Acórdão Nº 0300163-10.2015.8.24.0042 do Terceira Câmara de Direito Civil, 20-10-2020

Número do processo0300163-10.2015.8.24.0042
Data20 Outubro 2020
Tribunal de OrigemMaravilha
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão

Apelação Cível n. 0300163-10.2015.8.24.0042

Relator: Desembargador Marcus Tulio Sartorato

RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS MOVIDA EM FACE DE CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. FALTA DE ENERGIA ELÉTRICA DURANTE FESTA ORGANIZADA POR PARÓQUIA. PLEITO DE REPARAÇÃO DOS LUCROS CESSANTES. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE QUANTO ÀS PERDAS ALEGADAS. INVIABILIDADE DE REMESSA DA QUESTÃO PARA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO DANO EM SI. CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL QUE EXIGE TAL PROVA. DEVER DE INDENIZAR NÃO EVIDENCIADO. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300163-10.2015.8.24.0042, da comarca de Maravilha 1ª Vara em que é Apelante Mitra Diocesana de Chapecó - Paróquia São José Operario - Comunidade Católica Nossa Senhora das Graças e Apelada Celesc Distribuição S.A.

A Terceira Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso e arbitrar honorários advocatícios recursais nos termos do voto. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, com votos vencedores, a Exma. Sra. Des.ª Maria do Rocio Luz Santa Ritta e o Exmo. Sr. Des. Saul Steil.

Florianópolis, 20 de outubro de 2020.



Desembargador Marcus Tulio Sartorato

Presidente e Relator


RELATÓRIO

Adota-se o relatório da sentença recorrida que é visualizado às fls. 65/66, por revelar com transparência o que existe nestes autos, in verbis:

Mitra Diocesana de Chapecó - Paroquia São José Operário - Comunidade Católica Nossa Senhora das Graças da Linha Primavera Baixa, Maravilha/SC, entidade religiosa CNPJ n. 83.314.930/0021-90, através de procuradores (fl. 7) ajuizou "ação de indenização" em desfavor de Celesc Distribuição S/A, pessoa jurídica de direito privado, CNPJ n. 83.878.892/0001-55, com sede na Avenida Itamarati, 160, Blocos A1, B1 e B2, Bairro Itacorubi, Florianópolis/SC.

Assinalou: (a) que na data de 27/04/2014 a Autora promoveu o evento festivo "Festa da Padroeira Nossa Senhora das Graças", no Salão de Eventos da Comunidade Católica da Linha Primavera Baixa, com início previsto para às 10 horas e término para as 18 horas; (b) que meia-hora após o início da festa, houve queda de energia elétrica, tendo a promotora do evento acionado a requerida; (c) que o restabelecimento do serviço aconteceu por volta das 15h30min, quando não havia mais possibilidade de continuar a festa; (d) que a demora no atendimento pela requerida acarretou prejuízos no valor de R$ 8.160,60 (oito mil, cento e sessenta reais e sessenta centavos), adotando-se como parâmetro o ano de 2013; (e) que se trata de responsabilidade objetiva, restando presentes o nexo de causalidade, cabendo à requerida responder pelos danos causados à entidade autora.

Em arremate, pede julgamento de procedência do pedido, para condenação da requerida ao pagamento das "perdas e danos" no valor de R$ 8.160,60 (oito mil, cento e sessenta reais e sessenta centavos) ou que seja arbitrado conforme os documentos apresentados, postulando o deferimento do benefício da Justiça Gratuita.

Juntou procuração (fl. 7) e documentos (fls. 8/33).

Efetivada a citação (fl. 38).

Celesc Distribuição S/A apresentou defesa (fls. 40/43) assinalando: (a) que aconteceu rompimento de cabo condutor de energia, sendo que tais eventos trazem a necessidade de que seja percorrida a rede elétrica inteira para identificação do ponto a ser reparado; (b) que tão logo o problema foi constatado, foi resolvido, restando ausente qualquer conduta ilícita da requerida; (c) que quando o evento a ser realizado dependa de energia elétrica caberá ao promovente dispor de "fontes alternativas"; (d) que para se legitimar a indenização por lucros cessantes resta imperativa prova concreta de que a entidade ofendida, em face do ilícito, deixou de lucrar vantagens ou rendimentos, não bastante meras alegações.

