Acórdão Nº 0300255-24.2015.8.24.0030 do Quarta Câmara de Direito Público, 03-12-2020

Número do processo0300255-24.2015.8.24.0030
Data03 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemImbituba
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0300255-24.2015.8.24.0030, de Imbituba

Relatora: Desembargadora Bettina Maria Maresch de Moura

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM INDENIZATÓRIA. MAGISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INCONFORMISMO DA AUTORA.

NECESSIDADE DA RESERVA DE 1/3 (UM TERÇO) DA JORNADA DE TRABALHO PARA ATIVIDADES EXTRACLASSE. ACOLHIMENTO. INTELIGÊNCIA DO § 4° DO ART. 2° DA LEI FEDERAL N. 11.738/08, CUJA CONSTITUCIONALIDADE FOI RECONHECIDA PELO STF E POR ESTA CORTE. JORNADA ENTRETANTO, QUE DEVE SER DESENVOLVIDA NA UNIDADE ESCOLAR.

PAGAMENTO DE HORAS EXTRAS, EM DECORRÊNCIA DA FRAÇÃO DE 1/3 (UM TERÇO) DA JORNADA DE TRABALHO PARA ATIVIDADES EXTRACLASSE, NÃO USUFRUÍDAS. POSTULAÇÃO RECHAÇADA. AUSÊNCIA DE PROVA QUANTO AO LABOR EXTRAORDINÁRIO. ÔNUS QUE COMPETIA À DEMANDANTE (ART. 333, I, DO CPC/73).

REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300255-24.2015.8.24.0030, da Comarca de Imbituba, 2ª Vara, em que é Apelante Erika Koenig Souza e Apelado Estado de Santa Catarina.


A Quarta Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Odson Cardoso Filho, com voto e dele participou a Desa. Vera Lúcia Ferreira Copetti.

Florianópolis, 03 de dezembro de 2020.


Bettina Maria Maresch de Moura

Relatora


RELATÓRIO

Erika Koenig Souza ajuizou "Ação Ordinária de Cobrança" contra o Estado de Santa Catarina aduzindo, em síntese, que labora como professora estadual, com carga horária semanal de 40 (quarenta) horas e que 1/3 (um terço) dessa jornada, deveria ser destinado às horas-atividade para "preparação e avaliação do trabalho didático, colaboração com a administração da escola, reuniões pedagógicas, articulação com a comunidade e ao aperfeiçoamento profissional, nos termos da Lei do Piso Nacional do Magistério" (fl. 1). Requereu a declaração do direito "de usufruir horas-atividade na proporção de 1/3 da sua jornada de trabalho", inclusive "fora do ambiente escolar", bem como a condenação do Réu "ao pagamento de 5,33 horas-extraordinárias por semana (aulas excedentes – considerando a jornada de 40 horas), dos períodos em que não gozou de 1/3 da carga horária para suas horas-atividade", acrescidas dos encargos legais (fl. 7). Postulou a gratuidade da justiça, valorou a causa e juntou documentos (fls. 8/32).

A gratuidade da justiça foi concedida (fl. 33).

Citado (fl. 36), o Réu apresentou contestação com documentos (fls. 38/64). Sustentou a inconstitucionalidade do § 4° do art. 2° da Lei n. 11.738/98. Aduziu que não há extrapolação do limite de 2/3 (dois terços) da carga horária, com atividades de interação com educandos. Impugnou o quantum pleiteado pela parte Autora. Ao final, postulou o reconhecimento incidental da inconstitucionalidade do art. 2º, § 4º da Lei n. 11.738/2008 e, via de consequência, a total improcedência dos pedidos formulados na inicial.

Houve réplica (fls. 68/77).

Sobreveio sentença (fls. 78/89), nos seguintes termos:


[...] Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por Erika Koenig Souza em face do Estado de Santa Catarina.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e aos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, ex vi do disposto no art. 85, §6º, do CPC, cuja exigibilidade encontra-se suspensa em virtude do deferimento dos benefícios da Justiça Gratuita (art. 98, § 3º, do CPC). [...]


Irresignada, a Autora interpôs apelação (fls. 94/98). Reitera a tese de necessidade da reserva de 1/3 (um terço) de sua jornada de trabalho para atividades extraclasse e de condenação do Estado "ao pagamento das Horas-Extraordinárias semanais (aulas excedentes – considerando jornada semanal de 40 horas), dos períodos em que não gozou de 1/3 da carga horária para sua hora-atividade" (fl. 98).

Sem contrarrazões (fl. 103), os autos ascenderam a esta Corte.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Cezar Ramos de Oliveira, pela desnecessidade de intervenção (fl. 112).

Este é o relatório.



VOTO

1. Da admissibilidade do recurso

Inicialmente, consigno que a decisão recorrida foi publicada quando já em vigor o Código de Processo Civil de 2015, devendo este regramento ser utilizado para análise do recebimento da apelação.

Neste sentido, é orientação do Superior Tribunal de Justiça, através do Enunciado Administrativo n. 3:


"Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC."


Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.


2. Do mérito

Trata-se de recurso de apelação interposto por Erika Koenig Souza em face da sentença que julgou improcedente o pedido formulado na "Ação Ordinária de Cobrança", por si deflagrada contra o Estado de Santa Catarina.

Em suas razões, reitera a tese de necessidade da reserva de 1/3 (um terço) de sua jornada de trabalho para atividades extraclasse e de condenação do Estado "ao pagamento das Horas-Extraordinárias semanais (aulas excedentes – considerando jornada semanal de 40 horas), dos períodos em que não gozou de 1/3 da carga horária para sua hora-atividade" (fl. 98).

Razão lhe assiste em parte.

O artigo 2° da Lei n. 11.738, de 16 de julho de 2008, que instituiu o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica, disciplina que:


Art. 2o O piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica será de R$ 950,00 (novecentos e cinqüenta reais) mensais, para a formação em nível médio, na modalidade Normal, prevista no art. 62 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.

§ 1o O piso salarial profissional nacional é o valor abaixo do qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial das Carreiras do magistério público da educação básica, para a jornada de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais.

§ 2o Por profissionais do magistério público da educação básica entendem-se aqueles que desempenham as atividades de docência ou as de suporte pedagógico à docência, isto é, direção ou administração, planejamento, inspeção, supervisão, orientação e coordenação educacionais, exercidas no âmbito das unidades escolares de educação básica, em suas diversas etapas e modalidades, com a formação mínima determinada pela legislação federal de diretrizes e bases da educação nacional.

§ 3o Os vencimentos iniciais referentes às demais jornadas de trabalho serão, no mínimo, proporcionais ao valor mencionado no caput deste artigo.

§ 4o Na composição da jornada de trabalho, observar-se-á o limite máximo de 2/3 (dois terços) da carga horária para o desempenho das atividades de interação com os educandos.

§ 5o As disposições relativas ao piso salarial de que trata esta Lei serão aplicadas a todas as aposentadorias e pensões dos profissionais do magistério público da educação básica alcançadas pelo art. 7o da Emenda Constitucional no 41, de 19 de dezembro de 2003, e pela Emenda Constitucional no 47, de 5 de julho de 2005.


Ao apreciar a questão da (in)constitucionalidade do § 4º, através da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.167/DF, o Supremo Tribunal Federal, decidiu:


CONSTITUCIONAL. FINANCEIRO. PACTO FEDERATIVO E REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIA. PISO NACIONAL PARA OS PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA. CONCEITO DE PISO: VENCIMENTO OU REMUNERAÇÃO GLOBAL. RISCOS FINANCEIRO E ORÇAMENTÁRIO. JORNADA DE TRABALHO: FIXAÇÃO DO TEMPO MÍNIMO PARA DEDICAÇÃO A ATIVIDADES EXTRACLASSE EM 1/3 DA JORNADA. ARTS. 2º, §§ 1º E 4º, 3º, CAPUT, II E III E 8º, TODOS DA LEI 11.738/2008. CONSTITUCIONALIDADE. PERDA PARCIAL DE OBJETO.

1. Perda parcial do objeto desta ação direta de inconstitucionalidade, na medida em que o cronograma de aplicação escalonada do piso de vencimento dos professores da educação básica se exauriu (arts. e da Lei 11.738/2008).

2. É constitucional a norma geral federal que fixou o piso salarial dos professores do ensino médio com base no vencimento, e não na remuneração global. Competência da União para dispor sobre normas gerais relativas ao piso de vencimento dos professores da educação básica, de modo a utilizá-lo como mecanismo de fomento ao sistema educacional e de valorização profissional, e não apenas como instrumento de proteção mínima ao trabalhador.

3. É constitucional a norma geral federal que reserva o percentual mínimo de 1/3 da carga horária dos docentes da educação básica para dedicação às atividades extraclasse. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. Perda de objeto declarada em relação aos arts. e da Lei 11.738/2008 (Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4167/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa. Data do julgamento: 27.04.2011) (g.n.)


Apesar da improcedência, o efeito vinculante que naturalmente decorreria do decisum, foi afastado em razão de empate na votação, consoante constou da ata da sessão:


Colhido o voto do Presidente, Ministro Cezar Peluso, que julgou procedente a ação relativamente ao § 4º do art. 2º da Lei 11.738/2008, o...

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