Acórdão nº 0035975-04.2014.8.14.0301 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Privado, 21-03-2023

Data de Julgamento21 Março 2023
Órgão2ª Turma de Direito Privado
Ano2023
Número do processo0035975-04.2014.8.14.0301
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoIndenização por Dano Moral

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0035975-04.2014.8.14.0301

APELANTE: COMPAR COMPANHIA PARAENSE DE REFRIGERANTES

APELADO: CARLOS EDUARDO PEREIRA GOMES

RELATOR(A): Desembargador RICARDO FERREIRA NUNES

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. PRELIMINARES. NÃO ACOLHIDAS. RELAÇÃO DE CONSUMO. AQUISIÇÃO DE REFRIGERANTE COM CORPO ESTRANHO DENTRO DA GARRAFA. PRODUTO IMPRÓPRIO PARA O CONSUMO. EXPOSIÇÃO DO CONSUMIDOR A RISCO CONCRETO DE LESÃO A SUA SAÚDE E SEGURANÇA. DANO MORAL CONFIGURADO. PEDIDO DE MINORAÇÃO DO DANO. ACOLHIDO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. À UNANIMIDADE.

  1. 1 - Preliminares. Não acolhidas

  1. 2 - Cinge a controvérsia recursal acerca da existência ou não de danos morais em virtude de corpo estranho dentro do refrigerante. Verifica-se que o autor, foi até seu estabelecimento comercial que fica em frente a sua residência pegar um refrigerante Coca-Cola 1litro do tipo retornável para usufruir com a família durante seu almoço do dia 07 de junho de 2010 e se deparou com um adesivo de plástico no interior da bebida, tratando-se de objeto estranho ao conteúdo do bem consumível, fato este comprovado por exame feito pelo Centro de Perícias Científicas Renato Chaves.

  1. 3 - A situação narrada de mal-estar é, por si só, capaz de causar dano moral ao autor, trazendo abalos a sua honra subjetiva, consubstanciada em todo o abalo psicológico durante o fato. A lesão moral decorre da violação ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do princípio da dignidade humana, restando caracterizado o defeito do produto, já que expõe o consumidor à risco concreto de dano à sua saúde e segurança, além de violar o dever do fornecedor disposto no art. 8º do CDC.

  1. 4 - Entendo, que o valor do dano moral deve ser minorado, sendo razoável e proporcional o arbitramento em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), pois houve exposição do consumidor à risco, mas não houve ingestão do produto.

  1. 5 - Recurso de Apelação conhecido e parcialmente provido, à unanimidade.

RELATÓRIO

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por COMPAR COMPANHIA PARAENSE DE REFRIGERANTES em face de sentença proferida pela 8ª Vara Cível e Empresarial de Belém, nos autos da ação de indenização por danos morais e materiais, proposta por CARLOS EDUARDO PEREIRA GOMES, em face da apelante.

Na inicial, afirmou o autor, que foi até seu estabelecimento comercial que fica em frente a sua residência pegar um refrigerante Coca-Cola 1litro do tipo retornável para usufruir com a família durante seu almoço do dia 07 de junho de 2010 e se deparou com um adesivo de plástico no interior da bebida, tratando-se de objeto estranho ao conteúdo do bem consumível.

Preocupado com a proveniência e a qualidade da bebida, ainda mais por tratar-se de marca renomada e mundialmente conhecida, procurou delegacia competente e registrou boletim de ocorrência conforme acostado aos autos. Foi procedido exame através do Centro de Perícias Científicas Renato Chaves a fim de averiguar o relatado, o que confirmou a avaria plástica no interior do recipiente do refrigerante.

Diante disso, ajuizou a presente ação de danos morais e materiais.

A requerida, após ser devidamente citada, não contestou, sendo assim, revel.

Após, foi proferida sentença com o seguinte comando final:

Ante o exposto, e considerando o que mais dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a ação e extingo o feito com resolução de mérito na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, condenando o réu ao pagamento de danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), porém indefiro o pedido do autor com relação aos danos materiais por não ter restado comprovado o quantum a ser indenizável, devendo os mesmos terem sido comprovados quando da peça vestibular de ingresso. Ainda, condeno o réu, por fim, ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios do advogado do autor, que fixo em 20% sobre o valor da causa. Sem custas ao autor da parte que sucumbiu, pois, parte do benefício da justiça gratuita.

Da decisão, foi oposto embargos de declaração, que teve a seguinte decisão:

“Pelo exposto, conheço dos embargos de declaração e assim dou-lhes PARCIALMENTE PROVIMENTO, apenas para indicar a taxa/índice de correção monetária omissa na sentença, e assim deve-se aplicar a atualização devida com juros simples de 1% ao mês mais correção monetária pelo IPCA-IBGE, contados da citação, bem como a indenização por danos morais deve ser corrigida monetariamente desde a data do arbitramento (Súmula nº 362/STJ) e os juros de mora a partir da citação.”

Inconformado, apenas a interpôs o presente recurso de apelação (ID 2915548), aduzindo preliminarmente, falta de interesse processual pela não apresentação de requerimento administrativo, devendo o processo ser extinto. Defende ainda, que houve prescrição da ação, devendo a ação ser extinta com resolução do mérito.

