Acórdão Nº 0300230-75.2018.8.24.0007 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 26-11-2020

Número do processo0300230-75.2018.8.24.0007
Data26 Novembro 2020
Tribunal de OrigemBiguaçu
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0300230-75.2018.8.24.0007, de Biguaçu

Relator: Desembargador Luiz Zanelato

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS EMBARGOS COM BASE NO CPC/15.

RECURSO DO EXECUTADO-EMBARGANTE.

EXECUÇÃO DE CHEQUE POR PORTADOR ENDOSSATÁRIO. ARGUMENTAÇÃO DE DESACORDO COMERCIAL DO NEGÓCIO JURÍDICO QUE DEU ORIGEM À EMISSÃO DA CÁRTULA, A QUAL FOI SUSTADA POR ESTAR VINCULADA AO CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULOS. ALEGADA FALTA DE EXEQUIBILIDADE DO TÍTULO E POSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO DA "CAUSA DEBENDI". TESE INSUBSISTENTE. AUTONOMIA DO CHEQUE FRENTE AO NEGÓCIO JURÍDICO QUE LHE DEU CAUSA. TÍTULO SUJEITO A ENDOSSO, TRANSFERIDO DE FORMA LÍCITA EM FAVOR DO ENDOSSATÁRIO. INOPONIBILIDADE DAS EXCEÇÕES PESSOAIS AO TERCEIRO DE BOA-FÉ. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 25 DA LEI DO CHEQUE. DESAVENÇA COMERCIAL ENTRE A EXECUTADA-EMBARGANTE E O ENDOSSANTE DOS CHEQUES QUE NÃO PREJUDICA O PORTADOR DE BOA-FÉ. DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO CONSUBSTANCIADA NAS CÁRTULAS QUE LEGITIMA E TORNA VÁLIDA A AÇÃO DE EXECUÇÃO, RESSALVADO O DIREITO DO EMITENTE DOS CHEQUES DE DEMANDAR O TOMADOR ORIGINÁRIO POR EVENTUAIS PREJUÍZOS.

" [...] extrai-se que o cheque constitui título de crédito essencialmente autônomo, pois cada obrigação que deriva do título é independente, não podendo uma das partes da cártula invocar, a seu favor, fatos ligados aos obrigados anteriores. Disto exsurgem a abstração cambiária e a inoponibilidade das exceções pessoais; duas ramificações da autonomia que merecem toda atenção, porquanto capazes de solver a quaestio posta em exame. Se a abstração garante que a obrigação cambiária (ordem de pagamento à vista, o cheque) não se vincule e nem dependa da causa que deu origem ao crédito (cada obrigação existe por si); a inoponibilidade das exceções pessoais impede que o devedor ressuscite defeitos jurídicos oriundos da relação primitiva em relação aos terceiros supervenientes, os quais estão imunes às defesas relativas à relação obrigacional originária, ressalvados os casos de má-fé'. (Apelação Cível n. 2010.023323-9, da Capital, Quarta Câmara de Direito Comercial, rel. Des. Altamiro de Oliveira, j. 15-2-2011)". [...] (Apelação n. 0000443-86.2012.8.24.0033, de Itajaí, Quarta Câmara de Direito Comercial, rel. Des. José Carlos Carstens Köhler, j. 2-8-2016).

VERBAS SUCUMBENCIAIS. APELO MANEJADO SOB A VIGÊNCIA DO CPC/15. NOVO REVÉS DO RECORRENTE. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DA VERBA EM FAVOR DO CAUSÍDICO DA APELADA QUE SE IMPÕE. EXEGESE DO ARTIGO 85, § 11, DO NOVO CPC.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300230-75.2018.8.24.0007, da comarca de Biguaçu 1ª Vara Cível em que é/são Apelante Márcio José da Cunha e Apelado Zulmar Murilo da Silva.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, com majoração dos honorários advocatícios de sucumbência, com fundamento no artigo 85, § 11º, do CPC/15, para R$ 800,00 (oitocentos reais). Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Guilherme Nunes Born, e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Mariano do Nascimento e José Maurício Lisboa.

Florianópolis, 26 de novembro de 2020.

Desembargador Luiz Zanelato

Relator

RELATÓRIO

Márcio José da Cunha interpôs recurso de apelação da sentença de fls. 64-72, proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível da comarca de Biguaçu, nos autos da ação de embargos à execução, proposta em face de Zulmar Murilo da Silva, que julgou improcedentes os pedidos formulados na petição inicial.

Na origem, trata-se de embargos do devedor ofertados pelo ora apelante para o fim de resistir ao processo de execução de título extrajudicial, fundado em cheque, promovido pelo ora apelado. Requereu, ao final, a procedência dos pedidos iniciais para extinguir a execução em apenso (fls. 01-05).

Em juízo de admissibilidade da demanda, o magistrado de origem recebeu os embargos à execução, sem atribuir-lhes efeito suspensivo (fls. 20).

