Acórdão nº 0152419-33.2015.8.14.0060 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Penal, 27-11-2023

Data de Julgamento27 Novembro 2023
Órgão2ª Turma de Direito Penal
Year2023
Número do processo0152419-33.2015.8.14.0060
Classe processualRECURSO EM SENTIDO ESTRITO
AssuntoHomicídio Simples

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) - 0152419-33.2015.8.14.0060

RECORRENTE: CASTRO SILVA DO CARMO

RECORRIDO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargador RÔMULO JOSÉ FERREIRA NUNES

EMENTA


RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – DECISÃO DE PRONÚNCIA NOS TERMOS DOS ARTIGOS 121 CAPUT DO CPB – RECURSO DA DEFESA – IMPRONUNCIA – ABSOLVIÇÃO.LEGITIMA DEFESA - INVIABILIDADE – AUSÊNCIA DE PROVA PLENA E INESCUSÁVEL DA EXCLUDENTE DE ILICITUDE – DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE – PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA InexistÊNCIA incontrastável quanto ao real intento do AGENTE - PRONÚNCIA MERO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE.eventuais dúvidas a respeito da intenção ficam a cargo do egrégio Tribunal Popular. JUÍZ NATURAL DA CAUSA. DECISÃO DE PRONÚNCIA MANTIDA EX VI ART. 413 DO CPP - COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI – RECURSO EM SENTIDO ESTRITO CONHECIDO E IMPROVIDO – DECISÃO UNÂNIME


I – Na sentença de pronúncia, o juízo monocrático deve tecer um mero juízo de admissibilidade da denúncia, de caráter nitidamente processual, verificando as provas de materialidade e indícios da autoria delitiva. No tocante as questões relativas ao mérito da ação criminal devem ser apreciadas pelo Tribunal do Júri, a quem cabe o exame aprofundado da matéria;

II - Com efeito, conveniente asseverar que nesse momento processual, consubstanciado na admissibilidade formal da acusação se satisfaz com a prova da existência do fato e com a presença de indícios acerca da autoria. Nesse passo, a análise das circunstâncias em que o delito ocorreu, pois as asserções contidas nos recursos, visando o reconhecimento das eventuais teses da ausência de animus necandi, retrataria questão intimamente relacionada com o mérito da causa e cuja competência seria do Júri Popular, juiz natural da causa, podendo ser acolhida nesta fase somente quando ausente, de forma inquestionável, elementos de prova em sentido incriminador, caso contrário, como no caso em apreço, em face da existência de duas versões nitidamente contrapostas, quais sejam: a do recorrente e a das testemunhas, inevitavelmente a matéria deve ser submetida à apreciação da Corte Leiga, cuja competência constitucional deve ser respeitada em face do princípio do juiz natural. Precedentes do STJ;

III - Nesse contexto, em face dos fundamentos apresentados, imperioso submeter o Recorrente ao Tribunal do Júri para que aquele Órgão, como juiz natural dos crimes contra a vida em expresso mandamento constitucional, manifeste seu veredicto a respeito dos fatos;

IV - Recurso conhecido e improvido.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores da 2ª Turma de Direito Penal, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, na conformidade do voto do relator.


Desembargador Rômulo José Ferreira Nunes

Relator

RELATÓRIO

CASTRO SILVA DO CARMO, inconformado com a decisão que o pronunciou como incurso nas penas do artigo 121, caput do CPB, manejou o presente recurso em sentido Estrito (ID 14794229), objetivando a reforma decisão, (ID 13714385) prolatada pelo Juízo da Vara única da Comarca de Tome-açu/PA.

Em suas razões, a defesa do recorrente asseverou (ID 13714398) pelo reconhecimento da excludente de ilicitude (legítima defesa), uma vez que não teria sido comprovado a intenção de matar, e teria utilizado dos meios moderados para repelir injusta agressão. Por fim asseverou pela desclassificação para lesão corporal seguida de morte.


Em contrarrazões, o representante do Ministério Público pugnou pela manutenção da decisão de pronúncia (ID 14794241)

Nesta Superior Instância, o Custos Legis opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (ID 15184255).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e faço um breve resumo dos fatos constantes do processo.

Cuida-se de Recurso em Sentido Estrito interposto por CASTRO SILVA DO CARMO, em face da decisão prolatada pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Tome-açu/PA.

Noticiam os autos, que no dia 31/10/2015, por volta das 12h00, um grupo de pessoas estava ingerindo bebida alcóolica em um estabelecimento comercial denominado "Bar da Gleide" localizado neste município. Dentre as referidas pessoas, faziam-se presentes no local o Denunciado CASTRO SILVA e a vítima Edilson Gonçalves dos Santos, vulgo "Duelo", os quais, em determinado instante, iniciaram uma discussão, que teve como desfecho o Denunciado esfaqueando a vítima nas regiões do braço e do peito, ocasionando seu óbito ainda no local. Ato contínuo, o réu subiu em sua motocicleta e se evadiu do local.

Nesses termos, o juízo pronunciou CASTRO SILVA DO CARMO, nos termos do artigo 121 caput do CPB. Irresignado manejou o presente recurso em sentido estrito, objetivando a sua reforma.

É a síntese dos fatos, passo a analisar das razões do recurso.

DA MANUTENÇÃO DA DECISÃO DE PRONÚNCIA

Na espécie, para a prolação de uma decisão de pronúncia, nos termos do art.413 do CPP, basta que o juízo se convença da existência do crime e dos indícios de autoria, o que restou devidamente demonstrado no caso dos autos. No tocante a absolvição sumária somente seria possível, caso se estivesse diante de produção probatória plena, incontroversa, ou seja, quando não haja qualquer dúvida acerca da tese invocada, sob pena de usurpação da competência do Tribunal do Júri.

In casu, a prova da materialidade do crime restou evidenciada pelo Laudo de necrópsia juntado (ID 80602089), que descreveu que a vítima faleceu por conta de hemorragia interna e externa devido a ferimentos em vasos sanguíneos do braço esquerdo e pulmão esquerdo, por ação perfuro cortante, evidencias que se aliam as provas orais carreadas ao acervo processual, gravados em sistema audiovisual, como se pode observar pelas declarações prestadas por RAIMUNDO MENDES CORREA (vulgo MANO), o qual relatou:

Que, estava bebendo com amigos quando CASTRO chegou; que a vítima DUELO chegou depois, e pegou a comida e bebida de CASTRO; que CASTRO questionou DUELO, pois, em momentos antes, DUELO havia negado a ele bebida; que rapidamente CASTRO “rodou”, pegou a faca e furou DUELO; que DUELO foi “arriando” e falou “MANO, me acode”. A testemunha ainda afirmou que CASTRO havia comprado a faca no mesmo local onde todos estavam, bem como uma lanterna; que DUELO não tentou agredir CASTRO e nem estava armado. Por fim, afirmou que não estavam servindo refeição no local.

Por sua vez a testemunha GLEIDE MARIA DA SILVA, esclareceu:

Que, o réu bebia com seus amigos ANTONIO e MATA-ONÇA no estabelecimento dela; que não viu os fatos, pois havia entrado para fazer o almoço; que ouviu MATA-ONÇA gritar “irmã, o castro furou o duelo”; que correu para ver o que tinha acontecido e ANTONIO E MATA ONÇA já haviam ido embora, estando apenas CASTRO no local; que chegou a segurar a vítima para ele não cair de uma vez, mas logo depois- ele faleceu; que não viu CASTRO com faca na mão nem prestou atenção se ele estava sujo de sangue; que observou uma lesão no braço da vítima. A testemunha afirmou, ainda, que seu estabelecimento vendia churrasquinhos, e que o réu CASTRO foi servido de carne, havendo talheres na mesa

Na espécie, verificou-se, diante do acervo processual, prova da materialidade delitiva e indícios de autoria, requisitos mínimos e necessários para viabilizar a decisão de pronúncia.

DA LEGÍTIMA DEFESA

Na espécie, não restou comprovado, indene de dúvidas, que CASTRO SILVA DO CARMO, teria repelido uma injusta agressão da vítima ou de que fez uso moderado dos meios necessários para contê-la, segundo os termos apresentados pela defesa para que fosse reconhecido a excludente de ilicitude e assim alcançar a absolvição. Uma vez que a absolvição sumária ou impronúncia apenas podem ser reconhecidas, quando não houver dúvida acerca da existência de alguma dirimente ou a inexistência da materialidade do delito e da sua autoria, fatos que não ocorreram no caso em comento, segundo o ensinamento de Júlio Fabbrini Mirabete:

" A absolvição sumária nos crimes de competência do Júri exige uma prova segura, incontroversa, plena, límpida, cumpridamente demonstrada e escoimada de qualquer dúvida pertinente à justificativa ou dirimente, de tal forma que a formulação de um juízo de admissibilidade da acusação representaria uma manifesta injustiça. "(in Código de Processo Penal Interpretado, Júlio Fabbrini Mirabete, Ed. Atlas, 9ª edição, p. 1.123).

E ainda:

(...) Absolvição sumária por legítima defesa, na firme compreensão da jurisprudência e doutrina pátrias, somente há de ter lugar, quando houver prova unívoca da excludente, a demonstrá-la de forma peremptória (Código de Processo Penal, artigo 411).” (HC 25858/RS, 6ª Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 01/08/2005). (...) (HC 99.194/PE, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 17/06/2008, DJe 18/08/2008)”

Dessa maneira, inviável reconhecer a absolvição sumária, consubstanciada na legítima defesa, a qual exige prova plena e incontestável para a sua aplicação, sob pena de caracterizar usurpação da competência do júri:

“RECURSO EM SENTIDO ESTRITO HOMICÍDIO QUALIFICADO TESE DE LEGÍTIMA DEFESA VERSÃO QUE NÃO SE ENCONTRA DEMONSTRADA ESTREME DE DÚVIDAS NOS AUTOS DÚVIDA A SER DIRIMIDA PELO TRIBUNAL DO JÚRI PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO SOCIETATE RECURSO DESPROVIDO. - Havendo dúvida quanto à tese de legítima defesa, impõe-se a pronúncia do réu, pois somente o Conselho de Sentença, juiz natural e soberano da causa - constitucionalmente instituído para julgar os crimes dolosos contra a vida -, poderá dirimi-la com maior amplitude e liberdade (CPP, art. 413), adotando a vertente probatória que melhor traduza a aplicação da justiça”. (Recurso em Sentido Estrito nº 672.866-9, da 1ª Câmara Criminal do TJPR, rel. LUIZ OSÓRIO MORAES PANZA julgado em 19.08.2010).

Nesses termos, existindo indicativos de que o acusado teria sido o eventual autor do fato descrito...

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