Acórdão Nº 0067643-72.2019 do Conselho da Magistratura, 10-08-2020

Número do processo0067643-72.2019
Data10 Agosto 2020
Tribunal de OrigemBlumenau
Classe processualRecurso Administrativo
Tipo de documentoAcórdão


ACÓRDÃO


Recurso Administrativo n. 0067643-72.2019.8.24.0710, da Comarca de Blumenau


Relator: Des. Dinart Francisco Machado


RECURSO ADMINISTRATIVO. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA BLUMENAU. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO DE AVERBAÇÃO DE DIVÓRCIO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO. QUALIFICAÇÃO REGISTRAL NEGATIVA. NOTA DEVOLUTIVA. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA FORMULADA PELA OFICIALA REGISTRADORA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DO INTERESSADO.


REQUERIMENTO DE AVERBAÇÃO DE DIVÓRCIO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO. NEGATIVA BASEADA NO ART. 681 DO CÓDIGO DE NORMAS DA CGJ QUE EXIGE O REGISTRO QUANDO A PARTILHA JÁ TENHA OCORRIDO. SUSCITADO QUE ARGUMENTA TER RECEBIDO O IMÓVEL POR DOAÇÃO DE SEU GENITOR, COM EXPRESSA INTENÇÃO DE TRANSMITIR-LHE EXCLUSIVAMENTE. INEXISTÊNCIA, CONTUDO, DE CLÁUSULA DE INCOMUNICABILIDADE, COMO ESTÁ A EXIGIR O ART. 1668, I DO CÓDIGO CIVIL. BEM QUE SE COMUNICA EM VIRTUDE DO REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL. AUSÊNCIA DE ASSINATURA DA ENTÃO ESPOSA NA ESCRITURA PÚBLICA. IRRELEVÂNCIA. ARGUMENTO DE QUE O CÔNJUGE SUPÉRSTITE NÃO TERIA DIREITO A ACRESCER O BEM DOADO, NOS MOLDES DO ART. 551 DO CC. MATÉRIA ATINENTE À SUCESSÃO, QUE NÃO TEM RELAÇÃO COM O CASO.


RECURSO ADMINISTRATIVO DESPROVIDO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Administrativo n. 0067643-72.2019.8.24.0710, da 1ª Vara da Fazenda, Acidentes e Registros Públicos da Comarca de Blumenau, em que é apelante o suscitado Osmar Creuz, sendo suscitante a Oficiala do 1º Registro de Imóveis de Blumenau:


O Conselho da Magistratura decidiu, por votação unânime, negar provimento ao recurso.


O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Ricardo Roesler e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Salim Schead dos Santos, João Henrique Blasi, Soraya Nunes Lins, Roberto Lucas Pacheco, Carlos Adilson Silva, Odson Cardoso Filho, Hélio do Valle Pereira, Júlio César Machado Ferreira de Melo e José Agenor de Aragão.


Funcionou como representante do Ministério Público o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Mário Luiz de Melo.


Florianópolis, 10 de agosto de 2020.


Dinart Francisco Machado


Relator


RELATÓRIO


Trata-se de recurso administrativo interposto contra sentença de procedência proferida em 29-4-2020, nos autos de suscitação de dúvida n. 0067643-72.2019.8.24.0710, da 1ª Vara da Fazenda, Acidentes e Registros Públicos da Comarca de Blumenau, em que é apelante Osmar Creuz, sendo suscitante a Oficiala Registradora Substituta do 1º Registro de Imóveis de Blumenau.


Osmar Creuz apresentou, em 7-2-2019, requerimento de averbação de divórcio na matrícula 1.326 de imóvel registrado naquele Ofício (doc. 2488521 - fl. 14-17).


A Escrevente substituta procedeu à devolução do pedido, prestando informações no sentido de que a sentença que versar sobre divisão de bens, independentemente do percentual que tocar a cada um dos cônjuges, deve ser objeto de registro, pois a averbação de alteração do estado civil só é possível quando não houver decisão sobre a partilha (doc. 2488521 - fl. 18).


Osmar Creuz argumentou que o imóvel em questão não entrou na divisão, pois foi adquirido por seu pai, Curt Franz Reinhold Creuz, e doado exclusivamente a ele. Reiterou o pedido de averbação (doc. 2488521 - fl. 19-25).


A Escrevente substituta novamente exigiu a apresentação da carta de sentença, acrescentando que o regime de bens adotado foi o da comunhão universal e não há cláusula de incomunicabilidade no registro do imóvel (doc. 2488521 - fl. 26).


O requerente insistiu no pedido e requereu, subsidiariamente, que a oficiala suscitasse dúvida ao Juízo competente (doc. 2488521 - fl. 28/29), o que foi feito, mediante o protocolo da presente suscitação em 29-8-2019 (doc. 2488521).


O suscitado ofertou resposta (doc. 2742574).


O Ministério Público da 12ª Promotoria de Justiça da Comarca de Blumenau apresentou parecer opinando pela procedência (doc. 3155966).


