Acórdão Nº 0300055-73.2017.8.24.0021 do Segunda Turma Recursal, 26-05-2020

Número do processo0300055-73.2017.8.24.0021
Data26 Maio 2020
Tribunal de OrigemCunha Porã
ÓrgãoSegunda Turma Recursal
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Segunda Turma Recursal



Recurso Inominado n. 0300055-73.2017.8.24.0021, de Cunha Porã

Relatora: Juíza Ana Karina Arruda Anzanello


RECURSO INOMINADO. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO. CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA. OBRA DE PAVIMENTAÇÃO ASFÁLTICA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.

INSURGÊNCIA DO MUNICÍPIO DE CUNHA PORÃ. TRIBUTO INSTITUÍDO DENTRO DA LEGALIDADE. PREVISÃO DE COBRANÇA NO CÓDIGO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL. EFETIVA VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL. HONORÁRIOS EM DESRESPEITO AO ART. 85, §3º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. CORREÇÃO MONETÁRIA COM BASE NO ART. 1º F DA LEI 9.494/97.

AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E PUBLICIDADE. NÃO PRODUÇÃO DE EFEITOS NO MUNDO JURÍDICO. CÓDIGO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL. LEI GENÉRICA QUE NÃO SUPRE A EXIGÊNCIA DE LEI ESPECÍFICA PARA INSTITUIÇÃO E COBRANÇA DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA. "De acordo com a orientação emanada do Superior Tribunal de Justiça e pacificada pelo Grupo de Câmaras de Direito Público deste Tribunal, a instituição de contribuição de melhoria depende de lei prévia e específica para cada obra realizada pelo poder público, não sendo suficiente a sua previsão genérica na legislação tributária local" (TJSC, Apelação Cível n. 0300444-67.2015.8.24.0073, de Timbó, rel. Des. Jaime Ramos, Terceira Câmara de Direito Público, j. 03-04-2018). CORREÇÃO MONETÁRIA QUE DEVE SE DAR PELO IPCA-E, EM CONFORMIDADE COM ENTENDIMENTO DA SÚMULA 810 DO STF. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS EM PRIMEIRO GRAU.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado Criminal n. 0300055-73.2017.8.24.0021, da comarca de Cunha Porã Vara Única, em que é Recorrente Município de Cunha Porã e Recorrido Laurindo Alberto Bôer.


A Segunda Turma Recursal decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso, dar-lhe parcial provimento e, de ofício, aplicar o IPCA-E como índice de correção monetária. Sem custas e honorários advocatícios.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Juiz Marco Aurélio Ghisi Machado, com voto e dele participou Exmo. Sr. Juiz Vitoraldo Bridi.


Florianópolis, 26 de maio de 2020.


Ana Karina Arruda Anzanello

Relatora






















RELATÓRIO

O Município de Cunha Porã interpôs Recurso Inominado contra sentença de fls. 194 - 199 que julgou procedente os pedidos formulados nos autos da Ação Anulatória de Débito Fiscal c/c Repetição do Indébito, proposta por Laurindo Alberto Bôer, declarando inexigível a contribuição de melhoria e condenou a restituir os valores pagos indevidamente pela parte autora.

Em suas razões recursais, em suma, alega existência de previsão expressa na lei municipal, em conformidade com o art. 82 do Código Tributário Nacional, autorizando a cobrança do tributo. Sustenta que a pavimentação gerou valorização comercial do imóvel.

Diz que os honorários fixados devem ser minorados para atender o disposto no art. 85,§3º do Código de Processo Civil e que sobre a correção monetária, caso mantida a decisão, deve incidir os consectários previsto no art. 1ºF da Lei n. 9.494/97.

Requer, ao final, o provimento do recurso para julgar improcedente os pedidos formulados na inicial, nos termos expostos nas razões recursais e, caso mantida a decisão de primeiro grau, que incida sobre a correção monetária, os consectários do art. 1ºF da Lei n. 9.494/97. (fls. 202-208)

Contrarrazões apresentadas às fls. 211-215.

Proferida decisão monocrática às fls. 226-232 que converteu o apelo em recurso inominado e remeteu os presentes autos para Turma Recursal..

Este é o relatório.








VOTO

Inicialmente, encontram-se presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, o reclamo merece ser conhecido e recebido no seu efeito devolutivo, passando-se, desta forma, à respectiva análise.

Extrai-se da leitura dos autos, que o Município de Cunha Porã instituiu, por meio do Edital 002/2011, cobrança do Tributo de Melhoria em razão da pavimentação da rua 13 de maio, no valor de R$ 5.070,00 (cinco mil e setenta reais), sem que houvesse edição de legislação prévia.

