Acórdão Nº 0300187-41.2018.8.24.0007 do Sexta Câmara de Direito Civil, 04-02-2020

Número do processo0300187-41.2018.8.24.0007
Data04 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemBiguaçu
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0300187-41.2018.8.24.0007, de Biguaçu

Relator: Desembargador André Carvalho

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CONDENATÓRIA AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO REGRESSIVA. COOPERATIVA DE ELETRIFICAÇÃO RURAL A QUE INDENIZOU, EM PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO, DANOS MATERIAIS CAUSADOS A COOPERADO EM RAZÃO DE PROLONGADA INTERRUPÇÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA, A QUAL PARALISOU O PROCESSO DE SECAGEM DE FUMO EM ESTUFA, CAUSANDO PERDA NA QUALIDADE DA PRODUÇÃO. PRETENSÃO REGRESSIVA DA COOPERATIVA EM FACE DA CELESC, A QUEM IMPUTA A CULPA PELA FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA CONCESSIONÁRIA DEMANDADA.

ADMISSIBILIDADE. PRETENDIDO AFASTAMENTO DA INCIDÊNCIA DO CDC. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA AO CASO CONCRETO QUE CONSTITUIU FUNDAMENTO DE DECISÃO INTERLOCUTÓRIA IRRECORRIDA QUE INVERTEU O ÔNUS DA PROVA. MATÉRIA PRECLUSA. NÃO CONHECIMENTO.

"Consoante disposto no art. 507 do Código de Processo Civil 'é vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão'.

Na espécie, não é dado à parte demandada alegar, em sede de recurso de apelação, a impossibilidade de inversão do ônus da prova se a parte ré não se insurgiu contra a interlocutória que ordenou a referida inversão. Logo, inviável conhecer da temática, pois acobertada pela preclusão. [...]" (TJSC, Apelação Cível n. 0007835-44.2011.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Robson Luz Varella, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 10-04-2018).

CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO. ADEQUAÇÃO DA MEDIDA EM FACE DA NATUREZA DA DEMANDA. PROCEDIMENTO IRRETOCÁVEL DO JUÍZO A QUO.

Não há que se falar em cerceamento de defesa quando a instrução probatória vindicada pelas partes se afigura inadequada a influenciar no convencimento do julgador, restando aplicável o julgamento antecipado do mérito.

ALEGADO DESCABIMENTO DA PRETENSÃO DE REGRESSO. IMPROCEDÊNCIA. COOPERATIVA QUE, EM RAZÃO DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA, INDENIZOU O CONSUMIDOR. DIREITO DE REGRESSO CONTRA O RESPONSÁVEL PREVISTO NO ART. 37, §6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E 934, DO CÓDIGO CIVIL.

Seja em face do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, ou à luz do disposto no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, remanesce a responsabilidade objetiva nos casos de interrupção injustificada da prestação dos serviços por concessionária de energia elétrica.

CONCESSIONÁRIA RÉ (ART. 373, II, DO CPC/2015) QUE DEVE FAZER PROVA AO MENOS INDICIÁRIA DA REGULARIDADE NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. CASO EM QUE A CELESC JUNTOU DOCUMENTAÇÃO QUE CONFIRMA A INTERRUPÇÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA NA UNIDADE CONSUMIDORA DA COOPERATIVA NA DATA RELATADA PELO CONSUMIDOR. COMPROVADA A FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.

NEXO DE CAUSALIDADE. LIAME SUBJETIVO INCONTESTE ENTRE OS DANOS À PRODUÇÃO DE FUMO E A INTERRUPÇÃO DO SERVIÇO DE ENERGIA. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE NÃO VERIFICADAS. ADEQUAÇÃO ADMINISTRATIVA QUE NÃO ILIDE A OBRIGAÇÃO REPARATÓRIA. INTEMPÉRIES CLIMÁTICAS. FORTUITO INTERNO AO SERVIÇO DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE.

A conformidade ao marco regulatório do setor elétrico não afasta, por si só, a obrigação de reparar os danos causados aos consumidores em decorrência da prestação anômala dos serviços.

Salvo condições extraordinárias, as intempéries do clima constituem fortuito interno à atividade de distribuição de energia elétrica, não encerrando excludente idônea ao afastamento do dever de indenizar.

QUANTUM INDENITÁRIO. IMPUGNAÇÃO AO LAUDO TÉCNICO QUE INSTRUIU A AÇÃO DO CONSUMIDOR EM FACE DA PERMISSIONÁRIA. DESCABIMENTO. QUANTIFICAÇÃO DO DANO FIXADA EM SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO. VERBA REGRESSIVA QUE DEVE CORRESPONDER AO EXATO MONTANTE PAGO AO COOPERADO.

HONORÁRIOS RECURSAIS (ART. 85, §§ 1º E 11, DO CPC/2015).

RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300187-41.2018.8.24.0007, da comarca de Biguaçu (1ª Vara Cível), em que é Apelante Celesc Distribuição S/A e Apelado Cooperativa de Prestação de Serviços Públicos de Distribuição de Energia Elétrica Senador Esteves Júnior CEREJ.

