Acórdão Nº 0068782-35.2009.8.24.0023 do Quarta Câmara de Direito Civil, 06-02-2020

Número do processo0068782-35.2009.8.24.0023
Data06 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0068782-35.2009.8.24.0023, da Capital - Eduardo Luz

Relator: Des. Helio David Vieira Figueira dos Santos

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO ORDINÁRIA. ACCESSIO POSSESSIONIS. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSO DA AUTORA.

ALMEJADO RECONHECIMENTO DA AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DA PROPRIEDADE PELA SOMA DE POSSES. IMPOSSIBILIDADE NO CASO. POSSE ANTERIOR EXERCIDA PELO PROPRIETÁRIO (JUS POSSIENDI). NÃO CABIMENTO DA USUCAPIÃO. PRECEDENTES DESTA CORTE E CÂMARA.

Para aplicação do instituto da accessio possessionis, há de se diferenciar a posse exercida pelo proprietário (jus possidendi) daquela do possuidor não proprietário (jus possessionis), pois sua natureza é diferente. Enquanto a primeira resulta do domínio já consumado, a segunda funda-se na vontade de exercê-lo, de querer ser dono. Sendo o fim pretendido a aquisição originária da propriedade em decorrência do exercício pleno de um dos poderes a ela inerentes por determinado lapso temporal, sem interrupção, não há como levar em conta atos de posse exercidos por quem já era proprietário.

PRAZO DECENAL (ART. 1.242 DO CÓDIGO CIVIL) EXAURIDO NO CURSO DA LIDE. PREENCHIMENTO DO REQUISITO TEMPORAL, EM TESE. NECESSIDADE, NO ENTANTO, DE ESCLARECIMENTO DE FATOS LEVANTADOS POR CONFINANTES. DISCUSSÃO RELATIVA À SERVIDÃO SUPOSTAMENTE INCLUÍDA PELA AUTORA NA ÁREA USUCAPIENDA. JULGAMENTO ANTECIPADO QUE IMPEDIU A ELUCIDAÇÃO DA QUESTÃO. POSSE CONTESTADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REABERTURA DA INSTRUÇÃO, SOB PENA DE CERCEAMENTO DE DEFESA.

RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA CASSADA DE OFÍCIO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0068782-35.2009.8.24.0023, da comarca da Capital - Eduardo Luz Vara de Sucessões e Reg Pub da Capital em que é Apelante Marta Claudete Maria.

A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento e, de ofício, cassar a sentença e determinar a reabertura da instrução processual.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Des. José Agenor de Aragão e o Exmo. Sr. Des. André Carvalho.

Florianópolis, 6 de fevereiro de 2020.

Helio David Vieira Figueira dos Santos

Relator


RELATÓRIO

Trata-se de ação de usucapião ajuizada por Marta Cláudia Maria, perante o juízo da Vara de Sucessões e Registros Públicos desta Capital, visando a declaração de titularidade e domínio de imóvel situado no bairro Campeche, com área de 379,36 m², alegadamente adquirido por meio de contrato particular de compra e venda, firmado em 2009 com Maria Deolinda Nunes, então possuidora, que o teria recebido de herança em 1980. Diz satisfazer o requisito temporal para aquisição originária da propriedade, defendendo que a sucessão possessória deu-se de forma regular e que o exercício da posse foi ininterrupto, pacífico e sem oposição.

Citado, o confrontante Carlos Adalberto Dabul Jamil mencionou não ter conhecimento da aquisição do terreno sub judice pela requerente, esclarecendo residir em outro Estado desde 2009 (p. 83/84).

Já os confrontantes Antonio Carlos Borges de Moura e Rosa Gonzaga de Moura, por sua vez, apresentaram contestação, aduzindo que a) o lote usucapiendo constitui fração de um todo, registrado no 2º CRI da Comarca, matrícula 11.419; b) a autora não reside nem cercou o terreno; c) não há edificação nem ligação de água, luz ou telefone no imóvel; d) a metragem assinalada no levantamento topográfico exibido pela requerente leva em conta área destinada à servidão de 3,3 m existente no local há mais de 10 anos, desde a divisão dos lotes realizada pelos proprietários da gleba maior. Referiram não se opor à usucapião do terreno, desde que excluída a referida servidão da aquisição (p. 121/126).

Os confinantes Enio Luiz Reitz, Helena da Silva Reitz e Marcia Coelho, citados (p. 91 e 120) não se pronunciaram.

A autora respondeu a contestação, afirmando que a servidão não integra o lote usucapiendo (p. 141/146).

O Ministério Público apontou a dispensabilidade de sua intervenção, explicando que, por estar o imóvel registrado em cartório competente, ainda que em sua integralidade, não se enquadra a discussão nas hipóteses da Lei m. 10.257/2001 (p. 149/151).

Sobreveio sentença que extinguiu o feito sem resolução do mérito, com fulcro no art. 267, VI, do CPC/73, por entender a magistrada que a posse anterior, de Maria Deolinda Nunes e Valdir Arcelino Nunes, que venderam o lote usucapiendo à autora, não pode ser somada à desta para fins de usucapião, vez que eles, na qualidade de proprietários da área maior do imóvel, não a exerciam "com um animus possendi de querer ser dono, mas sim de efetivamente o ser". Concluiu a togada, assim, que como a requerente, sozinha, não demonstrou o preenchimento do requisito temporal, não seria possível a declaração de aquisição do domínio (p. 169/172).

A autora apelou, sustentando, primordialmente, que: a) não há vedação legal à soma das posses de proprietário-possuidor e possuidor não-proprietário para efeito de reconhecimento da prescrição aquisitiva deste; b) o requisito do animus domini existe apenas para diferenciar a posse precária da posse ad usucapione; c) a uniformidade quanto ao objeto, condição para junção de posse presente e anterior, é diversa da uniformidade da natureza das posses. Argui, ademais, que ainda que se repute inviável a soma de posses no caso, há de se dar procedência à ação de usucapião, cujo efeito é simétrico ao da ação divisória que a autora teria de ingressar depois de consumar a transferência da titularidade por escritura pública, pelo princípio da instrumentalidade das formas. Requer, por isso, a reforma da sentença, para que seja declarada proprietária da área em questão (p. 175/203).

O recurso é tempestivo e está preparado (p. 204/205).

Vieram os autos a este grau de jurisdição e a PGJ, em seu...

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