Acórdão Nº 0300045-68.2017.8.24.0008 do Primeira Câmara de Direito Público, 27-06-2023

Número do processo0300045-68.2017.8.24.0008
Data27 Junho 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0300045-68.2017.8.24.0008/SC



RELATOR: Desembargador PEDRO MANOEL ABREU


APELANTE: TATIANA FERREIRA DOS SANTOS (EXEQUENTE) ADVOGADO(A): Antonio Carlos Marchiori (OAB SC006102) ADVOGADO(A): MARCELO SCHUSTER BUENO (OAB SC014948) ADVOGADO(A): NILSON DOS SANTOS (OAB SC016612) APELADO: MUNICÍPIO DE BLUMENAU (EXECUTADO) MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (MP)


RELATÓRIO


Cuida-se de apelação cível interposta por Tatiana Ferreira dos Santos em objeção à sentença que, nos autos do cumprimento de sentença oriunda de ação coletiva que move em face do Município de Blumenau, acolheu a impugnação ao cumprimento de sentença "para reconhecer a carência de ação da exequente, em face da sua manifesta ilegitimidade ativa ad causam".
Em sua insurgência, a apelante defende, preliminarmente, a concessão da justiça gratuita. No mérito, disse que o título executivo decorre de ação coletiva proposta pelo sindicato da categoria para assegurar a todos os servidores públicos o direito à promoção por desempenho, independentemente da data em que isso deveria ter ocorrido. Alega que a petição inicial da demanda coletiva formulou pedido mediato de condenação do Município à avaliação de todos os servidores beneficiados pela Lei Complementar n. 127/96, sem excepcionar ou excluir quaisquer das hipóteses legais, tendo este pedido sido julgado totalmente procedente. Afirma que o apelado não suscitou, em sede de contestação, qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito então vindicado, e, portanto, não pode fazê-lo agora, na fase de execução, em razão da eficácia preclusiva da coisa julgada. Destaca que as causas impeditivas da avaliação por desempenho previstas no parágrafo único do art. 21 da Lei Complementar 127 deveriam ter sido arguidas na fase de cognição, em sede de contestação, a fim de prestigiar a eficácia preclusiva da coisa julgada e a teoria do isolamento dos atos processuais. Aduz que a sentença afastou o reconhecimento de transação entre o Município e o sindicato acerca dos servidores beneficiários da progressão, o que viola os artigos 389 e 408 do Código de Processo Civil. Defende que o Município deve ser condenado ao pagamento de honorários sucumbenciais, ante o princípio da causalidade, eis que deu causa ao ajuizamento da demanda, pois forneceu a relação nominal dos beneficiários da sentença coletiva, sem qualquer ressalva superveniente. Prequestiona o art. 14, 85, 337, 389, 408, 505, 508, 525, § 1º, inciso VII, e 535, § 1º, incisos II e VII, 778, caput e 926 do Código de Processo Civil de 2015, o art. 5º, caput, incisos XXXVI e XXV, da Constituição Federal e os arts. 95 e 103, inciso III, da Lei 8.078/1990. Ao final, pugna pelo provimento do recurso para reconhecer a legitimidade para o ajuizamento da demanda, invertendo-se o ônus de sucumbência.
Em sede de contrarrazões, o apelado pugnou pela manutenção do decisum.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça não identificou na causa interesse público a justificar a sua intervenção.
Este é o relatório

