Acórdão Nº 0300176-96.2015.8.24.0013 do Terceira Câmara de Direito Público, 02-08-2022

Número do processo0300176-96.2015.8.24.0013
Data02 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Nº 0300176-96.2015.8.24.0013/SC

RELATOR: Desembargador SANDRO JOSE NEIS

EMBARGANTE: JOSE MARIO DRESCH (RÉU) EMBARGANTE: JOSE VALMIR DRESCH (RÉU)

RELATÓRIO

José Mário Dresch e José Valmir Dresch opuseram os presentes embargos de declaração ao aresto que, nos autos da Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais n. 0300176-96.2015.8.24.0013/SC, ajuizada por Valmor Nunes e Jocilene Maia em face dos ora Embargantes, do Município de Campo Erê e do Estado de Santa Catarina, decidiu, por votação unânime, conhecer dos recursos de apelação interpostos e negar-lhes provimento.

Em suas razões, asseveram, em síntese, vício de omissão no julgado, porquanto teriam sido desconsideradas as conclusões do Inquérito Policial realizado. Aduzem, outrossim, haver contradição no acórdão, ao considerar a inevitabilidade do acidente e ainda assim a culpa concorrente do condutor. Derradeiramente, apontam que não foram observados os precedentes do Superior Tribunal de Justiça para fins de fixação do montante indenizatório (Evento 33, Eproc/SG).

Não foram apresentadas contrarrazões (evento 38, Eproc/SG).

Este o relatório.

VOTO

O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, devendo, pois, ser conhecido.

De início, consigna-se que os Embargos de Declaração possuem a finalidade de saneamento dos vícios elencados no 1.022 do Código de Processo Civil:

Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para:I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento;III - corrigir erro material.Parágrafo único. Considera-se omissa a decisão que:I - deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento;II - incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º.

Possuem, portanto, a finalidade de integração e esclarecimento, não sendo viável o seu manejo para rediscutir questões cuja solução foi desfavorável à parte embargante.

No caso em análise, os Embargantes apontaram vício de omissão no julgado, referindo malferimento ao art. 1.022, parágrafo único, inciso I, do CPC/2015, pois teriam sido desconsideradas as conclusões do Inquérito Policial, no qual não houve reconhecimento de excesso de velocidade do automóvel. Afirmaram também ser contraditório afirmar a inevitabilidade do acidente e ainda assim considerar a culpa concorrente do condutor. Derradeiramente, indicam que há omissão ao não observar os precedentes do Superior Tribunal de Justiça elencados pelos Recorrentes, no que toca à fixação do montante indenizatório

Contudo, não se vislumbrams os vícios apontados, eis que foram analisados todos os elementos dos autos, com clareza na exposição dos fundamentos.

Calha mencionar, no que toca às circunstâncias relativas à velocidade do condutor do automóvel, que não há vinculação da conclusão da responsabilização criminal à esfera civil, eis que aquela decidiu por absolvição em razão de inexistência de prova, o que não exclui a possibilidade de que tal conduta seja deduzida dos demais elementos dos autos para fins de averiguar a fração de responsabilidade do condutor para o evento lesivo.

Deveras, cada uma das instâncias possui escopo diverso e pauta-se em princípios distintos.

Com efeito, ao reverso do que alegam os Embargantes, foi devidamente ponderada a questão da culpa do condutor do automóvel, sopesando-se os diversos elementos constantes nos autos, não sendo contraditórias as conclusões externadas, tendo se afirmado que embora as circunstâncias fáticas indiquem a inevitabilidade do acidente, a conduta do condutor contribuiu para o agravamento do resultado, in verbis:

[...]1) Da Responsabilidade pelo Evento Lesivo:

Os fatos narrados em exordial dizem respeito a um acidente de trânsito que culminou no falecimento do filho dos Demandantes, Alean Vitor Maia Nunes.

Tem-se como incontroverso que o evento lesivo ocorreu na data de 25/03/2016, no final da tarde, quando o filho dos Demandantes retornava da escola em ônibus escolar fretado pelo Município de Campo Erê, de propriedade e conduzido por José da Rosa. Após o motorista do ônibus ter deixado o filho dos demandantes e seu irmão nas proximidades de sua residência, a criança veio a ser atropelada pelo automóvel Chevrolet/Classic LS, de propriedade de José Valmir Dresch, conduzido pelo Réu José Mario Dresch, resultando no óbito do infante.

