Acórdão Nº 0045087-91.2005.8.24.0023 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 30-01-2020

Número do processo0045087-91.2005.8.24.0023
Data30 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0045087-91.2005.8.24.0023

Relator: Desembargador Guilherme Nunes Born

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.

REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. DESCONTOS EM COMISSÕES DA AUTORA (REPRESENTANTE) QUE, SUPOSTAMENTE, FORAM FEITOS PARA PAGAR INADIMPLEMENTO DE CLIENTE PARA COM A REQUERIDA (REPRESENTADA). AUSÊNCIA DE PROVA. ÔNUS QUE CABIA À AUTORA DESCUMPRIDO. ART. 373, I, DO CPC. CONSTATAÇÃO DE QUE JUNTO AO CONTRATO HAVIA POSSIBILIDADE DE A COMISSÃO SER PAGA ANTES DA SATISFAÇÃO DA DÍVIDA PELO CLIENTE. INADIMPLEMENTO DESTE QUE LEVOU AO POSTERIOR DESCONTO DA COMISSÃO JÁ PAGA À AUTORA. LEGISLAÇÃO E DOUTRINA QUE PERMITEM A DEVOLUÇÃO.

RESCISÃO CONTRATUAL ASSINADA COM VÍCIO DE CONSENTIMENTO. QUESTÃO, IGUALMENTE, NÃO COMPROVADA PELA AUTORA.

HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO QUE SE IMPÕE. ART. 85, §11, DO CPC E PARÂMETROS DELINEADOS NO ED NO AI NO RESP N. 1.573.573/RJ DO STJ.

Recurso conhecido e desprovido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0045087-91.2005.8.24.0023, da comarca da Capital 6ª Vara Cível em que é Apelante Dinesi Colombo Representações Ltda e Apelado Laboratório Neo Química Com. Ind. Ltda.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso para negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 30 de janeiro de 2020, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Salim Schead dos Santos, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Luiz Zanelato.

Florianópolis, 30 de janeiro de 2020.




Desembargador Guilherme Nunes Born

Relator

RELATÓRIO

1.1) Da inicial

Dinesi Colombo Representações Ltda. ajuizou ação de cobrança em face de Laboratório Neo-Química Com. Ind. Ltda..

Relatou que: I) em junho/1999, assinou contrato de representação para o Estado; II) em novembro/2000, um cliente inadimpliu duplicatas no montante aproximado de R$120.000,00; III) a requerida cobrou da autora o valor não pago; IV) em dezembro/2000 não recebeu comissão e, desde então, descontou-se cerca de 20% das comissões para pagamento da dívida; V) a requerida teria informado que, se a cliente pagasse o débito, reembolsaria os valores descontados; VI) em dezembro/2002, rescindiu-se o contrato, tendo recebido R$58.035,18, sem receber a importância descontada; VII) sofreu coação moral para assinar a rescisão contratual e a quitação dos débitos.

Postulou a condenação ao pagamento da complementação das comissões pagas a menor ao longo do tempo – de fevereiro/2001 a dezembro/2002 –, no valor de R$66.883,78 (fls. 2/12).

1.2) Da resposta

A requerida contestou alegando que: I) falta pressuposto de desenvolvimento válido do processo; II) o juízo é incompetente; III) em dezembro/2002, deu-se a rescisão, com quitação total e recíproca; IV) as comissões devidas à autora eram pagas no mês seguinte ao da prestação do serviço, mesmo que não tivesse recebido do cliente o pagamento das vendas por ela intermediadas em razão do prazo concedido para pagamento; V) o inadimplemento só é verificado depois que o representante comercial recebe a comissão; VI) os descontos feitos decorreram das comissões de vendas antecipadas, porém não satisfeitas pelos clientes; VII) houve quitação geral, de forma livre voluntária, não tendo ocorrido nenhum vício de vontade; VIII) os descontos praticados foram lícitos (art. 32 da Lei n. 4.886/65); IX) inexistência de valores a serem pagos (fls. 122/132).

1.3) Do encadernamento processual

Justiça gratuita deferida (fls. 116).

Réplica (fls. 200/201).

Requerida postulou julgamento antecipado (fls. 205).

Autora pugnou pela ouvida testemunhal (fls. 217).

Competência declinada (fls. 219).

Agravo de instrumento (fls. 223/235).

Sentença (fls. 254/262).

Apelação cível (fls. 265/285).

Em decisão monocrática, cassou-se a sentença (fls. 466/469).

Audiência com ouvida de uma testemunha (fls. 583/584).

Alegações finais apenas da autora (fls. 585/588 e fls. 591).

1.4) Da sentença

Prestando a tutela jurisdicional (fls. 592/597), o Juiz de Direito Celso Henrique de Castro Baptista Vallim prolatou sentença nos seguintes termos:

Posto isto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por Dinesi Colombo Representações Ltda. na presente "Ação de cobrança" ajuizada em face de Laboratório Neo-Química Comércio e Industria Ltda.

Arca o Autor com as custas processuais e honorários sucumbenciais. Arbitro os honorários em favor do patrono da Ré no valor de 15% sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, §2º do CPC (mais que 10% porque essa foi segunda sentença prolatada). Aponto também necessidade de ser observado o artigo 98, §3º, do CPC (suspensão dos honorários em vista da hipossuficiência do Requerente). (fls. 597)

1.5) Do recurso

Inconformada, a autora apelou argumentando que: I) em novembro/2000, um cliente inadimpliu montante aproximado de R$120.000,00; II) a requerida cobrou da autora o valor; III) em dezembro/2000 não recebeu comissão e, desde então, descontou-se cerca de 20% das comissões; IV) a requerida teria informado que se houvesse o pagamento pela cliente, reembolsaria os descontos; V) em dezembro/2002, rescindiu-se o contrato, tendo recebido R$58.035,18, sem receber a importância descontada; VI) sofreu coação moral para assinar a rescisão contratual e a quitação dos débitos (fls. 601/607).

1.6) Das contrarrazões

Ausente (fls. 611).

Este é o relatório.

VOTO

2.1) Do juízo de admissibilidade

Conheço do recurso porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, pois ofertado a tempo, modo e evidenciado o objeto e a legitimação. Ausente recolhimento do preparo pois a autora é beneficiária da justiça gratuita.

2.2) Do mérito

A resolução da contenda passa, diretamente, por esclarecer e comprovar se os valores descontados da autora se deu em razão (1) do inadimplemento de dívida por parte do cliente que negociou com a requerida por intermédio da autora ou (2) se decorreu da devolução da comissão antecipadamente paga à autora por conta da resolução do negócio perante a não quitação do cliente.

Pois bem.

Segundo tese da autora, a requerida impôs que o "prejuízo deveria ser arcado pela Requerente, que foi responsável pelo contrato discutido e não pago" (fls. 5). Ato seguinte, as comissões dos meses seguintes foram pagas com descontos.

Tal tese foi reiterada, naturalmente, em sede recursal.

Contudo, tal tese não encontra respaldo no contexto probatório, ônus este que era da autora (art. 373, I, do CPC).

Veja-se.

Não há documentos dando guarida à tese em tela.

A prova testemunhal, igualmente, sozinha e tendo sido colhido de uma única testemunha, por estar desamparada de outras provas que a corroborem, não tem força a amparar a alegação.

A prova testemunhal, de credibilidade questionável, por não ter sido reforçada por outras provas, não teve o condão de, exclusivamente ela e com base em um único depoimento, demonstrar a alegação da autora.

Por outro lado, existem "Instrumento Particular de Contrato de Representação Comercial Autônomo" celebrados com a requerida (fls. 148/152, de 15-6-1999, fls. 40/45, de 11-9-2000, e fls. 46/51, de 18-5-2000), o qual dispôs a respeito do pagamento:

CLÁUSULA DÉCIMA – DO PAGAMENTO

As comissões devidas pela representação ora contratada, serão pagas pela REPRESENTADA a REPRESENTANTE, no dia 10 de cada mês, considerados as vendas efetuadas no período mensal anterior.

[...]

PARÁGRAFO SEGUNDO

O pagamento das comissões a que se refere esta cláusula, somente será efetuado pela REPRESENTADA, mediante a apresentação pela REPRESENTANTE da respectiva Nota Fiscal de Serviços, sendo de inteira e exclusiva responsabilidade desta o pagamento do ISS [...], cabendo à REPRESENTADA apenas a retenção de IRRF [...]. (fls. 43)

A mesma redação se repetição às fls. 49 e 150.

Fato que, conforme se observou, os pagamento das comissões se davam no dia 10 de cada mês com relação as vendas do período mensal anterior, os quais se valiam apenas da apresentação de nota fiscal.

Portanto, nada forçoso concluir, diante da redação retro citada, que tanto havia possibilidade da autora receber comissão de negócios já adimplidos pelo cliente junto à requerida, bem como de receber de negociações ainda não pagas, seja em razão da dilação do prazo para pagamento ou até mesmo por conta de vendas parceladas, oportunidade em que a representada, ora requerida, teria recebido parte do montante devido pelo cliente.

Assim sendo, repete-se, contratualmente estabeleceu-se a possibilidade das comissões recebidas precederem ao efetivo adimplemento por parte do cliente, o que é lícito, como se verá a seguir.

Primeiro ponto, necessário tratar da regra contemplada na Lei n. 4.886/65:

Art. 32. O representante comercial adquire o direito às comissões quando do pagamento dos pedidos ou propostas.

[...]

Apesar dessa regra que prevê o direito às comissões quando do pagamento, doutrina especializada leciona sobre a possibilidade de pagamento da comissão anterior ao adimplemento devido pelo cliente, bem como, caso não pague, nada ser devido ao representante.

Leciona Rubens Requião:

O art. 32 disciplina o direito à comissão resultante do contrato de representação comercial. O representante comercial adquire o direito assim que o preço seja pago, no todo ou em parte, mas a exigibilidade da comissão está subordinada à regra contida no contrato ou, na falta dessa, na forma do art. 32, §1º.

[...]

Ficou esclarecido , no comentário ao art. 27, letra "f", nº 147, supra, que o representante comercial, como mediador que é, adquire o direito à remuneração não pelo seu trabalho, mas pela utilidade que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT