Acórdão Nº 0300295-44.2014.8.24.0061 do Sexta Câmara de Direito Civil, 03-05-2022

Número do processo0300295-44.2014.8.24.0061
Data03 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300295-44.2014.8.24.0061/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ CARVALHO

APELANTE: LUIZ GUSTAVO ALVES PEREIRA CARDOSO APELADO: ADM DO BRASIL LTDA (RÉU) APELADO: GLOBAL LOGISTICA E TRANSPORTE LTDA (RÉU)

RELATÓRIO

Reproduzo, por sua qualidade e completude, o relatório da sentença:



Trata-se de ação de indenização ajuizada por LUIZ GUSTAVO ALVES PEREIRA CARDOSO em face de ADM do Brasil Ltda. e Global Logística e Transportes Ltda., todos(as) devidamente qualificados(as) nos autos.

Relatou a parte autora, em síntese, que, na noite do dia 24.09.2013, expressiva quantidade de fertilizante de propriedade da primeira ré, que se encontrava armazenada em galpão pertencente à segunda ré, situado neste município de São Francisco do Sul, entrou em combustão advinda de reação química, provocando, por conseguinte, a formação de vultosa cortina de fumaça que, imediatamente, atingiu diversos bairros da cidade.

Exultou que, diante dos possíveis riscos à saúde humana, decorrentes da inalação da fumaça tóxica, os moradores dos bairros mais afetados foram alertados pela Defesa Civil e Bombeiros Voluntários de que deveriam deixar suas residências, o que ocasionou tumulto, medo e insegurança.

Em consequência, após tecer os fundamentos que entendeu embasar seu direito, pugnou pela condenação solidária das rés ao pagamento de indenização por danos morais, bem como das demais cominações de estilo. Pleiteou, por fim, a concessão do benefício da Justiça Gratuita em seu favor. Anexou documentos.

O beneplácito da gratuidade da justiça restou deferido em favor da parte autora.

As rés, representadas por advogados com poderes especiais para tanto, compareceram espontaneamente aos autos, suprindo a falta de citação (CPC, art. 214, § 1º), ocasião em que apresentaram resposta sob a forma de contestação, altercando, preliminarmente, a inépcia da inicial em razão da falta do comprovante de residência em nome próprio. No mérito, aduziram, em suma, a ausência dos requisitos essenciais à responsabilização civil em face da inexistência de: a) ato ilícito, b) conduta negligente da ADM na contratação da Global, c) danos comprovados, e, d) nexo de causalidade em virtude da excludente de caso fortuito; além da não configuração da responsabilidade civil por dano ambiental. Requereram, ao final, a total improcedência do reclamo formulado na preambular. Aparelharam documentos.

Em réplica, a parte autora rechaçou as teses aventadas pelas rés, reeditando os argumentos expendidos na peça inaugural.

É o breve relatório.



Sobreveio sentença de improcedência, ao fundamento de que a parte autora deixou de comprovar - conforme lhe incumbia - que à época residia em local afetado pelo infortúnio (6).

Irresignado, o demandante interpôs o recurso de apelação cível presentemente apreciado, em que sustenta, em síntese, que: a) os documentos pessoais e a procuração, acostados junto à peça vestibular, comprovariam sua residência junto à localidade afetada pela fumaça tóxica, nos termos da Lei n. 7.115/1983, tendo o juízo a quo tratado o caso com excesso de rigor; b) a instância de origem já teria prolatado diversas sentenças favoráveis à pretensão autoral; c) o magistrado sentenciante deveria ter aberto prazo para a emenda à petição inicial, omissão que, segundo aduz, conduziria à nulidade do decisum impugnado; d) o julgamento antecipado da lide implicaria cerceamento de defesa; e) a extinção do feito dever-se-ia ter operado sem resolução do mérito.

Com tais fundamentos, postulou a reforma da sentença para que fossem julgados procedentes os pleitos autorais, ou, subsidiariamente, a anulação do decisum (14).

Contrarrazões no evento 19.

Após, os autos ascenderam ao Tribunal e me foram distribuídos por sorteio.

É o necessário relatório.

VOTO

Registro inicialmente que a decisão recorrida foi publicada na vigência do Código de Processo Civil de 1973, de modo que o presente caso será analisado sob o regramento da codificação antecedente, com pontual ressalva às disposições que ostentem aplicação imediata, em consonância com o Enunciado Administrativo n. 2 do Superior Tribunal de Justiça.

Por estarem preenchidos os requisitos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido.

Trata-se de Apelação Cível interposta por LUIZ GUSTAVO ALVES PEREIRA CARDOSO em "ação de indenização" que move em desfavor de ADM DO BRASIL LTDA e Global Logística e Transportes Ltda., tendo o magistrado sentenciante julgado improcedentes os pedidos declinados à exordial.

