Acórdão Nº 0300323-62.2019.8.24.0020 do Quarta Câmara de Direito Público, 10-11-2022

Número do processo0300323-62.2019.8.24.0020
Data10 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300323-62.2019.8.24.0020/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ LUIZ DACOL

APELANTE: EDP TRANSMISSAO ALIANCA SC S.A. (AUTOR) ADVOGADO: PEDRO MIRANDA DE OLIVEIRA (OAB SC015762) APELADO: AIRTON MATIAS DISNER (RÉU) ADVOGADO: IVO CARMINATI (OAB SC003905) APELADO: PAULINO DISNER (RÉU) ADVOGADO: IVO CARMINATI (OAB SC003905) APELADO: ALINE NENES DISNER (RÉU) ADVOGADO: IVO CARMINATI (OAB SC003905) MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (MP)

RELATÓRIO

À luz dos princípios da economia e celeridade processual, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem (evento 132, SENT1, 1G):



Cuida-se de ação de constituição de servidão administrativa ajuizada por EDP Transmissão Aliança SC S.A. em desfavor de Airton Matias Disner, Aline Nenes Disner e Paulino Disner, em virtude da necessidade de implantação das Linhas de Transmissão integrantes do Lote 21, objeto do Contrato de Concessão 039/2017.

Requereu a procedência do pedido para constituir servidão administrativa em seu favor da área descrita na inicial, com o devido registro na matrícula do imóvel.

A liminar de imissão provisória na posse foi deferida e cumprida.

Citados, os réus apresentaram contestação conjunta, anuindo com a instituição da servidão administrativa e discordando do valor indenizatório proposto, em especial quanto ao valor atribuído ao hectare e ao coeficiente indicativo da perda de produtividade.

No mais, apresentaram reconvenção sob o fundamento que a indenização da terra nua e da perda de produtividade é insuficiente, havendo necessidade de indenizar "a proibição de construir sob a linha de transmissão de energia elétrica e imediações, dentro da faixa de servidão (30%); a limitação das culturas (10%); o perigo decorrente (10%); indução (2%); trânsito permanente para fiscalização, manutenção e reparos (3%), além da desvalorização do imóvel remanescente (8%)", além dos lucros cessantes e da desvalorização da área remanescente.

Houve réplica.

Instado, o Ministério Público optou por não intervir no feito.

Foi determinada a produção de prova pericial, com apresentação do laudo no Evento 77 e do laudo complementar no Evento 92.

Encerrada a instrução, houve a apresentação das razões finais por ambas as partes.

É o relatório.



Sobreveio sentença, a qual julgou a lide nos seguintes termos:



I) DA AÇÃO PRINCIPAL

JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido exordial para constituir servidão administrativa em favor da autora sobre a área descrita na inicial, tornando definitiva a liminar possessória.

Por corolário lógico, CONDENO a autora no pagamento de indenização em favor da ré pela constituição da servidão administrativa, no valor de R$ 61.199,09 (sessenta e um mil, cento e noventa e nove reais e nove centavos), a ser corrigida monetariamente pelo INPC a partir da data do laudo pericial e acrescida de juros moratórios de 6% ao ano a contar do trânsito em julgado, incidindo ainda juros compensatórios de 6% (seis por cento) ao ano desde a imissão provisória na posse até o efetivo pagamento da indenização, calculado sobre a diferença entre 80% (oitenta por cento) do preço ofertado em juízo pela autora e o valor do bem fixado na sentença, devendo ser abatido o valor já depositado no início do processo para obtenção da liminar possessória.

Ainda, CONDENO a autora no pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 5% (cinco por cento) do valor da diferença entre a indenização fixada e o preço oferecido.

Transitada em julgado, se mantida a decisão, extraia-se Carta de Sentença para registro da servidão na matrícula do imóvel, bem como expeça-se mandado de imissão definitiva na posse.

