Acórdão Nº 0028591-40.2012.8.24.0023 do Quarta Câmara de Direito Civil, 01-10-2020

Número do processo0028591-40.2012.8.24.0023
Data01 Outubro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0028591-40.2012.8.24.0023

Relator: Desembargador José Agenor de Aragão

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO. VOLUME DO SOM EM CASA NOTURNA ACIMA DO PERMITIDO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.

INSURGÊNCIA DA REQUERIDA.

PRETENDIDA A REFORMA DA SENTENÇA E O AFASTAMENTO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE PROVA ACERCA DO EXCESSO DO LIMITE SONORO PERMITIDO NO LOCAL E DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL QUE EXTRAPOLE O DISSABOR. PARTE AUTORA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DE PROVAR O FATO CONSTITUTIVO DO SEU DIREITO. EXEGESE DO ART. 373, I DO CPC. SENTENÇA REFORMADA.

INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA. CONDENAÇÃO DA PARTE AUTORA AO PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DAS CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

HONORÁRIOS RECURSAIS DESCABIDOS. ORIENTAÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNA DE JUSTIÇA (EDcl no AgInt no REsp n. 1.573.573/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Belizze).

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0028591-40.2012.8.24.0023, da comarca da Capital 1ª Vara Cível em que é/são Apelante(s) Novo Brasil Entretenimento Ltda - Parador 12 e Apelado(s) Nilton Agenor Gaia e outros.

A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade de votos, conhecer do Recurso de Apelação interposto e dar-lhe provimento, para: a) reformar a sentença de primeiro grau, e julgar improcedente o pedido de indenização por danos morais, nos termos do art. 487, I, do CPC; inverter o ônus da sucumbência, a fim de que a parte autora arque com a totalidade das despesas processuais e honorários advocatícios, estes que fixo em em 10% sobre o valor da causa atualizado. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Hélio David Vieira Figueira dos Santos, e participaram, com voto, os Exmos. Srs. Desembargadores Selso de Oliveira e Luiz Felipe Schuch.

Florianópolis, 01 de outubro de 2020.

Desembargador José Agenor de Aragão

Relator


RELATÓRIO

A bem dos princípios da celeridade e da economia processual, adoto o relatório elaborado na sentença por delinear com precisão o processado, verbis (fls.92/97):

"No ano de 2012, ingressam Nilton e Madalena Gaia, Mauri Coutinho e Marlene Ferreira Coutinho, Ivanio da Luz, Valdomiro José Alves, Evandro Rosa, Claudinei Sara da Luz, Edison Manoel Rosa, Pedro Rodrigues da Silva e Miria de Souza, Tiaraju Ferreira, Rodrigo Alves, Valmi Canuto, Pedro do Nascimento e Francisco Canuto Filho com ação de indenização por danos morais em face de P-12, Parador Internacional. Dizem, resumo devido, serem moradores da Praia do Forte faz muitos anos, vizinhos do réu que lá se instalou, o que ocasionou drásticas mudanças no seu quotidiano em razão das festas promovidas no local, nos períodos diurno e noturno (madrugada afora), "com som insuportável ligado em alto volume, perturbando seu sossego". Os fatos narrados fizeram com que várias vezes para lá se dirigisse a autoridade policial (BOs), promovendo-se inclusive abaixo-assinado. Além do som em volume excessivo, destacam a invasão de "propriedades para práticas de atos contra a moral e bons costumes, assim como para mictórios, estacionamento de automóveis e motocicletas". Invocam, dentre outros, o Estatuto da Cidade. Por isso entendem ter havido abalo anímico ressarcível. Juntam documento por eles endereçado à Floram, noticiando os fatos, BOs (f. 35, datado de 18/03/2011, 23:35h; f. 36, mesma data; f. 39, f. 42), termo de audiência (f. 41, datado de 04/08/2010) e abaixo assinado promovido pelo Conseg, dando conta da perturbação do sossego, vias de fato, vandalismo e uso de drogas no local.

Em resposta, afirma o réu (Novo Brasil Bar e Restaurante Ltda.) inexistir nexo de causalidade. Encontra-se o estabelecimento em funcionamento há mais de cinco anos sem reclamações, em terreno denominado ATR-3 / área turística residencial. "No máximo houve confusão entre eventos", relatando a existência de casa de shows contígua. Afirma estar observando toda a legislação pertinente, inclusive aquela relativa à limitação sonora. Ao lado do réu há outro estabelecimento, o "Clube 12", que em muitas ocasiões é locado para festividades, "o que pode dar razão à reclamação sonora". O ônus da prova é dos autores. Requer a improcedência dos pedidos. Junta licenças, alvarás e abaixo assinado em seu favor.

