Acórdão Nº 0300240-23.2018.8.24.0039 do Segunda Turma Recursal, 21-07-2020

Número do processo0300240-23.2018.8.24.0039
Data21 Julho 2020
Tribunal de OrigemLages
ÓrgãoSegunda Turma Recursal
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão




ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Segunda Turma Recursal





Recurso Inominado n. 0300240-23.2018.8.24.0039, de Lages

Relatora: Juíza Margani de Mello







RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COMPRA DE VEÍCULO COM VÍCIO REDIBITÓRIO. DIFERENÇA DE NUMERAÇÃO DE CHASSI. SENTENÇA QUE RECONHECEU A DECADÊNCIA. PRAZO DE 90 (NOVENTA) DIAS. ARTIGO 26, II, § 3º, DO CDC. RECLAMO DA CONSUMIDORA. AUTOMÓVEL ADQUIRIDO EM JULHO DE 2016 E REPROVADO EM VISTORIA EM OUTUBRO DO MESMO ANO. IMPOSSIBILIDADE DE TRANSFERÊNCIA. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA SUJEITA AO PRAZO DO ARTIGO 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. EXTINÇÃO DO PRAZO NÃO VERIFICADA. SENTENÇA REFORMADA. OBRIGAÇÃO DO PRIMEIRO ACIONADO DE COMUNICAÇÃO DE ALIENAÇÃO AO ÓRGÃO DE TRÂNSITO (ARTIGO 123, I, §1º, CTB) E DA REVENDEDORA, POR FORÇA DO MANDATO QUE LHE FOI OUTORGADO, NÃO CUMPRIDA A TEMPO E MODO DEVIDOS. PARTE DA OBRIGAÇÃO QUE INCUMBIA À ADQUIRENTE (ARTIGO 134, CTB) OBSTADA PELA IMPOSSIBILIDADE DE APRESENTAÇÃO DO COMPROVANTE DE APROVAÇÃO DE INSPEÇÃO VEICULAR (INCISO XI DO REFERIDO ARTIGO). DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL APTO A ENSEJAR A INDENIZAÇÃO POSTULADA NO CASO CONCRETO. FRUSTRAÇÃO QUANTO À EXPECTATIVA DE REGULARIDADE, USUFRUTO E DISPONIBILIDADE DO BEM QUE SUPERA O MERO ABORRECIMENTO. DANOS MORAIS EVIDENCIADOS. QUANTUM QUE DEVE SER FIXADO COM RAZOABILIDADE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.



Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado n. 0300240-23.2018.8.24.0039, da comarca de Lages Juizado Especial, em que é recorrente Patricia Schmitz Moreira Cordova, e recorridos Autor Car Veículos e Nilvo Schroder:



I - RELATÓRIO

Conforme autorizam o artigo 46, da Lei 9.099/95 e o Enunciado n. 92, do FONAJE, dispensa-se o relatório.

II - VOTO

Insurge-se a consumidora contra a sentença de pp. 60-61, da lavra do juiz Geraldo Corrêa Bastos, que, reconhecendo a decadência do direito potestativo afirmado na inicial, julgou extinto o processo, com resolução de mérito, com amparo no artigo 487, II, c/c artigo 354, ambos do Código de Processo Civil. Sustenta, em síntese, que os recorridos devem ser condenados ao pagamento de indenização pelos danos morais a ela causados em razão da existência de vício redibitório (irregularidade da numeração do chassi) que resultou na inabilitação do bem por laudo de vistoria, somada à inércia para transferência da titularidade do veículo adquirido.

Contrarrazões apresentadas às pp.110-116.

O histórico dos autos demonstra que (i) em março de 2014, o proprietário do veículo VW GOL, ano 1996, Placa LXU 0523, Nilton Schroder (primeiro requerido) (p. 23), outorgou procuração para o representante legal da empresa recorrida Autor Car Veículos com poderes para efetuar a transferência do veículo junto aos órgãos de trânsito em caso de alienação (p. 25); (ii) conforme faz prova o contrato de p. 57, a venda do bem ocorreu em abril do mesmo ano para o Sr. Douglas Sandri das Neves; (iii) por alegado óbito do comprador, a transferência para o seu nome não foi efetivada, tendo o veículo sido repassado pelo irmão deste, Sr. Cleber, à recorrente Patrícia Schmitz, em julho de 2016, ocasião em que a mesma compareceu à revenda para firma do recibo veicular, haja vista ainda vigentes os poderes outorgados para tanto pelo proprietário registral – tais circunstâncias são extraídas do áudio aportado na p. 56 e do depoimento pessoal das partes constantes no termo de audiência (pp. 58-59).

Do que se seguiu, consta que, em outubro de 2016, o veículo foi reprovado em vistoria pelo Departamento Nacional de Trânsito por divergência de numeração do sequencial do chassi (pp. 12-14). Em janeiro de 2018, foi proposta a presente demanda com o objetivo de compelir as partes à efetivação da transferência, bem como ao ressarcimento dos danos morais experimentados pela compradora.

Não há dúvida que a inconsistência da numeração do chassi que impede a aprovação da vistoria veicular é considerada vício redibitório, a ensejar a aplicação do prazo de 90 (noventa) dias do artigo 26, do Código de Defesa do Consumidor. Não obstante, a pretensão indenizatória sujeita-se ao prazo trienal previsto no artigo 206, § 3º, V, do Código Civil, de forma que merece reforma a sentença.

A propósito, colhe-se precedente de caso análogo:



DIREITO DO CONSUMIDOR - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - VÍCIO OCULTO DE PRODUTO - RESTITUIÇÃO DO VALOR PAGO - PRAZO DECADENCIAL DE 90 DIAS, A PARTIR DA CONSTATAÇÃO (CDC, ART. 26, II E § 3º) - TRANSCURSO - DECADÊNCIA MANTIDA. Tratando-se de vício oculto de produto durável, o direito de reclamar decai no prazo de 90 (noventa) dias, que se inicia no momento em que ficar evidenciado o defeito (CDC, art. 26, II e § 3º). DANOS MORAIS - PLEITO INDENIZATÓRIO SUBMETIDO À PRESCRIÇÃO - PRAZO TRIENAL (CC, ART. 206, § 3º, V) - NÃO FLUÊNCIA - MERO ABORRECIMENTO - INOCORRÊNCIA 1 Prescreve em 3 (três) anos a pretensão de reparação civil (CC, art. 206, § 3º, V). (...). (TJSC, Apelação Cível n. 0300718-69.2015.8.24.0028, de Içara, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 04-06-2019).



Partindo dessa premissa, restando incontroverso que a obrigação de comunicação de alienação ao órgão de trânsito, obrigação do primeiro requerido (artigo 123, I, §1º, CTB) e da revendedora, por força do mandato que lhe foi outorgado, não restou cumprida no tempo e modo devidos, e que a parte que incumbia à adquirente/recorrente (artigo 134, CTB) restou obstada pela impossibilidade de apresentação do comprovante de aprovação de inspeção veicular (requisito previsto no inciso XI do referido artigo), reconhece-se a ocorrência de descumprimento contratual com...

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