Acórdão Nº 0300049-13.2018.8.24.0092 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 26-04-2022

Número do processo0300049-13.2018.8.24.0092
Data26 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300049-13.2018.8.24.0092/SC

RELATORA: Desembargadora JANICE GOULART GARCIA UBIALLI

APELANTE: SUPERROSA LTDA APELANTE: BANCO DAYCOVAL S.A. RÉU: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuida-se de apelações cíveis interpostas por Superrosa Ltda. (Supermercado Rosa) e Banco Daycoval S.A. da sentença proferida nos autos da Ação de Revisão Contratual n. 0300049-13.2018.8.24.0092. O decisório recorrido contou com a seguinte parte dispositiva (evento 18):

Diante do exposto, julgo procedente em parte o pedido para revisar os contratos firmados pelas partes, observando-se as seguintes regras: I) avenças 37031/12, 49147/14, 54209/08, 56313/09, 66867/10, 701145/12, 70780/12, 71389/12, 73093/13, 74230-0, 75429-5, 76042-2, 76964-0 e 77455-5: substituir, na correção monetária, o CDI pelo INPC; II) pactos 37031/12, 56313/09, 66867/10, 69263/11, 70145/12, 70780/12, 71389/12 e 73093/13: proibir qualquer forma de capitalização de juros; III) cédula 49147/14: afastar a mora, vedando a incidência de encargos moratórios; IV) CCB's 79114-0, 79572-2, 80228-1: determinar que, no período de anormalidade contratual, a comissão de permanência não supere a soma dos demais encargos pactuados; V) mútuo 81503-0: reduzir os juros moratórios para 1% ao mês;VI) cédulas constantes dos itens "1" e "2": condenar o réu a restituir os montantes pagos a maior, acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês, contados da citação (CC, artigos 405 e 406), e corrigidos monetariamente (INPC) a partir da quitação, conforme apurado em liquidação por cálculos aritméticos, a teor do art. 509, § 2o, do CPC/2015.Condeno o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 20.000,00 (vinte mil reais), de acordo com os artigos 85, §2º e §8º, e 86, parágrafo único, ambos do NCPC, observados os critérios do grau de zelo do profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da causa, o trabalho realizado e o tempo exigido.

Embargos de declaração pela parte ré (evento 23), rejeitados (evento 25).

A autora apelante defende, em síntese, que: a) houve equívoco no dispositivo da sentença, porquanto "a repetição do indébito deverá ocorrer em relação a todas as Cédulas mencionadas nos itens da parte dispositiva, nas quais tenham havido alguma modificação e/ou limitação dos encargos contratuais"; b) é imperioso o afastamento "dos encargos moratórios cobrados também nos contratos extintos (e não apenas nos vigentes)"; c) é necessária a "descaracterização da mora também com relação aos contratos que se encontravam extintos quando do ajuizamento da ação e possuíam encargos de normalidade declarados abusivos"; d) o caso não comporta "fixar os honorários na forma do art. 85, § 8º do CPC", mas sim "entre 10% e 20% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º do CPC" (evento 28).

O banco apelante sustenta, em resumo: a) cerceamento de defesa, em razão do julgamento antecipado da lide; b) a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor; c) a prevalência da cláusula de eleição de foro; d) a legalidade da utilização do índice CDI contratualmente pactuado; e) que "a Apelada sabia exatamente as consequências dos seus atos, e o fez de forma livre, sem qualquer vício que permita, agora, a alteração dos termos firmados"; f) que as "taxas de juros praticadas pelo BANCO DAYCOVAL são legais, pois [...] em todos os contratos foram respeitadas a média imposta pelo Banco Central"; g) que "não há que se falar em limitação das taxas de juros expressamente pactuadas" na Cédula de Crédito Bancário n. 81503-0; h) que as cláusulas contratuais dos contratos n. 79114-0, n. 19572-2, n. 80228-1 e n. 49147/14, preveem "a cobrança dos demais encargos de mora como alternativa à cobrança da comissão de permanência", de modo que não se pode "admitir que este Apelante arque com os encargos de sucumbência sem que tenha sido demonstrado qualquer ilegalidade de sua atitude"; i) que "não há que se falar em afastamento da mora, ainda que somente sobre o contrato 49147/14"; j) a necessidade de minoração da verba honorária (evento 29).

Com as contrarrazões (eventos 34 e 35), os autos ascenderam a esta Corte.

Em sessão realizada no dia 5 de maio de 2020, a Quarta Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer de parte do recurso do banco e negar a ele provimento; conhecer do recurso da autora e dar a ele parcial provimento (evento 46).

Irresignado, o banco interpôs recurso especial (evento 32, eproc 2º grau).

Após a apresentação de contrarrazões da parte adversa (evento 45, eproc 2º grau), o 3º Vice-Presidente desta Corte de Justiça proferiu decisão monocrática inadmitindo o recurso especial (evento 61, eproc 2º grau).

Interposto agravo em recurso especial (evento 68, eproc 2º grau) e apresentadas as contrarrazões (evento 79, eproc 2º grau), o 3º Vice-Presidente desta Corte de Justiça manteve a decisão agravada e determinou a remessa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça (evento 83, eproc 2º grau).

No julgamento do agravo em recurso especial, o Ministro Raul Araújo deu provimento ao recurso especial para determinar o retorno dos autos à Corte de origem para que analise a aplicabilidade do CDC ao caso dos autos (p. 10, evento 93, eproc 2º grau). A referida decisão monocrática foi mantida pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça que negou provimento a agravo interno em sessão realizada no dia 21 de setembro de 2021 (p. 47, evento 93, eproc 2º grau).

Vieram-me os autos conclusos.

VOTO

Conforme relatado, o acórdão proferido por este Órgão Fracionário foi cassado em parte pelo Superior Tribunal de Justiça que determinou o retorno dos autos à origem para análise da aplicabilidade da legislação consumerista ao caso em apreço.

Portanto, passa-se a analisar novamente o recurso no que toca à tese de inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, bem como as relativas à revisão contratual.

Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor

Conforme inteiro teor do agravo em recurso especial interposto neste feito, a Corte Superior de Justiça fundamentou que "não incide o CDC, por ausência da figura do consumidor (art. 2º do CDC), nos casos de financiamento bancário ou de aplicação financeira com o propósito de ampliar capital de giro e atividade profissional". A corroborar, foram citados dois julgados:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO. CAPITAL DE GIRO. RELAÇÃO DE INSUMO. FATOS. REEXAME. SÚMULA N. 7/STJ. INAPLICABILIDADE. CONFISSÃO. REQUALIFICAÇÃO JURÍDICA. CÉDULA DE CRÉDITO COMERCIAL. MULTA MORATÓRIA. 10% (DEZ POR CENTO). POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. NÃO PROVIMENTO. 1. A requalificação jurídica de fatos incontroversos, seja porque constantes no acórdão recorrido, alegados e não impugnados ou confessados, não demanda reexame, de modo que não encontra o óbice de que trata o verbete n. 7 da Súmula desta Casa. 2. "A empresa que celebra contrato de mútuo bancário com a finalidade de obtenção de capital de giro não se enquadra no conceito de consumidor final previsto no art. 2º do CDC. Precedente." (AgRg no AREsp 71.538/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 28/5/2013, DJe 4/6/2013) 3. Admite-se o pacto de multa de 10% (dez por cento) em cédulas de crédito comercial. Precedentes. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1257994/CE, Rel. Ministra MARIA ISABE GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 19/11/2019, DJe 06/12/2019)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO ART. 535, II, DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA-CORRENTE FIRMADO COM PESSOA JURÍDICA. CAPITAL DE GIRO. APLICAÇÃO DO CDC AFASTADA. PRECEDENTES. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. O acórdão ora embargado tratou expressamente acerca da questão suscitada, malgrado não tenha acolhido os argumentos suscitados pela recorrente, o que não inquina a decisão recorrida do vício de omissão. 2. "Tratando-se de financiamento obtido por empresário, destinado precipuamente a incrementar a sua atividade negocial, não se podendo qualificá-lo, portanto, como destinatário final, inexistente é a pretendida relação de consumo." (REsp 218.505/MG, Relator o Min. BARROS MONTEIRO, DJ de 14/2/2000) 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 492.130/MG, de minha Relatoria, QUARTA TURMA, julgado em 19/03/2015, DJe 20/04/2015)

Dessa forma, necessário analisar se as avenças revisadas no feito tinham como objetivo o financiamento bancário ou a ampliação do capital de giro e atividade.

A Cédula de Crédito Bancário n. 54209/08, firmada em 23-1-2008, previu a concessão de crédito no valor de R$ 1.000.000,00, com prazo de pagamento de 362 dias e cessão fiduciária de direitos creditórios (doc 4, evento 1). Ainda, restou consignado na Cláusula Primeira que o valor líquido do empréstimo deveria ser utilizado para "financiamento de capital de giro ou para aquisição de bens ou serviços" (p. 9, doc 4, evento 1).

Idêntica redação constou na Cláusula Primeira da Cédula de Crédito Bancário n. 56313/09, firmada em 5-3-2009, pelo valor de R$ 600.000,00, com prazo de pagamento de 364 dias e cessão fiduciária de direitos creditórios (doc 4, evento 1); na Cédula de Crédito Bancário n. 66867/10, firmada em 29-9-2010, pelo valor de de R$ 700.000,00, com prazo de pagamento de 547 dias e garantia constituída por meio de cessão de direitos creditórios (doc 5, evento 1); na Cédula de Crédito Bancário n. 69263/11, firmada em 18-11-2011, pelo valor de R$ 500.000,00, com prazo de pagamento de 549 dias e cessão fiduciária de direitos creditórios (doc 6, evento 1); na Cédula de Crédito Bancário n. 70145/12, firmada em 18-4-2012, pelo valor de R$ 500.000,00, com prazo de pagamento de 743 dias e cessão fiduciária de direitos creditórios (doc 6, evento 1); na Cédula de Crédito Bancário n. 70780/12, firmada em 6-8-2012, pelo valor de R$ 250.000,00, com prazo de pagamento de 184 dias e cessão fiduciária de direitos creditórios (doc 6, evento 1); na Cédula de Crédito Bancário n. 71389/12...

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