Em réplica, requerem os autores a procedência dos pedidos.

Provas especificadas.

Em interlocutória (f. 117), decide a culta Magistrada de então deferir a produção da prova oral, indeferindo o pedido para feitura de prova pericial. Decisão irrecorrida.

Colhida a prova oral.

Em sede de alegações finais, sublinham os autores os pontos que destacam, pugnando pela procedência do pedido.

Outra é a leitura da defesa. Afirma que o entorno da área onde se localiza é motivo de intensa movimentação, que não se verifica somente por conta dela (ré). É a "inevitável caminhada humana ao futuro". Rebate os argumentos autorais e repisa sua defesa técnica. Carnaval e ano novo são datas festivas e é por isso que a legislação municipal admite o funcionamento de estabelecimentos como o seu além do horário. Requer a improcedência".

Na sequência, o Togado de primeiro grau, julgou procedente os pedidos nos seguintes termos:

"Procede o pedido autoral. Sentença de mérito.

Condena-se a ré ao ressarcimento do dano anímico experimentado pelos autores. Fixa-se o valor do ressarcimento em R$5.000,0 (cinco mil reais) para cada autor. O valor deverá sofrer atualização monetária e incidência de juros legais a contar da data do evento danoso (considerado o registro no termo de audiência do Juizado Especial juntado à f. 41, isto é, 04/08/2010).

Condena-se a ré ao pagamento dos honorários advocatícios, estes em 10% do valor da condenação".

Opostos Embargos de Declaração pela requerida (fls.152/154), restaram rejeitados (fls. 165).

Inconformada a Requerida interpôs Recurso de Apelação (fls. 168/181), pleiteando a reforma da sentença, para que sejam julgados improcedentes os pedidos de dano moral, sob o argumento de que não restou comprovado os fatos narrados na exordial.

Contrarrazões à fls. 187/194.

Presentes os requisitos de admissibilidade do recurso.

Este é o relatório.


VOTO

Ab initio, sobreleva consignar que a sentença objurgada foi prolatada no dia 15.04.2019 (fl. 148) e publicada em 22.04.2019 (fl. 151), ou seja, sob a vigência do Diploma Processual Civil de 2015, atraindo, portanto, a aplicação do Enunciado Administrativo n. 3 da Corte da Cidadania à hipótese em análise, in verbis:

Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.

No mais, o recurso de apelação interposto é cabível, tempestivo e preenche os requisitos de admissibilidade, razão pela qual defiro o seu processamento, passando a análise das teses recursais.

Insurge-se a requerida/Apelante contra sentença que julgou procedente o pedido de indenização por danos morais, pelos transtornos sofridos pelos Requerentes/Apelados com a perturbação de sossego, com música alta e demais barulhos, decorrentes das festas promovidas pela Apelante, desrespeitando as regras de convivência.

E em suas razões, pretende a requerida/Apelante a reforma da sentença, alegando, em síntese, a inexistência de prova que pudesse permitir a conclusão da ocorrência de extrapolação do limite sonoro no local quando dos fatos, ou no mínimo a origem da fonte (por autuação de órgão fiscalizatório ou mesmo por perícia), já que nada foi juntado ou esclarecido pelos Apelados, assim, defendendo não terem se desincumbido do ônus de provar os fatos constitutivos do direito.

Em singela resenha, como dito pelo juiz singular, "afirmam os postulantes serem vizinhos do réu, tendo este lhes causado dano anímico por desrespeito ao direito de vizinhança ao "promover festas no local, nos períodos diurno e noturno (madrugada afora), "com som insuportável ligado em alto volume, perturbando seu sossego""

Cinge-se, portanto, a controvérsia em se verificar a ocorrência de violação ao sossego pela Requerida/Apelante, notadamente pelo excessivo volume do som, durante a realização de festas e se tais fatos são hábeis a ensejar danos morais aos Apelados, que residem nas redondezas do local.

E ao que se extrai do caso concreto, adianta-se merece acolhimento as razões da Apelante.

Pois bem.

A questão tem vertente constitucional com arrimo no art. 5º, inciso X, da Constituição Federal, o qual estabelece que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Na esfera infraconstitucional, sobreleva consignar que o caso sub judice atrai a aplicação da responsabilidade civil subjetiva, bem insculpida nos art. 186 e 927 do Código Civil, in verbis:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

[...]

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Nesse sentir, colhe-se da doutrina de Flávio Tartuce:

"De início, ato ilícito é o ato praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direitos e causando prejuízos a outrem. Diante da sua ocorrência, a norma jurídica cria o dever de reparar o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT