Acórdão Nº 0064116-20.2011.8.24.0023 do Sexta Câmara de Direito Civil, 07-12-2021

Número do processo0064116-20.2011.8.24.0023
Data07 Dezembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0064116-20.2011.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ CARVALHO

APELANTE: PATRIC CABRAL LALAU (RÉU) REPRESENTANTE LEGAL DO APELADO: HELOISA HELENA GRIJO MELLER (Inventariante) (AUTOR) APELADO: MARCIO MELLER (Espólio)

RELATÓRIO

Adoto, por economia processual e em homenagem à sua completude, o relatório de sentença da magistrada Eliane Alfredo Cardoso de Albuquerque, in verbis:

Espólio de Márcio Meller, qualificado à fl. 05, ajuizou perante a 7ª Vara do Trabalho de Florianópolis a presente ação condenatória em desfavor de Patric Cabral Lalau, também qualificado nos autos, alegando, em síntese, ter o falecido atuado como agente do réu, jogador de futebol, por meio de contrato firmado em 06/11/2007, com validade de dois anos e cláusula de exclusividade.Como contraprestação ao serviço prestado pelo réu, cabia o repasse, em duas parcelas, do equivalente a 10% de todos os valores relativos a qualquer negociação envolvendo o réu.Relatou que, em 2009, Márcio Meller começou a entrar em contato com o Clube Português Sport Lisboa e Benfica para tentar firmar um contrato de trabalho profissional entre o requerido e o clube de futebol. Essas negociações, segundo contou, eram intermediadas em parceria com Hélio Vasone Junior, sócio da empresa Energy Sports, então detentora dos direitos econômicos do réu.Explicou, em seguida, que a Fédération Internationale de Football Association (FIFA) estabelece as chamadas "janelas de transferência", que nada mais seriam do que datas específicas para a realização de transferências internacionais de atletas profissionais de futebol. No caso de Portugal, país de destino do réu em agosto de 2009, a janela de transferência era janeiro, na intertemporada, ou nos meses de julho e agosto, na chamada pré-temporada.Em abril de 2009, o réu viajou a Lisboa para celebrar o pré-contrato e realizar exames médicos. No dia 29 desse mesmo mês, contudo, Márcio Meller se envolveu em acidente de trânsito, vindo a falecer e sua esposa, após recuperada fisicamente do sinistro do qual também participara, buscou se informar sobre a viagem e a assinatura do pré-contrato pelo réu, vindo a ser informada de que tudo teria corrido conforme o planejado.Tentando dar continuidade ao serviço prestado pelo marido para, ao menos, receber o valor devido quando da assinatura do contrato final, a esposa de Márcio Meller buscou entrar em contato com o requerido, diante da proximidade da data da assinatura do instrumento, não obtendo sucesso.Após muitas tentativas, conseguiu contato com o réu, o qual informou que conversaria com o seu advogado e daria um retorno sobre os valores devidos, o que nunca ocorreu.Assim, diante da impossibilidade de solução da lide pelas vias extrajudiciais, tendo a FIFA alegado a sua ilegitimidade, não restou alternativa diversa do ajuizamento da presente ação.Requereu, então, a exibição nos autos do contrato firmado entre o réu e o clube de futebol Sport Lisboa e Benfica, condenando-se o requerido ao pagamento do valor relativo a 10% do referido contrato e ao pagamento de indenização a título de danos morais. Alternativamente, requereu a condenação do réu pela quebra de contrato.O réu compareceu espontaneamente em juízo e ofertou defesa (fls. 97/113), na qual alegou, preliminarmente, a incompetência absoluta da Justiça do Trabalho para apreciar o feito, a inépcia da inicial pela ausência de causa de pedir e a ilegitimidade do autor quanto ao pleito de indenização por danos morais.Além disso, destacou que o caso dos autos é regido pelo "Reglamento sobre los agentes jugadores" da FIFA, tendo acostado o documento na língua espanhola sem a devida tradução por entender ser de fácil compreensão, requerendo, se fosse o caso, a concessão de prazo para a juntada de versão traduzida para o português.No mérito, alegou ser incontroverso o fato de que o réu firmou o contrato de mediação com Márcio Meller em 06/11/2007 com validade até 06/11/2009, mas negou ter sido Márcio Meller o responsável pelas negociações que resultaram na transferência do requerido ao clube de futebol Benfica. Contou que os responsáveis por conseguir ao réu a oportunidade de transferência para o clube português foram os agentes ligados exclusivamente ao time Brasa Futebol Clube Ltda, do qual o autor fazia parte.Destacou, ainda, que o regulamento da FIFA permite ao atleta negociar contrato de trabalho de forma direta, sem a participação de agente, sendo o que fez ao viajar sozinho a Portugal, antes mesmo do falecimento de Márcio Meller.Além disso, relatou não ter permanecido mais de dois meses jogando pelo time Benfica, embora seu contrato tivesse vigência de 01/07/2009 a 30/06/2014, pois logo fora "emprestado" ao Cruzeiro Esporte Clube e, posteriormente, em 08/01/2010, para o Avaí Futebol Clube.Em 27/12/2010, o atleta foi cedido de forma permanente pelo Benfica ao Clube Atlético Mineiro, em contrato com duração de 05/01/2011 a 20/12/2014.Dessa forma, entendeu que, caso seja reconhecido ao Espólio o direito ao percebimento de 10% dos valores auferidos pelo réu, que o montante base seja limitado aos dois salários recebidos pelo atleta nos meses em que jogou pelo Benfica.Por fim, impugnou o pedido de indenização por danos morais e, com isso, requereu a improcedência da ação.Houve réplica (fls. 187/197).Às fls. 202/204, foi reconhecida a incompetência absoluta da Justiça do Trabalho, sendo os autos encaminhados a esta Vara.Na decisão de saneamento, foi reconhecida a ilegitimidade ativa do Espólio no que diz respeito ao pleito de danos morais e afastada a preliminar de inépcia da inicial. Além disso, foi reconhecida a preclusão da juntada do documento traduzido às fls. 115/147. No mesmo ato, foram delimitadas as questões de fato e determinada a produção de prova oral, consistente na oitiva de testemunhas e no depoimento pessoal do réu.Às fls. 278/281, o autor apresentou declaração prestada pela testemunha Rubens Renato Angelotti em cartório, diante da impossibilidade de seu comparecimento na data da audiência.Durante a audiência de instrução e julgamento, o réu impugnou a juntada da escritura pública de declaração, sendo a análise da questão postergada para a ocasião da sentença. No mesmo ato, foi colhido o depoimento pessoal do réu (fls. 282/283).A testemunha arrolada pelo réu foi ouvida por carta precatória (fl. 323).As partes apresentaram suas alegações finais às fls. 327/335 e 337/343.Ao retornarem os autos conclusos para julgamento, verificou-se que a gravação do depoimento pessoal do réu estava parcialmente inaudível (fl. 344), sendo informada pelo TSI a impossibilidade de melhoria na qualidade do áudio (fl. 360).Intimadas, a parte autora acostou às fls. 348/354 transcrição do depoimento da testemunha arrolada pelo réu e este, ainda que não sendo a parte interessada na prova, informou seu desinteresse na repetição do ato.Em seguida, o autor reforçou que a transcrição por ele acostada bastava para o julgamento da lide (fls. 361/362).É o relatório.Passo a decidir.

O édito singular foi de procedência, cuja parte dispositiva é do seguinte teor, ex vi:

Em face do que foi dito, julgo procedente o pedido de pagamento de comissão formulado pelo Espólio de Márcio Meller contra Patric Cabral Lalau para condenar o réu ao pagamento do valor correspondente a 10% (dez por cento), percentual que incidirá sobre a base de cálculo definida em regulamento da FIFA destinado ao regramento da remuneração dos agentes de jogadores de futebol em vigor em 2007, a ser comprovada nos autos em liquidação de sentença na forma do art. 509, II, do CPC, devidamente convertidos de Euro para Real, se necessário, uma metade segundo a cotação de 01º/07/2009 e a outra metade conforme a cotação de 27/12/2010, com correção monetária pelos índices oficiais que incidirá sobre metade do débito desde 01º/07/2009 e sobre a outra metade desde 27/12/2010, além de juros legais de mora devidos desde 01º/07/2009 em relação à 50% do valor devido e desde 27/12/2010 quanto à outra metade da dívida (art. 397, CC).Condeno a parte ré ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, forte no que estabelece o art. 85, §2º, do CPC.

Irresignado com a prestação jurisdicional entregue, o réu interpôs o presente recurso de Apelação Cível argumentando que: (i) preliminarmente, não há se falar em competência da Justiça Estadual para apreciar e julgar o feito relativo aos contornos contratuais entre atleta profissional de futebol e agente intermediador, pois cabe à Câmara Nacional de Resolução de Disputas (CNRD) da CBF a competência para tal desiderato, reclamando a incompetência absoluta, à luz do art. 64 do CPC; (ii) no mérito, aduz que não há provas da alegada mediação promovida pelo de cujus e o clube Sport Lisboa e Benfica, a despeito do art. 373, inc. I do CPC. Aduz que os elementos trazidos aos autos são circunstanciais e não comprovam que o Sr. Márcio Meller efetivamente participou das negociações, sendo imprescindível a presença de outros elementos probatórios, como "uma troca de e-mails, uma conta telefônica com registros das chamadas havidas entre as partes no transcorrer das negociações, um fax, ou ainda, uma declaração do clube adquirente ou do clube cedente" (evento 126, out. 334, fl. 9); (iii) ainda, sustenta que, acaso mantida a obrigação de pagar percentual de comissão ao autor, aludida condenação deve ser restrita ao período em que efetivamente jogou no clube português, afastando-se aquele em que esteve cedido a outros clubes até a rescisão da avença.

Frente a este contexto, requereu a reforma do decisum objurgado para: (i) acolhendo a preliminar de incompetência da Justiça Estadual, extinguir o processo; (ii) subsidiariamente, julgar improcedentes os pedidos formulados à exordial ante a inexistência de participação do de cujus junto à equipe portuguesa, ou (iii) subsidiariamente, limitar a obrigação de comissão devida ao de cujus em 2 (dois) meses, tempo...

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