Acórdão Nº 0300284-75.2019.8.24.0049 do Quarta Câmara de Direito Civil, 09-12-2021
Número do processo | 0300284-75.2019.8.24.0049 |
Data | 09 Dezembro 2021 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça de Santa Catarina |
Órgão | Quarta Câmara de Direito Civil |
Classe processual | Apelação |
Tipo de documento | Acórdão |
Apelação Nº 0300284-75.2019.8.24.0049/SC
RELATOR: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO
APELANTE: JUNIOR DA SILVA ROSA (AUTOR) APELADO: LIBERTY SEGUROS S/A (RÉU)
RELATÓRIO
Em atenção aos princípios da economia e da celeridade processual, adoto o relatório da sentença [evento 20 - EPROC1] por retratar com fidedignidade a tramitação da ação naquela instância:
"Trata-se de "ação ordinária de cobrança de seguro" movida por Junior da Silva Rosa - ME em face de Liberty Seguros, em que aduz, em síntese, que: a) contratou com a requerida um seguro de seu caminhão "CARGO 1622 Turbo", placa LXU6299, ano/modelo 1995, chassi n. 9BFFYTNFT3SDB74108, que lhe segurava em face de danos, furtos e roubos; b) em 01/12/2018, enquanto vigente a apólice de seguro, teve seu bem furtado quando, por motivos de falha mecânica, foi obrigado a parar seu caminhão e ir a pé buscar as chaves para conserto; c) encaminhado pedido administrativo, a requerida respondeu negativamente aduzindo irregularidades que desobrigariam a seguradora da indenização.
Derradeiramente requereu a procedência dos pedidos para condenar a requerida ao pagamento de danos materiais estabelecidos em R$ 47.995,00 (quarenta e sete mil, novecentos e noventa e cinco reais).
Como documentos trouxe, mormente, apólice de seguro (fls. 09-12), manual de condições gerais do seguro (fls. 13-143), boletim de ocorrência (fls. 144-145) e ofício informando a não indenização administrativa (fl. 146).
O despacho de fls. 150-151 recebeu o feito e determinou a citação da requerida que contestou (fls. 157-170), arguindo, em suma, que: a) o seguro não cobre todo e qualquer risco, não garante reembolso a toda e qualquer indenização suportada pelo segurado, mas apenas os riscos decorrentes de eventos previstos pela apólice; b) quando da regularização do sinistro o segurado afirmou que não possuía a chave do veículo, que a ignição foi alterada de ignição por chaves para ignição direta, de modo que para dar a partida no veículo bastava apertar um botão, que a porta ficava destrancada em razão de danos e que o veículo foi largado na estrada sem qualquer cuidado após falha mecânica; c) a incidência de tais circunstâncias caracterizam-se agravamento de risco a ponto de levar à perda de todas as garantias contratadas; d) as alterações no veículo não foram informadas à seguradora para que pudesse reanalisar a contratação; e) em caso de condenação deverá ficar condicionada à transferência do salvado livre e desembaraçado de qualquer ônus à seguradora.
Por fim requereu seja o pedido autoral julgado improcedente.
Juntou com a contestação documentos, principalmente, apólice de seguro (fls. 176-179) e gravação da entrevista do segurado (fl. 183).
Impugnação à contestação às fls. 184-188".
O ilustre Magistrado a quo, reconhecendo o agravamento injustificado do risco pela segurada, prolatou sentença, julgando improcedente o pedido exordial, condenando a Requerente ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC.
Inconformada, a Requerente interpôs recurso de apelação [evento 25 - EPROC1], pugnando pela reforma da sentença, aduzindo em síntese que no caso não restou demonstrado agravamento do risco do seguro contratado por parte da segurada.
Defende que não se olvida a utilização da gravação clandestina, mas como o teor da gravação foi negado pela demandante, afirma que outros meios de prova deveriam ter sido produzidos pela Requerida/Apelada, mas que não ocorreu. Aliado a isso ainda menciona que não se mostra possível averiguar a integridade do áudio.
Ressalta ainda, que mesmo levando a efeito o referido áudio, não haveria razoes para seguradora negar a cobertura, porquanto afirma que os problemas de tranca da porta e adaptação da ignição eram se conhecimento da seguradora, pois certamente antes de aceitar a proposta foi feita vistoria no veiculo pela seguradora.
Aduz ainda que o fato do veiculo ter sido deixado as margens da estrada não configura agravamento no risco, e, portanto, deve ser reformada a sentença, condenando a seguradora ao pagamento da indenização securitária.