Em fechamento, pede julgamento de improcedência do pedido, juntando procuração (fl. 44) e documento (fl. 45).

Réplica apresentada pela autora (fls. 50/52), sendo designada audiência de instrução e julgamento (fls. 53/54), colhida a prova oral (fls. 63/64) e apresentadas razões derradeiras.

É o que cabia relatar.


O MM. Juiz de Direito da 1ª Vara da comarca de Maravilha, Dr. Solon Bittencourt Depaoli, decidiu a lide nos seguintes termos (fls. 66/67):

Ante todo o exposto, forte no artigo 487, I, do NCPC, julgo improcedente o pedido formulado pela autora em desfavor da ré.

Por força da sucumbência, condeno a demandada ao pagamento das custas processuais, bem como da verba honorária do procurador da ré, essa que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais) (NCPC, artigo 85, § 8.º), encargos que ficam suspensos, eis que restaram conferidos à Autora os benefícios da Justiça Gratuita (fl. 34).

P. R. I.

Transitada em julgado, arquive-se em definitivo.


Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação (fls. 71/78), no qual afirma que, no dia 27.04.2014, houve queda de energia por quatro horas durante a realização do evento "Festa da Padroeira Nossa Senhora das Graças", acarretando perda nas vendas que se realizam na celebração, sendo presumível o prejuízo daí decorrente. Acrescenta que a prova dos autos se traduz em material suficiente ao cálculo da perda alegada, ou seja, do que efetivamente poderia ter lucrado, não fosse a falha do fornecimento em questão, mormente se comparado o lucro de 2014 em relação ao de 2013, este último devidamente demonstrado no processo. Assevera que o prejuízo é facilmente presumido e que, havendo dúvida quanto ao valor do dano, pode-se determinar a realização de liquidação de sentença. Por fim, requer o provimento do recurso para julgar procedente o pedido inicial, condenando-se a ré ao pagamento dos lucros cessantes alegados.

Em contrarrazões (fls. 84/86), a ré defende a manutenção da sentença.


VOTO

1. Nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, "as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".

Sobre o tema, clássica é a lição de Hely Lopes Meirelles, para quem "o exame desse dispositivo revela que o constituinte estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desmembramentos administrativos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros por seus servidores, independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão. Firmou, assim, o princípio objetivo da responsabilidade sem culpa pela atuação lesiva dos agentes públicos e seus delegados (in: Direito administrativo brasileiro. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 653)".

Em comentários ao referido dispositivo constitucional, ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro que "mesmo as concessionárias e permissionárias de serviço público somente responderão objetivamente na medida em que os danos por elas causados sejam decorrentes da prestação de serviços" (in: Direito administrativo. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 613-614).

Dessa forma, a ré, na condição de concessionária de serviços públicos, responde objetivamente pelos danos causados em decorrência da prestação do referido serviço.

Por conta da aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso concreto, também não se pode perder de vista seu art. 14, que assim dispõe: "o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos".

Como se verifica, o Código Consumerista recepcionou também a teoria da responsabilidade objetiva, dispensando a prova da culpa lato sensu para responsabilização do fornecedor a indenizar os prejuízos causados.

Essa responsabilidade, nos termos do referido enunciado legal, somente poderá ser excluída caso o fornecedor comprove a inexistência de defeito no serviço, a culpa exclusiva da vítima ou a culpa exclusiva de terceiro.

É o que preceitua o § 3º do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor:

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.


De qualquer sorte, não basta à caracterização da obrigação indenizatória a ocorrência de ato imputável à prestadora do serviço público. Faz-se indispensável que dele decorra um dano, havendo de se comprovar o prejuízo e o nexo de causalidade.

Neste sentido, tratando-se, na hipótese, de pleito...

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