Devidamente intimado (fls. 21), o exequente-embargado apresentou impugnação aos embargos, pugnou pela sua rejeição (fls. 23-29).

Intimado, o embargante não se manifestou acerca da impugnação (fl. 33).

Em decisão de saneamento do processo, o juiz "a quo" determinou a intimação das partes para especificação das provas que pretendiam produzir (fl. 34).

O embargante requereu a oitiva de testemunhas à fl. 39.

Deferida a colheita de prova oral, foi designação audiência de instrução e julgamento, na qual houve a tentativa de conciliação, que restou inexitosa e foi dispensada a produção de prova testemunhal no ato (fl. 43).

Alegações finais do exequente às fls. 48-53 e do executado às fls. 54-56.

Na data de 06-09-2019, o juiz da causa, Dr. José Clécio Machado, prolatou sentença de improcedência, nos seguintes termos:

[...] Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES OS EMBARGOS À EXECUÇÃO opostos por Márcio José da Cunha, qualificado, em face de Zulmar Murilo da Silva, qualificado, para determinar o prosseguimento da Ação de Execução correspondente. CONDENO o Embargante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixando estes no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), com fulcro no art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após transitada em julgado, arquive-se. (fls. 57-60)

Irresignado, o executado-embargante interpôs recurso de apelação, sob os fundamentos de que: a) versa a presente ação sobre embargos a uma execução ajuizada pelo apelado, onde o título executivo executado pelo mesmo, corresponde a um cheque sustado por desacordo comercial, bem como e a condenação por litigância de má-fé; b) o titulo executivo esta vinculado a um contrato de compra e venda de veículos automotores celebrado entre ele e Passos Comércio de Veículos Ltda, uma vez que o cheque está devidamente transcrito no instrumento contratual, em que houve desacordo comercial, não tendo sido injusta a sustação da cártula; c) as partes nunca se conheceram e não houve qualquer negócio entre elas; d) o apelado altera a verdade dos fatos, deduz pretensão contra texto expresso de lei e contrato, age de modo temerário ao ajuizar ação sem efetiva sustentação fática do caso concreto (fls. 64-72).

Contrarrazões apresentadas às fls. 81-88, em que o apelado requer o desprovimento do recurso.

O recurso ascendeu ao Tribunal de Justiça e foi distribuído a esta relatoria.

Os autos vieram conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

1. Exame de admissibilidade

Inicialmente, registra-se que se trata de recurso de apelação interposto contra sentença prolatada sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este diploma processual que disciplina o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Feitas estas digressões, conheço do recurso de apelação porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

2. Fundamentação

Examinados os autos, denota-se que as razões recursais não se prestam a demonstrar a existência de error in judicando na sentença que julgou improcedentes os embargos à execução, tendo em vista que não logrou êxito em demonstrar a má-fé do portador do cheque endossado, cuja boa-fé deve ser presumida, sendo ônus da prova da parte devedora alegante.

É cediço que a ação de execução é o meio adequado para a cobrança, no prazo legal, de direito cambiário literal e autônomo constante de título de crédito, gênero do qual o cheque é uma de suas espécies (art. 784, I, do CPC).

Duas de suas principais características são a autonomia das obrigações cambiais e a abstração, sobre as quais extrai-se a lição de Fran Martins:

O segundo princípio que caracteriza os títulos de crédito é o da autonomia das obrigações assumidas, capaz de promover, com segurança, a circulação dos direitos emergentes dos títulos. Significa autonomia ao fato de não estar o cumprimento das obrigações assumidas por alguém no título vinculado a outra obrigação qualquer, mesmo ao negócio que deu lugar ao nascimento do título. [...] Outro princípio característico dos títulos de crédito é a abstração. Significa isso que os direitos decorrentes do título são abstratos, não dependentes do negócio que deu lugar ao nascimento do título. A abstração às vezes tem sido confundida com a autonomia, mas, na realidade, são coisas diferentes. Abstratos são os direitos porque independem do negócio que deu origem ao título. Uma vez o título emitido, liberta-se de sua causa, e, assim, a mesma (que tem sido chamada de relação fundamental ou negócio fundamental), não poderá ser alegada futuramente para invalidar as obrigações decorrentes do título, pois esse, uma vez emitido, passa a conter direitos abstratos, não cabendo, de tal modo, a exigência de contraprestação para poder ser satisfeita a obrigação. (Títulos de crédito. 15.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 9/11 - grifou-se)

A autonomia e abstração dos títulos de crédito e a condição de título de crédito previsto em lei afastam a necessidade de comprovação do negócio jurídico que deu causa à emissão ou transmissão dos cheques, sobretudo quando há circulação das cártulas, hipótese em que é evidente que a relação jurídica entre as partes é apenas cambial.

O art. 896 do Código Civil pr...

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