Acórdão Nº 0080842-61.2009.8.24.0113 do Quarta Câmara de Direito Público, 15-12-2022

Número do processo0080842-61.2009.8.24.0113
Data15 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0080842-61.2009.8.24.0113/SC

RELATORA: Desembargadora VERA LÚCIA FERREIRA COPETTI

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA APELANTE: WAGNER DE MIRANDA RÉU: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuida-se, na origem, de "ação de indenização por danos materiais, estéticos e morais" ajuizada por Wagner de Miranda em face do Estado de Santa Catarina, objetivando a condenação do réu ao pagamento dos danos sofridos em razão de acidente de trânsito, causado supostamente por policial militar.

Narra o autor, na exordial, que, em 12/07/2009, por volta das 19:30 horas, trafegava com sua motocicleta em via pública na cidade de Camboriú, quando foi surpreendido por uma viatura da Polícia Militar, a qual invadiu a contra-mão de direção, abalroando a lateral esquerda da motocicleta que conduzia e ocasionando sua queda. Sustenta que, em decorrência do acidente, sofreu fratura em dois ossos da perna esquerda, precisou ser submetido a duas cirurgias para implantação de placas de sustentação e foi afastado de suas atividades por tempo indefinido.

Por tais motivos, postula a condenação do Estado ao pagamento de indenização pelos danos materiais, morais e estéticos causados por agente público, bem como lucros cessantes e pensão mensal, enquanto persistir sua incapacidade para o trabalho (Evento 120, PET2/8).

Citado, o Estado de Santa Catarina apresentou contrarrazões, alegando culpa exclusiva da vítima e defendendo que o acidente não teria ocorrido se o autor estivesse trafegando normalmente pela sua mão de direção, sem realizar qualquer manobra proibida ou tentado se evadir da abordagem policial, razão pela qual pugna pela total improcedência dos pedidos (Evento 123, CONT68/78).

Houve réplica (Evento 120, RÉPLICA84/86).

Indeferido o pedido de denunciação da lide (Evento 120, DEC88), foi interposto agravo de instrumento que foi convertido em retido nos autos (Evento 120, ACOR269/276).

Deferida a produção de prova pericial ( Evento 120, DESP115), o autor trouxe aos autos cópia da sentença penal pela qual, pelos mesmos fatos aqui apurados, o Policial Militar João Flaviano foi condenado ao cumprimento de pena privativa de liberdade (Evento 120, PET146/162 e Evento 120, ANEXO223/244).

Juntado o laudo pericial (Evento 120, INF202/205), sobre a qual as manifestaram-se partes (Evento 120, PET209/211 e Evento 120, PET213/214), sobreveio a sentença de parcial procedência (Evento 120, SENT248/262), nos seguintes termos:

Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO proposta por WAGNER DE MIRANDA em face do ESTADO DE SANTA CATARINA, para:

A) CONDENAR o Estado réu ao pagamento, em favor do autor, de INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS, no valor de R$20.000,00 (vinte mil reais), corrigido monetariamente a partir desta decisão (Súmula 362/STJ), e acrescido de juros legais a contar de 12.07.2009 (Súmula 54/STJ);

B) CONDENAR o demandado ao PAGAMENTO, em favor do demandante, de INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, estes em relação aos GASTOS MÉDICOS, HOSPITALARES e com MEDICAMENTOS, tudo a ser apurado EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA POR TÓPICOS;

C) CONDENAR o requerido ao PAGAMENTO, em favor do requerente, dos LUCROS CESSANTES, consistentes na DIFERENÇA entre o SALÁRIO que este percebia à época do sinistro e o valor recebido mensalmente à título de AUXÍLIO DOENÇA, até que cesse sua incapacidade laboral, tudo a ser apurado em LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA, com a devida correção e juros legais;

D) INDEFERIR o pedido de PENSÃO MENSAL;

E) Por fim, DECLARAR EXTINTO O FEITO, COM A RESOLUÇÃO DO MÉRITO.

Condeno, ainda, o Estado réu ao pagamento dos honorários do patrono da parte autora (sucumbência), fixando estes em R$3.000,00 (três mil reais) [...]

Irresignado, o Estado de Santa Catarina interpôs recurso de apelação, oportunidade em que requereu, preliminarmente, a apreciação do agravo retido interposto contra a decisão que indeferiu a denunciação à lide do policial militar que dirigia a viatura envolvida no acidente. Na sequência, defende a anulação da sentença por cerceamento de defesa. No mérito, sustenta que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima, não se configurando a responsabilidade civil. Pugna, também, pela exclusão da condenação pelos danos materiais, visto que tais gastos foram totalmente desnecessários, uma vez que o autor poderia perfeitamente ser atendido pelo Sistema Único de Saúde; pela improcedência do pedido de lucros cessantes, ante a ausência de prova de que, na data do acidente, realmente exercia atividade laboral e, ainda, aduz a inexistência de dano moral e estético a ser indenizado. Por fim, subsidiariamente, pede seja fixado como dies a quo para a contagem dos juros de mora e correção a data do trânsito em julgado, bem como a redução dos honorários advocatícios sucumbenciais (Evento 135).

Wagner de Miranda também interpôs apelo, requerendo, em suma, a majoração do quantum arbitrado a título de indenização pelos danos morais e estéticos, bem como que os honorários de sucumbência sejam fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (Evento 136).

As partes apresentaram contrarrazões (Eventos 139 e 144).

Instada, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Paulo Cezar Ramos de Oliveira, entendeu pela desnecessidade de manifestação ministerial no feito (Evento 18, Eproc2G).

VOTO

Quanto ao juízo de admissibilidade, verifica-se que as pretensões recursais preenchem todos os pressupostos processuais intrínsecos e extrínsecos, razão pela qual devem ser conhecidas.

Trata-se de apelações cíveis interpostas em face da sentença proferida nos autos da ação indenizatória n. 0080842-61.2009.8.24.0113, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados por Wagner de Miranda em face do Estado de Santa Catarina, condenando o réu ao pagamento de danos morais e estéticos, na quantia de R$20.000,00; danos materiais e lucros cessantes, a serem apurados em liquidação de sentença. e, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em R$3.000,00.

Passo à análise dos recursos.

1. Do recurso do Estado de Santa Catarina

1.1 Do agravo retido

De início, em sede de apelação, o Estado postulou o julgamento do agravo retido, interposto no Evento 125, por meio do qual se insurge contra o indeferimento do pedido de denunciação da lide ao agente público envolvido no acidente.

Quanto ao juízo de admissibilidade, conheço do agravo retido interposto pelo Estado de Santa Catarina, diante do cumprimento do disposto no art. 523 do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época da prática do ato processual.

Adianto que a pretensão de inclusão do policial militar, suposto causador do sinistro, como parte ré no feito, é de ser negado.

A respeito, já decidiu este e. Tribunal que, nos casos de ação de indenização em face do Estado, fundada no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, a denunciação da lide do agente público não é considerada obrigatória; veja-se:

APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO ENTRE VIATURA POLICIAL E MOTOCICLETA, NO MOMENTO DA PERSEGUIÇÃO. DENUNCIAÇÃO À LIDE DO POLICIAL CONDUTOR. DESNECESSIDADE. DIREITO DE REGRESSO DO ENTE PÚBLICO EM RELAÇÃO AOS SEUS AGENTES. ARTIGO 37, § 6º, CF. A denunciação à lide do servidor público nos casos de indenização fundada na responsabilidade objetiva do Estado não deve ser considerada como obrigatória, pois impõe ao autor manifesto prejuízo à celeridade na prestação jurisdicional. Haveria em um mesmo processo, além da discussão sobre a responsabilidade objetiva referente à lide originária, a necessidade da verificação da responsabilidade subjetiva entre o ente público e o agente causador do dano, a qual é desnecessária e irrelevante para o eventual ressarcimento do particular. Ademais, o direito de regresso do ente público em relação ao servidor, nos casos de dolo ou culpa, é assegurado no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, o qual permanece inalterado ainda que inadmitida a denunciação da lide (REsp 1089955/RJ, Rel. Min, Denise Arruda, j. 03-11-2009)(Agravo de Instrumento n. 2014.006364-1, de Brusque, rel. Des. Cid Goulart, j. 17-03-2015) [...](Apelação Cível n. 0003974-08.2012.8.24.0058, de São Bento do Sul, rel. Des. Subst. Júlio César Knoll, j. 27-9-2016). (grifei)

APELAÇÕES CÍVEIS E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS CAUSADOS EM FACE DE ACIDENTE DE TRÂNSITO. PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INCONFORMISMO DAS PARTES. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DEFERIDA AO SEGUNDO DEMANDANDO. HIPÓTESE DO ART. 7º DA LEI N. 1.060/50 NÃO CONFIGURADA. BENESSE MANTIDA. DENUNCIAÇÃO À LIDE DO AGENTE ESTATAL. PESSOA QUE JÁ INTEGRA A DEMANDA. PLEITO CONSIDERADO PREJUDICADO PELO JUÍZO SINGULAR. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO. MATÉRIA PRECLUSA. ADEMAIS, DENUNCIAÇÃO NÃO OBRIGATÓRIA. POSTULAÇÃO REJEITADA. Não há falar em denunciação à lide de preposto que já figura no processo como réu -, a qual, inclusive, foi considerada prejudicada pelo juízo singular, sem qualquer insurgência em face do interlocutório, operando-se, assim, a preclusão sobre a matéria. Ademais, nos casos de ação de indenização em face do Estado fundada no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, a denunciação à lide do agente público não é considerada obrigatória. [...](TJSC, Apelação Cível n. 0012237-23.2010.8.24.0018, de Chapecó, rel. Odson Cardoso Filho, Quarta Câmara de Direito Público, j. 13-12-2018).

APELAÇÕES CÍVEIS E REEXAME NECESSÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. ABUSO DE AUTORIDADE. EXCESSO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. AGRAVO RETIDO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. POLICIAL MILITAR RESPONSÁVEL PELO DANO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO AUTOR. ECONOMIA E EFICIÊNCIA PROCESSUAL. AGRAVO RETIDO CONHECIDO E DESPROVIDO. "Em regra, a integração da lide pelos servidores públicos, requerida pela Administração através de pedido de denunciação da lide, introduz discussão acerca da culpa ou dolo daqueles. Todavia, excepcionalmente se autoriza a adoção dessa medida quando não há possibilidade...

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