Contrarrazões [evento 30 - EPROC1].
Este é o relatório.
VOTO
Ab initio, sobreleva consignar que a sentença objurgada e sua publicação ocorreram sob a vigência do Diploma Processual Civil de 2015, atraindo, portanto, a aplicação do Enunciado Administrativo n. 3 da Corte da Cidadania à hipótese em análise, in verbis:
Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.
No mais, o recurso de apelação interposto é cabível, tempestivo e preenche os requisitos de admissibilidade, razão pela qual defiro o seu processamento, passando a análise do mérito.
Insurgem-se a Requerente/Apelante contra sentença que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, em razão do reconhecimento de que a atitude da segurada foi o fator preponderante para a ocorrência do sinistro, dando margem ao agravamento do risco, afastando-se a responsabilidade da seguradora da indenização pelo furto do veículo. Aduz em sua defesa a inexistência de conduta hábil ao agravamento do risco.
Inicialmente, destaca-se que a relação pactuada entre as partes é de origem consumerista, porquanto "o contrato de seguro envolve relação de consumo, razão pela qual se aplicam as disposições constantes do Código de Defesa do Consumidor à ação de cobrança" (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0033410-50.2016.8.24.0000, de Chapecó, rel. Des. Subs. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, j. 19-09-2016).
Por conseguinte, a norma civilista, especificamente no art. 757, caput, do Código Civil, estabelece que "pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados", ou seja, as seguradoras possuem o dever de indenizar nos casos em que a ocorrência do risco esteja previamente fixada no contrato.
Também sobre o conceito de seguro, leciona Sergio Cavalieri Filho:
"[...] seguro é contrato pelo qual o segurador, mediante o recebimento de um prêmio, assume perante o segurado a obrigação de pagar-lhe uma determinada indenização, prevista no contrato, caso o risco a que está sujeito se materialize em um sinistro. Segurador e segurado negociam as consequências econômicas do risco, mediante a obrigação do segurador de repará-los" (Programa de Direito do Consumidor. São Paulo: Atlas, 2014, p. 263).
Assim, devidamente comprovado o prejuízo previsto entre os riscos predeterminados pelo contrato, é dever da entidade seguradora adimplir com a quantia acordada, em estrita conformidade com as condições pactuadas. É o que se extrai do artigo 776 do Código Civil:
"Art. 776. O segurador é obrigado a pagar em dinheiro o prejuízo resultante do risco assumido, salvo se convencionada a reposição da coisa."
O segurado, por sua vez, perderá o...
RELATOR: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO
APELANTE: JUNIOR DA SILVA ROSA (AUTOR) APELADO: LIBERTY SEGUROS S/A (RÉU)
RELATÓRIO
Em atenção aos princípios da economia e da celeridade processual, adoto o relatório da sentença [evento 20 - EPROC1] por retratar com fidedignidade a tramitação da ação naquela instância:
"Trata-se de "ação ordinária de cobrança de seguro" movida por Junior da Silva Rosa - ME em face de Liberty Seguros, em que aduz, em síntese, que: a) contratou com a requerida um seguro de seu caminhão "CARGO 1622 Turbo", placa LXU6299, ano/modelo 1995, chassi n. 9BFFYTNFT3SDB74108, que lhe segurava em face de danos, furtos e roubos; b) em 01/12/2018, enquanto vigente a apólice de seguro, teve seu bem furtado quando, por motivos de falha mecânica, foi obrigado a parar seu caminhão e ir a pé buscar as chaves para conserto; c) encaminhado pedido administrativo, a requerida respondeu negativamente aduzindo irregularidades que desobrigariam a seguradora da indenização.
Derradeiramente requereu a procedência dos pedidos para condenar a requerida ao pagamento de danos materiais estabelecidos em R$ 47.995,00 (quarenta e sete mil, novecentos e noventa e cinco reais).
Como documentos trouxe, mormente, apólice de seguro (fls. 09-12), manual de condições gerais do seguro (fls. 13-143), boletim de ocorrência (fls. 144-145) e ofício informando a não indenização administrativa (fl. 146).