À guisa de questão preliminar, a parte autora infere que o magistrado sentenciante deveria ter aberto prazo para a emenda à petição inicial, a fim de que o demandante sanasse o vício apontado pelo julgador, sob pena de nulidade da decisão recorrida.

Razão, todavia, não lhe assiste.

Acerca dos requisitos da petição inicial, transcreve-se o seguinte excerto do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época da instrução:



Art. 282. A petição inicial indicará:

I - o juiz ou tribunal, a que é dirigida;

II - os nomes, prenomes, estado civil, profissão, domicílio e residência do autor e do réu;

III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido;

IV - o pedido, com as suas especificações;

V - o valor da causa;

VI - as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados;

VII - o requerimento para a citação do réu.

Art. 283. A petição inicial será instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação.

Art. 284. Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a emende, ou a complete, no prazo de 10 (dez) dias.

Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.



À espécie, não há falar em necessidade de abertura de prazo para emenda à exordial, visto que a hipótese dos autos não se subsome a vício passível de correção ulterior. Trata-se, em verdade, de hipótese de improcedência dos pedidos em face da inexistência de comprovação da pretensão autoral, porquanto ausente prova imprescindível ao endosso das alegações do demandante, matéria relativa ao direito instrutório e, por tal razão, atinente ao mérito da causa.

Acerca dos documentos que devem instruir a petição inicial, destaco as seguintes disposições do Código Buzaid:



Art. 396. Compete à parte instruir a petição inicial (art. 283), ou a resposta (art. 297), com os documentos destinados a provar-lhe as alegações.

Art. 397. É lícito às partes, em qualquer tempo, juntar aos autos documentos novos, quando destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados, ou para contrapô-los aos que foram produzidos nos autos.



E do Código de Processo Civil de 2015, veja-se:



Art. 434. Incumbe à parte instruir a petição inicial ou a contestação com os documentos destinados a provar suas alegações.

Parágrafo único. Quando o documento consistir em reprodução cinematográfica ou fonográfica, a parte deverá trazê-lo nos termos do caput, mas sua exposição será realizada em audiência, intimando-se previamente as partes.

Art. 435. É lícito às partes, em qualquer tempo, juntar aos autos documentos novos, quando destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados ou para contrapô-los aos que foram produzidos nos autos.

Parágrafo único. Admite-se também a juntada posterior de documentos formados após a petição inicial ou a contestação, bem como dos que se tornaram conhecidos, acessíveis ou disponíveis após esses atos, cabendo à parte que os produzir comprovar o motivo que a impediu de juntá-los anteriormente e incumbindo ao juiz, em qualquer caso, avaliar a conduta da parte de acordo com o art. 5º.



Dessarte, se, ao momento da propositura da ação, era perfeitamente possível à parte autora trazer o documento comprobatório de sua residência, afigura-se inviável a juntada posterior - sobretudo sem justificante idônea -, restando precluso o direito de produzir a referida prova documental, acarretando, in casu, a total improcedência dos pedidos, consoante acertadamente decidiu-se na instância de origem.

Sobre o tema, destaca-se valiosa lição de Fredie Didier Jr., Paula de Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira:



De acordo com o art. 396 do CPC, compete à parte instruir a petição inicial (art. 283), ou a resposta (art. 297), com os documentos destinados a provar-lhe as alegações. De uma forma geral, tem-se que a petição inicial e a contestação devem estar acompanhados, sob pena de invalidade, dos chamados documentos indispensáveis, que podem ser classificados em substanciais e fundamentais.

São substanciais os documentos que a lei expressamente exige para que a demanda seja proposta (a procuração; título executivo, na execução; prova escrita, na ação monitória; escritura pública, na reivindicatória de imóvel de valor superior a 30 vezes o maior salário mínimo vigente; o comprovante de que a pessoa jurídica é microempresa ou empresa de pequeno porte, para atuar no polo ativo de causa em juizado etc.). São fundamentais os documentos que se tornam indispensáveis porque o autor a eles se referiu na petição inicial, como fundamento do seu pedido. (DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula de Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil. Vol. II. 9ª Edição. JusPodivm: Salvador, 2014, p. 172 - grifou-se).



Em sentido idêntico, convém trazer à baila o preciso ensinamento de José Joaquim Calmon de Passos:



O momento para a produção de prova documental, pelo autor, é o do ajuizamento da petição inicial (art. 396). Se não produzido o documento nesta oportunidade, precluso estará o seu direito de trazê-lo aos autos com fins probatórios. Somente quando se cuide de fazer prova de fato ocorrido após os articulados, ou de contraprova à que foi produzida na circunstância apontada, é que se admitirá a produção de documento, pelo autor, após a inicial.

Em face disso, nem só os documentos ditos indispensáveis à propositura da ação devem acompanhar a inicial. Anexados...

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