Nesse eito, ao ajuizarem a ação, os Demandantes sustentaram que o motorista do ônibus, o condutor e o proprietário do veículo que atropelou a criança possuem parcela de culpa para a ocorrência do infortúnio. Enfatizaram que também o Município de Campo Erê deveria ser responsabilizado, eis que responde pelos eventos lesivos aos quais o seu contratado para prestar o serviço de transporte escolar der causa. Pretenderam, ainda, que o Estado de Santa Catarina responda pelo evento danoso, porquanto ao longo da rodovia não havia acostamento, área para parada de ônibus e desembarque de passageiros ou placas de sinalização no mesmo sentido, possuindo, também, sua parcela de culpa pelo evento danoso.

O Estado de Santa Catarina foi excluído do polo passivo da ação e, ao julgar a demanda, o Juízo de origem considerou somente os réus José Valmir Dresch e José Mario Dresch como responsáveis pelo evento danoso.

Em sede recursal, pretendem os Autores que o Município e o motorista do transporte escolar sejam também condenados solidariamente à reparação pelos danos causados.

Doutro viso, os Réus José Valmir Dresch e José Mario Dresch almejam não ser responsabilizados pelo evento, ao argumento de se tratar de infortúnio ocorrido por culpa exclusiva da vítima.

A pretensão dos Autores, em relação aos Réus José da Rosa e Município de Campo Erê, encontra-se no campo da responsabilidade civil da Administração Pública.

Sabe-se que "as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa", conforme disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição da República.

A responsabilidade da Administração Pública, em regra, independe de sua culpa, posto que vige a teoria da responsabilidade objetiva, sendo necessária apenas a comprovação do dano e do nexo causal, o qual, contudo, não foi devidamente comprovado na espécie.

O ponto de maior discussão tanto na doutrina como na jurisprudência ocorre em relação aos danos causados por conta de omissão do Poder Público, uma vez que a dicção da norma constitucional faz referência apenas à "ação" estatal.

De qualquer sorte, verifica-se que a orientação nesses casos é aplicar a teoria subjetiva. Nesse vértice, Celso Antônio Bandeira de Mello afirma:

Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de se aplicar a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar ao evento lesivo.Deveras, caso o Poder Público não estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razão para impor-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as consequências da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo responsabilidade por ilícito, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o consituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidades de responsabilidade subjetiva. (Curso de Direito Administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 1002-1003)

Contudo, a mera constatação de uma conduta omissiva do Estado não é apto a ensejar a aplicação da teoria da responsabilidade subjetiva. Isto porque, faz-se necessário analisar a natureza da omissão, se específica ou genérica.

Acerca do assunto, Sérgio Cavalieri Filho explica que:

Haverá omissão específica quando o Estado, por omissão sua, crie a situação propícia para a ocorrência do evento em que tinha o dever de agir para impedi-lo. Assim, por exemplo, se o motorista embriagado atropela e mata pedestre que estava na beira da estrada, a Administração (entidade de trânsito) não poderá ser responsabilizada pelo fato de estar esse motorista ao volante sem condições. Isso seria responsabilizar a administração por omissão genérica. Mas se esse motorista, momentos antes, passou por uma patrulha rodoviária, teve seu veículo parado mas os policiais, por alguma razão, deixaram-no prosseguir viagem, aí já haverá omissão específica que se erige em causa adequada do não-impedimento do resultado. (Programa de Responsabilidade Civil. 6 ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 261, grifou-se).

Na hipótese em testilha, a propalada omissão é específica.

Com efeito, os danos noticiados nos autos são atribuídos à desídia do Ente Municipal e do prestador de serviço de Transporte Coletivo Escolar, que não teriam observado o dever de segurança do transporte escolar dos alunos, o que resultou no grave acidente envolvendo o filho dos Autores, que veio a óbito no local.

Entrementes, para que sejam o Município e o condutor do transporte escolar responsabilizados pelo evento lesivo, é imprescindível a demonstração do competente nexo causal, ou seja, a prova de que as falhas apontadas pelos recorrentes - local em que o condutor do ônibus parou para que a criança desembarcasse - foram determinantes para a morte do infante.

Acerca do nexo de causalidade, Sérgio Cavalieri...

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