Acórdão nº 0037983-46.2017.8.14.0301 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Privado, 28-02-2023

Data de Julgamento28 Fevereiro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Ano2023
Número do processo0037983-46.2017.8.14.0301
AssuntoReconhecimento / Dissolução
Órgão2ª Turma de Direito Privado

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0037983-46.2017.8.14.0301

APELANTE: ANA MARIA ROSA TRINDADE

APELADO: ROGERIO ERASMO TRINDADE DOS SANTOS, ORLANDO AUGUSTO TRINDADE DOS SANTOS, WILMO AUDY TRINDADE DOS SANTOS, IONE IVANY TRINDADE DOS SANTOS

RELATOR(A): Desembargadora MARIA DE NAZARÉ SAAVEDRA GUIMARÃES

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL “POST MORTEM” – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA - REQUISITOS DO ARTIGO 1.723 DO CÓDIGO CIVIL NÃO COMPROVADOS - IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO – MANUTENÇÃO DE SENTENÇA – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

1. A questão devolvida à apreciação nesta Instancia Revisora, cinge-se acerca da caracterização da união estável entre a autora/apelante e o de cujus Orlando Rodrigues dos Santos e que não foi admitido pelo Juízo de origem, ante as provas produzidas nos autos.

2. Em suas razões recursais, aduz restar claro nos autos que conviveu por 15 (quinze) anos em união estável com o de cujus, com convivência duradoura, pública e contínua, salientando ainda, que após a citação dos requeridos para apresentarem contestação, dois dos herdeiros do de cujus apresentaram proposta de acordo, bem como declararam reconhecer a existência de união estável entre o de cujus e a ora recorrente.

3. Para o reconhecimento de união estável como entidade familiar, há necessidade de convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família, nos exatos termos do art. 1.723 do Código Civil.

4. Hipótese em que a prova documental produzida não demonstrou a existência de união estável vivida entre o falecido e a autora, impondo-se assim a manutenção da sentença ora vergastada.

5. Recurso CONHECIDO e IMPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL, tendo como apelante ANA MARIA ROSA TRINDADE e como apelados ROGERIO ERASMO TRINDADE DOS SANTOS, WILMO AUDY TRINDADE DOS SANTOS e IONE IVANY TRINDADE DOS SANTOS

Acordam Excelentíssimos Senhores Desembargadores, membros da 2ª Turma de Direito Privado deste E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará, em turma, à unanimidade, em CONHECER DO RECURSO e NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto da Excelentíssima Desembargadora–Relatora Maria de Nazaré Saavedra Guimarães.

Belém/PA, 28 de fevereiro de 2023.

MARIA DE NAZARÉ SAAVEDRA GUIMARÃES

Desembargadora – relatora.

RELATÓRIO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0037983-46.2017.8.14.0301

APELANTE: ANA MARIA ROSA TRINDADE

APELADOS: ROGERIO ERASMO TRINDADE DOS SANTOS

WILMO AUDY TRINDADE DOS SANTOS

IONE IVANY TRINDADE DOS SANTOS

RELATORA: DESª MARIA DE NAZARÉ SAAVEDRA GUIMARÃES

EXPEDINTE: 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO

RELATÓRIO

Tratam os presentes autos de recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por ANA MARIA ROSA TRINDADE, inconformada com a Sentença prolatada pelo MM. Juízo da 2ª Vara de Família de Belém /PA que, nos autos da AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL “POST MORTEM”, ajuizada por si em desfavor dos herdeiros do falecido ORLANDO RODRIGUES DOS SANTOS - ROGERIO ERASMO TRINDADE DOS SANTOS, WILMO AUDY TRINDADE DOS SANTOS e IONE IVANY TRINDADE DOS SANTOS, julgou improcedente a pretensão exordial.

Em sua exordial (ID 11322605), narrou a autora/apelante ter convivido, em união estável desde janeiro de 1990, como se casada fosse, com o “de cujus” Orlando Rodrigues dos Santos, até maio de 2013, ou seja, por 27 (vinte e sete) anos, salientando que a convivência era pública e continua, estabelecida com objetivo de constituição de família, sendo conhecida por parentes e amigos e que teria persistido até o falecimento de seu companheiro.

Pugnou, assim, pela concessão dos benefícios da justiça gratuita nos termos da Lei 1060/50 e, no mérito, pela procedência da demanda, reconhecendo a sua sociedade de fato com Orlando Rodrigues dos Santos e, com o consequente deferimento da meação dos bens adquiridos na constância da união estável, bem como a condenação do espólio ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios nos termos do artigo 20, §3º, do CPC.

A requerida Ione Ivany Trindade dos Santos, apresentou contestação (ID 11322621), discordando dos termos da exordial e não reconhecendo a união estável defendida pela requerente, afirmando que não foi juntada provas, nem sustentado alegações suficientes que comprovassem a existência de uma relação de união estável com o de cujus.

Por sua vez, a requerente ANA MARIA ROSA TRINDADE, apresentou replica a contestação (ID 11322625), reiterando os pedidos formulados na inicial, bem como a condenação da requerida por litigância de má-fé.