A Sexta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer de parte do recurso e, nessa extensão, negar-lhe provimento, arbitrando-se honorários recursais na forma da fundamentação. Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. André Luiz Dacol e Des. Gerson Cherem II.

Florianópolis, 04 de fevereiro de 2020

Desembargador André Carvalho

Relator


RELATÓRIO

Reproduzo, por sua qualidade e completude, o relatório da sentença, da lavra do Magistrado José Clésio Machado (fls. 631-639):

Vistos, etc.

Trata-se de Ação Regressiva por Danos Materiais promovida por Cooperativa de Prestação de Serviços Públicos de Distribuição de Energia Elétrica Senador Esteves Júnior, qualificada, em face de Celesc Distribuidora S.A., igualmente qualificada, requerendo à restituição da importância de R$ 5.380,00(cinco mil, trezentos e oitenta reais), que foi adimplida pela Requerente a um de seus associados, em decorrência de sucessivas interrupções no fornecimento de energia elétrica, efetivadas pela Requerida.

Citada, a Requerida apresentou resposta na forma de Contestação, fls. 80/117, aduzindo em preliminar, a competência da Justiça Federal em razão da matéria, o litisconsórcio necessário com a União e a ANEEL e a impossibilidade jurídica do pedido. No mérito, sustentou que na relação estabelecida entre as partes deve ser aplicada a regulamentação imposta pela agência reguladora - ANEEL, sem direito à restituição de valores pagos a título de indenização pois já é a Requerente remunerada na forma estabelecida pela respectiva agência reguladora.

Igualmente, alegou a impossibilidade de ação regresso, pois a Requerente firmou acordo, sem esgotar todos os meios para evitar o pagamento de indenização, além de não ter a Requerida participado ativamente da negociação. Em continuidade, afirmou que as ocorrências narradas não decorrem de culpa da Requerida, mas sim por "condição climática adversa, consequência condutor de rede partido", tendo tomado todas as medidas para evitar prejuízos aos consumidores, imputando caso fortuito e de força maior, além da possibilidade de interrupções em situações emergenciais.

Ainda, imputa a culpa ao consumidor, que não instalou gerador, e a não comprovação dos danos materiais. Por fim, pleiteia a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, o acolhimento das preliminares com extinção da ação e, subsidiariamente, a improcedência da ação. Acostou documentos, fls. 118/403.

Réplica, fls. 407/422.

Despacho determinando a especificação de provas pelas partes, fl. 425. A Requerente pleiteou a exibição de documentos pela Requerida, fl. 430, enquanto a Requerida arrolou testemunhas, fls. 428/429.

Decisão, fls. 439/440, invertendo o ônus da prova, intimando a Requerida para juntada de protocolo. Manifestação pela Requerida, fl. 443/619.

Decisão rejeitando a preliminar de incompetência do Juízo, fl. 627.

Conclusos. Relatados. Decido.

Em julgamento antecipado do mérito, os pedidos foram julgados procedentes, conforme dispositivo da sentença que passo a transcrever:

Diante do exposto, o que mais dos autos consta e os princípios de direitos aplicáveis JULGO PROCEDENTE o pedido deflagrado na presente Ação Regressiva por Danos Materiais promovida por Cooperativa de Prestação de Serviços Públicos de Distribuição de Energia Elétrica Senador Esteves Júnior, qualificada, em face de Celesc Distribuidora S.A., igualmente qualificada, CONDENANDO a Requerida à restituição da importância de R$ 5.380,00(cinco mil, trezentos e oitenta reais), atualizado desde o pagamento, com juros a contar da citação.

Condeno, também, a Requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 4º, do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após transitada

em julgado, arquive-se.

Biguaçu (SC), 11 de fevereiro de 2019.

Irresignada, a concessionária ré interpôs o presente apelo. Afirma, em suma: a) preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, em razão do julgamento antecipado do mérito; b) também em preliminar, a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso em deslinde, defendendo o descabimento da inversão do ônus da prova; c) no mérito, que não há possibilidade de ação de regresso; d) que, a despeito da existência de registros de interrupção no fornecimento de energia elétrica na data informada na exordial, foram elas causadas por intempéries climáticas extremas, que constituem excludente de responsabilidade; e) que a concessionária teria cumprido as metas de fornecimento estipuladas pela ANEEL, com o automático pagamento por eventuais transgressões dos limites de continuidade, defendendo que a regularidade administrativa afastaria a ilicitude da conduta impugnada; f) que os danos materiais não foram devidamente comprovados, impugnando os laudos técnicos acostados aos autos da ação indenizatória movida pelo consumidor contra a CEREJ; g) a necessidade de realização de média ponderada entre as produções das safras anteriores e daquela dita prejudicada a fim de apurar o montante efetivamente devido. Pelo exposto, pugna pelo acolhimento da preliminar, cassando-se a sentença e determinando-se o retorno dos autos à origem para regular instrução e processamento. Subsidiariamente, pleiteia a reforma da sentença para que sejam julgados totalmente improcedentes os pleitos exordiais (fls. 643-663).

Contrarrazões às fls. 670-681.

É o necessário relatório.

VOTO

Registro inicialmente que, tendo a ação sido ajuizada já sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, são desnecessárias discussões relativas ao direito...

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