Acórdão Nº 0033488-76.2006.8.24.0038 do Segunda Câmara de Direito Público, 19-04-2022

Número do processo0033488-76.2006.8.24.0038
Data19 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0033488-76.2006.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA

APELANTE: JOINVILLE ESPORTE CLUBE (RÉU) APELADO: FEDERACAO DAS ASSOCIACOES DE ATLETAS PROFISSIONAIS (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível inteposta por Joinville Esporte Clube contra sentença proferida pela MMa. Juíza de Direito da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Joinville, Dra. Denise Nadir Enke, que, em "ação de cobrança" ajuizada pela Federação das Associações de Atletas Profissionais - FAAP, julgou em parte procedente o pedido formulado na inicial, condenando-lhe ao pagamento da contribuição devida por força do art. 57, I, "a", da Lei n. 9.615, de 24 de março de 1998 - Lei Pelé.

Em suas razões recursais, o apelante requer, preliminarmente, a concessão do benefício da justiça gratuita.

Quanto ao mérito, em resumo, reitera as teses de que: a) contratos de empréstimo de atletas não podem ser utilizados como base de cálculo da contribuição devida à FAAP; e b) é nula a cobrança e a contribuição, que não se trata de imposto nem taxa, é inconstitucional "por afronta aos princípios constitucionais de incentivo ao desporto, igualdade e liberdade de associação".

Apresentadas as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça, sendo distribuídos a este Relator.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça deixou de intervir no mérito da causa.

É o relatório.

VOTO

O recurso deve ser conhecido, porquanto satisfeitos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

1. Do benefício da justiça gratuita:

Após o apelante ter sido intimado para comprovar a necessidade do benefício da justiça gratuita na Apelação n 0045590-57.2011.8.24.0038, cujo julgamento ocorre de forma concomitante, demonstrou que seus balanços apresentam déficit financeiro considerável.

As diversas dívidas e as dificuldades financeiras encontradas pelo clube, atualmente, fora da disputa de qualquer competição em nível nacional, as execuções e ações de cobrança em curso, bem como pelo fato de já ter sido agraciado com a benesse em outros processos, sugerem a necessidade de concessão do benefício.

Vencido o elementar, quanto ao mérito, melhor sorte não assiste ao recorrente.

2. Mérito:

A sentença proferida pela MMa. Juíza de Direito da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Joinville, Dra. Denise Nadir Enke, deve ser confirmada por seus próprios e bem lançados fundamentos.

Com efeito, possui natureza tributária a contribuição de intervenção no domínio econômico devida à FAAP, instituída pela União, que autorizou a cobrança e o recolhimento pela respectiva federação.

Portanto, diante de sua natureza marcadamente tributária, é compulsória a prestação.

Há precedente desta Corte:

"TRIBUTÁRIO - COBRANÇA - CONTRIBUIÇÃO DE 1% DEVIDA POR CLUBE DE FUTEBOL À FEDERAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES DE ATLETAS PROFISSIONAIS (FAAP) SOBRE O MONTANTE DE CADA CONTRATAÇÃO - PREVISÃO NO ART. 57, INCISO I, DA LEI N. 9.615/1998 ("LEI PELÉ") - OBRIGATORIEDADE - INCONSTITUCIONALIDADE AFASTADA - DEMONSTRAÇÃO DO CRÉDITO POR MEIO DE RELATÓRIO DA FEDERAÇÃO SOBRE AS CONTRATAÇÕES DE ATLETAS HAVIDAS NO PERÍODO - PAGAMENTO PARCIAL COMPROVADO - EXCLUSÃO DETERMINADA PELO JUÍZO - AUSÊNCIA DE QUESTIONAMENTO DO CLUBE SOBRE AS DEMAIS CONTRATAÇÕES OU DE PROVA DA QUITAÇÃO DAS RESPECTIVAS CONTRIBUIÇÕES - ACEITAÇÃO DA VALIDADE DO RELATÓRIO - CONDENAÇÃO MANTIDA.

É devida à Federação das Associações de Atletas Profissionais (FAAP) a contribuição prevista no art. 57, inciso I, da Lei n. 9.615/1998 ("Lei Pelé") de um por cento (1%) sobre o valor de cada contrato de atleta profissional admitido por Clube de Futebol. Tal dispositivo não é inconstitucional. O relatório das contratações do período, apresentado pela Federação é suficiente para embasar a cobrança judicial, se o Clube de Futebol deixa de impugná-lo adequadamente, ainda mais quando admite a veracidade de algumas das contratações sobre as quais comprovou ter pago a devida contribuição, o que motivou a exclusão delas da condenação." (TJSC, Apelação Cível n. 2012.092828-6, de Criciúma, rel. Jaime Ramos, Quarta Câmara de Direito Público, j. 27-06-2013).

Extrai-se do voto condutor proferido pelo eminente Relator, Des. Jaime Ramos:

"Há que se negar provimento ao recurso.