Foram realizadas as audiências de praxe para elucidação das alegações e produção de prova, ocasião em que a requerente afirmou mais uma vez que o falecido já estava separado de fato da esposa, que teria morado com o de cujus em Mosqueiro no período de 1995 até 2010/2011, afirmando que teria retornado para Belém porque Orlando estaria mantendo um relacionamento com a empregada doméstica, cujo nome não lembrava.

Ato contínuo sobreveio a Sentença (ID 11322686) na qual a Magistrada a quo julgou improcedente o pedido, nos termos do artigo 487, inciso I do CPC, por entender que o arcabouço probatório produzido pela parte autora não demonstrou a existência de união estável entre esta e o de cujus.

Condenou ainda a requerente ao pagamento das custas e honorários advocatícios no valor de R$2.000,00 (dois mil reais), restando a exigibilidade suspensa em virtude do deferimento da justiça gratuita.

Inconformada, a requerente ANA MARIA ROSA TRINDADE interpôs o presente recurso de Apelação (ID 11322687), sustentando a reforma da sentença, pois os fundamentos da improcedência da ação são frágeis diante das robustas provas colacionadas aos autos.

Aduz restar claro nos autos, que conviveu por 15 (quinze) anos em união estável com o de cujus, com convivência duradoura, pública e contínua, salientando ainda que, após a citação dos requeridos para apresentarem contestação, dois dos herdeiros do de cujus apresentaram proposta de acordo, bem como declararam reconhecer a existência de união estável entre o de cujus e a ora recorrente.

Afirma não saber a razão de todos os apelados se voltaram contra ela, pois todos sabiam da união estável que mantinha com o pai de ambos, asseverando ainda a existência de contradição com o inventariante do espólio e herdeiro do de cujus, Rogério Erasmo Trindade dos Santos, que havia lhe proposto acordo, bem como declarado, com firma reconhecida em cartório, que conviveu em união estável com seu pai e, após, ter afirmado em juízo, em audiência, que nunca fora companheira do de cujus.

Por fim, pugna pelo conhecimento e provimento do presente recurso, com fim de reformar a sentença ora vergastada, reconhecendo a união estável “post mortem” com o de cujus Orlando Rodrigues dos Santos, julgando procedente os pedidos formulados na inicial.

Em sede de contrarrazões (ID 11322691), a apelada IONE IVANY TRINDADE DOS SANTOS pugnou pelo desprovimento do recurso de apelação.

Coube-me, por distribuição a relatoria do feito.

Instada a se manifestar (ID 11334253), o representante do Ministério Público deixou de exarar parecer afirmando inexistir interesse público capaz de ensejar a sua intervenção (ID 11970900).

É o relatório.

VOTO

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Avaliados, preliminarmente, os pressupostos processuais subjetivos e objetivos deduzidos pela apelante, tenho-os como regularmente constituídos, bem como atinentes à constituição regular do feito até aqui, razão pela qual conheço do recurso, passando a proferir voto.

DA INCIDÊNCIA DO DIREITO INTERTEMPORAL

Precipuamente, em observância as regras de Direito Intertemporal, positivada no art. 14 do Código de Processo Civil de 2015, o recurso em exame será apreciado sob a égide deste, visto que a vergasta decisão foi publicada na vigência do Novo Diploma Processual Civil.

DAS QUESTÕES PRELIMINARES

Á mingua de questões preliminares, atenho-me ao exame do mérito.

MÉRITO

A questão devolvida à apreciação nesta Instancia Revisora, cinge-se acerca da caracterização da união estável entre a autora/apelante e o de cujus Orlando Rodrigues dos Santos, que não foi admitido pelo Juízo de origem, ante as provas produzidas nos autos.

Em suas razões recursais, aduz restar claro nos autos que conviveu por 15 (quinze) anos em união estável com o de cujus, em convivência duradoura, pública e contínua, salientando ainda que, após a citação dos requeridos para apresentarem contestação, dois dos herdeiros do de cujus apresentaram proposta de acordo, bem como declararam reconhecer a existência de união estável.

Sobre a união estável assim define a doutrina:

“Ainda que a união estável não se confunda com o casamento, ocorreu a equiparação das duas entidades familiares, merecedoras da mesma proteção. A Constituição acabou por reconhecer juridicidade ao afeto, ao elevar as uniões constituídas pelo vínculo de afetividade à categoria de entidade familiar” (Maria Berenice Dias citada por Pablo Stolze Gagliano). E mais, segundo os juristas Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho “a união estável, por seu turno, não se coaduna com a mera eventualidade na relação e, por conta disso, ombreia-se ao casamento em termos de reconhecimento jurídico, firmando-se como forma de família, inclusive com expressa menção constitucional (CF, § 3º do art. 226)”, in Novo Curso de Direito Civil, 2ª Edição. Editora Saraiva, 2010.

Cabe ressaltar que o atual Código Civil Brasileiro, em seu art. 1.723, reconhece como estável a convivência duradoura, pública e contínua de um homem e de uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de família.

Ainda, segundo a doutrina, diante da complexidade e da gravidade que envolve reconhecer e dissolver uma união estável, os julgadores avaliam provas escritas (cartas, bilhetes, declarações), fotografias, depoimentos de testemunhas e tudo mais que puder ser útil para formar sua convicção.

Da análise dos autos, verifico...

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