Acórdão Nº 0131137-16.2013.8.24.0064 do Terceira Câmara de Direito Público, 12-07-2022

Número do processo0131137-16.2013.8.24.0064
Data12 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0131137-16.2013.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN APELADO: QUEOP'S EXECUTIVE'S CENTER

RELATÓRIO

Na Comarca de São José, Edifício Queop's Executive's Center ajuizou "ação de consignação em pagamento c/c inexistência de relação jurídica c/c adequação de cláusula contratual c/c repetição de indébito" contra Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, objetivando obter a quitação das faturas decorrentes do fornecimento de água, com medição por hidrômetro único, pelo consumo real e não pelo sistema de economias, conforme pretende a parte ré.

Sustentou que a leitura do consumo de água é feita através de único medidor e a tarifa a ser cobrada deveria se pautar com base no consumo real; que a ré está cobrando indevidamente valores do demandante, porquanto efetua a cobrança com base no número de unidades autônomas do condomínio; que a cobrança é indevida, porque não se refere ao valor efetivamente consumido pelo demandante; que a ré deve ser condenada a devolver os valores pagos indevidamente pelo autor. Requereu, por fim, a concessão dos benefícios da gratuidade da justiça, a procedência dos pedidos exordiais, com a condenação da CASAN ao pagamento de custas e honorários advocatícios.

Foi deferida a gratuidade da justiça almejada.

Citada, a CASAN contestou arguindo que, na hipótese dos autos, prevalece o Direito Administrativo sobre o Código de Defesa do Consumidor; que a cobrança pelo número de unidades autônomas é lícita, porque corresponde ao sistema de economias; que o pedido referente à restituição de valores deve ser afastado; que deve ser aplicada a prescrição trienal.

Impugnados os argumentos da contestação, foi proferida sentença, cuja parte dispositiva restou assim fundamentada:

"[...]

"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados nessa ação de consignação em pagamento c/c inexistência de relação jurídica c/c adequação de cláusula contratual c/c repetição de indébito ajuizada por Edificio Quéops Executive's Center contra Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - Casan, para:

"1) Declarar a ilegalidade da cobrança de tarifa de água no valor do consumo mínimo multiplicado pelo número de economias existentes no imóvel.

"2) Determinar que a ré Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - Casan adote o sistema de cobrança com base no consumo de água registrado no hidrômetro do autor Edificio Quéops Executive's Center.

"3) Após a apuração em liquidação de sentença, DETERMINO o levantamento dos valores depositados nos autos pelo autor da quantia paga em excesso e, após, DETERMINO a expedição de alvará em favor da parte ré do montante realmente devido.

"4) Condenar a ré à repetição do indébito, de forma simples, nos termos da fundamentação supra, fazendo incidir correção monetária, pelo INPC, a contar do vencimento de cada fatura, e juros da mora iguais a 1% ao mês da citação.

"Tendo em vista a sucumbência mínima do autor, condeno a ré, ainda, ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o montante do numerário a apontado no item 4, atualizado. Observe-se em relação à ré a redução/isenção prevista no Regimento de Custas.

"Publique-se. Registre-se. Intimem-se. [...]" (Evento 54, SENT319, autos principais - grifo original).

Inconformada, a CASAN apelou repisando os termos expostos na contestação acerca da aplicação da prescrição trienal e da legalidade no critério de faturamento.

Por sua vez, a parte autora apresentou recurso adesivo em que postulou a reforma parcial da sentença para que a empresa fornecedora de água seja condenada a devolver, em dobro, a quantia indevidamente cobrada.

Intimadas as partes, apenas a CASAN apresentou contrarrazões.

Os autos subiram a esta Corte de Justiça, perante a qual a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra da Exma. Srª. Drª. Sonia Maria Demeda Groisman Piardi, deixou de manifestar-se por considerar ausente o interesse público que justificasse sua intervenção.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que, nos autos da "ação de consignação em pagamento c/c inexistência de relação jurídica c/c adequação de cláusula contratual c/c repetição de indébito" proposta pelo Edifício Queop's Executive's Center contra Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, julgou procedentes os pedidos exordiais, condenando a concessionária ré ao pagamento de custas e honorários advocatícios.

Da prescrição

Inicialmente, a CASAN insurge-se aduzindo que o prazo prescricional aplicável ao caso em comento é de 3 (três) anos, consoante o disposto no art. 206, § 3º, inciso IV, do Código Civil.

Razão não lhe assiste.

