Acórdão Nº 0026597-93.2006.8.24.0020 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 10-11-2020

Número do processo0026597-93.2006.8.24.0020
Data10 Novembro 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0026597-93.2006.8.24.0020, de Criciúma

Relatora: Desa. Janice Ubialli

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO BANCO.

REPETIÇÃO DE INDÉBITO NA FORMA SIMPLES. PRETENSÃO JÁ ALCANÇADA NA ORIGEM. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL.

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. APLICABILIDADE. SÚMULA 297 DO STJ.

REVISÃO CONTRATUAL. POSSIBILIDADE. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA.

CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PACTUAÇÃO NÃO DEMONSTRADA. COBRANÇA AFASTADA.

COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM DEMAIS ENCARGOS DA MORA.

JUROS REMUNERATÓRIOS. CONTRATO NÃO JUNTADO. APLICAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO, SALVO SE A TAXA COBRADA FOR MAIS VANTAJOSA PARA O DEVEDOR. SÚMULA 530 DO STJ.

MULTA CONTRATUAL. ART. 52, § 1º, DO CDC.

A multa contratual deve respeitar o limite legal de 2% (dois por cento).

HONORÁRIOS RECURSAIS. CABIMENTO.

RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0026597-93.2006.8.24.0020, da comarca de Criciúma (2ª Vara Cível), em que é Apelante Banco do Brasil S.A. e Apelados Dumont Máquinas e Equipamentos para Panificação Ltda. e outros:

A Quarta Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer de parte do recurso e negar a ele provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. José Antônio Torres Marques, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Sérgio Izidoro Heil.

Florianópolis, 10 de novembro de 2020.

Janice Ubialli

Relatora


RELATÓRIO

Cuida-se de apelação cível interposta por Banco do Brasil S.A. (sucessor do Banco do Estado de Santa Catarina - BESC) da sentença proferida nos autos da Ação de Revisão de Contrato Bancário n. 0026597-93.2006.8.24.0020, aforada por Dumont Máquinas e Equipamentos para Panificação Ltda., Laudi Bússolo dos Santos e Franceli Alberton dos Santos. O decisório recorrido contou com a seguinte parte dispositiva:

Pelo exposto, julgo parcialmente procedente o pedido e, em consequência: 1- o contrato ou conta corrente que deu origem ao Contrato de Abertura de Crédito Rotativo em Conta Corrente, deverá ser analisado desde o momento em que foi firmado, sendo que a partir do momento em que for detectada a inadimplência, o débito deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC, acrescido de juros de mora de 6% ao ano (art. 1062 do antigo CC), devendo ser elevada para 12% ao ano (art. 406 do CC), sendo indevida a cobrança de juros remuneratórios, capitalização, comissão de permanência e multa (uma vez que não foram expressamente pactuados). Tal fórmula de cálculo deverá se dar até a data em que foi firmado o Contrato de Abertura de Crédito Rotativo em Conta Corrente (data 04.10.99), devendo ser utilizado os encargos aqui encontrados: a partir do momento que for detectada a inadimplência, o débito deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC, acrescido de juros remuneratórios de 3,9% ao mês, podendo ser exigida a cobrança, inclusive após a vigência do pacto, acrescido, ainda, de juros de mora de 12% ao ano e multa de 2%, vedando-se a cobrança da capitalização de juros e a cumulação de multa contratual e juros moratórios. Autorizo a cobrança do IOF. Alternativamente, permite-se ao credor a cobrança de comissão de permanência mais juros de mora, vedando-se em tal caso a cobrança de juros remuneratórios ou capitalização, bem cobrança de multa contratual, desde que não exceda o contratado. Quanto ao Contrato de Abertura de Crédito Fixo Tabela Price n. 1999/029796-0, a partir do momento que for detectada a inadimplência, o débito deverá ser corrigido monetariamente pela TR, acrescido de juros remuneratórios de 3,1% ao mês, podendo ser exigida a cobrança, inclusive após a vigência do pacto, acrescido, ainda, de juros de mora de 12% ao ano e multa de 2%, vedando-se a cobrança de capitalização de juros, bem como a cumulação de multa contratual e juros moratórios. Alternativamente, permite-se ao credor a cobrança de comissão de permanência mais juros de mora, vedando-se em tal caso a cobrança de juros remuneratórios ou capitalização, bem cobrança de multa contratual, desde que não exceda o contratado. Por fim, quanto ao Contrato de Abertura de Crédito, Confissão, Composição de Dívida, Forma de Pagamento e Outras Avenças - Tabela Price n. 2000/000078-1, a partir do momento que for detectada a inadimplência, o débito deverá ser corrigido monetariamente pela TR, acrescido de juros remuneratórios de 1,5% ao mês ou 18% ao ano, podendo ser exigida a cobrança, inclusive após a vigência do pacto, acrescido, ainda, de juros de mora de 12% ao ano e multa de 2%, autorizando a cobrança da capitalização de forma mensal e anual, vedando-se a cumulação de multa contratual e juros moratórios. Alternativamente, permite-se ao credor a cobrança de comissão de permanência mais juros de mora, vedando-se em tal caso a cobrança de juros remuneratórios ou capitalização, bem cobrança de multa contratual, desde que não exceda o contratado. 2- em relação aos contratos CL 55149-0, CL 55148-1, CL 55150-3, CL 55600-9 e CL 54696-8: a) os juros remuneratórios deverão corresponder à taxa média de mercado apresentada pelo Banco Central do Brasil na época de cada contratação se superiores, e, se inferiores, mantidos; b) ter a capitalização de juros afastada em caso de não ser prevista contratualmente; c) pela mora dos autores deverá ser cobrada apenas comissão de permanência (limitada à taxa dos juros remuneratórios) e multa contratual de 2%; d) o índice de correção monetária deverá ser o INPC. e) eventual repetição de indébito deverá ser de forma simples, apenas incidindo a correção monetária e juros moratórios legais. Condeno cada uma das partes no pagamento de 50% das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 2.000,00 (dois mil reais), conforme art. 20 § 4º c/c art. 21 caput ambos do CPC. P. R. I.

