Acórdão Nº 0300298-47.2017.8.24.0011 do Quarta Câmara de Direito Civil, 06-02-2020

Número do processo0300298-47.2017.8.24.0011
Data06 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemBrusque
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0300298-47.2017.8.24.0011

Relator: Desembargador José Agenor de Aragão

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C DANOS MORAIS E PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. FRAUDE NA EMISSÃO DE BOLETOS BANCÁRIOS QUE ENSEJARAM O PROTESTO DOS TÍTULOS E A NEGATIVAÇÃO DO NOME DA EMPRESA AUTORA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.

(i) RECURSO DO BANCO DEMANDADO

SUSCITADA SUA ILEGITIMIDADE PASSIVA "AD CAUSAM". INSUBSISTÊNCIA. ADULTERAÇÃO DO NOME DO BENEFICIÁRIO CONTIDO NOS BOLETOS BANCÁRIOS EMITIDOS NO SITE DA REQUERIDA. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA PELA CONFERÊNCIA DOS DADOS CONTIDOS NAS CÁRTULAS INCONTROVERSA. COMPROVAÇÃO DO PAGAMENTO DOS TÍTULOS PELA REQUERENTE. FALHA NO DEVER DE CUIDADO EVIDENCIADA. APLICAÇÃO DA TEORIA DO RISCO DO EMPREENDIMENTO. SÚMULA 479 DO STJ. BANCO QUE NÃO TOMOU AS CAUTELAS NECESSÁRIAS PARA EVITAR A OCORRÊNCIA DE FRAUDE. DÍVIDA, PORTANTO, INEXISTENTE. NEGATIVAÇÃO INDEVIDA. DANO MORAL "IN RE IPSA". DEVER DE INDENIZAR INAFASTÁVEL. INSURGÊNCIA RECHAÇADA.

(ii) APELO DA DEMANDANTE

PRETENDIDA A MAJORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. INACOLHIMENTO. VALOR ARBITRADO EM CONSONÂNCIA COM OS PRINCIPIOS DA ADEQUAÇÃO, RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE, ALÉM DE SEGUIR OS PARÂMETROS JURISPRUDENCIAIS.

HONORÁRIOS RECURSAIS. FIXAÇÃO DEVIDA EM FAVOR DO PATRONO DA PARTE AUTORA. EXEGESE DO ART. 85, § 11, DA NORMA PROCESSUAL E ORIENTAÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (EDcl no AgInt no REsp n. 1.573.573/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Belizze).

RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300298-47.2017.8.24.0011, da comarca de Brusque Vara Cível em que são Apte/Apdo Agatha Comércio de Material de Construção Ltda Me e Apdo/Apte Banco Bradesco S/A.

A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade de votos, conhecer de ambos os recursos e negar-lhes provimento. Fixar a verba honorária recursal em favor do procurador da autora em 2% (dois por cento), totalizando 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da condenação (art. 85, §11°, do CPC). Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Hélio David Vieira Figueira dos Santos, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador André Carvalho.

Florianópolis, 06 de fevereiro de 2019.

Desembargador José Agenor de Aragão

Relator


RELATÓRIO

Agatha Comércio de Material de Construção Ltda. Me, ajuizou ação de indenização por danos morais com pedido liminar da tutela de urgência pelos fatos e fundamentos jurídicos descritos na exordial de fls. 1/13, alegando, em síntese, que em meados de 2016, acessou a página eletrônica do banco requerido com o intuito de emitir a segunda via atualizada de três boletos bancários que estavam vencidos, sendo um no valor de R$583,66, do credor FABRIBAM, vencido em 22-7-2016 e outros dois do credor Fidc Martins, no valor de R$147,93 e R$142,11, ambos vencidos em 29-7-2016.

Afirma que, muito embora tenha emitido e quitado as segundas vias dos referidos boletos, após alguns dias, passou a ser cobrada em razão do suposto inadimplemento das cártulas.

Sustenta que, ao contatar os credores para esclarecer o ocorrido, foi cientificada de que os pagamentos não haviam sido perfectibilizados, porquanto a segunda via dos boletos emitida pelo próprio site da requerida havia direcionado os pagamentos para contas de terceiros, indicando uma falha do próprio site, situação que ensejou o protesto dos boletos junto ao tabelionato de notas local, bem como a inclusão de seu nome empresarial junto aos órgãos de proteção ao crédito.

Diante disso, pugnou pela concessão da tutela de urgência, para o fim de determinar a imediata exclusão dos apontamentos noticiados, e, no mérito, requereu a condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), a ser atualizado monetariamente e com acréscimo de juros de mora, ambos a incidir a partir da data do primeiro evento danoso (29-7-2016). Ao final, pleiteou pela inversão do onus da prova e condenação da instituição financeira ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios. Juntou documentos (fls. 14/49).

Em saneador (fl. 55), a Magistrada a quo determinou a emenda à exordial, o que restou cumprido à fl. 58.

Em audiência preliminar, a proposta conciliatória restou inexitosa (fl. 66).

Regularmente citada, a requerida apresentou contestação (fls. 68/82), aduzindo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva ad causam, haja vista que a emissão de boleto com dados bancários divergentes dos dados do credor da dívida configura evidente fraude contra terceiros, não podendo, portanto, responder civilmente pelo ocorrido. No mérito, sustentou que o abalo moral não restou demonstrado nos autos, motivo pelo qual a pretensão indenizatória não merece subsistir, ou, caso não seja este o entendimento, requereu a fixação dos danos morais de forma proporcional e moderada. Ao final, postulou a improcedência dos pedidos exordiais. Juntou documentos (fls. 83/90).

Réplica às fls. 94/101.

Devidamente intimadas para apresentarem as provas que pretendiam produzir (fl. 103), a parte autora informou que não possui mais provas a serem produzidas, além das constantes nos presentes autos, ao passo que o banco requerido ratificou as teses expendidas na peça contestatória (fls. 105 e 106).

Sentenciando (fls. 107/112), a Togada de primeiro grau julgou a lide nos seguintes termos:

"Do exposto, resolvo o mérito julgando procedentes os pedidos deduzidos na petição inicial (art. 487, I, do CPC), para condenar a acionada ao pagamento de reparação por danos morais em favor da parte ativa, fixada em R$ 10.000,00 por abalo de crédito, quantia que deverá ser devidamente corrigida pelos índices divulgados pela CGJ/SC, desde o seu arbitramento, nos termos da Súmula 362 do STJ, e acrescida de juros moratórios à razão de 1% ao mês (art. 406 do CC c/c art. 161, § 1.º do CTN), a contar da data do ilícito, nos termos do art. 398 do CC e da Súmula 54 do STJ.

Condeno a parte passiva ao pagamento das despesas processuais pendentes, conforme arts. 86 e 87 do CPC.

Está igualmente obrigada a indenizar as despesas adiantadas no curso do processo pelo vencedor, conforme art. 82, § 2º, do CPC.

Fixo os honorários sucumbenciais devidos pela parte antes referida ao advogado do litigante vencedor no percentual de 10% sobre o valor condenação (acrescido dos encargos moratórios), conforme art. 85 do CPC." (fls. 11/112 e 116).

Inconformada, a requerente interpôs recurso de apelação (fls. 118/128), pugnando pela majoração dos danos morais para quantia não inferior a R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) e pela majoração dos honorários de sucumbência.

Igualmente irresignada, a casa bancária requerida também apelou (fls. 132/137) oportunidade em que limitou-se a repisar os mesmos fatos e fundamentos jurídicos expendidos na peça contestatória em relação à sua ilegitimidade para figurar no polo passivo, pugnando, ao final, pela improcedência da actio.

Contrarrazões pela autora e pela requerida às fls. 145/152 e 155/164, respectivamente.

Os autos, então, vieram-me conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

Ab initio, sobreleva consignar que a sentença objurgada foi prolatada no dia 11-1-2018 (fl. 112) e publicada em 18-1-2018 (fl. 115), ou seja, sob a vigência do Diploma Processual Civil de 2015, atraindo, portanto, a aplicação do Enunciado Administrativo n. 3 da Corte da Cidadania à hipótese em análise, in verbis:

"Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

Os recursos de apelação interpostos são cabíveis, tempestivos e preenchem os requisitos de admissibilidade, razão pela qual defiro o seu processamento.

(i) RECURSO DA CASA BANCÁRIA REQUERIDA

Defende a apelante ser parte ilegítima para figurar no polo passivo do presente feito, ao argumento de que não foi beneficiária do pagamento efetuado pela parte autora, pois o valor foi creditado na conta do possível fraudador, situação que demonstra a ausência de culpa de sua parte e evidencia a inexistência de responsabilidade pelos danos causados à parte autora.

Razão, contudo, não lhe assiste.

Inicialmente, deve ser registrado que o caso sub judice atrai a aplicação da responsabilidade civil subjetiva, insculpida nos art. 186 e 927 do Diploma Civilista, in verbis:

Artigo 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou improcedência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

[...]

Artigo 927. Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Nesse sentir, colhe-se da doutrina de Flávio Tartuce:

"De início, ato ilícito é o ato praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direitos e causando prejuízos a outrem. Diante da sua ocorrência, a norma jurídica cria o dever de reparar o dano, o que justifica o fato de ser o ato ilícito fonte do direito obrigacional. (...) Pois bem, pode-se afirmar que o ato ilícito é a conduta humana que fere direitos subjetivos privados, estando em desacordo com a ordem jurídica e causando danos a alguém. [...] A consequência do ato ilícito é a obrigação de indenizar, de reparar o dano, nos termos da parte final do art. 927 do CC" (Manual de direito civil, volume único, 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 426-427).

Portanto, para o reconhecimento da responsabilidade civil subjetiva, é necessária a conjugação simultânea dos seguintes elementos: ação ou omissão culposa ou dolosa, dano e nexo de causalidade, a respeito dos quais se passa a perquirir.

Sobre o conceito de culpa, Sílvio de Salvo Venosa destaca que "em sentido amplo, culpa é a inobservância de um dever que o agente devia...

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