VOTO


Versam os autos sobre cumprimento individual de sentença originária de ação coletiva ajuizada pelo SINTRASEB em que se determinou a concessão do avanço de duas referências nos vencimentos dos servidores municipais de Blumenau que se enquadram nos requisitos previstos para promoção por desempenho prevista no art. 20, § 9, da LCM nº127/96.
Pois bem.
Antes de adentrar ao mérito, impende analisar, preliminarmente, o pleito de concessão da justiça gratuita.
É cediço que o art. 5º da Constituição Federal inclui, dentre os direitos e garantias fundamentais, a assistência judiciária integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;
Nesse sentido, a Lei n. 1.060/1950, já previa a "concessão de assistência judiciária aos necessitados", porém, no que se refere aos requisitos para concessão e extensão dos benefícios, houve revogação pelo atual Código de Processo Civil, que, por sua vez, também trata da gratuidade da justiça da seguinte forma:
Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.
Como visto, tanto a pessoa natural quanto a pessoa jurídica com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e honorários advocatícios têm direito à gratuidade da justiça, desde que comprovada.
No âmbito desta Corte, a Primeira Câmara de Direito Público fixou, como valor mínimo que faz presumir a hipossuficiência para as custas processuais, a quantia de R$ 4.500,00 de ganhos mensais. Para valores superiores a essa quantia, é necessária a comprovação de despesas elevadas que demonstrem o comprometimento significativo da renda.
Nessas hipóteses, despesas ordinárias com energia, telefone, supermercado etc., não bastam para justificar a concessão do benefício.
A situação fática delineada nos autos, no entanto, autoriza a presunção de que a recorrente não possui condições de arcar com as custas processuais, se enquadrando na condição de insuficiência de recursos a que alude a Carta Magna e o Código de Processo Civil.
Analisando os documentos acostados aos autos, verifica-se que a parte autora é professora do Município e auferindo remuneração líquida média de R$ 1.882,12 (evento 64, ficha financeira 2), o que, à toda evidência, a impossibilita de arcar com as custas processuais.
Sobre o tema, já se decidiu:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. MOTORISTA DO SAMU. JUSTIÇA GRATUITA. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA A HIPOSSUFICIÊNCIA DO POSTULANTE. INTELIGÊNCIA DO INCISO LXXIV DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ARTS. 98 A 102 DO CPC. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO PROVIDO.A PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO FIXOU O LIMITE MÍNIMO DE R$ 4.500,00 DE GANHOS MENSAIS PARA CONSIDERAR, DESDE LOGO, PRESENTES OS REQUISITOS PARA O DEFERIMENTO DA GRATUIDADE. PARA VALORES SUPERIORES A ESSA QUANTIA, É NECESSÁRIA A COMPROVAÇÃO DE DESPESAS ELEVADAS QUE DEMONSTREM O COMPROMETIMENTO SIGNIFICATIVO DA RENDA. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5035601-70.2022.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. do signatário, Primeira Câmara de Direito Público, j. 04-10-2022).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA A HIPOSSUFICIÊNCIA DO POSTULANTE. COMPROVAÇÃO DE RENDA MENSAL LÍQUIDA, RELATIVA À APOSENTADORIA. DESNECESSIDADE DE QUE A PARTE ESTEJA EM ESTADO DE PLENA MISERABILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 5º, LXXIV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ARTS. 98 A 102 DO CPC. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5058838-70.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Jorge Luiz de Borba, Primeira Câmara de Direito Público, j. 12-04-2022).
Portanto, firme nos precedentes da Câmara, referido quantum é insuficiente para que a parte possa arcar com os dispêndios processuais, pelo que o deferimento do benefício da justiça gratuita é a medida que se impõe.
Quanto ao mérito, sem delongas, não assiste razão ao apelante.
Denota-se que a matéria em debate não é inédita na Corte. A propósito e considerando a celeridade, a economia e a unicidade da jurisprudência deste Sodalício, sem descuidar da pertinência e adequação, cumpre trazer à baila a interpretação lançada em precedente análogo da lavra do Desembargador Hélio do Valle Pereira (AC n. 0313056-04.2016.8.24.0008, julgado em 16.05.2023), cuja judiciosa fundamentação adota-se integralmente como razões de decidir, já que há identidade de teses jurídicas, mudando-se, obviamente, apenas o que deve ser mudado. Colhe-se do precedente:
Como se verá à frente, compartilho das conclusões do juízo de primeira instância ao reconhecer a ilegitimidade da exequente para se beneficiar da coisa julgada formada em âmbito coletivo. Em outros termos, há o reconhecimento de que o título executivo então constituído não alcança sua situação jurídica; tem outros destinatários, enfim. Uma das condições para o viável manejo da execução (a pertinência subjetiva) não está presente. Pouco importa, a partir daí, uma hipotética aferição do montante devido a ser apurado em liquidação. Aliás, nem sequer há montante devido (eis a diferenciação essencial), não por decorrência direta do acertamento ocorrido na fase de conhecimento, independentemente de sua natureza líquida ou ilíquida.
O debate, portanto, reside em uma etapa antecedente do raciocínio: seja qual for a compreensão externada pela Corte Superior no tema vinculante, em nenhuma medida afetará a solução do caso. A parte simplesmente não está gabaritada a pleitear a individualização da obrigação de pagar quantia fixada no título advindo da demanda proposta pelo sindicato. É questão de ordem pública, passível de reconhecimento inclusive de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição.
Sigo, por conta disso, na apreciação do recurso.
2. Na comarca, como antecipado, foi pronunciada a ilegitimidade da apelante para propor a execução individual (expediente que precedeu o CPC/15) de sentença coletiva em ação patrocinada por sindicato da categoria.
Antes de tudo, então, convém definir a extensão exata daquele título condenatório. O embate de versões se concentra especialmente na delimitação da causa de pedir e pedido do autor do feito paradigma e o preciso dispositivo da sentença que lhes guarda correspondência. A recorrente...

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