O apelante sustenta, em síntese, que: a) "os valores que foram cobrados [...] estavam devidamente amparados pela figura de um contrato assinado pela parte apelada, não existindo qualquer irregularidade na cobrança efetuada pelo banco" (p. 346); b) são inaplicáveis as regras dispostas no Código de Defesa do Consumidor; c) não há falar em ilegalidade na cobrança de capitalização de juros nos contratos de abertura de crédito fixo, de crédito rotativo e nos contratos n. 55149-0, 55148-1, 55150-3, 55600-9 e 54696-8; d) "as alegações de que a comissão de permanência não poderá ser cumulada com juros moratórios e multa não procede, uma vez que a natureza de referidos institutos são distintos" (p. 347); e) "os pagamentos não foram efetivados com erro de consentimento, vício de origem, dolo ou coação, não se devendo falar, dai, em repetição de indébito em dobro" (p. 350); f) não há falar em limitação dos juros remuneratórios a taxa média indicada pelo Bacen nos contratos n. 55149-0, 55148-1, 55150-3, 55600-9 e 54696-8; g) "a multa pactuada na presente contratação está em total consonância com a legislação vigente e jurisprudência majoritária do STJ" (p. 353). Provido o recurso, os apelados devem ser condenados ao pagamento integral do ônus de sucumbência.

Sem as contrarrazões (p. 362), os autos ascenderam a esta Corte.

O Exmo. Des. Sebastião César Evangelista declarou o seu impedimento e determinou a redistribuição do feito

Após, vieram-me os autos conclusos.

VOTO

Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço de parte do recurso.

Ausência de interesse recursal

O apelante sustenta que "os pagamentos não foram efetivados com erro de consentimento, vício de origem, dolo ou coação, não se devendo falar, dai, em repetição de indébito em dobro" (p. 350).

Todavia, o togado de origem consignou expressamente na sentença objurgada que "eventual repetição de indébito deverá ser de forma simples, apenas incidindo a correção monetária e juros moratórios legais " (p. 338).

Dessarte, carece o apelante de interesse recursal, de modo que não se conhece do recurso no ponto.

Possibilidade de revisão do contrato e aplicabilidade das regras do Código de Defesa do Consumidor

Sustenta o apelante que a parte autora consentiu com as cláusulas da avença quando da sua formalização, de modo que descabe a alegação de que desconhece as cobranças realizadas. Afirma, ainda, que não há falar em aplicabilidade das regras do consumidor.

Sem razão, contudo. No caso dos autos, verifica-se a vulnerabilidade da parte autora em relação ao banco, inclusive porque pretende a revisão de contratos de adesão, aqueles em que as cláusulas são "estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor [...], sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo" (art. 54 da Lei n. 8.078/1990).

Também, não é demais anotar que a aplicação da Lei n. 8.078/1990 aos contratos bancários é questão pacificada. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, há mais de uma década, editou o enunciado sumular n. 297, segundo a qual "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras", que tem tido firme aplicação neste Tribunal.

Ainda, com suporte na legislação consumerista, deve o Poder Judiciário proceder à "modificação" das cláusulas de contratos bancários que estabeleçam "prestações desproporcionais" (CDC, art. 6, V); além de declarar "nulas de pleno direito, entre outras", aquelas cláusulas "abusivas", que coloquem o consumidor em "desvantagem exagerada" (art. 51, IV).

Ademais, a possibilidade de revisão das cláusulas de um contrato oriundo de relação de consumo assenta-se nas normas protetivas do consumidor previstas em lei especial, sobretudo diante dos princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual, de modo a mitigar o princípio do pacta sunt servanda.

O que não se pode perder de vista,...

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