Acórdão Nº 0300231-79.2017.8.24.0012 do Sexta Turma de Recursos - Lages, 18-10-2018

Número do processo0300231-79.2017.8.24.0012
Data18 Outubro 2018
Tribunal de OrigemCaçador
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Sexta Turma de Recursos - Lages


ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Sexta Turma de Recursos - Lages

Recurso Inominado n. 0300231-79.2017.8.24.0012

Recurso Inominado n. 0300231-79.2017.8.24.0012, de Caçador

Relator: Juiz Edison Zimmer

RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANO MORAL. FALHA NO ABASTECIMENTO DE ÁGUA NO MUNICÍPIO DE RIO DO DAS ANTAS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECLAMO DA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. ALEGAÇÃO NOS AUTOS DE QUE A FALTA DE ÁGUA NO MUNICÍPIO É SITUAÇÃO RECORRENTE. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DENTRO DE RAZOÁVEL NORMALIDADE. A COMPROVADA FALTA DE ÁGUA NÃO PODE SER CONSIDERADA EXCESSIVA. MERO DISSABOR DA VIDA COTIDIANA. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR NA ESFERA MORAL. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. PEDIDO INICIAL JULGADO IMPROCEDENTE.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado n. 0300231-79.2017.8.24.0012, da COMARCA de Caçador, 1ª Vara Cível, em que é Recorrente Companhia Catarinense de Águas e Saneamento S/A - CASAN e Recorrida Elisete Moreira:

RELATÓRIO

Trata-se de RECURSO INOMINADO interposto por COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN em face de ELISETE MOREIRA.

ELISETE MOREIRA moveu AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS contra COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN alegando que o abastecimento de água em sua residência é constantemente interrompido, gerando-lhe uma série de intercorrências. Assevera, ainda, que os problemas no abastecimento da água são constantes em seu município e que, não raras vezes, a água disponibilizada está em condições que impedem o seu consumo, situações que acabam por produzir dano irreparável a sua moral, devendo ser indenizada.

Citada, a concessionária de serviço público apresentou resposta, em forma de contestação, alegando, preliminarmente, a incompetência do juízo para julgamento de direitos individuais homogêneos e pela necessidade de produção de prova pericial, bem como a inépcia da petição inicial. No mérito, sustenta que o serviço de água no município onde reside a autora é normal, havendo interrupções pontuais e prontamente resolvidas, geralmente causadas por motivos de caso fortuito ou força maior, o que não caracteriza descontinuidade no serviço público prestado, bem como que a falta de água pode também estar relacionada ao reservatório de cada unidade consumidora, não havendo o que se falar acerca da alegada responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar.

Sobreveio sentença que julgou procedente o pedido formulado pela autora sob o argumento de que a falha na prestação de serviço essencial causa dano moral, condenando a requerida ao pagamento de R$10.000,00 a título de indenização.

Inconformada, a empresa pública manejou o presente Recurso Inominado sustentando o excesso no valor da condenação e repetindo as demais teses aventadas em sede de contestação, acrescentando a nulidade do julgamento antecipado do feito pois imprescindível a realização de prova pericial, pugnando pela reforma do julgado.

Não foram apresentadas contrarrazões.

Este é o relatório.

VOTO

O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, devendo ser conhecido.

Quanto às preliminares suscitadas pela requerida/recorrente em suas razões recursais, no que diz respeito à alegação de incompetência do juizado especial, seja pela necessidade de produção de prova pericial seja pela natureza da demanda, afasto-as e adoto como razão de decidir os fundamentos contidos na decisão atacada.

Com relação à preliminar de nulidade do julgamento antecipado, embora o feito não tenha respeitado o rito previsto nas Leis n. 12.153/09 e 9.099/95 não vejo qualquer prejuízo às partes, devendo ser afastada, pois o julgamento do feito depende apenas de prova documental, até porque busca a pretensa reparação moral decorrente da alegada interrupção no serviço de água na residência da requerente/recorrida.

Quanto ao mérito, adianto, o recurso merece provimento.

O pedido formulado pela requerente/recorrida refere-se apenas à reparação moral decorrente da interrupção do serviço de abastecimento de água em sua residência, sem qualquer pedido acerca da regularização do serviço de fornecimento de água.

Sustenta o pedido formulado no fato de ser consumidora do serviço de água que está sendo prestado de forma deficiente, o que por si só configura ato ilícito e o dever de indenizar da requerida/recorrente.

A deficiência alegada pela requerente/recorrida refere-se à falta de água ou à sua entrega com turbidez/cor alterada.