No mérito do recurso, alega que o código de defesa do consumidor não deve ser aplicado no presente caso, tendo em vista, não ser uma relação de insumo. Aduz ainda, pela ausência da obrigação de indenizar em dano moral, posto que a não ingestão do produto, não gera o dever de indenizar, no entanto, caso a condenação persista, pede que o valor seja minorado.

Por fim, pede pela redução dos honorários advocatícios.

Contrarrazões foram apresentadas, pugnando pela manutenção da sentença (ID 2915550).

É o relatório.

Inclua-se o presente feito na próxima pauta da sessão de julgamento do plenário virtual.

Belém, 2023.

Des. RICARDO FERREIRA NUNES

Relator

VOTO

  1. Juízo de admissibilidade.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.

  1. Razões recursais.

2.1 Preliminares:

a) Falta de interesse processual.

A ré interpôs o presente recurso de apelação, aduzindo preliminarmente, falta de interesse processual pela não apresentação de requerimento administrativo, devendo o processo ser extinto.

Entendo que a referida preliminar, não deve prosperar, tendo em vista que o prévio pre requerimento administrativo não é pressuposto para o ingresso da ação judicial, que encontra amparo nas disposições do art. 5º, XXXV, da CF ("A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito").

Isto posto, rejeito a preliminar.

b) Prescrição.

Defende ainda, que houve prescrição, devendo a ação ser extinta com resolução do mérito.

Pois bem, no presente caso, em relação a pretensão indenizatório, aplica-se o prazo quinquenal previsto no artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor para a reparação de danos decorrentes de fato do produto ou serviço.

Nesse sentido, é a jurisprudência deste Egrégio tribunal:

EMENTA APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DO AUTOR – RELAÇÃO DE CONSUMO – PRAZO PRESCRICIONAL DE 05 (CINCO) ANOS – INTELIGÊNCIA DO ART. 27 DO CDC – CONFIGURAÇÃO DO LAPSO TEMPORAL MESMO CONSIDERANDO A CAUSA DE INTERRUPÇÃO DESCRITA NO ART. 202, INCISO I DO CC – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1-Analisando detidamente os autos, observa-se que o lapso temporal para a configuração da prescrição relativa à pretensão que tem como objeto a ocorrência de fato do produto ou do serviço, conforme o caso em questão, é de 05 (cinco) anos, iniciando-se a contagem a partir do conhecimento do dano e da autoria da conduta, nos termos do art. 27 do CDC. 2-No caso em comento, depreende-se das próprias razões recursais, que o apelante tomou conhecimento do fato gerador do pedido de indenização em janeiro de 2011 e, mesmo considerando a causa interruptiva alegada, qual seja, o despacho que ordenou a citação, nos autos da Ação nº. 0000232-44.2013.8.14.0049, que tramitava perante o juizado especial, ocorrido no dia 21/01/2013, o prazo quinquenal estabelecido no art. 27 do CDC, findaria em janeiro de 2018, tendo a parte requerente ajuizado a presente (12215222, 12215222, Rel. MARIA DE NAZARE SAAVEDRA GUIMARAES, Órgão Julgador 2ª Turma de Direito Privado, Julgado em 2022-12-06, Publicado em 2022-12-15)

Diante disso, a ocorrência do fato alegado ocorreu em 07/06/2010 e, o ajuizamento da ação no dia 14/08/2014 (ID 2915538 - Pág. 2). Com isso, não houve a prescrição alegada, vez que não decorreu o prazo de 5 anos, que se aplica no caso em questão.

Com essas breves considerações, também rejeito a preliminar.

Não havendo mais questões preliminares, passo ao exame do mérito do recurso.

2.1 Mérito recursal:

Em que pese o esforço argumentativo do apelante, nota-se claramente que a relação jurídica estabelecida entre as partes é de consumo, inserindo-se o autor, no conceito de consumidor, previsto no artigo 2º, da Lei nº 8.078/90, tendo em vista que utiliza o produto, sendo assim o seu destinatário final, e a empresa ré no conceito de fornecedor de serviços, nos termos do artigo 3º, § 2º, da mesma Lei nº 8.078/90. Dessa forma, sujeitam-se as partes à aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor.

A circunstância do autor da ação ser proprietário de um comércio que revende o refrigerante não é capaz de descaracterizar a relação de consumo, tendo em vista que, na hipótese, restou demonstrado que ele retirou o produto para consumo próprio e de sua família, conforme fato alegado na exordial e não refutado pelo réu, ante a sua revelia.

Nessa senda, torna-se irrelevante que o refrigerante pertencesse a seu comércio para revenda, o fato com relevância jurídica é que o produto foi retirado para consumo próprio, fazendo do autor da ação destinatário final e, caracterizando a sua condição de consumidor, do mesmo modo como se ele tivesse adquirido o refrigerante em qualquer outro ponto de venda.

Pois bem, da narrativa dos fatos articulados na petição inicial observa-se que a presente demanda versa sobre vício do produto, necessitando, assim, ser comprovada além do fato, o dano e o...

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