Acórdão Nº 0300283-22.2017.8.24.0256 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 06-10-2020

Número do processo0300283-22.2017.8.24.0256
Data06 Outubro 2020
Tribunal de OrigemAnchieta
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0300283-22.2017.8.24.0256, de Anchieta

Relator: Desembargador Robson Luz Varella

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ANULATÓRIA DE NEGÓCIO JURÍDICO - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - RECURSO INTERPOSTO PELA PARTE ACIONADA.

QUESTIONADA A AUSÊNCIA DE OUTORGA UXÓRIA PARA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEIS NO BOJO DE CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO - CONTUDO, BENS PERTENCENTES À TERCEIROS INTERVENIENTES, E NÃO À SOCIEDADE CONJUGAL DA AUTORA - PROMESSA DE COMPRA E VENDA EM FAVOR DA ACIONANTE E SEU CONSORTE INSUFICIENTE PARA TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE EM SEU BENEFÍCIO - FALTA DE REGISTRO DO NEGÓCIO, OU DE COMPROVADA CIÊNCIA DA ACIONADA ACERCA DA AVENÇA - APLICAÇÃO DO DISPOSTO NOS ARTS. 1.227 E 1.245, § 1º, DO CÓDIGO CIVIL - INOPONIBILIDADE DO AJUSTE DE VONTADES À RÉ - INEXIGIBILIDADE DA AUTORIZAÇÃO DA APELADA, COM FULCRO NO ART. 1.647, I, DO DIPLOMA CIVIL, POIS OS TERRENOS DISPUTADOS NÃO LHES PERTENCIAM AO TEMPO DA CONSTITUIÇÃO DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA - RECONHECIMENTO DA VALIDADE DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA ASSENTADA - PROVIMENTO DO RECLAMO QUE CULMINA NA NECESSIDADE DE EXAME DOS PLEITOS EXORDIAIS SUBSIDIÁRIOS - ANÁLISE, COM BASE NO ART. 1.013, § 1º, DO CÓDIGO PROCESSUAL CIVIL - POSTULADA RESERVA DE MEAÇÃO RELATIVA AOS IMÓVEIS LITIGIOSOS OU O RECONHECIMENTO DE SUA IMPENHORABILIDADE NA FORMA DA LEI N. 8.009/1990 - INVIABILIDADE, DE ACORDO COM OS MESMOS FUNDAMENTOS ACIMA EXTERNADOS - ACIONANTE E SEU COMPANHEIRO QUE NÃO TITULARIZAM OS BENS - IMPROCEDÊNCIA DA DEMANDA - INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS IMPOSITIVA.

A teor do disposto nos arts. 1.227 e 1.245, § 1º, ambos do Código Civil, a transmissão da propriedade imobiliária demanda o registro do negócio aquisitivo perante o Ofício Imobiliário, não bastando, para tanto, a mera celebração de promessa de compra e venda tendo por objeto o imóvel.

Na situação telada, muito embora a autora afirme a invalidade da alienação fiduciária sobre os imóveis de matrículas n. 3.072 e 3.073 do Registro Imobiliário de Modelo/SC, realizada no âmbito da Cédula de Crédito Bancário de n. 81120-3, por falta da outorga uxória preconizada no art. 1.647, I, do Código Civil, observa-se que, de acordo com o registro, os proprietários dos terrenos são terceiros intervenientes na constituição da garantia, de modo que os bens não integram a sociedade conjugal da demandante, a tornar inexigível a sustentada autorização desta.

Ainda, não obstante a existência de promessa de compra e venda envolvendo os imóveis debatidos, tal avença não foi devidamente registrada, e tampouco era do comprovado conhecimento da ré, tornando-se inoponível relativamente a esta, e afigurando-se válida a constituição da propriedade fiduciária em seu favor.

Os pedidos subsidiários formulados na exordial, de reserva da meação referente aos terrenos, ou reconhecimento de sua impenhorabilidade com espeque na Lei n. 8.009/1990, e cuja análise é efetivada com base no art. 1.013, § 1º, da Lei Adjetiva Civil, merecem igualmente rejeição, de acordo com os mesmos fundamentos acima externados, porquanto pressupõem a propriedade dos imóveis pela acionante.

Consequentemente, imperiosa a improcedência da totalidade das postulações inaugurais, com inversão dos corolários da derrota a fim de que observem a regra do art. 85, caput, da Lei Instrumental Civil, mantido o estipêndio patronal de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) fixado em primeira instância.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS - PROVIMENTO DO RECLAMO - ESTIPÊNDIO PATRONAL DEVIDO AO PROCURADOR DA PARTE VENCEDORA QUE DECORRE DA INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA - DESCABIMENTO DE MAJORAÇÃO - ENTENDIMENTO ASSENTADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO JULGAMENTO DOS EDCL. NO AGINT NO RESP. 1573573 / RJ.

Em caso de provimento da insurgência, o estipêndio patronal devido ao causídico da parte vencedora decorre da inversão da sucumbência promovida pelo julgado, não havendo falar no estabelecimento de honorários recursais.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300283-22.2017.8.24.0256, da comarca de Anchieta Unidade Regional de Direito Bancário do Extremo O em que é/são Apelante(s) Cooperativa de Crédito de Livre Admissão de Associados Itaipu Sicoob Pinhalzinho e Apelado(s) Marina Rita Chagas.

A Segunda Câmara de Direito Comercial decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso para, reformando a sentença, reconhecer a validade da alienação fiduciária tratada às fls. 37/49 e, por consectário, julgar improcedentes os pedidos exordiais, invertendo-se os ônus sucumbenciais. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado na data de 06 de outubro de 2020, os Exmos. Srs. Des. Altamiro de Oliveira e Newton Varella Júnior.

Florianópolis, 23 de outubro de 2020.

Desembargador Robson Luz Varella

Relator


RELATÓRIO

Cooperativa de Crédito de Livre Admissão de Associados Itaipu apelou da sentença de fls. 125/129, a qual julgou procedentes os pleitos formulados por Marina Rita Chagas em "ação anulatória de ato jurídico", nos seguintes termos:

Ante o exposto, confirmo a tutela antecipatória de fls. 71/73 e julgo procedente o pedido inicial, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para declarar nula a cláusula de alienação fiduciária da cédula de crédito bancário n. 81120-3 sobre os imóveis registrados perante o Ofício de Registros de Imóveis, Civis das Pessoas Naturais, Interdições e Tutela, Pessoa Jurídicas e Títulos e Documentos da Comarca de Modelo/SC, matriculados sob os ns. 3.072 e 3.073. Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários de sucumbência, os quais fixo em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), nos termos do artigo 85, § 8º, do CPC.

Em suas razões (fls. 133/142), sustenta que o juízo "a quo" fundou-se em premissa fática equivocada, porquanto a garantia questionada na exordial não foi oferecida pelo cônjuge da autora, mas sim, pelos srs. Cláudio Luiz Zorzi e Darli Maria Zorzi, verdadeiros proprietários do bem garantidor, conforme constante da matrícula imobiliária correspondente. Afirma a prescindibilidade da outorga uxória da demandante, afastando-se a observância do art. 1.647, I, do Código Civil, a se concluir pela validade da alienação fiduciária realizada na Cédula de Crédito Bancário n. 81120-3. Postula, dessa forma, a improcedência dos pedidos inaugurais, com inversão dos ônus de sucumbência.

Foram oferecidas contrarrazões às fls. 148/150.

É o necessário relatório.


VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra decisão que decretou a nulidade de alienação fiduciária em garantia.

O ato jurídico questionado é a garantia prestada na Cédula de Crédito Bancário n. 81120-3, emitida por Jamartini Indústria Comércio e Representações Ltda Me, sobre os imóveis de matrícula n. 3.072 e 3.073 do Registro Imobiliário de Modelo.

A cártula em comento possui como avalista o cônjuge da acionante, sr. Jamir Martini, e foi ajustada na importância de R$ 510.000,00 (quinhentos e dez mil reais), com vencimento para 30/8/2023.

A controvérsia recursal gira em torno da validade do negócio acessório ao título.

Pois bem. O art. 1.647, I, do Código Civil, invocado pela autora, exige a outorga uxória da mulher, em caso de venda de imóveis componentes da sociedade conjugal pelo marido, exceto no regime de separação absoluta de bens:

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:

I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;

A regra mencionada, porém, é inaplicável ao caso concreto, porquanto os terrenos disputados foram alienados não pelo cônjuge da demandante, mas pelos srs. Cláudio Luiz Zorzi e Darli Maria Zorzi, proprietários registrais dos imóveis, os quais participaram do ato jurídico objurgado, consoante certidões de fls. 23/27 e 28/32, e cédula de fls. 37/49.

Inclusive, do teor das cláusulas negociais, infere-se serem os srs. Cláudio Luiz Zorzi e Darli Maria Zorzi os prestadores da garantia, e não o marido da apelada.

Não se desconhece a promessa de compra e venda acostada às fls. 21/22, tendo por objeto os bens ora debatidos, entabulada entre os proprietários registrais e a acionante e seu consorte.

No entanto, tal negócio não se encontrava registrado nas matrículas imobiliárias de n. 3.072 e 3.073, tampouco era de comprovado conhecimento da parte demandada, de modo que, quanto a esta, revela-se inoponível.

Com efeito, não obstante eventual direito obrigacional havido pelos promissários compradores em face dos promitentes vendedores, em razão da avença celebrada, a carência do registro, ou mesmo da ciência daquele a quem se pretende opor o ajuste de vontades, torna inconclusa a transferência da propriedade, nos moldes dos arts. 1.245, § 1º, e 1.227, do Código Civil, "in verbis":

Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

§ 1 o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.

E:

Art. 1.227. Os direitos reais...

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