Acórdão Nº 0080047-34.2009.8.24.0023 do Sexta Câmara de Direito Civil, 13-10-2020

Número do processo0080047-34.2009.8.24.0023
Data13 Outubro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0080047-34.2009.8.24.0023, da Capital

Relator: Desembargador André Luiz Dacol

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REDIBITÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. AUTORA QUE SUPOSTAMENTE ADQUIRIU VEÍCULO COMO SENDO ZERO QUILÔMETRO E, EM RAZÃO DE DEFEITO NO AUTOMÓVEL, DESCOBRIU QUE SE TRATAVA DE SEMINOVO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

IRRESIGNAÇÃO DA PARTE DEMANDANTE. CONVERSA ACOSTADA À EXORDIAL, REALIZADA PELA AUTORA COM FUNCIONÁRIOS DA RÉ. VALIDADE COMO PROVA, POR TER SIDO GRAVADA POR UM DOS INTERLOCUTORES E NÃO VERSAR SOBRE QUESTÃO SIGILOSA. ADEMAIS, CONFIRMAÇÃO PELA RÉ, EM AUDIÊNCIA, DE QUE AS VOZES DA GRAVAÇÃO SÃO DE SEUS PREPOSTOS. MÍDIA EM QUE RESTA EVIDENTE QUE O VEÍCULO FOI VENDIDO COMO ZERO QUILÔMETRO À AUTORA, MUITO EMBORA TIVESSE SIDO VENDIDO A OUTRA PESSOA ANTERIORMENTE, RETIRADO DA LOJA E DEVOLVIDO POR DEFEITO NO AR CONDICIONADO. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENVIADA PELA DEMANDANTE AFIRMANDO TER DESCOBERTO O FATO, POSTULANDO A SUBSTITUIÇÃO POR OUTRO COM AS MESMAS CARACTERÍSTICAS OU O PAGAMENTO DA QUANTIA EQUIVALENTE À DESVALORIZAÇÃO DO CARRO ENTREGUE. COMUNICAÇÃO NÃO RESPONDIDA PELA RÉ. PROVA TESTEMUNHAL, AINDA, QUE CORROBORA A VERSÃO DA AUTORA DE QUE BUSCAVA UM CARRO ZERO QUILÔMETRO. PARTE DEMANDADA QUE NÃO LOGRA ÊXITO EM DEMONSTRAR QUE A CONSUMIDORA TINHA CIÊNCIA DE QUE ESTAVA COMPRANDO UM CARRO SEMINOVO, INCUMBÊNCIA QUE LHE CABIA POR FORÇA DO ART. 373, II, DO CPC. ADEMAIS, INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA QUE AMPARA A CONSUMIDORA. VIOLAÇÃO AO DIREITO DE INFORMAÇÃO EVIDENCIADA. VÍCIO REDIBITÓRIO NO AUTOMÓVEL CARACTERIZADO. OBRIGAÇÃO DA PARTE DEMANDADA EM REPARAR A AUTORA PELAS PERDAS E DANOS SOFRIDOS, CONSUBSTANCIADA NA DIFERENÇA ENTRE O VALOR DE MERCADO, À ÉPOCA, DE UM VEÍCULO NOVO E AQUELE EFETIVAMENTE ENTREGUE À CONSUMIDORA, ACRESCIDA DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS.

DANO MORAL. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO USADO COMO SE NOVO FOSSE QUE, POR SI, É INCAPAZ DE GERAR ABALO ANÍMICO. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. CONSUMIDORA QUE USUFRUI DO BEM QUE LHE FORA ENTREGUE SEM QUALQUER RESTRIÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE DA PARTE POSTULANTE. MERO DISSABOR. AUSÊNCIA DE DEVER INDENIZATÓRIO.

ÔNUS SUCUMBENCIAIS. REDISTRIBUIÇÃO QUE SE IMPÕE COMO CONSECTÁRIO LÓGICO DA REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA.

RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0080047-34.2009.8.24.0023, da comarca da Capital 3ª Vara Cível em que é Apelante Andreza Bordin e Apelado Repecon Automóveis Ltda.

A Sexta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso.

Presidiu o julgamento, realizado nesta data, a Exma. Sra. Desa. Denise Volpato, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. André Carvalho.

Florianópolis, 13 de outubro de 2020.

Desembargador André Luiz Dacol

Relator

RELATÓRIO

Andreza Bordin aforou a presente "Ação redibitória c/c indenização por perdas e danos c/c danos morais" em face de Repecon Automóveis Ltda., relatando, em síntese, que adquiriu junto à requerida, em 19/6/09, um veículo zero quilômetro da marca Fiat, modelo Línea Dualogic 16 V, cor prata Bari, chassi n. 9BD1105559150660, ano/modelo 2009/2009, RENAVAM n. 165006, placas FER 0002, pelo valor de R$ 54.700,00.

Contudo, não obstante ter adquirido um veículo novo, ao receber o bem verificou que no documento constava como proprietário anterior o sócio da ré, Fernando Nienkotter, e que, ao questionar a demandada a respeito, esta informou tratar-se de procedimentos internos para recebimento pela empresa e que tal situação se justificava para fins comerciais em virtude dos preços praticados.

Disse que, para a sua surpresa, logo o veículo começou a apresentar problemas no ar condicionado, que culminava com o vazamento de água em seu interior, encharcando os carpetes, mesmo após os primeiros consertos realizados pela parte contrária.

Contou, ainda, que tentou utilizar os serviços disponibilizados pela montadora Fiat, denominado "CONFIAT", mas foi informada pela atendente que o automóvel já teve outro proprietário e que, pelo fato de não estar registrado na montadora em seu nome, não poderia utilizar os benefícios que teria caso tivesse adquirido um veículo zero.

Também sustentou ter descoberto que o mencionado carro já havia sido adquirido por Ulisses Marlon Severino, em 25/4/09, que o levou até a cidade onde residia (Rio do Sul/SC) e que, após inúmeros problemas apresentados no veículo, devolveu-o e exigiu a substituição por outro com as mesmas características.

Nesse cenário, aduziu que se dirigiu até a sede da requerida exigindo a troca do automóvel por outro, mas que não foi atendida. Salientou que realizou uma reunião para esclarecer a situação, na qual estavam presentes seu esposo, o vendedor e o gerente da ré, a qual foi gravada, constando a confissão dos funcionários (gravação acostada no feito).

Informou, ainda, ter enviado notificação extrajudicial à demandada, em 5/11/09, a qual permaneceu inerte.

Assim, pretendeu a condenação da ré ao pagamento de danos materiais no importe de R$ 5.470,00, correspondente à diferença entre o valor de mercado do carro novo supostamente adquirido e o efetivamente recebido. Pugnou, ainda, pela condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, argumentando ter sofrido situações de vexame perante terceiros, oriundas do golpe sofrido e ter passado por humilhação ao descobrir ter sido enganada pela requerida.

Valorou a causa e juntou documentos.

Citada, a ré apresentou contestação. Preliminarmente, requereu a devolução do prazo de contestação porquanto não lhe foi garantido o acesso à mídia acostada pela autora, referente à gravação de uma suposta conversa havida com os representantes da empresa requerida, os quais, segundo ela, teriam admitido o fato gerador do seu pedido.

No mérito, argumenta que a nota fiscal de fl. 21, juntada pela própria autora, per se, põe fim a sua pretensão, uma vez que se observa claramente a expressão "venda de veículo usado". Asseverou que, de fato, a demandante compareceu a uma de suas lojas para adquirir um veículo e que, durante as apresentações, o vendedor lhe ofereceu o automóvel descrito na peça inaugural pelo valor de R$ 54.700,00, pois, apesar de não ser um veículo zero quilômetro, era um carro extremamente novo. Nessa toada, afirmou que a proposta foi aceita e o negócio foi fechado.

Confirmou a tese autoral de que o carro teria sido vendido a terceira pessoa, que o comprou em um sábado e devolveu na segunda-feira em razão de ter apresentado problemas no ar condicionado, contudo, realizados os reparos pelo fabricante, um dos proprietários da ré, Fernando Nienkotter, adquiriu o veículo, passando-o inclusive para seu nome. Pontuou que a situação não foi escondida da demandante.

Frisou ser impossível o alegado dano material na hipótese, consistente na diferença existente entre o valor pago e o de um veículo zero quilômetro de idêntica característica, pois somente teria esse direito se tivesse pago o valor equivalente a de um veículo zero quilômetro (R$ 61.500,00) e recebido um usado, mas, no caso, pagou o equivalente a um veículo usado e, por isso, não há o que ser reembolsado.

Quanto ao dano moral, disse que a questão não transcendeu os limites de sua individualidade, de modo a causar-lhe desonra ou humilhação pública e que o valor pleiteado é exagerado.

Por derradeiro, rogou pelo acolhimento da preliminar, produção de provas e improcedência da ação.

Réplica às fls. 80-85.

As partes foram intimadas para especificarem as provas que pretendiam produzir.

Designada audiência conciliatória, restou inexitosa.

A sentença, prolatada às fls. 116-133, julgou procedentes os pedidos iniciais. Todavia, foi cassada por esta Corte de Justiça em razão do acolhimento da tese da requerida de cerceamento de defesa, por conta do julgamento antecipado da lide (fls.164-172).

À fl. 177 foi designada audiência de instrução e julgamento.

A autora apresentou o rol de testemunhas à fl. 181 e a ré à fl. 183, reiterando o pedido de apreciação da prefacial arguida na contestação, haja vista que até aquele momento não foi possível obter cópia ou acesso ao conteúdo da mídia acondicionada no Cartório.

Na audiência, foi colhido o depoimento pessoal do representante da ré e ouvidas três testemunhas por meio do sistema audiovisual. As alegações finais foram orais.

A sentença, prolatada em audiência (fls. 194-197), decidiu da seguinte forma:

Ante o exposto, julgo improcedente os pedidos formulados na inicial e, em consequência, condeno a autora ao pagamento das despesas processuais, bem como honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 2.000,00 considerando o longo trâmite processual, inclusive com necessidade anterior de recurso à Superior Instância, bem como a perda econômica evitada.

Inconformada, a autora apelou (fls. 203-232). Sustentou que a gravação juntada com a peça inaugural não deixa qualquer dúvida de que foi enganada, haja vista que adquiriu um carro zero quilômetro e recebeu um que, posteriormente, descobriu ser usado.

Esclareceu que a mencionada mídia se refere à conversa realizada em reunião após descobrir que o automóvel que adquiriu teve um proprietário anterior e que havia sido enganada. Pontuou que a conversa ocorreu entre a apelante, seu marido, o vendedor (Jair) e o gerente (Odail) da ré. A fim de comprovar o arguido, transcreveu trechos da conversa.

Assim, afirmou que na conversa o vendedor da recorrida confirma que para ele o carro vendido era novo e que não havia saído da revenda, enquanto o gerente da apelada (Odail) afirma, inúmeras vezes, que o carro vendido foi um zero quilômetro e não um usado.

Narrou que foi tão enganada que, quando da entrega do automóvel, o hodômetro estava zerado. Também ressaltou que o preposto da ré, em seu depoimento pessoal, informa que, pelo que sabe, o hodômetro não estava zerado e que isso estaria registrado.

Contou que na...

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