Isso porque, a matéria já fora submetida à análise desta Corte de Justiça, que em caso análogo se pronunciou afirmando que "A tese de prescrição trazida pela concessionária não vinga, haja vista que o prazo aplicável ao caso é decenal, no termos do art. 205 do Código Civil. Foi, aliás, o que definiu o STJ por ocasião do julgamento do REsp n. 1.113.403/RJ sob a sistemática dos recursos repetitivos, o que gerou a Súmula 412, que associa a prescrição (nos casos de tarifas de água) àquele previsto no Código Civil (hoje, 10 anos, na falta de regra específica), aspecto detalhado no REsp Repetitivo 1.117.903-RS, rel. Min. Luiz Fux). Logo, não há como equiparar o caso a 'ressarcimento por enriquecimento sem causa' e seu lapso de três anos (do art. 206, § 3º, inc. IV, do Código Civil)" (TJSC, Apelação Cível n. 0313976-93.2017.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. em 6.9.2018).

E, ainda:

"CONSUMIDOR - FORNECIMENTO DE ÁGUA - SISTEMA DE ECONOMIAS - ILEGALIDADE - REPETIÇÃO DE INDÉBITO NA FORMA SIMPLES - PRESCRIÇÃO DECENAL.

"É ilícita a cobrança de tarifa de água pelo valor mínimo multiplicado pelo número de economias do imóvel (STJ, Tema 414). Já a prescrição é atualmente decenal, pois se rege pelo Código Civil. Na ausência de lapso peculiar, vale o tempo mais amplo (Súmula 412 do STJ; Tema 252). Repetição de indébito como consequência natural que deve se dar na forma simples, ausente a comprovação de má-fé. Precedentes. Recurso provido para assegurar a devolução simples." (TJSC, Apelação Cível n. 0303368-40.2015.8.24.0012, de Caçador, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. em 6.9.2018).

"APELAÇÃO CÍVEL. CASAN. AÇÃO CONDENATÓRIA À REPETIÇÃO DE INDÉBITO. TARIFA DE ÁGUA E ESGOTO. COBRANÇA ATRAVÉS DO SISTEMA DE ECONOMIAS. CONDOMÍNIO COM HIDRÔMETRO ÚNICO. PRÁTICA ILÍCITA. PROCEDÊNCIA PARCIAL NA INSTÂNCIA DE ORIGEM. RECURSO DA CONCESSIONÁRIA RÉ. SISTEMÁTICA DE COBRANÇA ILEGAL. CONDOMÍNIO QUE POSSUI APENAS UM MEDIDOR. IMPOSSIBILIDADE DE MULTIPLICAÇÃO DA TARIFA MÍNIMA PELO NÚMERO DE UNIDADES AUTÔNOMAS. FATURAMENTO DEVIDO PELO CONSUMO REAL. POSIÇÃO FIRMADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM RECURSO REPETITIVO (RESP N. 1.166.561/RJ - TEMA 414/STJ). SENTENÇA MANTIDA NESSE ASPECTO.

"É pacífico o entendimento no Superior Tribunal de Justiça segundo o qual é ilegal a cobrança de tarifa de água pela tarifa mínima multiplicada pelo número de economias quando existir um único hidrômetro no local. (STJ, AREsp 612.484/RJ-AgInt, rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, j. em 13.9.2016)."

"PRESCRIÇÃO. PRAZO DECENAL NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 E VINTENÁRIO SOB A ÉGIDE DO DIPLOMA ANTERIOR. EXEGESE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM RECURSO REPETITIVO (RESP N. 1.532.514/SP - TEMA 932/STJ). PRESCRIÇÃO VERIFICADA QUANTO À PRETENSÃO DE RESTITUIÇÃO DOS PAGAMENTOS EFETUADOS NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 (ART. 2.028 DO CC/2002). DECISÃO REFORMADA NO PONTO.

"Segundo entendimento assente, 'o prazo prescricional para as ações de repetição de indébito relativo às tarifas de serviços de água e esgoto cobradas indevidamente é de: (a) 20 (vinte) anos, na forma do art. 177 do Código Civil de 1916; ou (b) 10 (dez) anos, tal como previsto no art. 205 do Código Civil de 2002, observando-se a regra de direito intertemporal, estabelecida no art. 2.028 do Código Civil de 2002. (STJ, REsp 1.532.514/SP, rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, j. 10-05-2017) (...)." (TJSC, Apelação Cível n. 0005319-80.2013.8.24.0023, da Capital, rel. Des. André Carvalho, Primeira Câmara de Direito Civil, j. em 22.3.2018).

Portanto, o prazo prescricional para pleitear a devolução dos valores indevidamente cobrados, pelos serviços prestados por concessionária de serviço público de água e esgoto, deve ser o prazo geral do Código Civil de 2002, correspondente a 10 (dez) anos, com base no art. 205, do referido diploma: "A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor".

Assim, correta a sentença no tocante aos prazos prescricionais.

Do mérito

Primeiramente, cumpre salientar que relação jurídica entre a concessionária de serviço público e o usuário final para o fornecimento de serviços públicos essenciais, tais como água e tratamento de esgoto, é...

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