A Constituição Federal de 1988, no art. 217 e seus §§, estabelece que "é dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um, observados: I - a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento; II - a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para o do desporto de alto rendimento; III - o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não profissional; IV - a proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criação nacional."

Foi editada a Lei Federal n. 9.615, de 24.3.1998, conhecida por "Lei Pelé", que instituiu normas sobre desportos e deu outras providências.

Em seu art. 57, inciso I, tal lei instituiu uma contribuição de cada Clube de Desporto para a Federação de Associações de Atletas Profi8ssionais - FAAP. É nesse dispositivo que se funda o pleito de cobrança formalizado na peça vestibular. O dispositivo em causa sofreu alteração, em sua redação, pela Lei n. 9.891, de 14.07.2000 ("Lei Maguito Vilela), vigente à época das contratações discutidas nos autos, dizendo o seguinte:

"Art. 57. Constituirão recursos para a assistência social e educacional aos atletas profissionais, ex-atletas e aos em formação, recolhidos diretamente para a Federação das Associações de Atletas Profissionais - FAAP:

"I - um por cento do contrato do atleta profissional pertencente ao Sistema Brasileiro de Desporto, devido e recolhido pela entidade contratante;

"II - um por cento do valor da cláusula penal, nos casos de transferências nacionais e internacionais, a ser pago pela atleta;

"III - um por cento da arrecadação proveniente das competições organizadas pelas entidades nacionais de administração do desporto profissional;

"IV - penalidades disciplinares pecuniárias aplicadas aos atletas profissionais pelas entidades de prática desportiva, pelas de administração do desporto ou pelos órgãos da Justiça Desportiva."

Tal dispositivo foi alterado também pela Lei n. 12.395, de 16.03.2011, passando a ter a seguinte redação:

"Art. 57. Constituirão recursos para a assistência social e educacional aos atletas profissionais, aos ex-atletas e aos atletas em formação os recolhidos:

"I - diretamente para a federação das associações de atletas profissionais - FAAP, equivalentes a:

"a) 0,5% (cinco décimos por cento) do valor correspondente à parcela ou parcelas que compõem o salário mensal, nos termos do contrato do atleta profissional pertencente ao Sistema Brasileiro do Desporto, a serem pagos mensalmente pela entidade de prática desportiva contratante; e

"b) 0,8% (oito décimos por cento) do valor correspondente às transferências nacionais e internacionais, a serem pagos pela entidade de prática desportiva cedente; e

"II - diretamente para a Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol - FENAPAF, equivalentes a 0,2% (dois décimos por cento) do valor correspondente às transferências nacionais e internacionais de atletas da modalidade de futebol, a serem pagos no ato do recebimento pela entidade de prática desportiva cedente;

"§ 1º A entidade responsável pelo registro de transferências de atleta profissional de entidade de prática desportiva para outra deverá exigir, sob pena de sua não efetivação, além dos documentos necessários, o comprovante do recolhimento dos valores fixados neste artigo.

"§ 2º Os recursos de que trata este artigo serão integralmente aplicados em conformidade com programa de assistência social e educacional, previamente aprovado pelas entidades de que tratam os incisos I e II deste artigo, nos termos dos seus estatutos."

A redação prevalescente, no caso, é aquela dada pela Lei n. 9.891/2000, que estava em vigor quando das contratações que deram origem às contribuições discutidas nestes autos, as quais ocorreram no interregno entre 2006 e 2010, portanto, antes da entrada em vigor da Lei n. 12.395/2011, que é posterior. Não obstante, a sentença mandou aplicar a referida lei, para o cálculo dos valores devidos, em liquidação de sentença, e dessa parte não houve insurgência recursal da Federação demandante.

De qualquer forma, o Clube de Futebol arguiu a inconstitucionalidade do referido art. 57, inciso I, da Lei n. 9.615/1998, mesmo com a redação dada pela Lei n. 9.891/2000, por violação à competência da União para instituir contribuições (art. 149 da Constituição Federal de 1988) e ofensa ao princípio da anterioridade nonagesimal (art. 150, inciso III, letra "c", da Carta Magna), uma vez que a lei entrou em vigor na data de sua publicação.

Efetivamente, a contribuição reclamada pela Federação demandante tem natureza tributária.

Segundo o art. 3º do Código Tributário Nacional, "tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada".

A Constituição Federal de 1988, no art. 149, autoriza a instituição, pela União, de contribuições:

"Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo."

As Leis n. 9.615/1998 e 9.891/2000 foram editadas pela União, com base nos arts. 22, incisos I e XVI, 149 e 217, da Constituição Federal de 1988, e foi nelas que se instituiu a contribuição dos Clubes de Desportos para a Federação das Associações de Atletas Profissionais.

Não foi esta, portanto, quem instituiu a contribuição e sim a União...

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