Acórdão Nº 0300282-89.2015.8.24.0035 do Quarta Câmara de Direito Civil, 28-04-2022

Número do processo0300282-89.2015.8.24.0035
Data28 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300282-89.2015.8.24.0035/SC

RELATOR: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA

APELANTE: AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. ADVOGADO: CARLOS EDUARDO CAVALCANTE RAMOS (OAB SC042176) APELADO: CLEITON RAFAEL FOSTER ADVOGADO: ÉDIO CARLOS MACHADO (OAB SC004130) ADVOGADO: DJONATAN HASSE (OAB SC039208)

RELATÓRIO

A bem dos princípios da celeridade e da economia processual adoto o relatório da sentença, in verbis (evento 30 - SENT48):

Cleiton Rafael Foster ajuizou ação condenatória com pedido de tutela antecipada contra Santander - Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A. Alegou que é avalista de Maria Inês Vieira, no contrato de financiamento n. 20019135820, na modalidade de crédito direto ao consumidor, tendo adquirido o veículo VW/Saveiro 1.6 SuperSurf, placas MDC 9846, ano 2005/2005, e contratado seguro prestamista. A contratante Maria Inês Vieira veio a óbito em 23.04.2014 e até aquele momento as prestações do financiamento estavam quitadas. Ante a contratação de seguro prestamista, o autor solicitou a quitação do restante do saldo devedor do financiamento. A ré solicitou o aviso de sinistro por morte preenchido e assinado pelo beneficiário e pelo médico assistente do segurado. Alegou que entrou em contato com o médico assistente e este se recusou a assinar o documento sob o fundamento de que há vedação ética prevista no art. 1º da Resolução n. 2003/2012 do Conselho Federal de Medicina. Disse que informou a ré acerca da recusa do médico assistente em assinar o documento e que as informações necessárias já constam na certidão de óbito, no entanto, a ré recusou o pagamento por falta de documentos. Alegou que notificou extrajudicialmente a ré e esta quedou-se inerte, além de inscrever seu nome nos órgãos de proteção ao crédito. Após o falecimento da contratante, pagou três parcelas que somam R$ 1.933,15. Requereu a condenação da ré ao pagamento do seguro prestamista e quitação do contrato, a exclusão do seu nome dos órgãos de proteção ao crédito, danos morais e repetição do indébito.

Postergou-se a análise do pedido liminar para depois do contraditório e inverteu-se o ônus da prova.

Citada, a ré apresentou defesa na forma de contestação. Preliminarmente, suscitou a ilegitimidade passiva. No mérito, afirmou que o autor não encaminhou todos os documentos indicados pela seguradora, impossibilitando aferir se as condições para recebimento da indenização foram cumpridas, além da inexistência de vício ou defeito no negócio jurídico firmado, ausência de parâmetro para a fixação do quantum indenizatório e impossibilidade de inversão do ônus da prova.

Houve réplica.

Saneado o feito, afastou-se a preliminar de ilegitimidade passiva e determinou-se a intimação da ré para exibir o contrato de financiamento e a apólice do seguro prestamista em nome de Maria Inês Vieira.

Apresentados os documentos (págs. 108-146), intimou-se a parte autora para manifestar-se a respeito.

Após manifestação, vieram os autos conclusos.

O juiz Giancarlo Rossi assim decidiu (evento 30 - SENT48):

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados por Cleiton Rafael Foster contra Santander - Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A, extinguindo o feito com resolução do mérito (NCPC, art. 487, I), para condenar a ré a quitar o saldo devedor da cédula de crédito bancário n. 20019135820; a restituir ao autor, de forma simples, o valor de R$1.933,15, corrigidos monetariamente pelo INPC a partir da data de pagamento de cada parcela, com incidência de juros de mora de 1% ao mês desde a citação e, por fim, a indenizar o autor por danos morais, em valor correspondente a R$ 15.000,00, corrigidos a partir da publicação desta sentença, acrescidos de juros (1% am) desde 19/2/2015, data da declaração de pág. 39, já que não se sabe ao certo a dia da negativação (ato ilícito).

Defiro o pedido de tutela provisória de urgência para determinar a imediata baixa do registro existente em nome do autor nos cadastros da Serasa, quais sejam, aqueles descritos à pág. 39. Oficie-se à Serasa para cumprimento imediato desta decisão.

Condeno o réu ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios que fixo em 15% sobre o valor da indenização por danos morais e daquele relativo à repetição de indébito.

Apelou a ré Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A (evento 36 - PET52 e PET53/origem), insistindo: a) que a recusa ao pagamento da indenização securitária foi legítima, ante a não apresentação da documentação necessária para a regulação do sinistro, destacando que sequer a certidão de óbito da segurada foi entregue; b) o contrato foi firmado em 2012 e, de acordo com a documentação apresentada, a segurada possuía moléstia grave desde 2011; c) a existência da doença foi omitida, de má-fé, no ato da contratação do seguro, configurando a perda do direito à indenização; d) a ré não cometeu ato ilícito capaz de ensejar o dever de indenizar; e) não resultou comprovada a ocorrência de abalo moral indenizável; f) de igual sorte, não foram demonstrados os danos materiais reclamados. Subsidiariamente, requer: g) a minoração do quantum indenizatório, levando-se em consideração a conduta da vítima e ausência de função punitiva da indenização por danos morais; h) a estipulação do termo inicial da contagem dos juros de mora e da correção monetária sobre a indenização por danos morais na data em que o valor foi fixado.

Peticionou a ré (evento 37 - PET55/origem) informando que, cumprindo a obrigação de fazer imposta na sentença, retirou os registros negativos em nome do autor.

O autor apresentou contrarrazões (evento 48 - PET64 e PET65/origem) defendendo a manutenção da sentença, dizendo que "a Apelante tinha toda documentação e informações necessárias ao regular pagamento do seguro prestamista" (p. 4). Ressaltou, ademais, que a tese de preexistência da doença configura inovação recursal, visto que não foi suscitada em primeiro grau de jurisdição. Alegou, ainda, que "quando da contratação do seguro prestamista, a segurada Sra. Maria informou ao preposto da Apelante que era portadora de doença cancerígena. Nada obstante, na expectativa de vender o referido contrato de financiamento e seguro, o preposto da Apelante afirmou que tal fato seria irrelevante, que não causaria empecilho para o pagamento de eventual cobertura" (p. 7).

Na decisão de evento 33 foi reconhecida a presença dos requisitos de admissibilidade do recurso.

O recurso foi distribuído, inicialmente, ao desembargador José Maurício Lisboa, integrante da 1ª Câmara de Direito Comercial que, considerando que a ação tem esteio em normas civilistas, determinou a sua redistribuição às Câmaras de Direito Civil (evento 42).

Aportou aos autos petição da Santander Corretora de Seguros, Investimentos e Serviços e outro (evento 50 - PET1) informando que "não se opõe ao julgamento virtual, assim como dispensa a realização de sustentação oral", e requerendo que "as intimações de todos os atos e termos do processo sejam feitas ÚNICA e EXCLUSIVAMENTE em nome do advogado DR. HENRIQUE JOSÉ PARADA SIMÃO, OAB/SP 221.386".

VOTO

1 Admissibilidade

A sentença foi prolatada e publicada sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, à luz do qual o caso será apreciado, consoante o Enunciado Administrativo nº 3 do Superior Tribunal de Justiça.

O recurso é tempestivo e houve recolhimento do preparo, conforme decisão de evento 33.

O autor sustentou, em contrarrazões, que "em nenhum momento da negativa administrativa, bem como em nenhum momento da sua contestação ou defesa de primeiro grau a Apelante alegou o fato de doença pré-existente para justificar a negativa de pagamento do seguro, sendo cediço que é defeso ao apelante, em fase recursal, suscitar fatos não apresentados no juízo inferior" (evento 48 - PET64, p. 5).

A argumentação merece acolhimento.

Compulsando os autos, verifico que, de fato, a ré não alegou a preexistência da patologia da segurada como fundamento para a negativa da indenização, pautando toda a sua defesa na falta de documentos necessários para a regulação do sinistro.

Assim, porque a aludida tese não foi suscitada em primeiro grau, caracterizando evidente inovação recursal, mormente em não se tendo demonstrado motivo de força maior a justificar a omissão anterior, ou a superveniência de fato independente hábil a agasalhar o conhecimento do alegado somente nesta instância (artigo 493 c/c artigo 1.014, ambos do CPC), deixo de conhecer do recurso, neste particular.

Em situação similar, já decidiu este Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DO SEGURO OBRIGATÓRIO (DPVAT). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.APELO DA RÉ.ALEGADA INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR EM RAZÃO DA PREEXISTÊNCIA DA LESÃO INCAPACITANTE DO SEGURADO. NÃO CONHECIMENTO. ARGUMENTO NÃO SUSCITADO NA CONTESTAÇÃO E POR ISSO NÃO ANALISADO NA ORIGEM. INOVAÇÃO RECURSAL CONFIGURADA. IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO DA MATÉRIA, SOB PENA DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA.FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. ART. 85, §§ 2º E 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. SENTENÇA PUBLICADA APÓS A VIGÊNCIA DO ATUAL DIPLOMA PROCESSUAL CIVIL. MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA QUE SE IMPÕE.RECURSO NÃO CONHECIDO.(AC n. 0301873-83.2019.8.24.0023, Rel. Carlos Roberto da Silva, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 4/6/2020).

Preenchidos, no mais, os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

2 Do direito à indenização securitária

A ré insiste na legitimidade da recusa do pagamento da cobertura do seguro prestamista, visto que não foi entregue a documentação necessária para a análise do pedido.

Razão não lhe assiste.

Dispõe o Código de Processo Civil:

Art. 765. O segurado e o segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.

Art. 766. Se o segurado, por si ou por seu representante, fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa...

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