A Constituição Federal em seu art. 150, III, b, dita que:


Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

III - cobrar tributos:

a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou


Ademais, o Código Tributário Nacional, em atenção ao princípio da legalidade tributária (art. 150, I da CF e art. 128, I da Constituição Estadual), veda a instituição ou aumento de tributo sem prévia lei que o estabeleça, in verbis:


Art. 82. A lei relativa à contribuição de melhoria observará os seguintes requisitos mínimos:

I - publicação prévia dos seguintes elementos:

a) memorial descritivo do projeto;

b) orçamento do custo da obra;

c) determinação da parcela do custo da obra a ser financiada pela contribuição;

d) delimitação da zona beneficiada;

e) determinação do fator de absorção do benefício da valorização para toda a zona ou para cada uma das áreas diferenciadas, nela contidas;

II - fixação de prazo não inferior a 30 (trinta) dias, para impugnação pelos interessados, de qualquer dos elementos referidos no inciso anterior;

III - regulamentação do processo administrativo de instrução e julgamento da impugnação a que se refere o inciso anterior, sem prejuízo da sua apreciação judicial.

§ 1º A contribuição relativa a cada imóvel será determinada pelo rateio da parcela do custo da obra a que se refere a alínea c, do inciso I, pelos imóveis situados na zona beneficiada em função dos respectivos fatores individuais de valorização.

§ 2º Por ocasião do respectivo lançamento, cada contribuinte deverá ser notificado do montante da contribuição, da forma e dos prazos de seu pagamento e dos elementos que integram o respectivo cálculo.


Muito embora, o Decreto-Lei n. 195/67 traga em seu art. 2º que a pavimentação de vias públicas como obra que resulte em valorização do imóvel justifica a cobrança do tributo, cabendo a Administração Pública o dever de publicar o edital indicando as particularidades da referida cobrança (art. 5, I a IV do Decreto-Lei 195/67), não se pode considerar como dispensável a edição prévia de lei para cada obra.

Nesse sentido, Leandro Paulsen pondera que:


O DL 195/67 dispõe sobre a contribuição de melhoria em nível de lei complementar, assim como o CTN. Estabelece as obras que viabilizam a instituição da contribuição, como abertura, pavimentação, iluminação, arborização, esgotos pluviais e outros melhoramentos de praças e vias públicas, construção e ampliação de parques, pontes, túneis e viadutos, obras de abastecimento de água potável, esgoto, construção de aeroportos e seus acessos. Cuida, ainda, do procedimento a ser observado, impondo a publicação de edital com a delimitação da área beneficiada, orçamento e plano de rateio. Indispensável, porém, de qualquer modo, que o ente político institua, por lei, a contribuição de melhoria relativa a cada obra. Isso porque a legalidade estrita é incompatível com qualquer cláusula geral de tributação. Cada tributo depende de lei específica que o institua. (In Curso de Direito Tributário Completo. 4. ed. Porto Alegra: Livraria do Advogado, 2012. p. 39 - grifei).


Assim, a alegação do Município quanto a existência de previsão genérica autorizando a cobrança da contribuição de melhoria prevista no Código Tributário Municipal (Lei Complementar Municipal n. 10/98), não é suficiente, por si só, para a instituição do tributo.

Portanto, não resta dúvida que para instituir a contribuição de melhoria deve haver prévia edição de lei específica, diga-se de passagem para cada obra a ser realizada deve haver a edição dessa lei específica, sob pena de afronta ao princípio da legalidade.

O Grupo de Câmaras de Direito Público já definiu:


COMPOSIÇÃO DE DIVERGÊNCIA. ART. 555, § 1º, DO CPC. CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA DECORRENTE DA PAVIMENTAÇÃO DE RUA. DISSINTONIA ENTRE CÂMARAS JULGADORAS QUANTO À EXIGÊNCIA DE LEI ESPECÍFICA INSTITUIDORA DO TRIBUTO. ENTENDIMENTO MAJORITÁRIO DE QUE A INSTITUIÇÃO DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA DEPENDE DE LEI PRÉVIA E ESPECÍFICA, BEM COMO DA VALORIZAÇÃO IMOBILIÁRIA DECORRENTE DA OBRA PÚBLICA, CABENDO AO ENTE TRIBUTANTE A RESPECTIVA PROVA. ENUNCIADOS Nº 7 E Nº 83 DA SÚMULA DO STJ. (TJSC, Apelação Cível n. 2014.055447-2, de Pinhalzinho, j. 09-12-2015).


No mesmo sentido a Turma Recursal já decidiu:

RECURSO DE APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO FISCAL. CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO MUNICÍPIO. PRELIMINAR DE CONEXÃO. NÃO ACOLHIMENTO COM BASE NO ART. 55, § 1º, DO CPC. FEITO JÁ SENTENCIADO. PUBLICAÇÃO DE EDITAL E PREVISÃO NO CÓDIGO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL QUE NÃO RETIRA A NECESSIDADE DE LEI PRÉVIA ESPECÍFICA PARA CADA OBRA. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT