Acórdão Nº 0300259-67.2014.8.24.0007 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 09-06-2022

Número do processo0300259-67.2014.8.24.0007
Data09 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300259-67.2014.8.24.0007/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: WOLLSOFT ELETROSHOP EIRELI (AUTOR) ADVOGADO: DIOGENES MARTINS FLORES DE ALMEIDA (OAB SC048722) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

WOLLSOFT ELETROSHOP EIRELI e BANCO DO BRASIL S.A. interpuseram recursos de apelação da sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Biguaçu, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial (Evento 160 dos Autos Originários).

Na origem, WOLLSOFT ELETROSHOP EIRELI propôs ação revisional sob o argumento de que celebrou com o BANCO DO BRASIL contratos os quais possuem cláusulas abusivas, tais como juros remuneratórios acima de 12% ao ano e capitalização de juros. Requereu a tutela de urgência, a incidência do Código de Defesa do Consumidor, readequação da cláusulas ilegais e repetição do indébito (Petição 1 a 4, Evento 1, Autos Originários).

Citado, o réu apresentou contestação, suscitando, preliminarmente, a inépcia da petição inicial. No mérito, defende a legalidade das cláusulas contratuais, as quais foram livremente pactuadas entre as partes. Pugna a improcedência dos pedidos iniciais (Evento 12 dos Autos Originários).

Réplica (Evento 19 dos Autos Originários).

Realização de prova pericial contábil (Eventos 79, 104, 133 e 144 dos Autos Originários).

Na data de 8 de outubro de 2019, o juiz da causa, José Clésio Machado, prolatou sentença de parcial procedência, cujo dispositivo segue transcrito:

Diante do exposto, DEFIRO A LIMINAR para retirada do nome da Requerente dos cadastros de restrição ao crédito com relação aos contratos "Ourocard Empresa número 231198453", "Ourocard Empresa número 33495273" e "Cédula de Crédito Bancário de Renegociação 164.405.246", sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais); e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente Ação de Revisão Contratual proposta por Wollsoft Informatica LTDA ME em face de Banco do Brasil S/A, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para DETERMINAR A REVISÃO do Contratos firmados com o Requerido da seguinte forma:

a) limitando-se os juros remuneratórios ao limite do Bacen, para a espécie, salvo se cobrados juros efetivos mais benéficos, para os contratos "Ourocard Empresa número 231198453", "Ourocard Empresa número 33495273" e "Cédula de Crédito Bancário de Renegociação 164.405.246";

b) extirpando-se a capitalização de juros para os contratos "Ourocard Empresa número 231198453", "Ourocard Empresa número 33495273", "Cédula de Crédito Bancário de Renegociação 164.405.246" e "Cheque Especial conta corrente nº. 12.294-7";

c) aplicando-se, na inadimplência, apenas juros remuneratórios ao limite do Bacen, para a espécie, salvo se cobrados juros efetivos mais benéficos, para os contratos "Ourocard Empresa número 231198453", "Ourocard Empresa número 33495273" e "Cédula de Crédito Bancário de Renegociação 164.405.246", além de juros moratórios em 12% (doze por cento) ao ano e multa moratória de 2% (dois por cento); e juros da normalidade, com juros moratórios em 12% (doze por cento) ao ano e multa moratória de 2% (dois por cento) nos demais contratos;

d) correção monetária, se incidente, pelo INPC para todos os contratos - CONDENANDO a(o) Requerida(o) a compensar e/ou restituir os valores cobrados indevidamente na forma simples, com correção monetária pelo INPC desde o evento danoso (S. 43, STJ) e juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação (art. 406, CC).

Condeno a(o) Requerente ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, fixando estes em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), consoante o art. 85, §8º., c/c art. 86, parágrafo único, do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. (Evento 160 dos Autos Originários).

Opostos embargos de declaração pela autora, estes foram acolhidos nos seguintes termos:

Acolho os aclaratórios, diante do evidente equívoco, corrigindo a parte final da Sentença de fls. 1003/1011, devendo constar: "Condeno o Requerido ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, fixando estes em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), consoante o art. 85, §8º., c/c art. 86, parágrafo único, do Código de Processo Civil". Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após transitada em julgado, arquive-se.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. (Evento 174 dos Autos Originários).

O réu interpôs recurso de apelação, sustentando, em síntese, que (a) é descabida a revisão dos contratos, à luz do Código de Defesa do Consumidor, cujo teor deve ser mantido em atenção ao princípio da boa-fé e ao pacta sunt servanda; (b) os juros remuneratórios devem ser mantidos na forma originalmente pactuada; (c) não há ilegalidade na capitalização de juros; (d) os juros de mora são meras consequências, ou seja, meros acessórios, os quais, embutidos na comissão de permanência, dela são expurgados, com a aplicação da limitação legal; (e) é descabida a repetição do indébito; e (f) os ônus da sucumbência devem ser arcados pelo adversário. Ao final, pugna o prequestionamento da matéria (Evento 167 dos Autos Originários).

O autor também interpôs recurso, asseverando, por seu turno, que (a) é imperiosa a descaracterização da mora, porquanto constatada a abusividade de encargos cobrados durante o período de normalidade contratual, além do adimplemento substancial da dívida; (b) o pagamento da parte tida como incontroversa não é possível até que se proceda a liquidação dos valores de acordo com as diretrizes previstas no comando judicial, sendo descabida a incidência de encargos moratórios; e (c) os honorários advocatícios devem ser fixados de acordo com o art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Contrarrazões (Eventos 172 e 191 dos Autos Originários).

Ao aportar no Tribunal de Justiça, o recurso foi distribuído a esta relatoria por sorteio (Evento 1).

É o relatório.

VOTO

1. Exame de admissibilidade

Porquanto presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço dos recursos.

2. Fundamentação

2.1. Recurso do banco réu

2.1.1. Revisão dos contratos

Defende o apelante que não há abusividade nas cláusulas contratuais, tampouco na revisão das mesmas, porquanto o autor tinha ciência de seu teor ao assinar livremente os contratos em discussão.

Em que pese tal argumento, sem razão o banco recorrente neste tocante.

Na espécie, trata-se de uma relação de consumo propriamente dita, a qual se submete ao regime e proteção da Lei n. 8.078/90. É certo, por outro lado, que referida legislação tem incidência às entidades financeiras, aliás, como pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça por meio da Súmula 297, sob este verbete: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

Nesse sentido, pronuncia-se a jurisprudência deste Tribunal de Justiça:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO PARA FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. DECISÃO AGRAVADA QUE INDEFERIU A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO PACTA SUNT SERVANDA. SÚMULA 297 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. POSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA, NOS TERMOS DO ART. 6º, INCISO VIII, DO CDC. EVIDENTE HIPOSSUFICIÊNCIA TÉCNICA DO CONSUMIDOR DIANTE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DAS NORMAS DO CPC. RECURSO PROVIDO. Nos termos do que preceitua a Súmula 297 do STJ, o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. E, consoante o art. 6º, inciso VIII do CDC, são direitos básicos do consumidor a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente. Assim, ressalvada a aplicação subsidiária do CPC, no caso concreto deve ser deferida a inversão do ônus da prova em favor da parte autora, ante a hipossuficiência técnica frente a instituição financeira ré. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (Agravo de Instrumento n. 4027480-12.2018.8.24.0000, de Palhoça, rel. Des. Dinart Francisco Machado, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 10-9-2019).

CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO E OUTRAS AVENÇAS. REVISÃO. PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELOS DAS PARTES. APELO DA PARTE DEMANDANTE [...] INCIDÊNCIA DAS NORMAS PROTETIVAS DO CONSUMIDOR, NOS TERMOS DA SÚMULA N. 297 DO STJ. PRINCÍPIO DA AUTONOMIA DA VONTADE MITIGADO NA HIPÓTESE. Em atenção ao art. 6º, inciso V e ao art. 51, ambos previstos no Código de Defesa do Consumidor, é patente a possibilidade de revisão, pelo Poder Judiciário, das cláusulas contidas nos contatos que instrumentalizam as relações de consumo, especialmente com o fim de aniquilar as arbitrariedades comumente inseridas nos contratos de adesão, tal como nos contratos de natureza bancária. Ademais, a revisão das cláusulas contratuais é permitida também sob à ótica do Código Civil, à luz dos princípios da função social do contrato (art. 421) e da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT