Acórdão nº 0030344-88.2019.8.11.0042 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Terceira Câmara Criminal, 06-09-2023

Data de Julgamento06 Setembro 2023
Case OutcomeProvimento
Classe processualCriminal - APELAÇÃO CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Número do processo0030344-88.2019.8.11.0042
AssuntoInjúria

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 0030344-88.2019.8.11.0042
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Injúria, Ameaça, Contra a Mulher]
Relator: Des(a).
GILBERTO GIRALDELLI


Turma Julgadora: [DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). RONDON BASSIL DOWER FILHO]

Parte(s):
[MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), ARTHUR PEAGUDO NETO - CPF: 009.480.141-05 (APELANTE), TALLES DRUMMOND SAMPAIO SANTOS - CPF: 046.251.601-62 (ADVOGADO), BRUNO REICHE - CPF: 037.015.891-19 (ADVOGADO), MERY CRISTINA KAMPHORST - CPF: 030.625.551-06 (VÍTIMA), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO.

E M E N T A

APELAÇÃO CRIMINAL – INJÚRIA REAL EM CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER – CONDENAÇÃO POR OFENSA PROFERIDA COM EMPREGO DE VIOLÊNCIA QUE RESULTOU EM LESÕES CORPORAIS LEVES – RECURSO DA DEFESA – ABSOLVIÇÃO – ALEGADA A EXCLUDENTE DE ILICITUDE DA LEGÍTIMA DEFESA – CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA DAR ENSEJO À CONDENAÇÃO – AUSÊNCIA DE CLAREZA SOBRE A DINÂMICA DOS FATOS – DÚVIDAS ACERCA DA CARACTERIZAÇÃO DOS ANIMUS INJURIANDI E LAEDENDI OU DO ANIMUS DEFENDENDI – APLICAÇÃO DO AFORISMO IN DUBIO PRO REO – ABSOLVIÇÃO DECRETADA – RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO.

A palavra da vítima possui especial relevo nos delitos praticados em contexto de violência doméstica e/ou familiar contra a mulher, porém, deve ser segura e coesa com os demais elementos de prova produzidos.

Tendo em vista a insuficiência de provas quanto à caracterização do animus injuriandi e do animus laedendi na conduta do acusado, podendo se cogitar até mesmo de animus defendendi, uma vez que restam severas dúvidas sobre a dinâmica dos fatos, de rigor a absolvição postulada, embora não com base na tese de legítima defesa arguida nas razões recursais, mas em razão do cenário de carência probatória, com esteio no brocardo jurídico in dubio pro reo.

Absolvição decretada com fundamento legal no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, com dispensa do réu do pagamento de custas processuais e da verba indenizatória mínima dos danos morais supostamente experimentados pela vítima em decorrência da infração penal.

Apelo defensivo conhecido e provido.

R E L A T Ó R I O

APELANTE:

ARTHUR PEAGUDO NETO

APELADO:

MINISTÉRIO PÚBLICO

R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI

Egrégia Câmara:

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por ARTHUR PEAGUDO NETO contra a r. sentença proferida pelo d. Juízo da Primeira Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Cuiabá/MT, que nos autos da ação penal n.º 0030344-88.2019.8.11.0042, o condenou à pena privativa de liberdade de 7 (sete) meses e 14 (quatorze) dias de detenção, no regime inicial aberto, e ao pagamento de 12 (doze) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, bem como à reparação dos danos morais causados à vítima em decorrência da infração, no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), em decorrência da prática do crime de injúria real, incursionando-o no art. 140, §2.º, do Código Penal, mais a pena correspondente à violência, subsumida ao art. 129, §9.º, do Código Penal.

Nas razões recursais disponíveis no ID 156133662, o apelante argumenta que agiu imbuído da excludente de ilicitude da legítima defesa e postula a absolvição, com consequente isenção do pagamento das custas processuais e da indenização mínima dos danos morais causados à vítima em decorrência da infração penal, ao que vincula ainda o pleito subsidiário de minoração do quantum indenizatório, em atenção à precariedade da sua condição socioeconômica. Ao final, prequestiona o art. 5º, LV da CF/88 e os arts. 23 e 25 do Código Penal, a fim de viabilizar eventual interposição de recursos perante os Tribunais Superiores.