II) DA RECONVENÇÃO

JULGO IMPROCEDENTE o pedido reconvencional e, em consequência, CONDENO os réus no pagamento dos honorários advocatícios, que fixo em 1% (um por cento) sobre o valor atualizado da causa.

Sem custas na reconvenção (art. 4°, IX, da Lei n. 17.654/2018).



A parte autora opôs embargos de declaração (evento 138, EMBDECL1, 1G) que foram rejeitados (evento 141, DESPADEC1, 1G).

Inconformada, interpôs recurso de apelação (evento 153, APELAÇÃO1, 1G).

Sustentou, em suma, que o laudo pericial apresenta atecnias, em razão da suposta utilização de amostra comparativa inadequada composta por imóveis situados em localidades distintas; utilização de nota agronômica equivocada para imóvel que pertence a classe III do Manual Brasileiro para Classificação das Terras por Capacidade de Uso, e aplicação de coeficiente de restrição de uso da propriedade (62,62%) que, no entender da apelante, não traduz o prejuízo real, pois trata-se de imóvel destinado a rizicultura, cultura que não seria inviabilizada pela servidão. Quanto às benfeitorias reprodutivas, sustentou ausência de supressão ou limitação que justifique a indenização correspondente na área em que não há torres de alta tensão, mas apenas cabos suspensos, concluindo que a indenização deve se dar apenas no período da implantação do empreendimento, se esta não ocorrer após colheita.

Requereu, desse modo, o provimento do apelo, no sentido de: "(a) [...] reforma da sentença para considerar como justo valor indenizatório aquele indicado pela autora no laudo carreado à inicial; não sendo este o entendimento de Vossas Excelências, (b) [...] seja cassada a sentença para determinar o retorno dos autos à origem, a fim de que a perita seja intimada para corrigir as atecnias apresentadas no laudo, que incorreu por apurar valor indenizatório desproprocional e injusto, sob risco de causar enriquecimento ilícito à parte adversa."

Airton Matias Disner apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do reclamo (evento 160, CONTRAZAP1, 1G).

A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo recebimento do apelo no duplo efeito e pela ausência de interesse na causa (evento 8, PROMOÇÃO1, 2G).

Os autos vieram conclusos.

VOTO

1. Compulsando os autos, observo a presença de todos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão por que conheço do recurso.

2. A preliminar de nulidade do julgamento de Primeira Instância em razão da alegada atecnia do laudo pericial se confunde com a matéria de mérito do recurso e com ela será apreciada.

3. Esclareço que a recorrente ajuizou a ação objetivando constituição de servidão administrativa com área de 1,1216 ha que foi declarada de utilidade pública para passagem de linha de transmissão (evento 1, INF8, 1G). Ofereceu, desse modo, a título de indenização, o valor de R$ 19.871,13, apurado por assistente técnico (evento 1, INF9, 1G).

Cediço que a "servidão administrativa é o direito real de gozo, de natureza pública, instituído sobre imóvel de propriedade alheia, com base em lei, por entidade pública ou por seus delegados, em favor de um serviço público ou de um bem afetado a fim de utilidade pública" (PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di, Direito administrativo. 32 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 187).

Desse modo, havendo inutilização de área que impeça o proprietário de gozar e fruir integralmente de sua propriedade, é devida a indenização pelo prejuízo enfrentado.

Conforme leciona Hely Lopes Meirelles:



A indenização da servidão faz-se em correspondência com o prejuízo causado ao imóvel. Não há fundamento algum para o estabelecimento de um percentual fixo sobre o valor do bem serviente, como pretendem alguns julgados. A indenização há que corresponder ao efetivo prejuízo causado ao imóvel, segundo sua normal destinação. Se a servidão não prejudica a utilização do bem, nada há que indenizar; se prejudica, o pagamento deverá corresponder ao efetivo prejuízo, chegando, mesmo, a transformar-se em desapropriação...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT