Acórdão Nº 0065707-80.2012.8.24.0023 do Primeira Câmara de Direito Civil, 12-03-2020

Número do processo0065707-80.2012.8.24.0023
Data12 Março 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0065707-80.2012.8.24.0023

Relator: Des. Gerson Cherem II

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE SONEGADOS C/C SOBREPARTILHA. RECURSO DE AMBAS AS PARTES.

1) RECLAMO DA AUTORA.

TENCIONADO RECONHECIMENTO DE SONEGAÇÃO DE VALORES PROVENIENTES AÇÕES JUDICIAIS, AUFERIDOS POR UM DOS HERDEIROS APÓS A PARTILHA. ESCRITURA PÚBLICA DE INVENTÁRIO, PARTILHA E CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS NA QUAL CONSTAM AS ALUDIDAS DEMANDAS. INSERÇÃO DOS TERMOS "SEM VALOR DEFINIDO". AÇÕES QUE, AO TEMPO DO INVENTÁRIO, ESTAVAM EM GRAU RECURSAL. BENS EXPRESSAMENTE PREVISTOS NA PARTILHA. OCORRÊNCIA DE CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS TOCANTE AOS RESPECTIVOS VALORES. INOCORRÊNCIA DA OMISSÃO DOLOSA (ART. 1.992, DO CC). ÔNUS DA DEMANDANTE (ART. 333, I, DO CPC/73). SENTENÇA MANTIDA.

2) RECURSO DO RÉU.

2.1) AVENTADA NECESSIDADE DE RISCAR AS EXPRESSÕES INJURIOSAS ESCRITAS NA INICIAL E NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. TERMOS QUE EVIDENCIARAM O ESTADO DE ANIMOSIDADE DAS PARTES. PRETENSÃO RECHAÇADA.

2.2) CONDENAÇÃO DA AUTORA NAS PENAS POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. DESCABIMENTO. HIPÓTESES DO ART. 17 DO CPC/73, NÃO EVIDENCIADAS. TESE REPELIDA.

2.3) MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. DESCABIMENTO. PLEITO ALTERNATIVO DE ESTIPULAÇÃO EM PERCENTUAL SOBRE O VALOR DA CAUSA. INVIABILIDADE. HONORÁRIOS QUE, NA HIPÓTESE, FORAM FIXADOS EM VALOR CERTO. OBSERVÂNCIA AOS PARÂMETROS DO § 4º E ALÍNEAS 'A', 'B' E 'C', DO §3°, DO ART. 20, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. RECLAMO DESACOLHIDO NO PONTO.

3) HONORÁRIOS RECURSAIS. INVIABILIDADE. SENTENÇA PROLATADA NA VIGÊNCIA DO CPC/73.

RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0065707-80.2012.8.24.0023, da comarca da Capital - Eduardo Luz Vara de Sucessões e Reg Pub da Capital em que é Apte/Apdo Mariza Dalil Mansur e Apdo/Apte Dalibar Dalil Mansur.

A Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer dos recursos e negar-lhes provimento. Custas na forma da lei.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido por este Relator, e dele participou o Exmo. Sr. Des. José Maurício Lisboa e o Exmo. Sr. Des. Luiz Cézar Medeiros.

Florianópolis, 12 de março de 2020.

Gerson Cherem II

PRESIDENTE E RELATOR


RELATÓRIO

Trata-se de apelações cíveis interpostas por Mariza Dalil Mansur e Dalibar Dalil Mansur, irresignados com a sentença prolatada pelo Juízo da Vara de Sucessões e Registros Públicos da Comarca da Capital que, nos autos da ação de sonegados c/c partilha ajuizada pela primeira, julgou extinto o feito, nos seguintes termos (fls. 987/988):

III. Pelo exposto, JULGO EXTINTO, sem resolução do mérito, a AÇÃO DE SONEGADOS c/c SOBREPARTILHA proposta por MARIZA DALIL MANSUR, diante da falte de interesse de agir, nos termos do art. 267, VI do CPC.

Condeno a autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), nos moldes do art. 20, § 4ª do CPC.

Inconformada, a autora recorreu, afirmando a sonegação dos valores expressos nas ações judiciais, bem como a sua adjudicação sem origem válida. Em decorrência, pugnou pelo retorno dos bens ao espólio, com a partilha e consequente exclusão do réu da respectiva divisão (fls. 991/1.011).

Por seu turno, o demandado pleiteou o reconhecimento de expressões injuriosas nas peças processuais da demandante, as quais deveriam ser riscadas. Buscou a condenação em litigância de má-fé e a elevação dos honorários advocatícios (fls. 1.016/1.023).

Com as contrarrazões (fls. 1.031/1.038 e 1.039/1.063), ascenderam os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos legais, conhecem-se dos recursos.

Ab initio, mister destacar que, com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, suas disposições aplicar-se-ão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei n. 5.869/73, segundo o art. 1.046, do CPC.

Todavia, o referido regramento estatui no art. 14: "A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".

Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery prelecionam:

Regra geral: irretroatividade da lei. Independentemente do sistema jurídico adotado pelo Estado soberano, a regra geral que vigora sobre vigência da lei é a irretroatividade da lei nova. A retroatividade é exceção e como tal tem que ser tratada, com interpretação e aplicação restritivas. Dizemos independentemente do sistema jurídico que se examina porque há Estados como o Brasil, que têm em sua Constituição a regra geral da irretroatividade; outros a têm em sua legislação infraconstitucional. A CF 5º XXVI diz que a lei não prejudicará o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. Lei está no texto constitucional em sentido amplo, significando que nem a lei abstratamente considerada (CF, Emenda Constitucional, lei ordinária), tampouco a lei para o caso concreto (sentença judicial transitada em julgada) pode atuar para prejudicar situações já consolidadas. (Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. p. 227).

Tratando-se a sentença prolatada de ato jurídico perfeito, pois publicada em 20.03.2015 (fl. 989), afasta-se a aplicabilidade do novo CPC.

Dessarte, parte-se para a análise do mérito recursal, sob a égide do CPC/1973.

1) Da apelação da autora - da sonegação:

A recorrente tenciona a alteração da sentença, que julgou extinto o feito, para que seja reconhecida a sonegação de valores oriundos de duas ações judiciais em que figurava como parte a autora da herança.

Assevera que restou comprovado nos autos que a quantia era de conhecimento do réu quando da abertura da sucessão, pois ele figurava como sócio do escritório patrocinador das duas causas. Assim, clama pela condenação daquele herdeiro à restituição dos alvarás levantados após o óbito.

A codificação civil prevê:

Art.1.992. O herdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendo no inventário quando estejam em seu poder, ou, com o seu conhecimento, no de outrem, ou que os omitir na colação, a que os deva levar, ou que deixar de restituí-los, perderá o direito que sobre eles lhe cabia.

Sobre o tema, leciona Washington de Barros Monteiro:

Se o inventariante omite, intencionalmente, ou não descreve qualquer bem ou valor, assim desfalcando o ativo do espólio; se o herdeiro não indica bens em seu poder, ou detidos por terceira pessoa, ou se nega a conferi-los, em obediência às disposições legais, pratica sonegação, sujeitando-se às penas previstas nos arts. 1.992 e 1.993 do Código Civil. (in Curso de Direito Civil, v. 6: direito das sucessões. 37. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 298).

Na hipótese, tem-se que o réu Dalibar Dalil Mansur fora nomeado inventariante do espólio de Laila Mattar Mansur, com a lavratura de escritura pública de inventário, partilha de bens e cessão de direitos no dia 03.12.2008. Constituíam-se em herdeiros as partes e o irmão falecido destas, Eliezer Dalil Mansur (fls. 34/38).

Os bens foram relacionados no item 3 (3.1 ao 3.9), dentre os quais os direitos aos resultados das ações judiciais n. 023.94.038971-2 e n. 95.00.1263-4 (precatório n. 2003.04.02.000695-1). Constou do documento a informação "sem valor definido" para ambos os processos (fl. 36).

Como percebe-se, os direitos foram expressamente insertos na relação de bens do espólio (itens 3.8 e 3.9). Na sequência, a partilha ficou assim definida (fl. 37):

8) em virtude da cessão de direitos hereditários, os bens pertencentes ao espólio restaram adjudicados em favor do herdeiro Dalibar Dalil Mansur, conforme segue: [...] 8.1.8) - 100% (cem por cento) dos direitos sobre a ação judicial descrita no item 3.8, sem valor definido; 8.1.9) - 100% (cem por cento) dos direitos sobre a ação judicial descrita no item 3.9, sem valor definido.

Nessa linha de raciocínio, não vinga a tese de inexistência de cessão dos aludidos direitos sobre as ações judiciais. Embora não constem as demandas no item 7 "da cessão onerosa e transferência de direitos hereditários", pois o preço ali descrito refere-se apenas aos itens 3.1 ao 3.7 (fl. 37), estreme de dúvidas que os direitos sobre aquelas lides foram cedidos, conforme disposição expressa acima transcrita.

Os valores decorrentes dos processos, segundo constou do instrumento público, não estavam totalmente definidos no momento da lavratura da escritura - dezembro de 2008.

Veja-se que a execução n. 023.97.013631-2, referente à ação de conhecimento n. 023.94.038971-2, estava pendente de análise do recurso interposto pela extinta, a qual discutia os valores ainda passíveis de quitação (fls. 771/793), cujo julgamento ocorreu no dia 30.06.2009 (fls. 814/819). Os autos retornaram à origem, com apresentação dos respectivos cálculos (fl. 825).

A ação n. 95.00.1263-4, que tramitou no TRF da 4ª Região, também estava em grau recursal no mês dezembro de 2008, conforme cópia de fl. 290.

Por conseguinte, exsurge inviável reconhecer-se a omissão dolosa do réu em não declarar os valores advindos das respectivas ações, se ainda não eram exatos naquela oportunidade.

Ademais, as partes eram assistidas por advogado, tudo indicando estarem cientes sobre a cessão de direitos hereditários.

Em suma, não restou inequivocamente demonstrada a sonegação do numerário - advindo dos processos - em nome da falecida, cujo ônus tocava à demandante.

Logicamente não cabe proceder-se à sobrepartilha, porque as aludidos demandas foram divididas de modo manifesto na escritura pública de inventário do espólio de Laila Mattar Mansur.

Tem-se que era imprescindível a prova robusta acerca da omissão dolosa sobre as ações judiciais, bem como dos correlatos valores, mas isto não ocorreu. Deste encargo, repise-se, deixou de destrelar-se a autora, na forma do art. 333, I, do CPC/73, vigente à época da sentença, in...

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