Em 29-4-2020, foi proferida a sentença pelo Juízo da 1ª Vara da Fazenda, Acidentes e Registros Públicos da Comarca de Blumenau, que julgou procedente a suscitação de dúvida, cujo dispositivo tem a seguinte redação:


Ante o exposto, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, resolvo o mérito da lide e julgo procedente a presente suscitação de dúvida, para reconhecer a exigibilidade de apresentação da carta de sentença, para registro, diante da existência de partilha dos bens do casal.


Não cabe condenação dos interessados ao pagamento das custas, na forma do art. 207 da Lei 6.015.


Publique-se. Registre-se. Intimem-se.


Transitado em julgado, cumpridas as formalidades legais, cientifique-se a Oficial Registradora do 1º Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Blumenau/SC, e, após, arquivem-se com as cautelas de estilo. (doc. 4641975).


O suscitado, em 7-5-2020, interpôs o recurso administrativo de apelação argumentando que na escritura consta que a aquisição foi realizada "por Curt Franz Reinhold Creuz 'para seu filho Osmar Creuz', gravando assim a doação com nítida cláusula de incomunicabilidade, não presumida, mas expressa" e que foi o único a assinar o instrumento público, de modo que apenas o regime de bens não é suficiente para fazer com que a doação se comunique (doc. 4666488).


A suscitante apresentou contrarrazões (doc. 4774936).


Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sr. Dr. Eliana Volcato Nunes, em 15-7-2020, que entendeu não haver interesse ministerial (doc. 4788292).


É o relatório.


VOTO


Trata-se de recurso interposto por Osmar Creuz contra sentença de procedência de suscitação de dúvida apresentada pela Oficiala do 1º Registro de Imóveis da Comarca de Blumenau.


Em suas razões recursais, argumenta que o imóvel foi doado por seu pai, sem a finalidade de que fosse comunicado à sua esposa, tanto que não há assinatura desta na escritura pública e no registro constou expressamente que a aquisição foi realizada "para seu filho", o que configura cláusula de incomunicabilidade.


Requereu a averbação do divórcio na matrícula do bem.


Na comunhão parcial, o bem doado a um dos cônjuges não entra no patrimônio comum do casal (CC, art. 1.659, I), salvo se o doador expressamente doá-lo em favor de ambos.


Na comunhão universal, o tratamento é distinto. Aqui, há ampla comunicação, de modo que tanto os bens anteriores quanto os posteriores à celebração do casamento passam a pertencer a ambos os cônjuges. O doador, se quiser restringir a liberalidade a apenas uma das partes, terá que inserir a cláusula de incomunicabilidade no ato.


É o que dispõe o Código Civil:


Art. 1.667. O regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte.


Art. 1.668. São excluídos da comunhão:


I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;


[...]


A comunicação é a regra, de modo que as exceções devem observar o disposto no art. 1.668 do CC.


A despeito da argumentação do recorrente, inexiste cláusula de incomunicabilidade na escritura de compra e venda, tampouco no registro do imóvel.


É o que se extrai da matrícula n. 1.326:


Pela escritura pública de compra e venda, lavrada em 22.12.1986, no Livro nº 78, a fls. 016, do 3º Tabelionato desta Comarca, NORBERTO DE LEMOS, bancário, e sua mulher MIRIAM LEICHT DE LEMOS, do lar, brasileiros, [...], venderam o terreno retro identificado, e mais a casa de madeira, nele edificada, [...], a CURT FRANZ REINWOLD CREUZ, brasileiro, viúvo, industrial, [...], para seu filho: OSMAR CREUZ, médico, casado com Loreta Manemann Creuz pelo regime da Comunhão Universal de Bens [...]. (doc. 2488521 - f. 10-13)


Há apenas menção ao fato de que o imóvel foi adquirido por Curt com a finalidade de doar-lhe ao filho Osmar. Entretanto, não há qualquer menção ao termo "incomunicabilidade", requisito exigido para imposição desta cláusula.


A doutrina elucida:


Na hipótese aqui mencionada, compreende-se facilmente que a regra geral é no sentido da comunicabilidade da doação antenupcial.


A única ressalva é justamente a hipótese de haver sido gravada cláusula de incomunicabilidade, ou seja, com a ressalva expressa de impossibilidade jurídica de transmissibilidade ao cônjuge, caso em que o bem doado integrará patrimônio exclusivo do donatário em futura partilha. (GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, R. Novo curso de direito civil: direito de família. São Paulo: Editora Saraiva, 2019. Disponível em: . Acesso em: 27 Jul 2020, grifei)


Assim, a incomunicabilidade, por se tratar de cláusula restritiva, não pode ser presumida. Ela deve ser expressa.


Aliás, dispõe a Lei n. 6.015/1973:


Art. 167 - No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos.


[...]


II - a averbação:


[...]


11) das cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade impostas a imóveis, bem como da constituição de fideicomisso;


[...]


Art. 169 - Todos os atos enumerados no art. 167 são obrigatórios e efetuar-se-ão no Cartório da situação do imóvel, [...]


A inserção do termo "para o seu filho" na escritura pública tinha por objetivo apenas formalizar o contrato de doação e não supre a inexistência da cláusula.


Em caso análogo, este Tribunal já decidiu:


APELAÇÃO CÍVEL....

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