É fato incontroverso que o abastecimento de água foi interrompido, em alguns períodos, no município em que reside a autora, mas nem de longe há prova de o problema seja contumaz, fulminando eventual discussão acerca da responsabilidade contratual da concessionária de serviço público - o que friso, não é objeto destes autos.

Se sequer poder-se-ia dar guarida a eventual reclamação acerca da responsabilidade contratual, não há o que se discutir sobre a responsabilidade civil decorrente do não cumprimento das obrigações contratuais da requerida/recorrente, objeto destes autos.

Não há qualquer menção ao motivo específico acerca de cada uma das interrupções no abastecimento, se causados por motivos externos (seca, excesso de chuvas) ou por problemas decorrentes dos equipamentos disponíveis no município para a prestação do serviço de água.

Não há prova também de que na residência da requerente/recorrida o abastecimento foi interrompido, seja nos períodos incontroversos ou em qualquer outro.

A documentação carreada das redes sociais (pp.50/74) indica sim a falta de água ou a entrega de água com cor alterada/turbidez no Município de Rio das Antas, mas nenhuma daquelas manifestações partiu da requerente/recorrida, não sendo possível presumir que em sua residência o mesmo aconteceu.

Tendo em vista que uma das alegações da requerente/recorrida para justificar o pedido de reparação por dano moral é a qualidade da água entregue pela requerida/recorrente, cabe aqui fazer menção ao que se convenciona acerca desse parâmetro.

Inicialmente destaco que há diversas publicações de órgãos com competência para o assunto, dentre eles o Ministério da Saúde, que em cartilha editada menciona que

a água, além de ser formada pelos elementos hidrogênio e oxigênio na proporção de dois para um, também pode dissolver uma ampla variedade de substâncias, as quais conferem à água suas características peculiares. Além disso, as substâncias dissolvidas e as partículas presentes no seio da massa líquida são transportadas pelos cursos d'água, mudando continuamente de posição e estabelecendo um caráter fortemente dinâmico para a questão da qualidade da água. [...] A conjunção das capacidades de dissolução e de transporte conduz ao fato de que a qualidade de uma água é resultante dos processos que ocorrem na massa líquida e na bacia de drenagem do corpo hídrico. Verifica-se, assim, que o sistema aquático não é formado unicamente pelo rio ou pelo lago, mas inclui obrigatoriamente a bacia de contribuição, exatamente onde ocorrem os fenômenos que irão, em última escala, conferir à água suas características de qualidade.1

Por conta dessas particularidades, muitas vezes a água apresenta turbidez e/ou cor alterada, sem, necessariamente, estar inadequada ao consumo.

Com relação a esses aspectos destaca-se que "a cor é geralmente um indicador da presença de metais (Fe, Mn), húmus (matéria orgânica oriunda da degradação de matéria de origem vegetal), plâncton (conjunto de plantas e animais microscópicos em suspensão nas águas) dentre outras substâncias dissolvidas na água.", enquanto turbidez pode ser definida como "medida do espalhamento de luz produzido pela presença de partículas coloidais ou em suspensão"2.

Com relação aos parâmetros de potabilidade da água a Portaria nº 518, de 25 de março de 2004 do Ministério da Saúde define:

Art. 4.º - Para os fins a que se destina esta Norma, são adotadas as seguintes definições: I - água potável - água para consumo humano cujos parâmetros microbiológicos, físicos, químicos e radioativos atendam ao padrão de potabilidade e que não ofereça riscos à saúde;

A água considerada imprópria para consumo é aquela que contém os microorganismos Escherichia coli ou coliformes termotolerantes e Coliformes totais. A presença desses microorganismos não alterarão, necessariamente, a cor da água, que é resultado de inúmeros fatores como mencionado anteriormente.

A mesma portaria define ainda índices de turbidez admitidos na água potável, ficando evidente que a água não precisa estar cristalina (art.12).

Como já mencionado, a qualidade da água não é o objetivo da requerente/recorrida, que se utiliza desses argumentos apenas para justificar o direito à reparação por dano moral.

Tratando-se o pedido inicial unicamente de reparação por dano moral decorrente da suposta má prestação de serviço público e ausente prova tanto do dano alegado quanto de que o serviço foi prestado em desacordo com a lei (desabastecimento ou entrega de água em desacordo com os parâmetros de qualidade), não há como ser dada procedência a ele.

A prova juntada aos autos é incontroversa indicando que a concessionária do serviço público recorrente está atuando para a solução dos problemas relativos ao fornecimento de água no município em que reside a requerente/recorrida, mas não há nos autos elementos suficientes para a conclusão de que os problemas no abastecimento de água sejam suficientes para caracterizar ato ilícito, ensejando o dever de indenizar.

Entendo...

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