O despacho de fls. 150-151 recebeu o feito e determinou a citação da requerida que contestou (fls. 157-170), arguindo, em suma, que: a) o seguro não cobre todo e qualquer risco, não garante reembolso a toda e qualquer indenização suportada pelo segurado, mas apenas os riscos decorrentes de eventos previstos pela apólice; b) quando da regularização do sinistro o segurado afirmou que não possuía a chave do veículo, que a ignição foi alterada de ignição por chaves para ignição direta, de modo que para dar a partida no veículo bastava apertar um botão, que a porta ficava destrancada em razão de danos e que o veículo foi largado na estrada sem qualquer cuidado após falha mecânica; c) a incidência de tais circunstâncias caracterizam-se agravamento de risco a ponto de levar à perda de todas as garantias contratadas; d) as alterações no veículo não foram informadas à seguradora para que pudesse reanalisar a contratação; e) em caso de condenação deverá ficar condicionada à transferência do salvado livre e desembaraçado de qualquer ônus à seguradora.
Por fim requereu seja o pedido autoral julgado improcedente.
Juntou com a contestação documentos, principalmente, apólice de seguro (fls. 176-179) e gravação da entrevista do segurado (fl. 183).
Impugnação à contestação às fls. 184-188".
O ilustre Magistrado a quo, reconhecendo o agravamento injustificado do risco pela segurada, prolatou sentença, julgando improcedente o pedido exordial, condenando a Requerente ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC.
Inconformada, a Requerente interpôs recurso de apelação [evento 25 - EPROC1], pugnando pela reforma da sentença, aduzindo em síntese que no caso não restou demonstrado agravamento do risco do seguro contratado por parte da segurada.
Defende que não se olvida a utilização da gravação clandestina, mas como o teor da gravação foi negado pela demandante, afirma que outros meios de prova deveriam ter sido produzidos pela Requerida/Apelada, mas que não ocorreu. Aliado a isso ainda menciona que não se mostra possível averiguar a integridade do áudio.
Ressalta ainda, que mesmo levando a efeito o referido áudio, não haveria razoes para seguradora negar a cobertura, porquanto afirma que os problemas de tranca da porta e adaptação da ignição eram se conhecimento da seguradora, pois certamente antes de aceitar a proposta foi feita vistoria no veiculo pela seguradora.
Aduz ainda que o fato do veiculo ter sido deixado as margens da estrada não configura agravamento no risco, e, portanto, deve ser reformada a sentença, condenando a seguradora ao pagamento da indenização securitária.
Contrarrazões [evento 30 - EPROC1].
Este é o relatório.
VOTO
Ab initio, sobreleva consignar que a sentença objurgada e sua publicação ocorreram sob a vigência do Diploma Processual Civil de 2015, atraindo, portanto, a aplicação do Enunciado Administrativo n. 3 da Corte da Cidadania à hipótese em análise, in verbis:
Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.
No mais, o recurso de apelação interposto é cabível, tempestivo e preenche os requisitos de admissibilidade, razão pela qual defiro o seu processamento, passando a análise do mérito.
Insurgem-se a Requerente/Apelante contra sentença que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, em razão do reconhecimento de que a atitude da segurada foi o fator preponderante para a ocorrência do sinistro, dando margem ao agravamento do risco, afastando-se a responsabilidade da seguradora da indenização pelo furto do veículo. Aduz em sua defesa a inexistência de conduta hábil ao agravamento do risco.
Inicialmente, destaca-se que a relação pactuada entre as partes é de origem consumerista, porquanto "o contrato de seguro envolve relação de consumo, razão pela qual se aplicam as disposições constantes do Código de Defesa do Consumidor à ação de cobrança" (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0033410-50.2016.8.24.0000, de Chapecó, rel. Des. Subs. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, j. 19-09-2016).
Por conseguinte, a norma civilista, especificamente no art. 757, caput, do Código Civil, estabelece que "pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados", ou seja, as seguradoras possuem o dever de indenizar nos casos em que a ocorrência do risco esteja previamente fixada no contrato.
Também sobre o conceito de seguro, leciona Sergio Cavalieri Filho:
"[...] seguro é contrato pelo qual o segurador, mediante o recebimento de um prêmio, assume perante o segurado a obrigação de pagar-lhe uma determinada indenização, prevista no contrato, caso o risco a que está sujeito se materialize em um sinistro. Segurador e segurado negociam as consequências econômicas do risco, mediante a obrigação do segurador de repará-los" (Programa de Direito do Consumidor. São Paulo: Atlas, 2014, p. 263).
Assim, devidamente comprovado o prejuízo previsto entre os riscos predeterminados pelo contrato, é dever da entidade seguradora adimplir com a quantia acordada, em estrita conformidade com as condições pactuadas. É o que se extrai do artigo 776 do Código Civil:
"Art. 776. O segurador é obrigado a pagar em dinheiro o prejuízo resultante do risco assumido, salvo se convencionada a reposição da coisa."
O segurado, por sua vez, perderá o...
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