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Paulo de Tarso Brandão, opinou pelo conhecimento e não provimento do recurso (p. 186-189).

Este é o relatório.


VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina contra decisão que julgou parcialmente procedente a denúncia e condenou o acusado pela prática do delito tipificado no art. 180, caput, do CP e o absolveu do delito grafado no art. 12 da Lei n. 10.826/2003.

O apelo é de ser conhecido, porquanto presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

O Ministério Público postula a condenação do acusado pelo delito de posse de acessório de arma de fogo de uso permitido, por entender que no caso concreto se mostra inaplicável o princípio da insignificância.

Sustenta que a apreensão dos objetos se deu em decorrência de mandado de busca e apreensão em um processo de ameaça que tramita no Juizado de Violência Doméstica contra a Mulher.

Razão assiste à acusação.

Consta da denúncia que, no dia 8 de novembro de 2017, o acusado possuía, no interior de sua residência, 3 carregadores de pistola calibre .380, 2 carregadores de pistola calibre 7.65mm e 1 cápsula de calibre .38 deflagrada, tudo de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

A materialidade, ainda que não contestada, está demonstrada por meio do auto de prisão em flagrante n. 3.17.01447 (p. 3), boletim de ocorrência n. 00125-2017-0005066 (p. 4-5), auto de exibição e apreensão (p. 9) e laudo pericial n. 9100.18.00093 (pp. 46-48), o qual atestou a eficiência dos acessórios de arma de fogo.

A autoria, da mesma forma restou demonstrada e recai sobre o acusado.

O apelado, em juízo (p. 94), confessou possuir os carregadores de arma de fogo, ao argumento de que faziam aproximadamente duas semanas que havia recebido os objetos para guardá-los para outra pessoa.

A confissão do acusado vem amparada pelo testemunho dos policiais que atuaram na diligência, os quais se transcreve pois fidedignos à mídia da audiência.


O Policial Civil Gustavo Figueiró Baldi, quando inquirido em Juízo, sob o crivo do contraditório (mídia eletrônica juntada à fl. 76), reiterou aquilo que já havia narrado na fase policial (fl. 10 e gravação audiovisual à fl. 24). Disse que, na época dos fatos, a ex-namorada do acusado informou que ele tinha em sua posse armas de fogo, inclusive um fuzil, e inclusive indicou o local na residência onde ele mantinha as armas, dizendo que ficavam no armário, entre as roupas. Que diante disso, o Delegado pediu mandado de busca e apreensão. Na data dos fatos, deram cumprimento ao mandado e ao chegarem no local, ninguém atendeu, razão pela qual foi necessário o arrombamento. Asseverou que Lucas estava no local e que sua função na operação foi de segurança do perímetro e não fez a apreensão dos objetos, mas depois visualizou os carregadores e a placa encontrados na casa do acusado. Apresentada a imagem de fl. 47 ao policial, o mesmo disse acreditar tratar-se dos objetos apreendidos na ocorrência. Que pelo que recorda, a placa estava nos fundos da residência. Disse que pelo que recorda, Lucas não disse nada sobre os fatos. Afirmou que havia pelo menos mais três pessoas na casa, uma menina, acha que a mãe e um rapaz.

No mesmo sentido, foi o depoimento do policial civil João Otávio Luiz, prestado na fase judicial (mídia eletrônica juntada à fl. 76). Na ocasião, aduziu que participou do cumprimento do mandado de busca e apreensão que deu ensejo ao presente processo. Que a denúncia consistia no fato do acusado guardar em sua residência arma de fogo, por meio da qual estaria ameaçando a companheira. Que no dia do...

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