Em sede de contrarrazões constantes no ID 163691174, o Ministério Público requer seja dado parcial provimento ao apelo, a fim de absolver o apelante com relação ao delito disposto no art. 140, §2º, do Código Penal, bem como manter a condenação do art. 129, §9º, do Código Penal e a indenização por danos moral.”

Instada a se manifestar, a i. Procuradoria-Geral de Justiça, por meio do parecer encartado no ID 168432675, opinou pelo conhecimento e parcial provimento do recurso, a fim de que o apelante seja absolvido apenas do crime previsto no art. 140, §2.º, do Código Penal e para que seja afastada a indenização mínima dos danos morais causados.

É o relatório.

À douta Revisão.

V O T O R E L A T O R

V O T O (MÉRITO)

EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Inicialmente, cumpre reconhecer que o recurso em apreço é tempestivo, foi interposto por quem tinha legitimidade para fazê-lo e o meio de impugnação empregado afigura-se necessário e adequado ao alcance das finalidades colimadas, motivos pelos quais, estando presentes os requisitos objetivos e subjetivos para a sua admissibilidade, CONHEÇO do apelo manejado pela Defesa.

Consta da denúncia que ARTHUR PEAGUDO NETO e Mery Cristina Kamphorst mantiveram um conturbado relacionamento amoroso por cerca de dez meses e estavam separados há alguns dias quando, em 14/06/2019, por volta das 14h30min, no interior do apartamento outrora habitado pelo ex-casal, o ora apelante, deparando-se com a ex-convivente no local no intuito de conversar e reaver seus pertences pessoais, teria ofendido-lhe a honra mediante emprego de violência consistente em xingamentos e agressões, causando-lhe lesões corporais.

Segundo exposto na peça acusatória, na data de 07/06/2019, após uma discussão com a vítima sem motivo especificado, ARTHUR PEAGUDO NETO teria jogado as roupas dela no chão e a mandado embora do imóvel onde juntos residiam, após o que o ex-casal manteve contato apenas para acertar questões referentes à partilha dos bens e à transferência da titularidade do apartamento, até que, na data fatídica, ao comparecer àquela morada para questionar o ex-convivente a respeito de dívidas contraídas e informá-lo que no dia seguinte um caminhão de mudança buscaria seus bens, Mery Cristina deparou-se com o acusado bastante agitado, o qual lhe ordenou que saísse do local, abriu a porta e arremessou contra si um caderno de anotações, tendo, também, a agarrado pelos cabelos e arrastado até a sacada, ao mesmo tempo em que proferia palavras de baixo calão e gritava ordenando que saísse da residência, ofendendo-lhe a honra ao dizer “sai daqui, desgraça! Desgraça!”

Ainda segundo a narrativa ministerial, enquanto era arrastada, a vítima bateu uma das costelas na quina da porta que dava acesso à sacada do apartamento, só cessando as agressões porque houve a intervenção da funcionária da vizinha, ocasião em que Mery Cristina Kamphorst pegou seus pertences e saiu do local.

Por esses fatos, o apelante foi denunciado e condenado pela prática do crime de injúria real, nos termos do art. 140, §2.º, do Código Penal, mais a pena correspondente à violência, subsumida ao art. 129, §9.º, do Código Penal; contexto em que agora exsurge inconformado perante esta instância revisora, nos termos já relatados.

Feitas essas breves digressões e inexistindo questões preliminares ou matéria de ordem pública a serem enfrentas ex officio, passo à análise do mérito do apelo.

Conforme relatado, o apelante pretende a absolvição amparado na tese excludente de ilicitude da legítima defesa e, subsidiariamente, o afastamento ou ao redução da indenização mínima pelos danos morais causados pela infração, argumentando em suas razões recursais que o relacionamento do ex-casal sempre foi conturbado porquanto a ofendida agia de modo impulsivo e com agressividade, tendo proferido diversas ofensas contra ele, tanto de natureza verbal quanto física, e após o término do relacionamento a situação se complicou, uma vez que Mery se portava de forma a prejudicar o acusado, conseguindo medidas protetivas em seu favor e a todo custo tentava fazê-lo ser preso.

No dia dos fatos em apreço, aduz que a ex-companheira foi até o apartamento outrora habitado pelo casal e onde ARTHUR estava residindo por ter se comprometido a permanecer no local e assumir as dívidas correspondentes até o término...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT